sábado, 30 de outubro de 2010

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Crónicas ou Crônicas
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Portucalenses

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(ao correr da pena)

 
Se Portugal vale a pena, um passeio pelo Alentejo é sempre algo maior! Aquelas planuras imensas com uma luz andaluza, os sobreiros com as suas copas abertas lembrando as acácias das savanas de África e, como símbolo da vitalidade de um país antigo (aliás o mais antigo do mundo com suas fronteiras definidas!), os milhares de hectares com novas plantações de oliveiras e até, para meu grande espanto, plantações de sobreiros que os proprietários sabem, primeiro da sua dificuldade em “pegar” e depois que só vão tirar rendimento destas maravilhosas árvores ao fim de 30 anos!

E como se come bem no Alentejo!... Beber, tem muita escolha dos vinhos regionais alentejanos, de que é difícil eleger o melhor. Podem bebê-los todos que são sempre bons.

E também se roda bem nas ótimas estradas que o retalham de vila em vila!

A brancura das suas casas, a lhaneza das gentes, uma anedota dos próprios sobre si mesmos, um castelo aqui e uma fortaleza do tempo dos árabes, além.

Além da sua beleza, o Alentejo é uma terapia para a alma! A quietude, ou espaço que chama à elevação, à meditação, ao sossego.

E o Algarve? O Al Garb, o velho Ocidente de toda a Península Ibérica, assim chamado pelos árabes.
Não há que o comparar ao Alentejo. Cada região sua beleza. O Algarve, atração turística por excelência em toda a Europa, com as suas praias lindas, um clima ameno praticamente todo o ano, mais de uma dezena de campos de golfe, montes de hotéis, cassino, prédios, sobretudo de veranistas, que saem do chão a toda a hora, o que mais falta para ser um lugar de eleição?
Voltemos à gastronomia, e aqui é o mar que impera.
No entanto não foram todas estas maravilhas que me levaram ao Algarve, mas sim encontrar e abraçar o meu amigo Alberto Gomes, “O Alberto” de quem já falei neste blog, e não via há mais de 47 anos! Recebeu-nos principescamente com uma caldeirada à moda da Baía das Pipas, uma verdadeira obra de arte culinária, mas sobretudo com seu enorme coração, sempre forte e rijo, com imenso calor humano e uma simplicidade que continua a captar a admiração e a amizade de quem o conhece.
O peixe para a caldeirada teve que o ir buscar a Olhão porque na Quateira o peixe parece ser pequenino e inapropriado!

E o vinho, além e de umas garrafinhas da vizinha Adega Cooperativa de Lagoa mais duas dum novo Alvarinho “Reguengo de Melgaço”, todas para serem bebidas de pé... mas apesar destas excelências, a caldeirada sobrepujou ou vinicultores!

Alberto ainda é um homem rijo e forte, em vésperas de completar 91 anos! Uma memória que envergonha qualquer elefante, e sempre uma história divertida para contar.

Descendente de pescadores algarvios pelo pai e neto dum chefe Mucubal pela mãe, foi um dia assistir a um casamento desta sua gente. Boi não se mata habitualmente; só em cerimônias especiais, como funeral ou casamento, e nesse dia o melhor boi, gordo e grande, foi o escolhido para abate. Vários homens correram, mas o bicho era forte e correndo, a todos ia sacudindo, não se deixando apanhar. Devia calcular a sorte que o esperava! No meio da confusão o nosso amigo Alberto esperava impassível o desenrolar do acontecimento, quando o boi corre em direção a ele. Alberto só tem tempo de o agarrar pelos chifres e, com toda a sua força, não largava o bicho! Este, deseperado sacode-se violentamente e consegue fugir. Mas os dois chifres ficaram na mão do Alberto!

O grande Alberto Gomes e toda a sua juventude de 90 anos

Podem achar que é balela dele. É preciso conhecê-lo, além da fama de no seu tempo ser talvez o homem mais forte da região de Moçamedes, hoje Namibe, para se ter a certeza de que isto foi verdade!

Foi uma grande jornada de muita amizade e recordações de um bonito passado que só volta nestes encontros.

31-out-10

(continua)

















quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Do Brasil por Francisco G. de Amorim

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Crónicas ou Crônicas Portucalenses - 1 -


(ao correr da pena!)





