sábado, 25 de julho de 2015



Soltas (3) e (muito) Dispersas


5.- Um dos melhores e mais extraordinários monumentos caligráficos de todo o mundo e o maior que Portugal possui é a Bíblia dos Jerónimos, manuscrita, em sete volumes, com iluminuras para além de magníficas. Nesta obra participou o grande artista António de Holanda.
Feita entre 1495 e 1514, dizem que foi presente da corte de Roma ao Rei Dom Manuel, ou de... quem?
Quando das invasões francesas o senhor Junot ROUBOU esta maravilha e levou-a para sua casa em Paris.



Depois que se estabeleceu novamente um governo em Portugal, o Duque de Palmela multiplicou enérgicas reclamações junto do Gabinete Francês. Finalmente, em 1815, o rei de França Luis XVIII, querendo fortalecer a sua delicada situação, entremeada com o pavor do regresso de Napoleão, meteu a mão no bolso e indenizou ele mesmo a viúva do ladrão Junot em 50.000 francos.
A maravilhosa Bíblia dos Jerónimos voltou então para sua casa e descansa, esperamos que per omnia saecula saeculorum, na Biblioteca Nacional.  

6.-  António de Holanda, depois de terminar os seus trabalhos na obra Bíblia dos Jerónimos, escolheu Évora para continuar os seus trabalhos. Foi investido no ofício de Arauto d’Armas de Portugal, o que lhe permitiu mandar ir para sua casa os livros magnos de Tomar que, dizem, ornou com suma habilidade. Apesar da avançada idade o grande miniaturista deixou a sua vivenda em Évora e foi estabelecer-se no Castelo de Tomar na antiga residência do Grã-Mestrado da Ordem de Cristo. 
Aqui, cercado de obras primas, que melhor do que ninguém sabia o valor, continuou o seu trabalho.
Infelizmente os livros magnos de Tomar “sumiram” no final do séc. XIX. Coisas da República!
Garcia de Resende, também grande desenhista e arquiteto – é dele o projeto da Torre de Belém – foi um dos artistas que executaram uma preciosidade, em que terá também trabalhado António de Holanda, a Árvore Genealógica dos Reis de Portugal, levada aos tempos mais afastados, como a Magg, filho de Japhet e neto de Noé.
Uma obra excelente dos miniaturistas portugueses do século XV, hoje estão... no Museu Britânico! Ainda se encontrava em Lisboa, mas em 1843, servindo o então adido à Legação da Inglaterra em Portugal, o sr. Newton Smith, Portugal vendeu a obra aos ingleses!
São onze folhas de pergaminho de não menos de um pé e dez polegadas de alto sobre dez polegadas de largo cada folha, estendidas todas sobre outras tantas lâminas de chumbo e protegidas por vidraças contra as injúrias do tempo!
Talvez tivesse sido bom irem para Londres. Lá estão bem entregues com o título de Portuguese Drawings.
Portugal já tinha abandonado o Mosteiro dos Jerónimos que estava em ruinas, e se o rei Dom Fernando não tivesse chegado a tempo para o salvar, assim como o Mosteiro da Batalha, vendido a um comerciante, que estava a ser desmontado para se venderem as suas pedras, o que seria feito dele? 

7.- Houve um período em que pela Coudelaria de Alter do Chão aparecia um “velho e rabugento” coronel, alentejano de todos os costados, cujo nome, por não ter já a certeza, não menciono. Aquela figura de coronel, empertigada, bigodes frondosos e revirados nas pontas!
Chefe de família grande, um dia alguém o foi cumprimentar e dar-lhe os parabéns porque ia casar mais uma neta.
O velho coronel, voz rouca, desdenhou:
- Ora, ora, pu* as as mesmas, cab** ões mais um!
Como o bom coronel previa o futuro e compreendia a família!

8.- Existem duas prováveis justificativas para explicar a origem da expressão "pagar o pato", sendo a primeira a referência a uma história do século XV e outra uma antiga brincadeira portuguesa. 
De acordo com a história, um camponês passava pela rua com um pato, quando foi abordado por uma senhora que queria comprar o animal, mas não tinha dinheiro e por isso propôs pagar com "favores sexuais". 
Passado algum tempo, a mulher alegava que já tinha feito sexo suficiente para pagar o valor do pato, mas o camponês exigia mais... pelo bicho. O marido da mulher chega à casa e encontra os dois discutindo e pergunta o motivo da briga. A esposa explica que o camponês queria mais dinheiro pelo pato que ela havia comprado. O marido, para evitar mais discussões, oferece dinheiro para o camponês, literalmente pagando pelo pato.

9.- Norte de Moçambique. Reza a tradição e narram na bula-bula escutada atentamente pelos mais novos, que quando o primeiro macua foi gerado de um caniço, e logo depois surgiu a primeira mulher, ambos começaram a conviver, comportando-se como macho e fêmea. Viram que era bom fornicar, ignorando que aquilo que lhes dava tanto gozo, pudesse resultar em procriação. Quando a mulher embarrigou e depois, surpreendida, viu sair de dentro de si uma criança, não relacionou o fato com o que fazia com o homem quando o corpo lho pedia. O nascituro era parte de la e exclusivamente sua. O macho nem deu conta de poder ter interferido no evento. A mulher atribuiu a natalidade, que ignorava poder ser fenómeno biologicamente simples, a forças que excediam o seu entendimento. Sem perceber o mistério, julgou trata-se de magia sobrenatural que a excedia. Refletindo depois, eventualmente, sobre o mistério, pode ter interiorizado, sem disso se aperceber, um incipiente conceito de religiosidade.
(Tabus e Vivências em Moçambique – Edgar Nasi Pereira)

06/2015



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