quarta-feira, 26 de abril de 2017



O Rio de Janeiro
Histórias da sua História
- 5 -

Não podemos “sair” do Convento sem contar mais duas historinhas que ilustram, uma, a engenhosidade de alguns frades, e outra a política que tantas vezes, sem se preocupar com a cultura e história prefere destruir o que lhe possa dar nome e votos. Já lá voltaremos.

Era uso no século XIX que os pregadores franciscanos pagassem ao convento, por cada sermão do Evangelho, feito noutras igrejas, uma dobra, e por cada prática quatro mil reis, tal o sucesso dos franciscanos na cidade. Era um ónus pesado!
Frei Francisco de Santa Teresa de Jesus Sampaio, um dos mais fecundos intelectuais e oradores, mais tarde também um grande político, escrevia, sem cessar, pregões que os frades que iam pregar fora levavam, não sem antes lhe pagarem os quatro mil reis! No regresso ao Convento os pregadores tinham que entregar ao frei guardião o que haviam recebido!
Um dia frei Francisco de Mont’Alverne, um grande teólogo e orador, que foi pregador oficial do Império, recebeu um convite para ir pregar na Igreja dos Terceiros do Hospício, pondo a condição de que ninguém deveria saber (para que pudesse guardar o pagamento!). Aceite o acordo, lá foi, pregou, voltou para casa sem que algum dos confrades tivesse tomado conhecimento. À noite houve uma solenidade no altar da enfermaria e frei Mont’Alverne lá foi, um pouco cedo e conversava com o guardião, frei Joaquim de S. Jerônimo, quando entra no salão um devoto, pessoa muito estimada, que, se lhe dirige, entusiasmado:
- Ah! Padre mestre. Que magnífico sermão pregou hoje vossa caridade! A admiração foi geral e eu ainda me encontro comovido e arrebatado!
Frei Mont’Alverne estava apanhado! E o devoto, muito enlevado relatou tudo quanto testemunhara.
O guardião começou a rir:
- Venha a dobra, padre mestre!
E frei Mont’Alverne teve que pagar!
Frei Sampaio foi mais hábil. Pouco tempo depois tinha que ir pregar um “sermão de angústia” na igreja da Misericórdia, e quando saía da sua cela encontrou o guardião com ar contrariado e pergunta-lhe:
- Que tem padre mestre? Parece preocupado?
- Ah! Não se pode mais ser prelado nestas casas. Os frades só nos dão desgostos!
- Deveras? – disse frei Sampaio sorrindo.
- Ria-se, ria-se, mas se fosse guardião havia de viver angustiado como eu.
- Pois por mim, eu lhe juro que não se queixará sobre o meu quinhão de angústias.
- Estou certo disso, e nunca pensei o contrário.
Dias depois lá foi frei Sampaio pregar o seu sermão. Voltou depois para a sua cela, e mal tinha entrado apareceu-lhe o frei guardião.
- A dobra, padre mestre!
- Que dobra?
- A dobra do sermão que pregou.
- Oh! Padre mestre guardião. De pagar essa dobra estou eu livre, porque preguei um sermão de angústias e há três dias lhe jurei, e vossa caridade recebeu meu juramento, que eu não lhe daria o meu quinhão de angústias.
O guardião riu-se e frei Sampaio não pagou a dobra!
Genial!!!

No dia 4 de Setembro de 1911, sem aviso prévio apareceram no Convento o segundo Procurador da República e o diretor do Patrimônio Nacional, para despejarem os frades e sequestrarem o Convento!
O tal diretor queria que os frades saíssem imediatamente! Interveio o procurador e a saída foi adiada, mas deixaram o Convento sob a guarda de um oficial de diligências e dois policiais!
No dia seguinte, o ainda e mesmo diretor, voltou a exigir que os frades cumprissem a ordem de despejo até às quatro horas do dia seguinte.
Dia 5 os jornais encheram as páginas com tão insólita notícia! Num deles “a União Católica Brasileira e a Associação da Mocidade, convidava todos os católicos do Rio de Janeiro para assistirem à saída dos religiosos franciscanos do seu Convento no Largo da Carioca, hoje, até às quatro horas da tarde, hora em que serão expulsos da sua residência. A Mocidade Católica convida todos os Vicentinos, todas as associações todos os católicos para se reunirem junto ao Convento, durante todo o dia para assistir aos religiosos e confortá-los.”
O povo reuniu-se em massa. O Executivo soube do desagradável incidente. O ministro do Exterior apressou-se a apresentar desculpas ao Núncio Apostólico.
Os frades permaneceram no Convento. Depois desta encenação “trágico-cômica” o governo moveu ainda um processo, tentando apoderar-se do Convento, mas perdeu a questão e foi condenado a pagar as custas. Recorreu ao Supremo. Este, seis anos mais tarde, apreciou o mérito e unanimemente negou-lhe provimento.
Publicada a sentença a 7 de Julho de 1918, o Executivo revogou a ordem de sequestro no dia 17 de Abril de 1919!

Como é fácil de imaginar houve alguns politicalhos que quiseram tirar vantagem de tamanha estupidez. Mas... o pior é que continua a haver gentalha dessa e, se o Supremo naquele tempo levou seis anos para apreciar e resolver a questão, imaginem como será hoje em dia, com milhares de processos, sobretudo os da canalha que quase leva o Brasil à falência (vidé Lava Jato).

