segunda-feira, 1 de maio de 2017


Abéculices... internacionais!
(Quem não souber o que é, p.f. vá ao dicionário)

Todos, todos, sabemos que a estupidez cresce mais do que o joio no meio do trigo. Muito mais.
É dessas estupidências que vamos dar umas pequenas pinceladas.

Comecemos por uma enviada por um amigo, com uns acrescentos de minha lavra.
Portugal 1993
Presidia Mário Soares a terrinha, conhecido também por o Bochechas ou Sua Magestade D. Mário I, e ainda o vendedor do ultramar, etc., tendo como primeiro ministro e igualmente um dos primeiros destruidores do país, sexa prof. Aníbal Cavaco e Silva. Encantadores.
Aproximava-se uma data redonda da chegada dos portugueses a Tanegashima (1543-1993), quatrocentos e cinquenta anos, da chegada dos primeiros ocidentais a um novo país, com novas gentes a que chamaram vários nomes como Nanbam ou até Cipango.
No Japão, Portugal é uma referência mítica, algo que pertence ao mundo das lendas, imaterial, sem que obste a que por lá todos saibam que foram os portugueses que lhes apresentaram espingardas e iniciaram o cristianismo. E três séculos e meio depois, no século XIX, é outro português que dá a conhecer ao mundo o “novo” Japão, Wenceslau de Morais.

Memorial de Wenceslau de Morais, Kobe, Japão

Motivos de sobra para comemorar e procurar estreitar mais ainda as ligações de Portugal com aquele grande país.
O próprio Imperador fez saber, através dos canais diplomáticos, que viria com gosto a Lisboa para a comemoração.
Márinho e Anilbalzinho nunca responderam ao Imperador. Garotos educados!
A comemoração, em Portugal foi chocha e a trouxe-mouxe. Raras pessoas se deram conta desse evento! No Japão, nada.
Uma vergonha que os japoneses devem ter levado à conta da ignorância da cultura portuguesa!
E quer fazer-se respeitada?
Esperemos por 2043 para ver o que farão! Quinhentos anos. Se eu puder vou lá!

Gabão - 1974 (ou 75)
Como português, passei vergonha no Gabão. Não por ser um «português-angolano» mas por, teoricamente, ali representar Portugal. Não havia lá outro!
E eles sabiam que haviam passado 300 anos !
Em 1474 os portugueses, mais uma vez, foram os primeiros europeus a passarem a linha do Equador, chegando a uma terra a que deram o nome de Gabão, numa expedição capitaneada por Lopo Gonçalves e Rui de Sequeira. Igualmente deram nome ao hoje Cabo Lopes, primeiro foi Cabo Lopo, que resguarda a baía do mesmo nome e a cidade de Port-Gentil.
Não sei em que ano Portugal teria assinado um acordo com o Gabão no sentido de criar em Libreville uma espécie de centro de estudos da língua portuguesa e de história, para o que se comprometia a mandar um professor. O Gabão dava instalações, etc.
Isto porque, pelo menos nessa época, os gaboneses tinham muito orgulho do nome – Gabão – dado pelos portugueses, sabendo que no primeiro século desse contato só estes comerciavam com eles, o que os ligava a Portugal, e assim havia uns milhares, milhares, sim, de alunos que queriam estudar a história de Portugal e seus descobrimentos, para eles mesmos se descobrirem !
O que fez Portugal ? NADA!!! Eles queixavam-se do desrespeito que isso demonstrava!
E eu a ouvir isto «por honra da pátria», pátria amada que entretanto me estava a expulsar de Angola!
Tudo porque não mandaram para lá um professor, nem se dignaram manter o contato!
Estive quase para me oferecer, mas como o salário sairia de Lisboa... seria um tiro no pé!
Tanta falta faz um Afonso de Albuquerque ou uma Maria da Cruz (lembram-se dela? Em Porto Alexandre?)

Sobre os padrões destruídos em Angola:
Não poderia Portugal oferecer novos padrões a Angola, e ir lá, solenemente, colocá-los?
É por eles que começa a história “moderna”, de Angola.
Comentário de um amigo:
Ainda é cedo para essas diplomacias.
Aquilo em Angola, não está nada bom.
Quem manda e quem quer mandar necessitam de um espantalho externo que lhes dê argumentos e distraia as populações da miséria em que vivem.
Como a cultura geral também não é muita, para a maior parte das pessoas o exterior reduz-se a Portugal (ex potência colonial), ao Brasil (e as suas telenovelas) e aos vizinhos do outro lado da fronteira (que nem sabem se é outro país ou não).
A alternativa que houver a Portugal neste "jogo da bilha", será a China. Mas os chineses não brincam em serviço e optaram por uma estratégia de enclave: "compram" o poder para fazerem o que bem entendem, mas já nem sócios angolanos querem.
Essa dos padrões será só para daqui a muito tempo - se os políticos portugueses, entretanto, subirem de nível uns bons degraus.
Será que um dia sobem? Vai aparecer outro Marquês de Pombal, ou Dom Diniz?

