O Rio de Janeiro
Histórias da sua História
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Não podemos
“sair” do Convento sem contar mais duas historinhas que ilustram, uma, a
engenhosidade de alguns frades, e outra a política que tantas vezes, sem se preocupar
com a cultura e história prefere destruir o que lhe possa dar nome e votos. Já
lá voltaremos.
Era uso no século
XIX que os pregadores franciscanos pagassem ao convento, por cada sermão do
Evangelho, feito noutras igrejas, uma dobra, e por cada prática quatro mil
reis, tal o sucesso dos franciscanos na cidade. Era um ónus pesado!
Frei
Francisco de
Santa Teresa de Jesus Sampaio,
um dos mais fecundos intelectuais e oradores, mais tarde também um grande
político, escrevia, sem cessar, pregões que os frades que iam pregar fora
levavam, não sem antes lhe pagarem os quatro mil reis! No regresso ao Convento os
pregadores tinham que entregar ao frei guardião o que haviam recebido!
Um dia frei Francisco de Mont’Alverne, um grande
teólogo e orador, que foi pregador oficial do Império, recebeu um convite para
ir pregar na Igreja dos Terceiros do Hospício, pondo a condição de que ninguém
deveria saber (para que pudesse guardar o pagamento!). Aceite o acordo, lá foi,
pregou, voltou para casa sem que algum dos confrades tivesse tomado
conhecimento. À noite houve uma solenidade no altar da enfermaria e frei
Mont’Alverne lá foi, um pouco cedo e conversava com o guardião, frei Joaquim de
S. Jerônimo, quando entra no salão um devoto, pessoa muito estimada, que, se lhe
dirige, entusiasmado:
-
Ah! Padre mestre. Que magnífico sermão pregou hoje vossa caridade! A admiração
foi geral e eu ainda me encontro comovido e arrebatado!
Frei Mont’Alverne estava apanhado! E o devoto, muito
enlevado relatou tudo quanto testemunhara.
O guardião começou a rir:
-
Venha a dobra, padre mestre!
E frei Mont’Alverne teve que pagar!
Frei Sampaio foi mais hábil. Pouco tempo depois tinha
que ir pregar um “sermão de angústia” na igreja da Misericórdia, e quando saía
da sua cela encontrou o guardião com ar contrariado e pergunta-lhe:
-
Que tem padre mestre? Parece preocupado?
-
Ah! Não se pode mais ser prelado nestas casas. Os frades só nos dão desgostos!
-
Deveras? – disse frei Sampaio sorrindo.
-
Ria-se, ria-se, mas se fosse guardião havia de viver angustiado como eu.
-
Pois por mim, eu lhe juro que não se queixará sobre o meu quinhão de angústias.
-
Estou certo disso, e nunca pensei o contrário.
Dias depois lá foi frei Sampaio pregar o seu sermão.
Voltou depois para a sua cela, e mal tinha entrado apareceu-lhe o frei
guardião.
-
A dobra, padre mestre!
-
Que dobra?
-
A dobra do sermão que pregou.
-
Oh! Padre mestre guardião. De pagar essa dobra estou eu livre, porque preguei
um sermão de angústias e há três dias lhe jurei, e vossa caridade recebeu meu
juramento, que eu não lhe daria o meu quinhão de angústias.
O guardião riu-se e frei Sampaio não pagou a dobra!
Genial!!!
No dia 4 de Setembro de 1911, sem aviso prévio
apareceram no Convento o segundo Procurador da República e o diretor do
Patrimônio Nacional, para despejarem os frades e sequestrarem o Convento!
O tal diretor queria que os frades saíssem
imediatamente! Interveio o procurador e a saída foi adiada, mas deixaram o
Convento sob a guarda de um oficial de diligências e dois policiais!
No dia seguinte, o ainda e mesmo diretor, voltou a
exigir que os frades cumprissem a ordem de despejo até às quatro horas do dia
seguinte.
Dia 5 os jornais encheram as páginas com tão insólita
notícia! Num deles “a União Católica Brasileira
e a Associação da Mocidade, convidava todos os católicos do Rio de Janeiro para
assistirem à saída dos religiosos franciscanos do seu Convento no Largo da
Carioca, hoje, até às quatro horas da tarde, hora em que serão expulsos da sua
residência. A Mocidade Católica convida todos os Vicentinos, todas as
associações todos os católicos para se reunirem junto ao Convento, durante todo
o dia para assistir aos religiosos e confortá-los.”