 Pelas Histórias anteriores foi-se apercebendo que Joaquim Manuel de Macedo tinha pelos políticos, a mesma consideração que tem hoje TODO o Brasil por essa mesma casta de fervorosos “crentes”!
Em 1861 a Irmandade da S. Cruz dos Militares tinha uma receita de 596.603$129, proveniente de aplicações financeiras, do aluguel de alguns prédios que lhes tinham legado, e ainda da contribuição dos irmãos, pagando religiosamente as devidas pensões às viúvas e órfãos de irmãos finados. Esta receita mostra bem o cuidado e sabedoria das administrações da Irmandade.
Diz Macedo: Pois nem todas as irmandades podem gabar-se do mesmo. O culto divino está ao serviço da pátria e há bom número de carolas que se aproveitam do serviço de Deus para cuidarem dos seus interesses particulares.
São os que rezam o Pai Nosso unicamente por causa do venha a nós! ...faz desconfiar tanta dedicação religiosa!
Século e meio passado, o que tem de devotos! Nas miríades de pseudo-igrejas que não mais são do que rendosíssimo comércio de venda de milagres, e na política, o VENHA A NÓS, muito, mas muito mesmo, vai mesmo para eles!
Basta ver o que se passa com os fundos de pensões, no Brasil, “rapados” pela canalha!

A questão da fronteira nordeste do Brasil com a França remonta ao Tratado de Utrecht de 1713, mas diversas interpretações quanto ao seu traçado continuam a existir. A França considerava que o rio Oiapoque mencionado no texto correspondia ao Araguari, o que lhes daria mais 400 quilômetros de costa e para cima de cento e sessenta mil quilômetros quadrados da Amazónia, e o Brasil considera que o Oiapoque... é o Oiapoque. O litígio correu durante quase dois séculos, na corte de Haia, até que uma arbitragem internacional feita pela Suíça deu razão ao Brasil.
O que o Rio de Janeiro tem a ver com isso? Muito. Vejamos.
Como se pode imaginar o Brasil não tinha como “resolver” o problema na paulada! A França ainda era uma das maiores potencias do mundo e, sabendo disso o Brasil não recrutou um único soldado, não fundiu canhões, nem a Marinha se movimentou. Mas, ainda segundo Macedo, “um poderoso exército se postou no Oiapoque”!
Esse exército, brilhante, foi o livro "L’Oyapock et l’Amazone", um estudo completo sobre a questão, editado em Paris em 1861 pelo seu autor o dr. Joaquim Caetano da Silva, gaúcho de nascimento, médico pela Universidade de Montpellier, em França, e o defensor, em Haia, do processo que ali corria. Tão minucioso e completo esse estudo que a arbitragem não teve grande dificuldade em acabar por dar razão ao Brasil, que continua a ser Do Oiapoque ao Chui!
O dr. Joaquim Caetano da Silva, foi carioca, por delegação do Imperador que o nomeou para várias embaixadas na Europa.

Por enquanto deixou o Rio em paz. Vou para outras bandas.
Paz? No Rio? Impossível, mas...

26/04/2017




domingo, 23 de abril de 2017



O Rio de Janeiro
Histórias da sua História
- 4 -


Mas mais uma vez, e não será a última, voltemos ao Convento de Santo António e aos Franciscanos.
Mas esta é uma história ESPECIAL.
Palavras de Joaquim Manuel de Macedo:
“Em um armário perto daquela sacristia acham-se cuidadosamente guardadas e conservadas quatro jarras de pau com uma delicada pintura de flores, e tão bem acabado trabalho que, apesar de velhas, iludem a vista, observadas mesmo a curta distância, parecendo de fina porcelana da China. (O escritor J.M. de Macedo chamou-lhes “porcelana da Índia”)
Estas jarras foram devidas a uma inocente travessura de um frade.
Como é natural, os religiosos esmeravam-se em ornar muito a sua igreja no dia da festa de S. António, e tinham já por costume mandar pedir emprestadas para esse fim umas lindíssimas jarras de porcelana que possuía um devoto fre­quentador do convento.
O bom devoto emprestava as suas belas jarras com o maior prazer, e talvez até que estimasse bastante vê-las uma vez por ano figurar no altar de S. António.
Durante não poucos anos, o pedido era tão certo da parte dos frades como o empréstimo da parte do devoto.
Em um ano, enfim, no dia que se seguiu ao da festa de S. António, estavam na igreja o sacristão, desarmando o altar, e um religioso, frei Francisco Solano Benjamim, con­versando com ele.
- Agora, cuidado com as jarras do devoto - disse o sacristão, tirando-as do altar com toda a delicadeza que pôde.
- Com efeito - observou frei Solano - Seria uma infelicidade se uma dessas jarras se quebrasse.
- Certamente. Porque não há outras tão lindas e tão ricas na cidade, e não podería­mos haver por preço algum, uma ou duas, iguais ou semelhantes, para restituir ao dono.
- Pois é preciso não pedi-las emprestadas outra vez.
- Sim... mas... 
- Quando têm de ser devolvidas?  - perguntou frei Solano, observando-as atentamente.
- Hoje mesmo.
- Mas eu preciso que elas me sejam confiadas por quatro ou cinco dias.
- Para quê?
- E um segredo meu.
O sacristão conveio no pedido de frei Solano; e este, levando para a sua cela as quatro jarras, tirou-lhes escrupulosamente o molde e, com o mesmo escrúpulo, copiou a pintura que as ornava.
No dia da festa de S. António do ano seguinte, o constante devoto vinha subin­do a ladeira do convento um pouco admirado de não lhe terem sido pedidas as suas jarras, como nos anos anteriores.
Desconfiariam os frades da minha boa vontade? - perguntava ele a si mesmo. - Já teriam comprado jarras tão bonitas como as minhas?
Assim refletindo, chegou o devoto ao adro e entrou na igreja, e depois de fazer a sua oração adiantou-se para a capela-mor, pôs os olhos no altar e recuou dois passos, exclamando:
As minhas jarras!    
Tornou a olhar, aproximou-se, observou com todo o cuidado e repetiu:
São as minhas jarras!
Mas o devoto tinha a certeza de não as haver emprestado, e confundido, com o que via, saiu da igreja, correu a casa, foi direto a um armário onde guardava as suas preciosas jarras e viu-as, com espanto, no seu devido lugar.
Voltou ao convento imediatamente, tornou a entrar na igreja e a olhar para o altar-mor.
Mas, por fim de contas, são mesmo as minhas jarras - disse ele.
Acabada a. festa, dirigiu-se o devoto ao sacristão e pediu-lhe encarecidamente que lhe explicasse aquele mistério.
O sacristão, sorrindo, foi tirar as jarras do altar e veio apresentá-las ao devoto.
- Bem vê que não são as mesmas - disse.
- Como? São as minhas, sim! - exclamou o devoto.
- Nesse caso, aí as tem. Tome conta delas.
O devoto, a esforços do sacristão, recebeu as jarras, e ficou ainda mais admirado.
- Então?
- Não são as minhas - disse, entregando outra vez as jarras. - Não são. Mas a única diferença é que as minhas são de porcelana, e estas são de pau.
- Há ainda outra diferença - observou o sacristão.
- E que as suas vieram da China, e estas foram feitas aqui no convento por frei Francisco Solano.                                                      
Este ligeiro episódio das jarras de pau, aliás, é absolutamente verdadeiro.”

