ANGOLA
Histórias da sua História
Há
562 anos, nas suas digressões pelo Atlântico Sul, para o seu estudo e à procura
da passagem para a Índia, o grande navegador Diogo Cão percorreu a costa de
Angola,onde foi deixando a sua marca com os padrões em pedra: o Padrão de Santa
Maria no cabo que parece ter começado por se chamar Cabo do Lobo, e hoje tem o
nome do padrão, a cerca de 100 milhas náuticas para sul de Benguela, outras 100
milhas mais a sul, o de São Jorge no Cabo Negro, um pouco a Norte do que foi
Porto Alexandre e agora é Tombua, e ainda um mais 400 milhas para sul, o
Padrão da Cruz que deu nome ao cabo, Cape Cross.
Para vergonha de Portugal, na Namíbia, quando ainda colónia
alemã, o grande chanceler Bismark, retirou o padrão original, que hoje se
exibe, lindo, no Institut fur Deutsche Geschichte, Berlim e para o
substituir mandou um outro, com dizeres ligeiramente diferentes, em alemão
dizendo mais ou menos: “que por este meio D. João II de Portugal tomava posse daquela
região africana”...
Hoje em Cape Cross estão duas cópias do padrão original
português. A segunda com uma pedra grande ao lado, lavrada em inglês, foi
mandada colocar ainda pelo governo sul africano, administrador daquele país em
1986, nos 500 anos da colocação do original, ambos muito bem conservados, sendo hoje lugar de
visitação turística, e ali se faz com que a história não se apague.
Cape Cross –
Namíbia
Os
de Angola, Santa Maria e São Jorge, em 1892 a Sociedade de Geografia de Lisboa,
imitando Bismark, levou os originais para Portugal, parece tê-los substituído
por cópias, que teriam sido colocadas nos respectivos locais, e hoje não sobram
nem vestígios deles!
O padrão (cópia) de São Jorge no
Cabo Negro
desaparecido depois de 1975
Em
1787 o naturalista Joaquim José da Silva que fazia parte de uma expedição ao
sul e visitou Cabo Negro, encontrou ainda o padrão original tombado e fê-lo
erguer.
No
Cabo de Santa Maria foi colocado outro igual. Mas só sobra um triste farol...
ainda com as quinas:
Deixemos
os padrões onde quer que estejam e voltemos a Porto Alexandre, porque assim se
chamava quando se passou o que vamos contar.
Em
1839 Pedro Alexandrino da Cunha fundeou num local conhecido por Porto Pinda,
explorou os arredores e disse ter encontrado nas margens do rio Curoca arimos
onde os nativos já exploravam feijão, milho e abóbora, e este seu relatório
incentivou a ocupação das terras do sul.
O
lugar chamou-se Angra das Aldeias, Porto Pinta, Porto Alexandre e hoje é Tombua! Uma baía muito bem abrigada
do mar, em pleno deserto do Namibe, mas com um mar riquíssimo em peixe e
marisco. Bom de mais!!!
Durante
muitos anos não foi possível construir nada em “pedra e cal”. Tudo era de “pau
a pique” e os seus habitantes praticamente se alimentavam só do mar, e a água
potável iam buscá-la ao rio, a cerca de 15 quilómetros para norte.
Um
dia decidiram escolher o próprio chefe que os orientasse quando necessário, e a
escolha caiu em Cruz Roldão, algarvio, que parece teria ali chegado em 1860 no
caíque “D. Ana”. Homem simples, não viveu muito mais e quem assumiu a “chefia”
foi a viúva, Maria da Cruz Roldão. Ela sabia ler e escrever, tinha alguma
cultura, e era uma mulher de coragem e forte decisão. Por várias vezes, Maria
da Cruz tomou decisões importantíssimas para a comunidade que chefiava. Em
dada altura, os hotentotes, vindos do Sudoeste, acossados pelos alemães,
passaram para norte do Cunene e dedicavam-se à pilhagem e ao massacre. A
povoação de Porto Alexandre estava nesta contingência. Porém, a regedora
procurou estabelecer contato com os chefes daquela gente, o que conseguiu, e
teve com eles uma conferência, no local conhecido por Arco do Carvalhão*, a uns
trinta e cinco quilómetros para Leste do aglomerado populacional, e a povoação
foi salva. Igualmente, em data que não ficou registada (mas deste facto nos
fala o almirante Augusto Castilho), fundeou um navio de guerra inglês
na baía, em frente à habitação de Maria da Cruz. Pouco depois, os súbditos de
Sua Majestade, esquecendo-se de que estavam em território de outra nação que
lhes devia merecer respeito, iniciaram exercícios de tiro para a restinga que
forma a baía. Muitos dos projéteis iam cair do outro lado, no mar, onde andavam
os nossos pescadores nas suas atividades. Este ato arrogante levantou
protestos das mulheres e crianças que estavam em terra e que traziam no mar os
maridos, pais e irmãos. Em pranto, dirigiram-se a casa da regedora e
pediram-lhe que acabasse com aquele abuso do navio estrangeiro. Maria da Cruz
mandou içar a Bandeira Nacional num tosco mastro que tinha à sua porta,
meteu-se num bote, e dirigiu-se para bordo do navio britânico. Saias
arregaçadas, punhos cerrados, gesticulando e no seu fraseado de gente do mar,
intimou o comandante inglês, a acabar imediatamente com a perigosa brincadeira.
Aquele, que apenas deve ter compreendido a indignação e o desassombro duma
verdadeira mulher de armas, fez suspender o fogo, abandonando o fundeadouro no
dia seguinte.
Mas a Maria da Cruz sendo uma
mulher humilde e de cultura limitada, evidenciou sempre grande coragem,
valentia e decisão pouco vulgares, que devem ser apontadas como exemplo. Por
outro lado, a dura têmpera desta mulher do povo deve ser o orgulho das mulheres
portuguesas... e de todas as as mulheres do mundo!
* - O “Arco do Carvalhão” que os
navegantes do Mussulo I, visitaram em 04 de Janeiro de 1906.
O lago é formado pela retenção
das águas do rio Curoca.
Nota:
a história desta valente Maria da Cruz foi encontrada no livro de Cecílio
Moreira “Entre Dunas e Mar”, impresso em Luanda talvez em 1968 a 1970.
Nota final:
Não poderia Portugal oferecer
novos padrões a Angola, e ir lá, solenemente, colocá-los?
É por eles que começa a história
“moderna”, de Angola.
06/04/2017
Muito interessante!
ResponderExcluirMuito interessante!
ResponderExcluirAfinal, a História de Angola é anterior a 1975...
Penso que o problema maior não estará em Portugal oferecer e instalar, mas sim em os governantes angolanos aceitarem...!
ResponderExcluirMeu caro Tio Chico. O verdadeiro nome da Regedora de Porto Alexandre era Maria da Cruz Rolão e não Roldão, conforme o livro de Cecílio Moreira, que deve ser por erro de impressão.
ResponderExcluirHá dúvida quanto ao seu casamento. Uma versão de que foi casada com José Cruz Rolão e que enviuvou e posteriormente casou com Manuel Tomé do Ó.
Outra versão é que apenas foi esposa de Manuel Tomé do Ó.
Para sua informação os TENDINHA são da linhagem ROLÃO por via paterna e TENDINHA por via materna, o que é interessante
Os pais do meu bisavô Tendinha eram o Januário António Rolão casado com a Maria do Carmo Tendinha.