O povo reuniu-se em massa. O Executivo soube do
desagradável incidente. O ministro do Exterior apressou-se a apresentar
desculpas ao Núncio Apostólico.
Os frades permaneceram no Convento. Depois desta
encenação “trágico-cômica” o governo moveu ainda um processo, tentando
apoderar-se do Convento, mas perdeu a questão e foi condenado a pagar as
custas. Recorreu ao Supremo. Este, seis
anos mais tarde, apreciou o mérito e unanimemente negou-lhe provimento.
Publicada a sentença a 7 de Julho de 1918, o Executivo
revogou a ordem de sequestro no dia 17 de Abril de 1919!
Como é fácil de imaginar houve alguns politicalhos que
quiseram tirar vantagem de tamanha estupidez. Mas... o pior é que continua a
haver gentalha dessa e, se o Supremo naquele tempo levou seis anos para
apreciar e resolver a questão, imaginem como será hoje em dia, com milhares de
processos, sobretudo os da canalha que quase leva o Brasil à falência (vidé
Lava Jato).
Pelas Histórias anteriores foi-se apercebendo
que Joaquim Manuel de Macedo tinha pelos políticos, a mesma consideração que
tem hoje TODO o Brasil por essa mesma casta de fervorosos “crentes”!
Em 1861 a
Irmandade da S. Cruz dos Militares tinha uma receita de 596.603$129,
proveniente de aplicações financeiras, do aluguel de alguns prédios que lhes
tinham legado, e ainda da contribuição dos irmãos, pagando religiosamente as
devidas pensões às viúvas e órfãos de irmãos finados. Esta receita mostra bem o
cuidado e sabedoria das administrações da Irmandade.
Diz Macedo: Pois nem todas as irmandades podem gabar-se
do mesmo. O culto divino está ao serviço da pátria e há bom número de carolas
que se aproveitam do serviço de Deus para cuidarem dos seus interesses
particulares.
São os que rezam o Pai Nosso unicamente por
causa do venha a nós! ...faz
desconfiar tanta dedicação religiosa!
Século e meio
passado, o que tem de devotos! Nas miríades de pseudo-igrejas que não mais são
do que rendosíssimo comércio de venda de milagres, e na política, o VENHA A NÓS, muito, mas muito mesmo,
vai mesmo para eles!
Basta ver o que
se passa com os fundos de pensões, no Brasil, “rapados” pela canalha!
A questão da
fronteira nordeste do Brasil com a França remonta ao Tratado de Utrecht de 1713, mas diversas interpretações
quanto ao seu traçado continuam a existir. A França considerava que o rio
Oiapoque mencionado no texto
correspondia ao Araguari, o que lhes daria mais 400 quilômetros de costa e para
cima de cento e sessenta mil quilômetros quadrados da Amazónia, e o Brasil
considera que o Oiapoque... é o Oiapoque. O litígio correu durante quase dois
séculos, na corte de Haia, até que uma arbitragem internacional feita pela Suíça deu razão ao Brasil.
O que o Rio de Janeiro tem a ver com
isso? Muito. Vejamos.
Como se pode imaginar o Brasil não tinha
como “resolver” o problema na paulada! A França ainda era uma das maiores
potencias do mundo e, sabendo disso o Brasil não recrutou um único soldado, não
fundiu canhões, nem a Marinha se movimentou. Mas, ainda segundo Macedo, “um poderoso exército se postou no
Oiapoque”!
Esse exército, brilhante, foi o livro
"L’Oyapock et l’Amazone", um estudo completo sobre a questão,
editado em Paris em 1861 pelo seu autor o dr. Joaquim Caetano da Silva, gaúcho
de nascimento, médico pela Universidade de Montpellier, em França, e o
defensor, em Haia, do processo que ali corria. Tão minucioso e completo esse
estudo que a arbitragem não teve grande dificuldade em acabar por dar razão ao
Brasil, que continua a ser Do Oiapoque ao
Chui!
O dr. Joaquim Caetano da Silva, foi carioca,
por delegação do Imperador que o nomeou para várias embaixadas na Europa.
Por enquanto deixou o Rio em paz. Vou
para outras bandas.
Paz? No Rio? Impossível, mas...
26/04/2017
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