domingo, 3 de dezembro de 2017


Ciclo dos Amantes

A Vida no Congo ex-belga


No tempo colonial, a Bélgica não deixava nenhum funcionário seguir para o Congo sem ir casado. Não queriam que para lá fossem solteiros e depois regressassem com uns quantos filhos mulatos, nem que os deixassem por lá exigindo a cidadania belga.
A solução encontrada por alguns, cujo vencimento proposto para trabalhar em África era de molde a juntar uma boa soma ao fim de poucos anos, foi fazerem um contrato com alguma mulher que estivesse disposta a receber uma parte dos ganhos e fingirem que eram casados.
Como é de imaginar estas situações deram aso a toda a pouca vergonha que se possa imaginar.
Os congoleses, sabendo desta desavergonhança, se já desprezavam os brancos duma forma geral, a estes então consideravam-nos abaixo de qualquer crítica.
O troca-troca entre “casais” era trivial, chegavam a alugar mulheres a quem necessitasse duma novidade, era como que Sodoma e Gomorra.
Michel foi um dos que não pôde recusar o convite para uma função administrativa no interior da colônia, onde receberia além dum vencimento, casa, carro e até alguns criados.
Informou-se com alguns “veteranos” como devia proceder, e não foi difícil encontrar a perceira ideal. Jovem, bem composta, mas que tinha necessidade de se “alugar” uns tempos, para também ajudar resolver a situação financeira da família que ficara arrasada com a guerra.
Haydée, era uma mulher atraente, com trinta e poucos, loira, forte, nascida no campo onde seus pais eram agricultores na região sul da Bélgica, Valónia, e Michel achou que a divisão dos ganhos com uma mulher bonita seria um ótimo negócio, e assinou o contrato com o governo, exibindo a certidão de casamento, entretanto efetuado na mairie. O normal seria dar à “esposa” entre 20 a 25 por cento dos ganhos, sem que ela tivesse que gastar nada no destino.
Entretanto Haydée foi avisando que o contrato não a obrigava a dormir com ele. Se lhe apetecesse, tudo bem, mas que o contrato era unicamente financeiro. Acordo fechado.
Viagem para África, de navio, onde, durante toda a viagem, alguns olhos não despegavam de Haydée, que de camponesa, ajeitada, se sentia já princesa, até chegarem ao destino, desembarcando em Pointe Noire.
Conduzidos para Leopoldville, hoje Kinshassa, Michel foi entregar a documentação ao governo central que o despachou como administrador da região de Lusambo, a cerca de 1.000 quilómetros da capital, uma pequena localidade à margem do rio Sankuru, rodeada de magníficas florestas.
Terra perdida no middle of nowhere, onde havia somente três estabelecimentos comerciais, um africano e dois portugueses, todos há anos ali estabelecidos, e uma população imensa de africanos a administrar, dos quais poucos viviam na povoação.
O clima, quente e úmido, mas suportável, uma casa confortável, três criados, um cozinheiro, uma lavadeira e um terceiro, Jonas Kipango, que tomava conta do interior, servir à mesa, etc.
Já durante a viagem Michel tinha pretendido avançar em cima de Haydée, que lhe lembrava que o acordo não era de cama, o que não impediu de ter havido, de comum acordo, algumas exceções, sem que com isso Haydée saísse satisfeita, mas que o fazia como política de bom convívio, e não lhe desagradasse. Sempre era melhor do que andar a colher batatas no campo! E lá no fundo... ambos gostavam.
Michel, chegado a Lusambo, logo fez conhecimento com os comerciantes, o que era fundamental, até porque sem a colaboração e conhecimento deles pouco poderia fazer.
Em casa, a vida para ela era duma terrível monotonia. Saía quase todos os dias. Visitava o mercado, a única escola, e a todos cumprimentava com um simpático sorriso. Os maiores atrativos era ir pescar no rio, que generoso, sempre a presenteava com bonitos e razoáveis peixes, ou, uns fins de semana assistir a caçadas. Caça grossa.
Nas caçadas foi um dos portugueses que lhes mostrou a beleza das selvas e das savanas, a fauna magnífica, a dimensão duma África completamente nova e totalmente desconhecida.
Michel agradecia, mas era Haydée quem se entusiasmava com toda a novidade, a grandiosidade, e até, por estranho que pareça, o permanente sorriso, com os alvissimos dentes atrás da pele escura das populações, era para ela um espetáculo que a atraía.
De volta a casa, a rotina. Michel saía cedo para a Administração, e só depois Jonas ia preparar o banho, numa larga banheira, para madame Haydée, onde ela se deixava ficar o máximo de tempo possível.
Ao lado da banheira sempre Jonas deixava ficar, numa cadeira, o lençol e o roupão, muito bem limpos e dobrados, com que Haydée se limpava, e o roupão para voltar ao quarto, que não era ao lado do banho, e então se vestir.