Depois de ter lido isto impunha-se uma visita ao Mosteiro! Tinha que lá ir ver esta obra. A curiosidade era imensa. Não consegui ver as jarras, que devem ser do final do séc. XVII, princípio do XVIII. Estão bem guardadas, em ambiente climatizado, não são exibidas nem em visitas guiadas, mas... pedi, muito, a um dos frades, o historiador do Convento, frei Roger Brunorio, se me conseguia uma foto das ditas. Atencioso, não prometeu, pediu-me para lhe mandar um e-mail explicando para que queria as fotos, e... o bom frade respondeu-me logo, e com as fotos! Como lhe estou grato. Que belo presente me mandou!



Não é possível deixar de ficar pasmado com a qualidade deste trabalho! Imitação, aliás cópia, das jarras de porcelana chinesa do século XVIII, feitas à mão, em madeira de mogno, e pintadas com uma precisão espetacular. Devem ter cerca de uns 220 a 230 anos!
Que trabalho magnífico! Reparem bem. Feitas na cela de convento, sem maquinaria, e com estes detalhes. Mais: em quatro ou cinco dias! A qualidade, a precisão, as cores... Não deve existir, em todo o mundo semelhante trabalho!
Voltemos a dar a palavra ao escritor Macedo:
“Frei Francisco Solano (1743-1818) foi um grande artista. Nasceu em Macacu, Estado do Rio de Janeiro, em 1743 e faleceu em 1818 no Convento, onde se tornou notável por diversos quadros de santos que executou e que ainda existem. Não era, nem podia ser, um grande mestre. Nunca saiu do Brasil, não teve a educação artística das academias, nem a frequência de pintores abalizados. Nos seus quadros adivinha-se e saúda-se o génio. Notam-se, porém, ao mesmo tempo, os senões devidos à falta de escola, aprecia-se a beleza do colorido; às vezes, porém, repara-se em alguma desproporção das formas das suas figuras. Entretanto, é impossível deixar de reconhecer talento e inspiração nas obras da sua paleta.
Há ainda outra razão para não se deixar no esquecimento o nome de frei Fran­cisco Solano.
Quando, no fim do século, outro franciscano, o célebre frei José Mariano da Conceição Veloso, se ocupava da sua importantíssima Flora Brasileira, tra­balho imenso que perpetuará o nome desse nosso compatriota, foi reconhecida a necessidade de dar um ajudante ao notável botânico.
O padre mestre frei Veloso não sabia desenhar, e não podia prescindir do de­senho na sua obra. Pediu, pois, que lhe fosse dado um ajudante desenhador, e por proposta sua, o vice-rei Luiz de Vasconcelos e Souza escolheu frei Francisco Solano para desempenhar esse mister.
Frei Solano tornou-se então o companheiro inseparável de frei Veloso. Seguiu-o em suas excursões pelo interior e pelas florestas, tomou parte em suas laboriosas vi­gílias de gabinete, e são, enfim, dele todos os desenhos de plantas que se encontram na Flora Brasileira.
Entre 1783 e 1790 percorreram a Capitania do Rio de janeiro para fazer o levantamento botânico da região.”

Como estão a ver há muito o que visitar e “espiolhar” neste Rio de Janeiro, além das praias, das caipirinhas e do Carnaval.
Ainda vamos falar um pouco mais do Convento e do Rio antigo. Aguardem.


