segunda-feira, 4 de outubro de 2021

 

Como se fabricam deuses - 1

 

Quantos deuses a humanidade já adorou? Só na Grécia antiga houve dezenas, centenas deles que depois os romanos adotaram, só lhes dando diferentes nomes como Zeus/Júpiter, Hera/Juno, Hades/Plutão, Posêidon/Netuno, Atena/Minerva, Hermes/Mercúrio, Apolo/Apolo, Artemis/Diana, Hefesto/Vulcano, Afrodite/Vênus, Ares/Marte, e muitos, muitos mais.

Ninguém sabe quais terão sido os primeiros deuses a serem cultuados, porque entram nas lendas e na cosmogonia.

Talvez Panku, lá para o oriente hoje chinês, há 10 ou 18.000 anos, pela Mesopotâmia encontram-se (?) mais uma mão cheia deles como Anu, o Deus acádio do céu, cerca de 2.300 anos a.C., Deus das fontes e da água, Uras avó de Gilgamesh, Qui a esposa de Anu, Apsu, pai de Anu e um nunca mais acabar deles. Por enquanto tudo gente boa e pacífica, mais ou menos ao mesmo tempo todos aqueles lindões do Egito, que à chegada de Aton, só com uma pazada, 2.000 deuses foram jogados no lixo, mas como bons deuses não tardaram a voltar. E por aí se vai. Olhem só esta “coleção; parecem todos da mesma família. E eram.

Nos primeiros tempos, os homo, qualquer que tenha sido a sua espécie, não deviam preocupar-se com outra coisa que não fosse a sua alimentação e reprodução. Assim que aquelas cabeças duras evoluíram, e que qualquer tipo de sociedade se foi estabelecendo, os tais homo começaram a ver e a temer forças que ultrapassavam a sua capacidade de compreensão, o que os levou a deduzir que algo, fora deste mundo animal os podia comandar. Algo, ou alguém que provocava inundações, erupções vulcânicas, doenças, florestas que ardiam sozinhas, raios e trovões, e entenderam que deviam prestar obediência e respeito a esse Poder que tanto os perturbava.

Quem era esse ser? Desconhecido, logo foi tratado de Senhor, Mestre, Chefe, Dominador. Talvez o sol, pelo calor abrasador que chegava a fazer, ou a lua que espreitava de noite, como a querer surpreendê-los, outros, no Egito, renderam culto a um inseto, porque lhe trazia fartura, mais para o interior de África foi a serpente, etc..

Tinham que apaziguar esse ente Superior, render-lhe homenagem, submissão, tributos.

Esta noção foi-se desenvolvendo, e começou a ter nomes em diferentes povos, como Adonai nos fenícios, Baal, Adad, Sudai, Melkom nos povos da Síria, todos estes nomes significando o mesmo, o Senhor, o Todo Poderoso.

Cada povo passou assim a ter o seu Senhor, sob o qual se sentiam protegidos, a quem não deixavam de fazer oferendas, todos sabendo que os seus vizinhos ou inimigos teriam o deles também. Tratava-se depois de saber, se guerreassem, o que esteve sempre a acontecer, qual dos Senhores era mais poderoso e daria a vitória a quem.

Homero fez combater os deuses de Troia contra os deuses dos gregos, sem que isso fosse qualquer novidade. Jefté rei dos judeus, diz aos amonitas: “Não têm vocês o direito sobre o que vosso senhor, Maloch, vos deu? Sofrei pois que nos possuiremos a terra que o nosso senhor Adonai nos prometeu.” Em outra passagem da bíblia Jeremias diz: “Que razão teve o senhor Melkom para tomar a terra de Gad?”

Isto pressupõe que desde os primeiros tempos os judeus reconheciam outros deuses, como Maloch e Melkom.

No primeiro capítulo do Livro dos Juízes encontra-se que “o Deus de Judá tornou-se o Senhor das montanhas, mas não podia vencer nos vales.”

Daí que no terceiro Livro dos Juízes os sírios dizem que o Deus dos judeus era o Deus das montanhas.

Mais tarde os gregos adotaram do Egito, o boi Apis e o cão Anubis, além de Amon e mais doze grandes deuses. Os romanos adotaram os deuses dos gregos. Jeremias, Amos e Santo Estevão garantem que durante os quarenta anos da travessia do deserto os judeus só reconheciam Moloc, Remfam (de onde provém o símbolo Estrela de David, que era a estrela do Deus Remfan, que foi ‘ungido’, e este representa Moloc, o diabo) e Baal. Durante esses quarenta anos do Exôdo não fizeram nenhum sacrifício ao senhor Adonai, mas carregaram o tabernáculo de Moloc!

De qualquer modo, através dos tempos, sempre sob guerras sanguinárias que dizimavam povos, todos aproveitavam para emitir leis, muitas vezes retiradas dos deuses dos vencidos.