Ao almoço Michel entrava em casa e saía uma hora depois, para entretanto poder dormir uma rápida sesta, e só voltava, normalmente ao sol posto.
Haydée quando não saía para pescar, sempre acompanhada pelo fiel e forte Jonas, ficava sentada na varanda a ler, respondendo a todos os cumprimentos dos que passavam em frente. Vez por outra ia até às lojas dos comerciantes onde se abastecia e encontrava souvenirs para levar de volta à Bélgica.
Por razões de política de boa vizinhança, abastecia-se de todas as lojas, onde sempre era recebida com muito respeito e simpatia.
Uma delas, especialmente. A Maison Borges, do português José Borges, que chegara ao Congo com dezoito anos, há vinte e cinco, os três primeiros passados em Lumbumbashi de onde saíu para se estabelecer em Lusambo. Casado, um casal de filhos pequenos, todos os anos mandava a mulher e os filhos para Portugal, onde ficavam a estudar.
Quando solitário, diziam, repartia o leito com jovens africanas, e muitos fins de semana saía para a caça, que era outra grande paixão.
Logo à chegada do novo casal belga, Borges tinha ido apresentar cumprimentos e oferecer os seus préstimos para lhes mostrar África.
Quando Haydée ia à sua loja, a visão de uma atraente europeia, deixava-o com os olhos presos e pensamentos a perturbá-lo, o que, se a mulher nenhuma passa desapercebido, Haydée sentia como um cumprimento.
A partir de certa altura Borges já convidava a cliente para sentar um pouco na varanda da sua casa, que ficava atrás da loja, para tomarem um café, que acabou por ser aceite. Conversavam sobre a família que ele tinha em Portugal, sobre a vida em África, caçadas, pescarias, etc.
Foi assim que não tardou em convidar o administrador e a mulher para o acompanharem nas caçadas, o que faziam com alguma regularidade, e mais ia aproximando o português da madame belga.
Jonas, sempre respeitoso, quando saía para acompanhar a patroa nas idas à pesca, vestia uma espécie de calção e o tronco nu, exibindo um físico forte, atlético, que cada vez mais chamava a atenção de Haydée. Era uma estátua grega feita em ébano!
A pesca, nas margens do rio poderia envolver alguns riscos. Haydée sentava-se por baixo duma frondosa árvore, bem na margem a uns dois metros acima do leito, que lhe dava uma bela sombra e visão, e Jonas a ajudava e pegar os peixes que ela eventualmente pescasse. Naquele lugar a possibilidade de aparecer algum jacaré era muito remota, mas poderia era escorregar e cair dentro de água, o que um dia veio a acontecer. Rápido, Jonas, entrou na água, pegou na sua madame, toda molhada e assustada, que ao escorregar havia torcido um pé, e não conseguia andar.
Não lhe custou nada, carregou a madame até casa, e cuidadosamente deixou-a estendida numa cadeira na varanda. Foi buscar panos quentes, massageou, depois amarrou com uma ligadura e Haydée passado umas horas sentia-se recuperada, e, sobretudo agradecida.
No dia seguinte quando entrou na sala do banho, como de costume encontrou a banheira cheia com a água na temperatura que ela gostava, e o lençol e o roupão dobrados na cadeira. Tudo normal.
Parou, olhou para aquelas peças e decidiu levar o roupão de volta para cima da sua cama.
Tomou o seu banho, sempre demorado e, quando saíu começou a limpar-se com o lençol. Não “vendo” o roupão, chamou pelo Jonas, que num instante estava atrás da porta a perguntar se madame precisava de alguma coisa.
- Jonas. Não tenho aqui o roupão. Pode trazê-lo?
Jonas ficou confuso, porque nunca se enganava, bate outra vez na porta para lhe passar o roupão e pede desculpa.
Haydée envolta no lençol, abriu a porta, recebeu o roupão, e pediu a Jonas se lhe dava mais uma massagem no pé.
Jonas sentou-se na frente dela e, sempre com cuidado, procurava repetir o tratamento da véspera.
- Pronto, Jonas. Creio que está bom. Por favor ajuda-me a vestir o roupão.
Jonas pega no roupão, tenta desviar o olhar, mas Haydée deixa cair o lençol que mal a cobria e veste o roupão, sem, no entanto o apertar pela frente. Vira-se para trás e Jonas, que impassível aguardava ordens, quando vê a bela madame toda despida na frente dele, quer retirar-se.
Haydée agarra-lhe na mão.
- Jonas eu não lhe agradeci o que você fez por mim. Vem cá.
E leva-o para o quarto.
- Por favor despe essa roupa.