19/04/2017

segunda-feira, 17 de abril de 2017



O Rio de Janeiro
Histórias da sua História
- 3 –

Vamos agora falar dos Franciscanos e seu Convento, “ali” no Morro da Carioca, o Convento de Santo António, e um pouco do nosso Santo.
Para se ter uma ideia de como era o Rio no século XVII, já com o Convento, que se fundou em 1608:

Ao fundo o Pão de Açúcar, e no centro a lagoa do Boqueirão descrito em texto anterior

No altar mor da Capela dedicado a Santo António, que se destaca na imagem ao lado do Mosteiro, havia uma bela imagem do Santo, obra de um dos frades da Ordem, artista que trabalhava em madeira, fez o magnífico corpo, com suas vestes, mas ao chegar à cabeça, sempre com a mesma devoção, não conseguia equilibrar essa parte, final da obra, com o corpo. Ou ficava pequena ou grande demais e o frade-artista, por muito que tentasse não chegava ao ponto de considerar a obra pronta, o que o entristecia. O Santo sem cabeça arriscava a que o frade perdesse a sua, porque nas conversas entre a confraria a única explicação era por causa de uma “desastrada imperícia”!
Mas uma noite, já bem tarde soa inesperadamente a campainha da portaria. Todos os frades já recolhidos, podia ser, por exemplo uma chamada de socorro para algum pobre moribundo. Corre-se à portaria, abre-se a porta e não se vê ninguém! Mesmo olhando em volta, em frente à porta não havia vivalma. Mas... encontram depositada no chão uma cabeça de Santo António!
Indaga-se, procura-se o portador do singular e precioso presente, e... nada!
A notícia do extraordinário espalha-se pelo mosteiro e acodem todos à porta. A cabeça é levada ao corpo do santo que já estava pronto, e serve perfeitamente como se tivesse sido feita expressamente para ele.
Nunca se pôde resolver o mistério e, antigas tradições fazem supor que os franciscanos consideraram ser uma obra sobrenatural.
É a imagem do Santo que se venerava na capela. Fui lá confirmar, e se o caso da cabeça ficou como lenda, a imagem já não está no altar!
O livro do Tombo dos Franciscanos tem escrito: “ Em 1621 colocou-se a imagem de Santo Antônio, o corpo feito por um religioso e a cabeça por um que pediu uma esmola para jantar, como se vê no Cartório do Convento”!


Para onde foi a estátua? Veremos mais adiante.
Santo Antonio é o santo de praticamente todas as causas! Tem sob a sua alçada os barqueiros, os marinheiros, os náufragos, os viajantes, os velhos, os pobres e oprimidos, as solteiras, as grávidas, as estéreis e os namorados, e as tropas, os batalhões!
E não é só o santo dos portugueses, brasileiros e italianos: para acabar com a “briga” se era de Lisboa ou Pádua, o Papa Leão XIII (1878-1903) chamou-lhe “o santo de todo o mundo”
E tem uma longa, imensa história, como “bravo” militar.
Santo António começou por assentar praça em Portugal, como soldado, durante as Guerras da Restauração, no Terço da Câmara de Lisboa, pouco tempo antes de 17 de junho de 1665, data em que foi travada a Batalha de Montes Claros, entre portugueses e espanhóis. Foi durante estes confrontos durante a Restauração da Independência, que o santo começou a destacar-se como protetor das forças portuguesas. Entre os soldados, começou a surgir a crença de que a presença da sua imagem em batalha redobrava a sua força e confiança, e 1665 será a data do início da carreira militar de Santo António, uma vez que foi nesse ano que o rei D. Afonso VI ordenou que o santo “fosse alistado no exército, como seu patrono” e que “assentasse praça como soldado” e lhe fosse pago o respetivo soldo”.
A primeira promoção aconteceu depois da Guerra da Restauração. Como reconhecimento pelas vitórias alcançadas frente aos espanhóis, D. Pedro II ordenou que o santo fosse integrado no Regimento de Infantaria n.º 2 de Lagos. À entrada para o regimento, em finais de janeiro de 1668, seguiu-se em 1733 a promoção a capitão. O santo começou então a receber um soldo de dez mil réis, conforme carta régia emitida por D. João V. Mais tarde, o capitão António foi aumentado, passando a recebeu 15 mil réis mensais.
Em 1777, o major Hércules António Carlos Luís Joseph Maria de Albuquerque e Araújo de Magalhães Homem (êta nome brabo!), do Regimento de Lagos, entregou a D. Maria I uma petição para que Santo António fosse promovido ao posto de major tendo em conta o seu “desempenho militar exemplar”.
“Durante todo o tempo, em que tem sido capitão, vai quase para cem anos, constantemente “cumpriu seu dever com o maior prazer à frente de sua companhia”, em todas as ocasiões, em paz e em guerra, e tal que tem sido visto por seus soldados vezes sem número, como eles todos estão prontos para testemunhar: e em tudo o mais tem-se comportado sempre como fidalgo e oficial”.
Na petição, o major do Regimento de Lagos fez ainda questão de certificar que não existia “alguma nota relativa a Santo António, de mau comportamento ou irregularidade praticada por ele: nem de ter sido em tempo algum açoitado, preso, ou de qualquer modo punido durante o tempo que serviu como soldado raso no regimento”.
Apesar dos apelos de Magalhães Homem, a promoção a major nunca chegou a acontecer.
Em vez disso, o santo foi promovido três anos depois ao posto de oficial-general.

