domingo, 2 de julho de 2017



CAMINHOS do SOL
Moçambique visto por dentro!

Tem muita história vindo aí, sobre Moçambique. Crónicas belíssimas, escritas por um grande amigo moçambicano, personagem do mais alto valor intelectual e moral daquele país.
Se indicasse simplesmente o seu nome, imagino que muitos dos leitores deste blog ficaria “na mesma”, por não o conhecer.
Assim, antes de darmos início à publicação destas crónicas, que o autor me sugeriu que colocasse no meu blog (não estou a querer me apropriar do alheio, longe vá o agouro!) vou apresentá-lo.

Jorge Ferrão

Nasceu em 23 de dezembro de 1962, na província de Nampula. Fluente em Português, inglês, francês e espanhol.
Atualmente é o reitor da Universidade Pedagógica, a maior universidade do país, com mais de 55,000 estudantes e de 2000 docentes. Esta Universidade Pedagógica tem doze filiais em todas as províncias moçambicanas.
De 2015 para 2016, foi Ministro da Educação e Desenvolvimento Humano. (Nota: foi afastado do cargo e nomeado reitor da Universidade Pedagógica (UP) porque “não fazia um controlo político na Educação”, mas sim, profissional. Que belo elogio!)
De 2007 a 2014, foi reitor da Universidade Lúrio, terceira universidade pública de Moçambique e a segunda estabelecida no país após a independência. Durante este período, ocupou os cargos de Presidente da Associação das Universidades de Língua Portuguesa (AULP) e membro do Comitê Executivo da Associação das Universidades da África Austral (SARUA). Também durante este período, tornou-se membro da Academia de Ciências de Moçambique e foi admitido à Academia de Ciências de Lisboa na categoria de membro correspondente de humanidades e membro do Conselho de Administração da BioFund e da Fundação para o Desenvolvimento das Comunidades (FDC).
No período de 2006 e 2007, foi assessor do Ministro do Turismo, sobre questões relacionadas com áreas protegidas e sua privatização.
No período 2005-2008, lecionou o tema da Gestão de Ecossistema para o curso de Mestrado em Desenvolvimento Agrário na Universidade Eduardo Mondlane e Mweka, faculdade de African Wildlife Management na Tanzânia.
De 2003 a 2005, foi Coordenador Regional do Parque Transfronteiriço do Grande Limpopo, que inclui parque da República da África do Sul, Zâmbia, Zimbabwe e Moçambique.
Em 2002, completou o doutoramento na Universidade Rural Federal do Rio de Janeiro, Brasil, com a “Convenção Sobre Diversidade Biológica (CDB) - sua implementação e gestão de recursos naturais (CBRNM) na África Austral: os casos do Zimbabwe, Zâmbia e Moçambique”.
Completou um ano sabático em Sociologia Rural na Universidade de Montpellier II, França.
Em 1999 conseguiu uma Pós-Graduação em estudos de Organização de Comércio Mundial e Cláusulas Ambientais, na Universidade de São Paulo - Brasil.
Em 1997, completou seu mestrado em Políticas Públicas Regionais na Universidade de Zimbabwe, em parceria com o Instituto Regional da África do Sul para estudos de política, um Instituto associado à Universidade de Harare.
Graduou-se em Relações Internacionais e Diplomacia em 1989, no Instituto Superior de Relações Internacionais (ISRI).
De 1987 a 1991, trabalhou como Director de Informação da SADC – Sector de Cultura e Informação em Maputo, e mais tarde ocupou o cargo de Coordenador Regional do Sul da África para o desenvolvimento no Zimbabwe, uma coalizão de filme independente e produtores de vídeo integrando sete países na África Austral.
No período de 1985-1987 juntou-se ao Instituto de Comunicação Social como jornalista, mantendo a posição de produtor e diretor de Canal Zero.