Refeições de “trabalho”
Anvers – 1965
Um estágio de duas semanas na fábrica da Gevaert (que Deus haja) sobre artes gráficas. Muito interessante, aprendi pra caramba!
Almoço na fábrica com o pessoal.
Numa dessas refeições ficou ao meu lado uma jovem francófona e quase na frente uma flamenga. Todos os que rodeavam queriam saber “coisas” de África! Para meu enorme espanto as duas fingiam que não entendiam o que a outra dizia. Uma falava flamengo e inglês e a outra francês e castelhano. E eu, avis rara de Angola, é que servi de interprete! No fim do almoço, ainda sobrava um tempinho para um bate-papo, e um dos belgas veio perguntar-me como é que nós, portugueses, nos entendíamos com os indígenas, em África. Ótima pergunta!
A Bélgica que tinha sido, através do seu rei, “proprietária” do Congo, onde dizimou, segundo números oficiais uns dez milhões de congoloses, não tinha a menor noção do que era África.
A minha resposta foi curta e grossa:
- Entendemo-nos muito bem. Bem melhor do que aquelas duas moças, belgas que fingem que não se entendem.
Fim de papo.
O diretor de exportação da Gevaert, com um nome próprio para o país, Mr. Van Brusselen, simpático, um dia levou-me para almoçar na sala especial (VIP) da diretoria, onde mais uma vez fui uma espécie de raridade. Criados bem fardados, comida refinada, bons vinhos e charutos (eu não fumava, nem fumo), um belo café, os big chefes reunidos, choviam perguntas. E choveram respostas!
Uns dias depois o senhor Van Brusselen convidou-me para jantar em sua casa. Escreveu-me num papel o endereço e como lá chegar no carro que eu tinha comprado na Alemanha.
Um pouco fora de mão, mas cheguei em boa hora.
Estava ele e esposa. Amável, sentámo-nos na sala, e ele foi buscar dois copos e a garrafa de whisky. Copos de uns 2dl. Encheu os dois até às bordas, gelo... só no Polo Norte (nesse tempo) e quando eu vi aquele bestialidade, pensei que se bebesse tudo não conseguia voltar para casa.
Tchim, tchim, um golinho, pequeno, depois outro, mais um e consegui dar cabo da tarefa. O anfitrião ainda quis servir-me segunda dose!
Fomos para a mesa. Abriu uma garrafa de vinho português, serviu os copos, mas ele não bebeu! A senhora, atarefada entre o jantar e a cozinha, lá nos ofereceu do que havia preparado, e findo esse primeiro prato, o dono empurra tudo o que tinha na frente, dobra o braços em cima da mesa e cai de borco a roncar!
Fiquei sentado à mesa... sozinho!
A senhora pediu-me que desculpasse o marido, ele tem andado com muito trabalho... esquecendo o quase meio litro de whisky que tragara, e oferece-me uma imensa fatia dum bolo seco, que eu pensei que seria muito bom para absorver o que também tinha bebido, mas continuava lúcido!
A certa altura achei que devia ir embora. Agradeci muito, mas quando me levantei o cara acordou e queria que eu bebesse mais com ele!
-Muito obrigado, faz-se tarde e tenho que voltar para o hotel!
Au revoir, merci infiniment, etc., e como me soube bem o friozinho da noite.
Mas para encontrar o caminho de volta penei. Decidi seguir um ônibus. Andei um monte de tempo até que o dito entrou na garagem. Terminara o serviço! Esperei que saísse um noturno de volta. Lá o segui até encontrar alguma rua onde me orientar!
Bravamente consegui chegar são e salvo, cansado e enjoado até cair na minha cama!