Documento onde consta o pagamento ao “oficial”!

A influência da imagem de Santo António no moral das tropas portuguesas era tal que chegou mesmo a ser roubada pelos franceses, que acreditaram assim poderem derrotar o exército português. Porém, ao descobrirem que a estátua tinha desaparecido, os portugueses atacaram com toda a força os franceses para recuperar o santo mais do que querido.
A imagem portuguesa encontra-se hoje no Museu Militar do Buçaco, e ostenta ao peito a Cruz da Guerra Peninsular, pelas lutas travadas contra as forças napoleónicas. Como forma de agradecimento pela vitória sob o exército francês, D. João VI atribuiu ainda ao santo a patente de tenente-coronel de infantaria, em 1814, já após a guerra, e recebeu ainda a Grã-Cruz da Ordem Militar de Cristo.
Com a extinção das ordens religiosas em 1834, a estátua de Santo António Militar só voltou a sair à rua, em Portugal, em 1895. É dessa altura que data um incidente que marcou a história da imagem. “Fez-se uma procissão, mas a imagem foi atacada pela maçonaria, na Baixa e a população teve de fugir”.
Foi também por volta dessa altura, para assinalar a comemoração dos 700 anos do nascimento do Santo, que surgiu a ideia de o promover a coronel. Porém, a promoção nunca chegou e o santo permaneceu para sempre general.
(Estranho: não foi promovido a major, mas a general, depois andou para trás para tenente coronel e mais tarde não o quiseram “promover” a coronel! Ele já era general!)

Deixemos Santo António... em Portugal, e voltemos ao Rio de Janeiro ver o “nosso” valeroso soldado, posto com que chegou ao Rio,
Em 1710, quando da invasão dos franceses, com Duclerc, o Governador, Francisco de Morais e Castro, pediu a proteção de Santo António e mandou ao Convento uma patente que o nomeava Capitão de Infantaria! O rei aprovou, e estipulou um soldo de dezesseis mil reis mensais, pagos ao Convento.
A imagem foi colocada no muro do Convento empunhando o bastão que lhe dera o governador da Colônia do Sacramento, Sebastião Veiga Cabral, em sinal de agradecimento pela proteção à sua guarnição de seiscentos homens que estiveram sitiados durante seis meses pelos espanhóis, protegendo os cariocas, e assim os franceses foram derrotados!
Em sinal de gratidão, a imagem do santo (e sua perfeita cabeça!) foi colocada no frontispício da Igreja, em 1779 muda para um nicho no frontispício do Convento, e passou a ser conhecida como Santo Antônio do Relento!
Lá está o Santo ao relento!

Para o altar-mor foi executada outra imagem, maior. A que lá está hoje!
Nas imagens, ele sempre aparece carregando o menino Jesus no colo. Segundo a fé católica, um barão que abrigava Santo Antônio no quarto de hóspedes de seu castelo viu, pelo buraco da fechadura, que o frei estava envolvido por uma luz de brilho muito forte e, em seu colo, sobre um livro grosso, estava um bebê, dando risadinhas. O bebê olhou e estendeu os braços na direção do barão, que ficou atordoado e fechou os olhos. Abrindo-os, só viu Santo Antônio de braços vazios. A criança seria o menino Jesus.
No candomblé da Bahia, Santo Antônio é conhecido como Ogum, o orixá da guerra, que forjava as suas próprias armas de metal.  
Passados uns anos, em 1810 o capitão Antônio é promovido a Sargento-Mor, equivalente a major, com soldo de trinta mil reis.
Em 1814 passa a tenente coronel, recebe a Grã Cruz da Ordem de Cristo e, até ao fim da monarquia sempre recebeu o soldo.
O governo republicano, alegando a separação entre Estado e Igreja suspendeu o pagamento, mas o Marechal Floriano ordenou que o soldo fosse pago enquanto um decreto especial não o cancelasse. Nunca houve o tal decreto, mas desde abril de 1991, não houve mais pagamento.
Em 1924, o Santo ainda constava como elemento do Exército Brasileiro, que levou o então Presidente Artur Bernardes, a emitir um despacho ao Ministro da Guerra, Fernando Setembrino de Carvalho, onde pedia a reforma de Santo António. Antes, porém, o Presidente, numa carta ao Ministro da Guerra, escrevera: "O Coronel António de Pádua vai quase em três séculos de serviço. Nomeie-o general e ponha-o na reserva."
Santo António figura desde então no Anuário Brasileiro, na lista dos oficiais da reserva do Exército da República do Brasil.

Nota: Estranho! Um militar com mais de 400 anos de serviço – no Brasil – passa à reserva e não tem direito a “aposentadoria”?

