CAMINHOS do SOL
Moçambique visto
por dentro!
Tem muita história
vindo aí, sobre Moçambique. Crónicas belíssimas, escritas por um grande amigo
moçambicano, personagem do mais alto valor intelectual e moral daquele país.
Se indicasse
simplesmente o seu nome, imagino que muitos dos leitores deste blog ficaria “na
mesma”, por não o conhecer.
Assim, antes de
darmos início à publicação destas crónicas, que o autor me sugeriu que
colocasse no meu blog (não estou a querer me apropriar do alheio, longe vá o
agouro!) vou apresentá-lo.
Jorge Ferrão
Nasceu em 23 de dezembro de 1962, na província de Nampula. Fluente em
Português, inglês, francês e espanhol.
Atualmente é o reitor da Universidade Pedagógica, a maior universidade
do país, com mais de 55,000 estudantes e de 2000 docentes. Esta Universidade
Pedagógica tem doze filiais em todas as províncias moçambicanas.
De 2015 para 2016, foi Ministro da Educação e Desenvolvimento Humano. (Nota: foi afastado do cargo e nomeado reitor da Universidade
Pedagógica (UP) porque “não fazia um controlo político na Educação”, mas sim,
profissional. Que belo elogio!)
De 2007 a 2014, foi reitor da Universidade Lúrio, terceira universidade
pública de Moçambique e a segunda estabelecida no país após a independência.
Durante este período, ocupou os cargos de Presidente da Associação das
Universidades de Língua Portuguesa (AULP) e membro do Comitê Executivo da
Associação das Universidades da África Austral (SARUA). Também durante este
período, tornou-se membro da Academia de Ciências de Moçambique e foi admitido
à Academia de Ciências de Lisboa na categoria de membro correspondente de
humanidades e membro do Conselho de Administração da BioFund e da Fundação para
o Desenvolvimento das Comunidades (FDC).
No período de 2006 e 2007, foi assessor do Ministro do Turismo, sobre
questões relacionadas com áreas protegidas e sua privatização.
No período 2005-2008, lecionou o tema da Gestão de Ecossistema para o
curso de Mestrado em Desenvolvimento Agrário na Universidade Eduardo Mondlane e
Mweka, faculdade de African Wildlife Management na Tanzânia.
De 2003 a 2005, foi Coordenador Regional do Parque Transfronteiriço do
Grande Limpopo, que inclui parque da República da África do Sul, Zâmbia,
Zimbabwe e Moçambique.
Em 2002, completou o doutoramento na Universidade Rural Federal do Rio
de Janeiro, Brasil, com a “Convenção Sobre Diversidade Biológica (CDB) - sua
implementação e gestão de recursos naturais (CBRNM) na África Austral: os casos
do Zimbabwe, Zâmbia e Moçambique”.
Completou um ano sabático em Sociologia Rural na Universidade de
Montpellier II, França.
Em 1999 conseguiu uma Pós-Graduação em estudos de Organização de
Comércio Mundial e Cláusulas Ambientais, na Universidade de São Paulo - Brasil.
Em 1997, completou seu mestrado em Políticas Públicas Regionais na
Universidade de Zimbabwe, em parceria com o Instituto Regional da África do Sul
para estudos de política, um Instituto associado à Universidade de Harare.
Graduou-se em Relações Internacionais e Diplomacia em 1989, no Instituto
Superior de Relações Internacionais (ISRI).
De 1987 a 1991, trabalhou como Director de Informação da SADC – Sector
de Cultura e Informação em Maputo, e mais tarde ocupou o cargo de Coordenador
Regional do Sul da África para o desenvolvimento no Zimbabwe, uma coalizão de
filme independente e produtores de vídeo integrando sete países na África
Austral.
No período de 1985-1987 juntou-se ao Instituto de Comunicação Social
como jornalista, mantendo a posição de produtor e diretor de Canal Zero.
Se tudo isto não for suficiente, vale acrescentar que foi a
personalidade do ano em Mocambique, na votação de diferentes órgãos de
informação, públicos e privados: no ano 2012 pela Rádio Mocambique, 2009, 2011
e 2017 pelos jornalistas de Nampula, 2015 pelo Jornal Noticias, 2016 pela
maioria da imprensa independente.
