terça-feira, 31 de maio de 2022

 

Os Meus Amigos


Os anos correm, alguns dos amigos dos tempos há muito passados foram percorrendo diferentes caminhos dos meus, e acabámos por quase esquecer ou perder a esperança de os voltar a encontrar.

Agora, então, que há muito passámos de idosos para entrar na classe dos velhinhos, mais difícil tem sido encontrar os que estavam “perdidos”… por mim.

Procurando nas chamadas redes sociais já encontrámos os descendentes de alguns desses que, de qualquer maneira compartilharam um pouco da nossa vida.

Há dias vi o nome, e a foto, de um deles, cabelo branco, mas não podia ser o amigo que fez o serviço militar comigo. Contactei-o. O mesmo nome do pai e o seu filho mais velho. O pai, infelizmente descansou já, há pouco tempo.

Conhecíamo-nos já em adolescentes, e entrámos para a tropa juntos, Regimento de Cavalaria 7, em Belém, onde estivémos um ano.

Lembro bem do seu carro, aliás o único que de todos nós tinha carro próprio, um Skoda verde, que não resisto de pôr aqui a foto de um, todo restaurado. Ainda demos uns passeios que ficaram na memória.


Há pouco ainda na militança, houve um baile chiquérrimo, que o Marquês da Foz, dava para “debute” da sua filha. Uma das minhas minhas irmã fazia parte das jovens que desse modo, à boa moda antiga, eram apresentadas à sociedade, foi também convidada, e eu, irmão mais velho tive que a acompanhar, mesmo estando com um pé engessado (tinha-me caído umas semanas antes um caixote com uma máquina agrícola em cima!!!)

Baile na sexta e, em princípio, militança no sábado. Fui falar ao major, contei-lhe uma balela qualquer e ele dispensou-me de comparecer no sábado. O meu “camarada” achou que ir mentir ao major lhe ficava mal e, também convidado, foi-lhe pedir dispensa. Tinha um baile que acabaria tarde… O major, todo macho, cavaleiro:

- No meu tempo nós saímos dos bailes e íamos diretos para o quartel.

E não o dispensou. Lembro que, já dia claro, quando eu regressava a casa, de taxi, cruzei-me com o tal Skoda e o meu amigo chateado!

Já mais tarde, valerosos cabos-milicianos, dia de grande chuvada, aproveitámos o pequeno intervalo do almoço para ir ver como estava o mar junto à estrada Marginal.

Tinha havido um grande deslize de terras que soterrara um combóio que ia de Cascais para Lisboa. Servir a Pátria e os aflitos, deixámos o carro na estrada e corremos para lá oferecer os nossos préstimos. Já lá estavam bombeiros e militares especializados e o chefe pergunta se éramos enfermeiros. Não. “Então por favor retirem-se que só podem atrapalhar o nosso trabalho.”

No final do tempo, um outro camarada-amigo-miltar, o José Luis Cardoso de Menezes (Margaride) (que também nunca mais vi) convida-nos para irmos às suas terras em Almeirim, porque estava na época dos melões (os melhores de Portugal) e terras dum vinho branco de alta qualidade.

Fomos sete, em dois carros, o outro era do Ernesto Lami (que também perdi de vista poucos anos depois de termos voltado a ser civis) e convidámos para ir conosco um cabo da Guarda Republicana que estava a fazer o curso para sargento. Homem simples, humilde, muito mais velho do que nós, atencioso.

Em Almeirim, na adega da casa Margaride, já nos aguardava uma larga mesa cheia de melões, copos e garrafas do famoso branco fresquinho. Comemos bem, bebemos muito melhor, e o Guarda ultrapassou os limites da sua capacidade. Tivemos que o carregar para o carro e ficou sentado no meio do bando traseiro. Eu à direita. Passadas umas quantas curvas o Guarda teve um vómito! Não houve tempo de abrir a janela toda e quem recebeu metade daquela “coisa horrorosa”… fui eu! Até chegar a casa carreguei aquele cheirinho…

Pouco depois acabava a nosso “guerra”.

Já paisanos, um pequeno jantar de despedida: Reconheço, eu, claro, por baixo do quadro do touro, à minha esquerda o Ernesto Lami, na extrema direita o Nani, ainda fardado um outro grande amigo que seguiu a vida militar, o Ramiro da Conceição Antunes, e de cara virada para o fotógrafo, o meu duplamente colega, de curso de Regente Agrícola e da “guerra”, o José Ravasco.

O Nani só voltei a vê-lo uma vez, em Luanda aí por 1965. Uma reunião dos Cursos de Cristandade. Eu tinha chegado um pouco atrasado e estava na entrada. De repente um senhor aproximou-se e parou ao meu lado.

Olhei para ver quem era e vejo um careca, uns restos de cabelo enquadrando a dita, branquinhos como os do meu avô, e quando, curioso, quis ver melhor quem era o velhote… era o Nani!

Grande abraço. Quis que almoçasse comigo no dia seguinte, mas estava só de passagem para São Tomé.

Nunca mais o vi. Saudade.

Naqueles tempos da tropa tinha mais ou menos esta cara que eu tentei guardar para o meu livro de Retratos de Amigos: o Nani, Jerónimo Carneiro.

Obrigado ao filho, também Jerónimo, que me fez rebuscar estas e ainda outras lembranças.



31/05/22


4 comentários:

  1. Mais uma excelente história. O Tio pode precisar a data do deslizamento de terras que caiu em cima do comboio?

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  2. Muito legal a historia tio Chico. Um abraco do Andre Mindelis (filho do Nuno :-)

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