13/04/2017







quarta-feira, 12 de abril de 2017


Justiça e Liberdade
e Perdão

Estamos no tempo do Perdão. Aliás é sempre tempo para perdoar !
Há 60 anos estava eu, jovenzinho, cheio de fogo “na guelra” a estagiar no Porto, na fábrica de cerveja.  Metia o nariz em tudo, fazia perguntas, análises no laboratório, passava horas com os funcionários e com o diretor técnico, enfim, queria aprender tudo no mínimo tempo possível. O normal para um jovem que não nasceu acomodado.
Fim de Outubro, começo de Novembro um daqueles frióis que assola a “Mui Nobre, Sempre Leal e Invicta Cidade do Poro”, derramou sobre a dita cidade uma miserável e brava epidemia de gripe, que foi derrubando, lá na fábrica, uns quarenta por cento do pessoal: diretor técnico, gerente de produção de refrigerantes (bastante péssimos na altura!), as técnicas do laboratório, os encarregados da produção de verveja e das adegas, enfim, quase poderia ter paralisado a fábrica. Ao ver o panorama, eu estava sózinho lá no Porto, fui a uma farmácia e pedi que me dessem uma qualquer dose “cavalar” que me livrasse daquela praga quase faraônica e bíblica. Calça abaixo, seringa na bunda... livrei-me da praga. O administrador da companhia, um homem muito simpático, cabelo todo branco, chamou-me e diz-me que tinha dado ordem para que nada fosse à sua mão sem o meu visto e eventual comentário.
Como é de imaginar eu quis tirar a dita b... fora, não consegui, e assim durante uns dez dias fui eu o “manda chuva” técnico. Aprendi mais nesses poucos dias do que nos outros três meses que ali estive!
O pessoal, todos os trabalhadores, almoçavam na fábrica e sempre lhes sobrava um tempinho para relaxarem, sentando-se à volta dum pátio e dando largas à conversa.
Entre esses trabalhadores, mulheres e homens, havia uma jovem, bonitona, desembaraçada, que atraía os olhares dos “lobos machistas”, sem que algum se atrevesse a pisar o risco.
Pois, num dos dias em que estava eu de responsável, um deles “pisou o tal risco” e a mulher em resposta cuspiu-lhe na cara! Burburinho, o homem quis dar-lhe um tapa, agarra daqui e dali, enfim, o caso veio parar às minhas mãos. Bem que eles podiam ter esperado mais uns dias...
Chamei-os, olhei bem na cara deles, colegas e até amigos havia já uns cinco ou seis anos, vinham cabisbaixos, e comecei o “discurso”, bem simples:
- Olhem, tenho duas opções para este problema: eu penso que vocês sempre se respeitaram, mas face ao que se passou agora e já está feito, e mal feito, uma tremenda falta de disciplina, ou faço uma comunicação para a administração e vocês apanham no mínimo uns quantos dias de suspenção, ou então olham bem olhos nos olhos e ambos pedem desculpa ao outro, não a mim, pelo disparate cometido. Mas nada de fingir que pedem desculpa, com má cara. Se o fizerem a sério o problema fica aqui resolvido entre nós.
Caras fechadas, aguardaram uns momentos, comecei a ver que estava difícil de se encararem, e insisti:
- Não vamos ficar aqui toda a tarde. Ou, realmente cada um pede desculpa ao outro ou...
Olharam-se, e começaram a achar graça ao “jogo”!
Primeiro pediram desculpa olhando-se de soslaio, e eu disse-lhes que assim não valia!
Voltaram a olhar-se, caras mais descontraídas e acabaram por pedir as necessárias desculpas!
- Vocês são amigos, não são?
- Somos.
- Então não se esqueçam que o respeito de um pelo outro é fundamental. Um aperto de mão e podem voltar ao trabalho sabendo que nada aconteceu, nem sequer comentem com os colegas. Isso nunca aconteceu. E a fábrica (aquilo se dera nos empregados da adega) continua a funcionar em boa harmonia.
Acabou a «farra» e tudo continuou sem incidentes.