Bem merece.
E agora apreciem as suas crónicas (sugiro que as acompanhem com um mapa
de Moçambique) que, de acordo com o autor serão publicadas num livro, a não perder,
que se irá chamar
CAMINHOS do SOL
Vamos começar por uma praia.
Guludo - a praia da reconciliação
Aos pés de quem pisoteia seus areais refinados, fica um gosto de um prolongado namoro para a eternidade. O suave sabor das ondas,
quase imperceptíveis, estendem seus tentáculos fraternamente para as infinitas
histórias de reconciliação. Ou não seria a reconciliação a melhor dádiva que os
Deuses nos podem proporcionar? O caranguejo do coqueiro, distraído e embebedado
pelo vinho do coco, até nos horários
mais quentes, empresta sua graça e alma Além, no infinito, o resto de uma nuvem
que cura divergências e casamenta as irreconciliáveis paixões de casais
inseguros. Esta é a praia do Guludo. Para os especialistas a melhor praia de
África. Para os leigos mais uma praia, porém muito peculiar e de verdadeira
reconciliação.
Vários
casais, hoje consolidados, afinaram os tons de seus casamentos em Guludo. A
praia tem esse dom. Outros, que nunca antes se conheceram, pavimentaram, em
suas areias, amizades transformadas em juras e laços matrimoniais. Quem nunca
casou e acha que não o fará, nunca, desconhece Guludo. Esta é a praia onde os indecisos colocaram
ponto final as suas hesitações.
Moçambique
sempre foi uma praia. Extensa e agreste. Serena e reconfigurada. Em dias
ensolarados uma praia cristalina e infinita. Nos dias de chuva e tempestades,
uma praia de cânhamo da maresia e ondas cinzentas como as inundações de
Janeiro, sempre, sempre anunciadas. Existem praias para todos os prazeres e gostos.
Algumas, poucas, são apenas pontos de encontro de águas salgadas e búzios
escurecidos. Outras, mais numerosas, são praias soberbas, dignas de competirem
com as melhores do planeta. Agora, descobrimos
as praias galácticas. Esses tesouros ainda não desvendados e que cujo turismo doméstico
não disfruta.
Os
critérios que determinam a beleza e raridade das praias serão sempre
subjectivos. Os indicadores nem sempre tão mensuráveis. Apesar destas vírgulas altas,
as revistas de especialidade turísticas, de todo o mundo, referenciam Guludo
como praia de qualidade suprema, deserta, na maior parte do ano, com águas
cristalinas e sem ondas. Nestas categorias as únicas praias que rivalizariam em
África seriam as praias de Rocktail Bay,
na África do Sul e Bosluisbail, na
Namíbia. A família Rockfeller, num passado nem por isso tão distante, comprou
uma praia, na Caraíbas, com semelhanças à praia de Guludo. Esta praia se
transformou na melhor do mundo. Nas classificações que se actualizam, com certa periodicidade, melhores que Guludo seria uma no Brasil e outra na Austrália.
Mergulhar
em cada uma destas praias continuará um sonho para poucos. Em qualquer uma
delas, o valor agregado permitiu sua completa valorização, com ganhos
consideráveis para as economias locais. Guludo bem no coração das Quirimbas,
ali em Macomia, de economia sofrida, como todos os locais de imensos recursos,
oferece acomodação rústica, com tendas de luxo, até com casa de banho a céu
aberto, e a possibilidade de se efectuarem múltiplos passeios pelos mangais. Tem de tudo. Tranquilidade, milhares de
espécies de peixes coloridos que renovam as cores da vida e dos sonhos.
Este local precisa de sair do anonimato. A raridade desta beleza merece
um outro espaço e tratamento. Precisaremos, nós próprios, de cuidar de
santuários que a natureza nos oferece de bandeja, mas que nos esquecemos deles
com a maior das naturalidades. Guludo, serena, aguarda por todos os
moçambicanos que procuram viver para se reconciliarem e reconciliar o mundo.
01/07/2017
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