Histórias da África
por onde os portugueses andaram
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O começo do fim
Pela
Convenção de Berlim, Portugal, para continuar a manter as suas ligações com
África, foi obrigado, como já vimos, a ocupar militar e administrativamente as
regiões onde há séculos comerciava, e com quem tinha, em muitos casos, boas
relações de entendimento e respeito.
A própria
Metrópole atravessava um período de total descontrole, com dois partidos
políticos que fingiam que eram adversários: os seus componentes passavam-se de
um lado para o outro como quem troca de camisa. Como é evidente, dinheiro não
havia! Portugal não conseguia sair da grave crise financeira que o acompanhava
desde as invasões francesas, que se agravara até mais não durante as Lutas
Liberais e que conhecera novo surto com o Ultimatum Inglês e a bancarrota do
Reino.
Mas houve
que mandar tropas para África, o que se verificou ser um outro desastre: em
muitos casos combater aliados, ou ser por eles derrotado, e constatar que as
finanças do país não suportavam essas despesas. Para mais, o controle da
situação não era tão evidente quanto pensava o governo lá em Lisboa!
O caso da
moeda no período colonial era outra bagunça. Nos territórios ultramarinos
corriam moedas de todos os países, e cada um dava-lhes o câmbio que bem entendia.
Faziam-se leis estabelecendo os câmbios que não entravam em execução. Enfim,
uma cegueira política e económica sobre a administração colonial.
Cabo Verde,
o Porto Grande do Mindelo, começava a deixar de ser o principal porto no
Atlântico – para reabastecimento de carvão aos “novos” navios a vapor –
o que lhe dava desafogo financeiro - perdendo para a concorrência dos portos de
Dakar e das Canárias, mais modernos e melhor apetrechados.
Para se
procurar arranjar dinheiro, forjavam-se leis com alguns impostos que alteravam
constantemente as pautas aduaneiras, faziam-se reduções às mercadorias
transportadas em navios de bandeira portuguesa, mas Portugal estava com a
marinha mercante reduzida a quase nada.
Além de tudo
Portugal temia que, facilitando os direitos (por exemplo em Angola), os
comerciantes poderiam aproveitar e re-exportar esses bens para os territórios
vizinhos, o que teria sido até um boa jogada comercial. Os interesses dos
monopólios em Portugal iam falando mais alto…
O tráfico de
escravos acabara. Os grandes empresários de Angola, os negociantes, os únicos
que tinham tido crédito, cujas notas promissórias circulavam como dinheiro,
estavam todos à beira da falência. Angola estava completamente descapitalizada.
Sonhava-se
em levar colonos de Cabo Verde e das ilhas, sobretudo dos Açores, para
colonizar Angola, mas chocava-se sempre no mesmo ponto: transporte e
financiamento, apesar de algumas tentativas terem resultado, como por exemplo
na Chibia, Huila, Angola, onde até hoje continuam a viver descedentes de
açoreanos.
O problema
da moeda, se escasseava em Portugal, em Angola era uma parafernália. Tudo
servia de moeda e a escassez chegava a situações que obrigou a muita vez se
adotar a “moeda” africana, como os panos do Luango ou Nzimbo para pagar à
tropa, e persistiam em outros tantos negócios a troca direta de bens, sobretudo
alimentares.
Em 1864 foi
criado o BNU, Banco Nacional Ultramarino, para ser o emissor nas colónias,
rapidamente entregue a “compadres maçons” sem que tivesse havido concurso
público, e que explorou, com juros exorbitantes, agricultores e comerciantes,
confiscando propriedades que em vez de se terem desenvolvido, se endividaram ao
banco.
(Com a lei
de 25 de Fevereiro de 1869, proclamou-se a abolição da escravatura em todo o
Império Português. Mas... em 1875 o BNU
contrata, diretamente da Libéria, 600 homens e mulheres para as suas
propriedades de S. Tomé e até ao final de 1876 tinha já “importado” da Libéria,
cerca de 3000 trabalhadores. A importação de mão de obra da Libéria foi a solução
que o F. Chamiço encontrou como ideal para evitar a caça aos navios de escravos
que era feita pelos navios de guerra ingleses sobretudo nas costas de Angola.
