UBERABA - Minas Gerais
Dizem os uberabenses, e o dicionário, que
Uberaba, palavra de origem tupi, significa "água
brilhante", de y, "água, rio" e berab, "brilhante".
Para quem não tem ideia onde fica esta cidade o melhor é procurar na Internet
para não estar aqui a fazer descrições geográficas que poderiam parecer
pretenciosas.
Há uns anos descobri lá em Uberaba, por intermédio de
uma amiga comum, um primo, afastado, da grande família brasileira La Rocque,
sobrenome da minha avó. Aliás descobrimo-nos um ao outro e não foi difícil
estabelecermos amizade.
Jovem (71 anos) da geração La Rocque abaixo da minha,
vive nessa cidade e há tempos insistia para eu lá ir passar uns dias.
Fui. Passei quase uma semana, encontrei outros
parentes, mas sobretudo gente simpática, acolhedora e... minêra, UAI!
Acolhimento simples, amável, descontraído, em todo o
lugar que o primo me levou, e olha que aquela região tem muito para ver.
Uberaba é o centro brasileiro do gado Zebu, um bovino
da sub-espécie Bos taurus indicus. Como se sabe, na ìndia o bovino é um animal sagrado, de preço barato. Segundo
a história destes animais no Brasil, em 1874, um dos muitos barões
do II Império, daqueles, milionários que adoravam ir gastar dinheiro na França
e Inglaterra, adquiriu, como novidade, em um zoológico de Londres, um casal do
gado Ongole repetindo a compra em 1877. Em 1878, um outro uberabense comprou um
lote no jardim zoológico de Hamburgo. A adaptação desses animais foi muito boa,
e a seguir passaram a encomendar animais diretamente da Índia por empresas
especializadas no fornecimento de animais para circos e zoológicos. Dessa
maneira, o Ongole foi descoberto pelos brasileiros e migrou para sua nova
pátria, onde ocuparia um lugar de destaque no cenário e, partindo dali,
chegaria ao mercado mundial. Mais tarde, entre 1900 e 1920, os próprios
brasileiros começaram a buscar Ongole na Índia, escolhendo os melhores e
reservando-os na província de Nelore, antes do embarque. Dai surgiu o nome
"Nelore" para esse gado.
Estes animais adaptaram-se perfeitamente às condições
do país; mais tarde começaram os cruzamentos e o aperfeiçoamento da raça, e o
Brasil hoje conta com mais de 200 milhões de cabeças de gado, sendo 90% de origem
zebu.
Em Uberaba está a ABCZ – Associação Brasileira de
Criadores de Zebu – com a raças brahman, cangaim, gir, guzerá, indubrasil,
nelore, sindi e tabapuã, e mais de 12 milhões zebus registrados, com as folhas
da gentética, etc. Muito interessante.
Surpresa grande foi ter encontrado no terreno desta
ABCZ umas árvores que jamais tinha visto, e por coincidência também originárias
da Índia. Akosha – Polyalthia pendula
longifolia – todos os seus braços, ao nascerem do tronco principal viram
para baixo, a árvore cresce, imenso, e fica sempre verde e estreita.
Veja-se na foto abaixo a sua altura. Para referência,
em baixo, tem um carro estacionado. Atrás, um imponente Pau Brasil - Caesalpinia leiostachya, árvore
que ultrapassa facilmente os 12 metros. Este deve ter 20 metros e a Akosha uns
18! Uma maravilha.
E esta foi a “minha paixão à primeira vista”, a
Akosha! Como as famílias ricas daquela região gostam muito de ir a Paris, este
foi o
meu “coup de foudre”! O meu hospedeiro e simpático
parente andou comigo quase um dia inteiro, andando de Herodes
para Pilatos até conseguirmos duas mudas que não tarda vão embelezar a entrada
do nosso palácio aqui no Rio de Janeiro.
Depois ao
visitarmos um amigo em seu magnífico jardim-sítio-fazenda, dei de caras com um
fruto que igualmente jamais tinha visto. As opiniões divergiam sobre o seu nome
e origem; houve quem dissesse que era uma espécie de maçã de Portugal –
Portugal jamais viu tal fruto, nem maçã era – depois que a sua origem seria do oriente, mas
a teimosia levou-me a desvendar o mistério: Caimito
- Chrysophyllum cainito L. – da família das
saponáceas, e originária das Antilhas e América Central.
Uma frutinha redonda,
como uma cereja, roxa, com uns 2 cm. de diâmetro e sabor agradável. Há quem lhe
chame, no Brasil Abiu roxo! Qualquer
dia virá uma ou duas mudas para o Rio! Deve dar uma compota agradável e tem
muito passarinho que vai adorar.
Outra novidade para
um ignorante itinerante foram as pedras, rochas, muito abundantes naquela
região: Tapiocanga. Nome genérico Limonita, conhecida por Tapiocanga, é um óxido
de ferro hidratado (ferro pardo), sem estrutura cristalina interna, amorfo. A
limonita não é um mineral, mas uma mistura de diversos óxidos de ferro. Por
esta razão a limonita é considerada uma rocha. Vermelha.