Visitar Portugal, aliás irmãos e amigos, que são os que lá nos levam, é algo que, à medida que os anos nos vão pesando nos ombros (e no resto...) se torna uma emoção só!
Todos, ou quase, a ficarem como eu, velhotinhos, mas onde a amizade e a saudade parecem que vão crescendo com o tempo e a longa distância física que nos separa.
Se é uma benção encontrar tantos amigos, é uma tortura a impossibilidade de arranjar tempo para ver todos, abraçar todos, e ter com todos palavras que quebrem a emoção, recordem o bom tempo que passámos juntos, e mitiguem assim um pouco dessa saudade que logo a seguir cresce ainda mais!
De qualquer modo visitar e passear por Portugal no Outono, é uma beleza. Tempo lindo, temperatura agradável, muita e magnífica fruta, do vinho nem se fala, e de gastronomia não me venham com sofisticações, “maitres” franceses, etc., porque em qualquer tasquinha daquele país se come maravilhosamente. E barato.
São as sardinhas assadas, o cozido à portuguesa, a feijoada de feijão branco com farinheira, as ameijoas à Bulhão Pato e o peixe, e o bacalhau! Ah! O bacalhau, sobretudo o do meu amigo Pereira, do Restaurante Laurentina, em Lisboa, o melhor bacalhau do mundo... e arredores! E os chouriços, paios, paiolas e presuntos, de porco preto ou branco, as alheiras e farinheiras, os queijos frescos e curados de Serpa e Évora, os cremosos de Azeitão e o glorioso queijo da Serra! Sem esquecer os pasteis de nata!
Não há como alguém se livrar de regressar a casa com uns quilitos a mais na barriga e uma imensa saudade. Inclusive por não ter conseguido oportunidade de ir beber umas ginginhas na velha “Tendinha”, no Rossio!
Vontade de voltar há sempre. O que é difícil é a viagem não ser de borla, além da imensa canseira que são as horas de espera nos aeroportos e as nove horas e meia de vôo. Pior ainda quando ao Rio de Janeiro chegam vários aviões ao mesmo tempo, formando imensas filas para o controle da Polícia que demora, demora, demora..., e depois as malas que para saírem demoram, demoram, demoram... Amontoam-se os passageiros, só há duas esteiras para retirar as bagagens, e quer o Rio sediar as Olimpíadas!
Desta vez SÓ ficámos no aeroporto, depois do avião pousar, mais de duas horas! Se os pés já chegam inchados como barriga de elefante, este final é dramático.
Voltemos a Portugal. Estradas de primeira qualidade por todo o país, as ruas das cidades sem buraqueira, muita automação, um cada vez maior respeito pelo pedestre que atravessas as ruas, enfim um país integrado, mesmo com dificuldades, no chamado primeiro mundo.
Problemas, uma vez mais nos aguardam na “volta a casa”: o tal respeito pelos pedestres... cada um que atravesse a rua onde quiser e correndinho que o automobilista está com pressa! E depois a triste sensação de encontrar o carro que deixámos na garagem em bom estado, afinal está com a suspensão toda estragada! Mas como é possível se o carro não andou durante a ausência do dono? Mistério! Chama-se o mecânico que confirma que está tudo em ordem! Mas logo vem à memória o que havíamos esquecido: as ruas da cidade!!! Uma buraqueira de fazer trincar os dentes! Sobretudo nos bairros menos “nobres” da cidade, onde vive a maioria da população que, mesmo com dificuldade, paga os seus impostos!
Agora os fados? Paixão da minha mocidade, parece estar crescendo em força. Que bom. Lá estão as herdeiras da Amália, da Lucília do Carmo, do Marceneiro, e tantos outros, e os exímios guitarristas “chorando” o fado menor! Ouvir um fadinho bem cantado, enquanto se saboreiam algumas “tapas” e uns copos do bom vinho... sempre nos faz rejuvenescer!
No Tejo já não se vêm as fragatas usadas sobretudo no transporte de cargas. Barcos lindos, cheios de tipicidade, de que só se encontram hoje raros exemplares. É pena, mas a evolução não tem coração.
Mas ficaram os carros elétricos, cheios de turistas de todas as nacionalidades, o elevador de Santa Justa onde estes fazem longas filas para não perder o espetáculo de ver a Baixa pelo alto, e, sobretudo e infelizmente, a passividade do povo português face à grave crise que está e vai atravessar!
Deu vivas ao Salazar, depois ao “glorioso vintecincobarraquatro” que arruinou as finanças do país, sorriu e aplaudiu o Cavaco e os montes de dinheiro que veio da CEE, deixou que os governos gastassem “à tripa forra”, com salários milionários aos comparsas dos partidos políticos, e agora que a crise subiu à tona, xingam os governantes e os políticos, mas cada um tranquilamente sentado no seu habitual canto do café, misturando a “desgraça do aperto de cinto” que aí vem, com os resultados do Benfica ou do Porto!
Mas tudo isto acaba por ser folclore! Vejam-se os hotéis cheios, turistas do mundo inteiro, um povo sisudo mas cortês, um sol maravilhoso e um bom petisco em cada esquina!
Portugal vale a pena!

28-out-10



(continua)