Alemanha – 1967 (Já não lembro nem da cidade nem do nome da empresa)
In illo tempore – só meio século passado – trabalhava eu com o José Pinto, em Luanda, em material fotográfico, artes gráficas e outras artes.
Visitas a feiras internacionais e a fábricas de material que ou já representávamos ou queríamos representar.
Uma dessas empresas fabricava diverso material para uso em laboratório. Tudo em plástico, mas de qualidade germânica, que se vendia regularmente.
Cheguei cedo, fui recebido pela gerente de exportação, lá discutimos o que entendemos (saí de lá com um descontinho extra!) e, antes de sairmos para almoçar ela foi apresentar-se ao “patrão”, dono do negócio.
Sentadão atrás da sua mesa, um aperto de mão tipo glacial, e quando a gerente explicou quem eu era – da representação deles em Angola, e há alguns anos – o boche, fez só uma pequena observação:
- Ah! Angola! Portugal! Eusébio!
Foi uma espécie de murro no estômago. Não gostei. E “amavelmente” respondi-lhe:
- Alemanha! Nazis! Hitler!
E virei-lhe as costas! O besta recebe assim um cliente! A pobre gerente saiu correndo atrás de mim, pedindo-me desculpa da indelicadeza do patrão.
O miserável, que há anos fazia negócio conosco só sabia do Eusébio! Nem teve o cuidado de consultar um mapa, ver o nosso dossier, oferecer-me um café, enfim, ser normal!
O almocinho, tête-a-tête foi muito simpático, e eu, macho, nunca tinha sido convidado para almoçar por uma jovem senhora, quis pagar a conta.
-  Nem pense. Quem paga é a empresa.
- Assim pode pagar!

Brasil – 1986
Neste ano tive um “ataque”: deu-me para comprar um bonito pedaço de terra, na montanha, a quase 200 quilômetros de São Paulo. Lugar lindo, clima soberbo, no alto da serra, sem vizinhos (quase!) várias nascentes de água espetacular, enfim um pequeno paraíso.
Os “ataques” dessa doença foram se sucedendo, com a compra de ovelhas, vacas (para que o caseiro tivesse leite fresco para dar a uma filhinha pequena e até dois pangarés, para eu me sentir “um grande proprietário rural”. E duas selas para os montar.

Os pangarés... tranquilos
Os primeiros netos, grandes cavaleiros

Entretanto, durante a semana, dormiam lá os pedreiros que estavam a construir a casa (que ficou uma beleza), e tinham autorização para, no fim do dia montarem os cavalos para irem a uma pequena casa de comércio que ficava a uns 4 ou 5 kms.
Sexta feira ao fim do dia saía eu de SP para ir ver a obra e gozar daquele ambiente.
De manhã diz o encarregado da obra:
- Roubaram os cavalos! Quarta feira.
- ?
- Foi um sujeito que vive do outro lado do morro. O caminho dele, passa aqui por dentro do seu terreno. Nós passamos por ele, à noite, guardamos as selas e soltamos os animais. Ele rebentou a porta onde estavam as selas e levou tudo.
- Quem é o sujeito?
- O nome não sabemos. Mas não é boa gente. Anda escondido porque matou um homem, foi condenado, depois fugiu e aqui pensa que ninguém o vem buscar.
- Muito bem. Amanhã passo no posto da polícia e vou tratar disso.
Domingo, no regresso a casa passo na povoação e conto à polícia o que acontecera.
- Nós vamos averiguar. Quando o senhor voltar, já terá notícias.
Na sexta feira seguinte lá estava eu. A polícia tinha recuperado as selas, um pouco danificadas para esconder as marcas que eu lhes havia feito. E mandou que ele levasse os cavalos de volta.
- O senhor quer apresentar queixa?
- Não. Para que, se ele já tem um homicídio às costas e vive à solta, sabendo a polícia onde ele está. Quero só pedir-lhes um pequeno favor: digam a esse pilantra se ele voltar a passar dentro do meu terreno, mesmo que tenha obrigação de dar serventia no caminho, que eu o mato. Se o vir por lá, não vou perguntar se ele me vem roubar outra vez ou matar-me. Assim, com a arma que lá tenho o primeiro tiro é meu e o cara tomba.
- O senhor vai matá-lo?
- Se ele me aparecer pela frente, com certeza.
­O bandido devolveu os cavalos, nunca mais passou nem perto e eu não tinha arma nenhuma. Mas tive que dar uma de macho, que é assim que no meio do mato as coisas funcionam!


Abril, 2017

2 comentários:

  1. OS PRIMEIROS ABÉCULAS SÃO OS DICIONARISTAS! TALVEZ PORQUE, JULGANDO-SE INTELIGENTES DEMAIS, ACABAM POR SER UNS NABOS, NÃO METENDO O VERBETE. BELA COLECÇÃO. E QUANTAS MAIS ABÉCULAS EM ARMAZÉM!SOMOS DOS MAIORES PRODUTORES MUNDIAIS DE ABÉCULA...

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  2. Encontrei! Aquele "cara" que me falou só no Eusébio... foi em Sigen!
    Meio caminho entre Frankfurt e Dusseldorf!

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