Se tudo isto não for suficiente, vale acrescentar que foi a personalidade do ano em Mocambique, na votação de diferentes órgãos de informação, públicos e privados: no ano 2012 pela Rádio Mocambique, 2009, 2011 e 2017 pelos jornalistas de Nampula, 2015 pelo Jornal Noticias, 2016 pela maioria da imprensa independente.
Bem merece.
E agora apreciem as suas crónicas (sugiro que as acompanhem com um mapa de Moçambique) que, de acordo com o autor serão publicadas num livro, a não perder, que se irá chamar

CAMINHOS do SOL
Vamos começar por uma praia.

Guludo - a praia da reconciliação

 

Aos pés de quem pisoteia seus areais refinados, fica um gosto de um prolongado namoro para a eternidade. O suave sabor das ondas, quase imperceptíveis, estendem seus tentáculos fraternamente para as infinitas histórias de reconciliação. Ou não seria a reconciliação a melhor dádiva que os Deuses nos podem proporcionar? O caranguejo do coqueiro, distraído e embebedado pelo vinho   do coco, até nos horários mais quentes, empresta sua graça e alma Além, no infinito, o resto de uma nuvem que cura divergências e casamenta as irreconciliáveis paixões de casais inseguros. Esta é a praia do Guludo. Para os especialistas a melhor praia de África. Para os leigos mais uma praia, porém muito peculiar e de verdadeira reconciliação.
Vários casais, hoje consolidados, afinaram os tons de seus casamentos em Guludo. A praia tem esse dom. Outros, que nunca antes se conheceram, pavimentaram, em suas areias, amizades transformadas em juras e laços matrimoniais. Quem nunca casou e acha que não o fará, nunca, desconhece Guludo. Esta é a praia onde os indecisos colocaram ponto final as suas hesitações.
Moçambique sempre foi uma praia. Extensa e agreste. Serena e reconfigurada. Em dias ensolarados uma praia cristalina e infinita. Nos dias de chuva e tempestades, uma praia de cânhamo da maresia e ondas cinzentas como as inundações de Janeiro, sempre, sempre anunciadas. Existem praias para todos os prazeres e gostos. Algumas, poucas, são apenas pontos de encontro de águas salgadas e búzios escurecidos. Outras, mais numerosas, são praias soberbas, dignas de competirem com as melhores do planeta. Agora, descobrimos as praias galácticas. Esses tesouros ainda não desvendados e que cujo turismo doméstico não disfruta.
Os critérios que determinam a beleza e raridade das praias serão sempre subjectivos. Os indicadores nem sempre tão mensuráveis. Apesar destas vírgulas altas, as revistas de especialidade turísticas, de todo o mundo, referenciam Guludo como praia de qualidade suprema, deserta, na maior parte do ano, com águas cristalinas e sem ondas. Nestas categorias as únicas praias que rivalizariam em África seriam as praias de Rocktail Bay, na África do Sul e Bosluisbail, na Namíbia. A família Rockfeller, num passado nem por isso tão distante, comprou uma praia, na Caraíbas, com semelhanças à praia de Guludo. Esta praia se transformou na melhor do mundo. Nas classificações que se actualizam, com certa periodicidade, melhores que Guludo seria uma no Brasil e outra na Austrália.
Mergulhar em cada uma destas praias continuará um sonho para poucos. Em qualquer uma delas, o valor agregado permitiu sua completa valorização, com ganhos consideráveis para as economias locais. Guludo bem no coração das Quirimbas, ali em Macomia, de economia sofrida, como todos os locais de imensos recursos, oferece acomodação rústica, com tendas de luxo, até com casa de banho a céu aberto, e a possibilidade de se efectuarem múltiplos passeios pelos mangais. Tem de tudo. Tranquilidade, milhares de espécies de peixes coloridos que renovam as cores da vida e dos sonhos.
Este local precisa de sair do anonimato. A raridade desta beleza merece um outro espaço e tratamento. Precisaremos, nós próprios, de cuidar de santuários que a natureza nos oferece de bandeja, mas que nos esquecemos deles com a maior das naturalidades. Guludo, serena, aguarda por todos os moçambicanos que procuram viver para se reconciliarem e reconciliar o mundo.



01/07/2017

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