É usada na
construção, pavimentação de ruas (paralelepípedos) e escultura. Interessante.
Limonita – Tapiocanga
Bonita Igreja de São Domingos, com a rocha Tapiocanga
A 20 quilómetros da
cidade tem uma pequena povoação ao lado de um sensacional sítio paleontológico: montes de dinossauros têm sido ali
encontrados, alguns com mais de 80 milhões de anos, e foi recentemente
encontrado o Uberabatitan ribeiroi, exclusivo brasileiro, bichinho com 15 metros de comprimento, cerca de 4 a 6 de altura e um peso estimado entre 15 a 18. Sugeri que o elegessem presidente!
E como Uberaba está em Minas Gerais, há que saber e sobretudo ouvir algumas histórias contadas na linguagem do povo simples, a que chamam Mineirês!
Aqui vai uma para
terminar:
Odmilson trabalhava sol a sol na sua roça, lá bem no
interiô caipira. Um dia ouvir dizer que ia haver um baile numa povoação “logo
ali (para o minêro tudo é logo ali), veste uma roupinha meio nova, camisa quase
fechada até ao pescoço, elegante e, a pé, mato fora, enfrenta a jornada de mais
dez quilómetros para chegar “logo ali”! Um sol escaldante, lá vai Odmilson a
suar que nem cavalo de corrido no verão!
Ao chegá procura uma moça prá dançá, e lá desencanta uma.
Dança de pular, Odmilson sua muito mais. Terminada a dança, a moça, vozinha
meiga, e olhos de gazela ferida diz-lhe:
- Voucê sua, hein!
E ele, encantado:
- Eu tamém voucê todjinho seu!
Foi uma bela semana
passada em Uberaba.
23/06/2015
A vocação uberabense para a pecuária deu-se desde os primórdios da ocupação da região pelos colonos brancos. Saint Hilaire em 1819, ao passar pela região já dizia:
ResponderExcluir“... devido a existência de bons pastos, vão se dedicar à criação de gado lanígero, porcos e principalmente gado vacum,...”
O comércio de Uberaba começou através das rotas salineiras com Formiga e São João Del Rei. Mais tarde com a produção de cana e café, a chegada dos imigrantes (portugueses, italianos, espanhóis), da estrada de ferro (Mogiana), e o aumento populacional provocado pela circulação dos militares que vieram de passagem para a guerra do Paraguai, houve um incremento notório do comercio. Porém, quando a estrada fez novos trajetos e desviou o comercio, Uberaba, abandonada, perdeu a hegemonia comercial da região e voltou-se novamente para as origens, a pecuária.
A introdução do gado zebu (com corcova) no Brasil se deu inicialmente na Bahia (1813) e depois no Rio de Janeiro na segunda metade do século XIX (GIR, CANCREJ/GUZERA e ONGOLE/NELORE. O gado misturou-se ao trazido de cabo Verde, no século XVI(dito na região “curaleiro”)por Ana Pimentel, e se espalhou principalmente Minas Gerais, sul Goiás, Mato Grosso.
Com a mudança dos rumos da economia na região, os cafeicultores aos poucos tornaram-se criadores de gado e muitos assumiram as duas atividades. Adquiriram reprodutores bovinos principalmente com pecuaristas do Rio de Janeiro. Mais tarde alguns fazendeiros foram buscar pessoalmente, com muitas dificuldades, até morte (João Martins Borges), no inicio do século passado, exemplares zebuínos na Índia. Animais estes e seus descendentes que fizeram a riqueza da região do Triangulo Mineiro no século XX.
Quanto às plantas o mineiro gosta bastante de cambiá-las e experimentar os plantios. Em Minas pode-se encontrar espécies vegetais de várias partes do mundo ( herança portuguesa?)
É fato e seu primo bem o sabe, as famílias ricas da região enviavam os filhos para estudar fora, e viajavam para o exterior e de lá traziam novidades que maravilhavam e despertavam inveja. Fazendas e casas havia que tinham na sua bela arquitetura e mobiliário mármore de Carrara, pinturas em trompe l’oeil, louça inglesa, indiana, chinesa, porcelana germânica (Rosenthal), magníficos relógios de carrilhão alemães, assoalhos e tetos em madeira trabalhados( marchetados), toalhas bordadas da Ilha da Madeira, cristais da Boemia,... até carro importado(Cadilac). Mas hoje tudo isso mudou, as grandes empresas é que dominam a economia, embora ainda se possa ver bonitas propriedades antigas preservadas que guardam a história de Uberaba.
Gostei muito da dissertação de Francisco Amorim sobre Uberaba, mostrou conhecimento e
Sensibilidade.
Uma pequena observação; a Igreja da foto é de São Domingos, um dos primeiros templos dominicanos construídos no Brasil. As freiras dominicanas foram no inicio do século passado as responsáveis pela instrução das jovens uberabenses.
O “causo minero”, adorei, hilário!
Maria Eduarda
Uberaba