Aliás, em 1877 o navio à vela “Ovarense” ao serviço do BNU, foi arrestado pelos
ingleses e confiscada toda a sua carga, sob pretexto de que fazia comércio de
escravos. Em 1877 o jornal “O Progresso” de Lisboa refere que em Luanda se
encontram 240 escravos comprados pelo BNU com destino a S. Tomé, estando mais
1000 escravos em Novo Redondo, prontos para partir para a “Água Izé”,
propriedade do BNU em São Tomé) É bom notar que estas roças, todas em S. Tomé, já propriedade do BNU, foram
confiscadas a antigos agricultores que tiveram a infelicidade de pedir dinheiro
ao banco!
A situação nas colónias mantém-se, economicamente, um desastre, pouco mais
se tendo feito, e com capitais ingleses, do que as três linhas de caminhos de
ferro – Benguela, Malange e Lobito em Angola e Beira e Lourenço Marques em
Moçambique – e criando-se companhias “magestáticas” para substituir os “prazos”
de Moçambique, tudo em proveito dos investidores, portugueses e estrangeiros.
Por muito grande que tenha sido o projeto vigarista de Alves dos Reis, 1925,
com o famoso Banco Angola & Metrópole (que ficou conhecido como “Engrola a
Metrópole”), talvez tenha sido uma pena que não tivesse seguido em frente.
Angola teria resolvido com esta jogada o seu problema financeiro que certamente
a faria crescer com rapidez.
A partir dos anos 20 do século XX são as grandes companhias, que vão para
Angola e Moçambique, nos mesmos moldes, como a dos diamantes, açucareiras,
algodoeiras cujos beneficiados eram os capitalistas e suas fábricas em
Portugal. São Tomé, um grande produtor de cacau e café, mandava para os
magnates portugueses, incluindo o próprio BNU, todo o lucro das suas explorações.
É com a 2ª Guerra Mundial que o dinheiro fácil chega a Portugal, assente
nas exportações de volfrâmio e de conservas de peixe para todas as partes
beligerantes. E são esses excedentes em divisas que, tempos mais tarde, tornam
possível o 1º Plano de Fomento e, com ele, Angola comece a crescer.
Só que Portugal tinha perdido quase totalmente a confiança dos povos
nativos. E nem parece ter escutado (ou, se escutou, não entendeu) as palavras
de De Gaulle aos soldados das suas colónias em África, quando lhes prometeu
dar-lhes a independência pela sua contribuição na guerra, ao lado da França.
No fim da 2ª Guerra Mundial, como para a população portuguesa o solo natal
lhe era adverso e pobre, Angola começa receber gente e a crescer, desta vez em
inúmeros setores, desde o agrícola, comércio, indústria e financeiro, com
praticamente todos os bancos da Metrópole a se instalarem, tanto em Angola como
em Moçambique.
As vozes dos intelectuais africanos, que pouco mais queriam do que ser
ouvidos e sobretudo tratados em condições iguais aos europeus que chegavam e
ocupavam todos os postos superiores da administração, não são ouvidas. O Governo
de Salazar faz ouvidos moucos e criam-se os movimentos que Portugal chamava de
“terroristas”, e o, talvez evitável se discutido desde os primeiros momentos,
apareceu: a luta pela independência.
Angola dá um pulo incrível de desenvolvimento entre 1961 e 1974, mas o mal
estava instalado e crescia. A Guerra Colonial podia até estar ganha em Angola.
Nunca na Guiné nem em Moçambique, mas o entendimento, a confiança, haviam
desaparecido.
O alardeado Império Colonial Português, não tivera nem meio século de vida.
Os 500 anos de colonialismo também não chegaram a cem (na verdade, vão da
2ª década do séc. XX até 1975)!
E assim Portugal se encontrou despido, ainda mal visto por muitos, quase
obrigado a aceitar esmolas de Timor para os sinistrados de incêndios (que ao
fim de muitos meses, por razões burocráticas!!!, ainda não entregou aos
destinatários).
Mas continua a ter 50 ministros e secretários de estado, mais de 200
deputados, todos muito contentes com eles-próprios. Para que?
22/05/2014
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