Jonas, nervoso tira a camisa, e depois que a patroa lhe diz para tirar tudo, aparece-lhe uma bela escultura, forte, seguro, maravilhoso, e sempre com cuidado leva-o para se deitarem.
Acaricia-o, repara que aquela pele negra era mais macia do qualquer outra que alguma vez tivesse sentido, Haydée deita-se e arrasta-o.
Jonas não estava a gostar daquilo. Se fosse apanhado com uma branca poderia custar-lhe até a vida, mas não podia mais retirar-se.
Como era um homem grande e pesado e Haydée preferiu dar a volta por cima.
Estava agarrado, com força, e Haydée se contorcia e ajeitava de modo a que ele a levasse ao fim do mundo.
Quando aconteceu ela gritou. Gritou, não sabia se de dor se de prazer. Certamente dor não era. Só se fosse de não ter há mais tempo aproveitado o que sempre estivera ali a seu lado.
Jonas fez o quanto podia e via na cara da sua madame como ela estava “voando”, segurando o mais tempo que pudesse, antes de dar por findo o “trabalho”.
Haydée ficou na cama. Suava, esgotada. Jonas vestiu-se e com ar de quem vem do mercado, foi até à cozinha, onde o cozinheiro, ar “apimentado”, lhe perguntou porque demorara tanto com a senhora.
- Ela está mal do pé que torceu ontem, e não quer sair da cama. Tive que massagear de novo.
- ?!
Michel chegou para o almoço, Haydée na cama, disse que lhe custava a andar e que Jonas lhe levasse ao quarto alguma coisa, leve, para comer.
Michel fez a sua sesta na varanda para não incomodar Haydée, e quando saíu, Jonas voltou ao quarto para saber se estava tudo bem.
Estava. Quase.
Haydée queria repetir a sessão da manhã!
- Madame, se alguém sabe disto eu estou perdido. Eu gosto muito da senhora, mas sei que corro perigo.
- Não te preocupes. Ninguém vai saber. Tira a roupa e deita aqui.
Jonas com todo o seu belo físico, magnífico equipamento, estendeu-se ao lado da madame e não tardou a pôr Haydée no topo, tanta era a força para segurar o parceiro que lhe deixava as costas marcadas.
Desta vez porém o transe demorou um pouco menos porque ela ainda estava cansada do programa anterior.
Antes de deixar Jonas se levantar, Haydée puxou a cabeça dele e deu-lhe um profundo beijo, hábito não praticado entre as populações da região. Jonas no primeiro momento não entendeu, nem concluiu se tinha gostado ou não.
- Jonas!
- Madame.
- Obrigado.
Os dias seguiam e quase todas as manhãs o ritual se repetia e Haydée querendo introduzir Jonas no jogo paralelo do beijo na boca, profundo, que este, sem se excitar com isso, aprendeu rápido.
Haydée inventava posições, queria sempre mais, mais prazer, e Jonas cumpria todo aquele jogo, com algum prazer, sim, mas sem muito entusiasmo, até porque deixou de ter consideração e de respeitar a senhora. Agora ela era a patroa, sim, mas uma sem-vergonha.
Um dia mandou encher a banheira com água bem morna. Chamou Jonas, pediu-lhe que se deitasse, nu, evidente, no fundo da banheira e ela entrou também. Não se saciava. Excitada, mexia-se de tal modo que à volta da banheira ficou tudo molhado, mas ela não parava e, felizmente, Jonas tinha capacidade para aguentar toda a loucura sem se cansar.
Haydée só interrompia estas festas nos períodos férteis em que pudesse engravidar.
Ao fim de um ano, Michel tinha direito a duas semanas de férias e foi passá-las na capital. Haydée disse logo que não ia. Não conhecia lá ninguém, era uma cidade suja, muita balbúrdia. Preferia ficar em Lusambo, onde levava uma vida traquila (!) e era estimada por toda a população. Combinado.
Michel foi embora, e logo nesse fim de semana José a convida para uma caçada.
- Neste fim de semana, não. No próximo.
Iriam procurar búfalos ou elefantes, o que deixou Haydée emocionada.
Sairiam sexta feira à tarde e voltariam no domingo, dormindo numa confortável barraca de campanha. Teve o cuidado de dizer que levava uma barraca para cada um, e outra para os pisteiros.
A pouco menos de cem quilômetros encontraram o local para acampar. Logo montaram as barracas, as duas principais encostadas uma a outra para eventual defesa e a dos pisteiros mais afastada.
Apanhada uma braçada de lenha, um fogo que servia para os aquecer da umidade da noite, um jantar com alguns acepipes que José levara, o indispensável vinho, e por fim, satisfeitos, recostados nas cadeiras de lona, o café a ser saboreado debaixo daquele céu imenso, límpido, cheio de estrelas.