Muitos, muitos anos depois, ao ler sobre os inuits – o povo do nordeste do Canadá e Groelândia – e sobre a sua filosofia de justiça, fiquei maravilhado. Quando alguém comete um crime, qualquer que seja, é chamado para encarar toda a comunidade. Ali confessa o erro, mostra-se arrependido e pede desculpa a todos. O “processo” fica resolvido, o “criminoso” volta à sociedade, sem nunca haver outra condenação. O próprio se sentindo arrependido e auto-condenado é o suficiente, e nem a comunidade lhe cobra mais alguma coisa. Passou, passou.
2.000 anos antes já esse sistema tinha sido anunciado! Até o miserável ladrão, pendurado na cruz, ao mostrar-se arrependido teve a certeza de que “logo se encontraria no reino dos céus”.
Cristo nunca condenou ninguém. O criminoso tem que se encarar, arrepender, formular com todo o seu coração, arrependimento e vontade de se emendar, e assim continuar no meio da sociedade, sem ser segregado.
O veridicto anunciado era o Perdão ! Perdoar a todos, perdoar ao seu semelhante, aos irmãos.
Como contnua a ser tão difícil perdoar !
Naquele tempo já havia o que continua a ser a maior desgraça da humanidade: o “chefe”, o “rei”, o que se arrogava, e ainda arroga o direito de vida e de morte sobre o seu semelhante, e muitas vezes ainda os comiam ! Hoje matam com tiros, bombas, facadas, gases, etc., ou, talvez pior mantendo bilhões de seres na maior miséria !
Criaram-se leis, sempre ditadas de cima para baixo, os poderosos com “jurisdição” sobre os mais fracos, e com isso os castigos, a prisão, a pena de morte, o arbítrio, a violência, o esmagamento dos mais desfavorecidos, o destroçar dos mais elementares princípios de humanidade.
Os soldados, derrotados em guerra, eram degolados ou viravam escravos. Não tinham mais poder algum. Não eram mais gente, eram peças. Mercadoria.
As leis e os tribunais “evoluíram”, sempre criando mais leis e mais castigos e pior, transformando-se em locais de contenda pessoal, quantas vezes da exibição do ego, em que a promotoria tudo faz para derrotar a defesa, e vice-versa, à custa do miserável que não cumpriu com as leis “dos de cima”, como se o que estivesse em causa mais fosse um jogo em que um jogador faz o mais que pode para vencer o outro, e não procurar a redenção dum ser humano.
Há relativamente pouco tempo o Canadá decidiu levar a sua “justiça”, a dos homens brancos, lá bem no Norte, para os inuits. Juiz, promotor e defensor, de avião para os gelos do Norte, montar o «circo jurídico».
Lá chegados, um julgamento “à séria”, se o criminoso fosse condenado era levado de avião para prisões no sul. O que os “meritíssimos” não esperavam era que a comunidade não deixava sair o avião com o prisioneiro sem que TODOS se fossem, afetuosamente, despedir dele.
O juiz face a esse espetáculo/lição resolveu que tinha que deixar a comunidade resolver seus próprios problemas, sem que “invasores”, como ele, pudessem interferir na forma humana como ela agia.
Agora, no Quebec, cada vez mais se estudam e adotam os sistemas dos “grandes seres primitivos”, procurando que os tribunais em vez de serem praças de antagonismo, se transformem em lugares de conciliação e mútuo entendimento.
Esses “seres primitivos”... como têm o que nos ensinar! Basta que se consiga meter na cabeça dos homens que somos todos iguais, que ninguém leva para a cova o que arrecadou a mais, quando podia tê-lo distribuído ou proporcionado um mais justo, humanitário, equilíbrio de vida entre todos.
Nas comunidades ‘‘primitivas’’ que em boa hora se vão expandindo, todos são iguais, todos têm exatamente os mesmos direitos, e se a comunidade tiver lucro, fruto do seu trabalho, esse é distribuído igualmente por todos.
Sociedade igualitária? Porque não?
Difícil!
Há que enterrar a ganância, o lucro absurdo, as abissais diferenças de ganho, por exemplo entre um jogador de futebol que ganha centenas de milhões por mês e um trabalhador que para dar de comer à família muito sua e às vezes não consegue.
Na Grécia antiga os atletas recebiam como prémio uma coroa de louros. E batiam-se por ela com mais entusiasmo do que hoje os animalescos e ferozes lutadores de boxe se esmurram, por vezes até à morte, para ganhar os tais milhões! E o povo, burro, besta, ainda pára para ver cenas de extrema brutalidade.
Cada vez mais, a parece que o homem terá sido o maior erro da Criação, não parece ?
Como perdoar, por exemplo às centenas de políticos que roubaram trilhões e deixaram o Brasil à beira da falência ? Como perdoar aos loucos/fanáticos do ISIS que matam só para matar ? Como perdoar a juízes que engavetam e escondem processos de criminosos para se venderem ? Como perdoar quase toda a humanidade que vê, neste momento, 20 milhões de seres a morrerem à fome sabendo que um só dos foguetes que a Coreia do Norte lança – e já lançou uma dúzia – daria para resolver grande parte do problema ? Como perdoar os responsáveis por ataques com armas químicas em cima de crianças e mesmo de militares oponentes ? Como perdoar aos responsáveis dos países que apregoam a Paz e vendem trilhões de dólares de armamento... que é feito para matar ?
Solução para este desiquilíbrio universal?
Um meteoro como o que acabou com os dinossauros... e começar tudo de novo ?
E, daqui a outros “x” milhões de anos voltaremos a ter milionários e sempre e cada vez mais pobres !


03/04/2017

terça-feira, 11 de abril de 2017



ANGOLA
Histórias da sua História
(Adenda ao texto anterior)


Vimos que Porto Alexandre teve vários nomes. Parece que teria começado como Porto Pinda, depois, Angra das Aldeias e, cerca de 1835 um explorador inglês, com autorização do governo português (???)  explorou aquela região, desenhou uma carta do que viu e nela inscreveu aquela baía – Angra das Aldeias – com o nome de “Port Alexander”, aliás muita mal colocada geograficamente.
Os babacas que então governavam Angola e/ou Portugal, não corrigiram a carta e assim se mudou a baía para o nome de um totalmente estrangeiro, o nome que era lindo, Angra das Aldeias, ou até Pinda.
Em 1860 com a chegada de algarvios o tal Porto Alexandre começa a tomar vulto, até, como se viu, com a magnífica Dona Maria da Cruz, e de lá “brotaram” uma boa quantidade de angolanos, muitos dos quais viraram “meus sobrinhos”!!!
Um dos fundadores de Porto Alexandre foi João Dolbeth e Costa. E agora o meu coração voltou a bater mais depressa:
1- Quando visitei Moçamedes, primeiro em 1958 e depois aí por 1962 ou 3, estive com um dos seus descendentes. Qual não lembro. Mas na ida a Angola na já “famosa” e quase lendária travessia no Mussulo, chegámos a Namibe dia 03 de Janeiro de 2006 e, uma das pessoas que nos aguardava na praia era o “Lanucha”, o general Alexandre Dolbeth e Costa, um amigo, que virou “sobrinho” e que deve fazer parte das grandes figuras de Angola. A sua atuação nas Forças Armadas a defender a fronteira sul contra os sul-africanos e, sobretudo, a sua alegria e simpatia contagiantes, marcaram a nossa rápida estadia na capital do Namibe.
2- Desta vez tentei lembrar de outras pessoas com quem estivera em 58! Lembrava só do nome “Mac-Mahon Vitória Pereira”. Um e uma irmã que me foram buscar ao hotel e me levaram a uma inesquecível visita à Baía das Pipas. Mas ninguém mais dessa família vivia já em 2006 no que fora Moçamedes, e virara Namibe, e agora, quer queiram quer não, voltou a ser Moçamedes!
Depois, durante a curta estadia em Luanda, antes de regressar a casa, cansado, demasiado emocionado com tudo o que tornara a ver e muito sentir, um dia, estava no Club Naval e apareceu um senhor, barba e cabelo brancos, bem mais novo do que eu, e com ele um rapaz aí dos seus dezessete anos.
Dirigiu-se a mim:
- Sei que foi amigo do meu pai e por isso venho cumprimentá-lo. O meu pai foi o Mac-Mahon Vitória Pereira (continuo a não recordar o primeiro nome, infelizmente) que o levou à Baía das Pipas. E trouxe o meu filho para o conhecer!
Se eu já estava num alto estágio de emoção, aquele gesto de imensa simpatia derrubou-me ainda mais! Só lembro – agora já lá vão mais onze anos – que este senhor era professor da universidade em Luanda. Se lhe chegar esta pequena nota ao conhecimento, saiba que não o esqueci, e lhe mando um forte e amigo abraço. E ao filho.
3- Outro dos primeiros povoadores foi Alexandre Augusto de Sampaio Nunes. Aí por 1954 conheci, possivelmente um dos seus netos Acrísio (Tendinha?) Sampaio Nunes, que trabalhava na Companhia Mineira do Lobito, com sede em Nova Lisboa!
4.- Por fim a família Tendinha, (serão todos descendentes do 1º presidente privativo da Câmara Municipal de Porto Alexandre, Lourdino Fernandes Tendinha?) começando pela “grande cineasta” Ana Clara Tendinha Rivera que filmou a chegada dos velejadores, do Rui Tendinha que nos albergou no seu simpático e confortável hotel/compound, e depois em Luanda o Mário Tendinha e o Manuel João Tendinha Pimentel Teixeira!
Parece que todos têm boas raízes em Porto Alexandre/Tombua, mas... e o Namibe?
Do Google Earth. O traço vermelho indicou uma distância entre
Namibe e Tombua de cerca de 40 kms.

Namibe? Mais um apontamento sobre aquelas terras do sul, enquadradas pelo deserto do Namibe pelo nascente e pelo generoso e lindo mar pelo poente.
A cidade de Moçamedes, após 1975 virou Namibe, a capital da Província do Namibe, dentro do deserto do Namibe, perto da fronteira com a Namíbia, confrontando com o... deserto do Namibe, na Namíbia. Um tanto confuso, não?
O padrão de Cabo Negro foi por ali colocado, como já vimos, por Diogo Cão em 1485. Dois anos depois Vasco da Gama esteve na Angra das Aldeias e por portugueses.
Em 1770 o sertanejo João Pilarte da Silva desceu a Chela para ir socorrer uns náufragos que tinham dado à costa.
Em 1787 nova expedição em que participou o naturalista Joaquim José da Silva encontrou o padrão original derrubado e o reergueu.
Em 1785 outra expedição, comandada pelo tenente coronel de engenharia Luis Candido Barreto Pinheiro Furtado, saiu de Benguela na fragata Loanda, fundeou na Angra do Negro, e a batizou com o nome do governador que ordenara essa expedição: Baía de Moçamedes.
Moçamedes deve assim este nome ao 6º Senhor de Mossamedes, e 1º Barão de Moçamedes, José de Almeida e Vasconcelos (José de Almeida e Vasconcelos Soveral de Carvalho da Maia Soares de Albergaria) que foi governador de Angola entre 1784 e 1797. Moçamedes, ou Mossamedes, que até soa como uma palavra de origem angolana, nada tem disso!
Vem dum Reguengo de Mossamedes, que foi doado em 1389, pelo rei D. João I a Gonçalo Pires de Almeida, por seus serviços e para casar com Inês Anes, sua parenta, viúva de Afonso Fernandes de Figueiredo.”
Família com nobreza medieval (séc.XIV) por ter a varonia antiga dos "Almeidas por quem o Tejo chora", foi a primeira que usou o duplo apelido Almeida e Vasconcelos. Tem o título "de juro e herdade" de Barão de Mossâmedes, que tirou do Reguengo de Mossâmedes (na Beira) propriedade concedida aos seus antepassados em 1388.
Ao fundar a povoação, no sul de Angola, o Ten. Cor. homenageou o nome do antiquíssimo reguengo propriedade da família do governador.
Esteve assim a antiga “Angra dos Negros” com o nome de Moçamedes durante, pelo menos 190 anos.
Agora, depois da independência lhe ter mudado o nome, a cidade de Namibe é riscada do mapa e volta a aparecer a cidade de Moçamedes!
Porque este “volte face”? Não sei e ainda não encontrei quem o explique, assim como não vislumbro o porquê de Porto Alexandre (nome aliás mal dado) ter virado Tombua, quando podia ter voltado para Pinda!
Coisas da política... sempre mesquinha, e quantas vezes destruidora da história!


10/04/2017