Haydée estava a respirar devagar para saborear o íntimo contato com a natureza que achava deslumbrante.
Conversaram um pouco, e José avisou que era melhor irem dormir, porque de manhã se levantariam antes do sol nascer.
Cada um se recolhe a sua barraca, mas ambos sabendo que isso era só encenação, para que os pisteiros não dessem conta.
- José! – chama Haydée – não me sinto nada segura dentro duma barraca de pano, sabendo que estamos rodeados de animais ferozes.
- Não se preocupe. Espere um momento.
Em silêncio, e de rastos para não ser visto, saíu da sua barraca, carregando as armas, e passou para a de Haydée.
- Eu durmo aqui ao seu lado. Assim não tem com que se preocupar.
- José. Não seja tonto. Vai dormir aí? No meu colchão, com boa vontade cabemos os dois.
É evidente que José esperava esse convite, e tinha muito mais do que a simples boa vontade, num instante estavam debaixo da mesma coberta e bem agarrados. Não porque o espaço fosse curto, mas porque era assim que ambos queriam.
- Haydée. Desde que você chegou a Lusambo que a sua imagem não sai da minha cabeça. Eu esperava este momento com uma imensa ansiedade. Você é linda.
- Bondade sua José, mas não vamos conversar muito, os pisteiros podem ouvir, e além disso não temos muitas horas para dormir...
José não a deixou terminar de falar. Agarrou-lhe a cara e... Haydée correspondeu com o melhor.
Entretanto os dois corpos já se tinham encontrado, despidas as roupas que impediam de se tocar, e as mãos não se aquietavam.
Haydée logo percebeu que José era um experimentado garanhão. Sabia como fazer as mulheres gozarem o máximo, e isso Haydée agora também aprendia.
Acabadas as manobras, ficaram um tempo assim agarrados, até que, tarde acabaram por adormecer.
Não dormiram tanto quanto seria de esperar para quem no dia seguinte tem uma caçada pela frente. Mas o fim de semana se tivesse terminado ali já teria sido uma maravilha.
Durante o dia, metade do tempo de jeep outra metade a pé pela savana, sempre dava algum resultado, e no primeiro dia caçaram um belo antílope. Um churrasco de lombo desses animais é uma delícia, como se deliciavam os pisteiros e o povo que aparecia para levar a maioria da carne, os dois sempre em volta da fogueira, a boa garrafa de vinho, conversa para passar o tempo e sobretudo uma vontade imensa de se esgueirarem para dentro da barraca, onde repetiriam o acalorado encontro dos corpos sedentos de amor e sexo.
Regresso a Lusambo.
Nos primeiros dias Haydée não chamou Jonas, o fim de semana tinha sido uma festa divina, e ela queria manter essa imagem viva, dentro de si.
Poucos dias passados, o truque do roupão alertou Jonas que tinha “trabalho” a fazer, e comparecia, sempre com o seu corpo de atleta, e ar humilde, “ás ordens” da madame.
Haydée não precisava dizer-lhe muita coisa. Com ar quase militar Jonas despia-se, avançava para a cama, e quase mecanicamente cumpria o dever de subalterno!
Michel continuava na capital. Telegrafou a perguntar se tudo estava bem, o que Haydée confirmou, e avisou que regressava dentro de uma semana, o que para ela era indiferente.
Quando regressou, contou sobre sua estadia, e a falta que ela lhe fizera, mas com sinceridade lhe disse que tinha encontrada bonitas parceiras em Leopoldville, que muito o tinham ajudado a passar o tempo.
- Que bom. Ainda bem que aproveitaste.
- E tu?
- Eu também tenho aproveitado esta calma, fui uma ou duas vezes à caça, mas o que eu gosto mesmo é de me estender aqui na varanda e olhar em volta, ou então de ir pescar.
Naquela noite Michel e Haydée se juntaram. O “casamento oficial” também sugeria encontros, mesmo que raros e casuais. Foi uma espécie de sessão de boas vindas.
Haydée em pouco tempo começou a estranhar que a menstruação não aparecese, mas nada disse a alguém. Pensou só que não teria muito mais tempo para aproveitar os encontros com José, raros e difíceis, e que teria que parar com as maravilhosas aventuras com Jonas. Talvez uns dois meses. Depois diria que se sentia mal, não sabia o que era, não tinha febre, mas alguma coisa se estava a passar, e que teria de voltar à Bélgica.
Regressou. Foi para casa dos pais, agricultores, onde deixou a barriga crescer. Como tinha “casado” com um belga, tudo foi bem aceito pela família e vizinhos.
No momento certo, Haydée foi para o hospital. Parto normal e o bebé nasceu fortão e saudável como o pai.
Um pouco mais escuro do que os avós esperavam.
Mas igual ao Jonas.

25/03/2014



                                                                                         


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