Os judeus, apesar da sua aversão a todos os outros, imitaram a circuncisão dos árabes, estes dos egípcios, (o que parece demonstrar que a circuncisão terá “nascido” no interior de África (veja no blog https://fgamorim.blogspot.com/search?q=circuncis%C3%A3o) adotaram os costumes destes últimos, a distinção das carnes, as abluções, as procissões, as danças sagradas e outras cerimónias. Vê-se que Jacob, neto de Abraão, não teve qualquer problema para casar com duas irmãs, Abraão já casara com uma irmã, no Egito Amenófis IV, Tutankaton, foi pai e avô de Amenófis V, Moisés casou com a filha de um idólatra, Eliezer, neto da Moisés foi sacerdote da tribo de Dan, idolatra. Etc.

Parece que os egípcios começaram por adorar Isis e acabaram por adorar os gatos. As primeiras homenagens dos romanos ainda primitivos eram para Marte; mais tarde, mestres de grande parte da Europa preferiam a deusa do casamento, Juno, herdada do deusa Hera dos gregos.

As apoteoses, as grandes manifestações a homens, só começaram muito tempo depois dos primeiros cultos. Não era natural fazer dum homem que vimos nascer, sofrer com doenças, desgostos, as misérias da humanidade, suportar as mesmas necessidades humilhantes, morrer e servir de pasto aos vermes. Mas por muito absurdo que isso seja acabou chegando a quase todas as nações ou povos, depois de muitas revoluções e muitos séculos.

Um homem mesmo que tivesse feito grandes coisas, rendido serviços importantes à humanidade, não podia ser visto como um Deus, mas alguns entusiastas se persuadiram que sele tendo qualidades eminentes, se tinha por um Deus, ou era filho de um Deus. Assim os deuses fizeram filhos em todo o mundo!  Sem contar as fantasias dos povos que precederam os gregos, Baco, Perseu, Hercules, Castor, Polux, foram filhos de deuses, Alexandre foi considerado Deus no Egito; Odin nas nações do Norte, Manco-Capac filho do Sol no Peru. O historiador dos mongóis, Albugazi, conta que um antepassado de Gengis Kan, chamada Alanku, sendo mulher foi engravidada por um raio celeste. O próprio Gengis passou por ser um filho de Deus (intitulava-se descendente do grande Lobo Solitário, fez-se proclamar o Grande Kahn, Kahkhan, e criou uma monarquia de direito divino, já que era o escolhido de Tengri, “o Céu Eterno”) e quando o Papa Inocêncio IV mandou o frade João Carpini a Batou-kan, neto de Gengis Kan, o monge não pôde ser recebido por ninguém de mais elevada hierarquia do que visir; quando disse que ia da parte do vigário de Deus, o ministro respondeu-lhe: “Esse vigário ignora que deve homenagens e tributos ao filho de Deus, o grande Batou-kan, seu mestre?”

De um filho de Deus a um Deus a distância não é grande para os homens que se maravilham com facilidade. Não são necessárias mais do que duas ou três gerações para que o filho partilhe o domínio de seu pai; assim os templos foram elevados a todos os que, com o tempo, foram supostamente nascidos do comércio sobrenatural da divindade com as nossas mulheres e filhas.

Muito se poderia escrever sobre este assunto, mas tudo se resume a duas palavras: a maioria dos seres humanos são, desde todos os tempos, insensatos ou imbecis. E os mais insensatos são os que quiseram dar um sentido a fábulas absurdas, e dar razão a toda esta loucura.

Mais tarde os reizinhos da maioria dos países eram também ungidos com óleo “sagrado”, como até hoje se faz, por exemplo no Desunido Reino da Britânia, quando o Deão de Westminster derrama sobre a cabeça do novo monarca um óleo de unção sagrada levado numa ampola e tirado com uma colher (tudo de ouro maciço, ora pois não), para se lembrarem que Samuel tinha mandado despejar azeite na cabeça de Saul (+ - 1.000 a.C) para que ele se tornasse rei.

Muito mais tarde foi ungido o rei visigótico Wamba da Hispânia, em 672 d.C, (nascido onde hoje é Vila Velha de Ródão, junto ao rio Tejo, em Portugal), o rei Pepino o Breve de França em 751, e continuaram muitos por essa Europa fora.

Já no começo de Portugal como país independente, por mais estranho que possa parecer, o rito primitivo da unção da cabeça não é mencionado; são ungidas as mãos e, a seguir, o peito, as espáduas e as articulações dos braços. Parece que o último rei português a ser ungido terá sido D. João I.

Os reis de Portugal ficaram-se , reis “pela Graça de Deus...”

Agora, com a negação dos princípios religiosos que inundam o mundo ocidental, os governantes “auto-se-ungem”, sobretudo com as mãos e bolsos, com o que conseguem roubar do povo, que depois transformam em ouro, depositado em paraísos fiscais. (Eles sabem da pedra filosofal: rouba do Estado.)

Saudades do Rei Wamba, que estava a arar a sua terra, humilde, atrás de um boi, quando o foram chamar para ser o rei da Hispânia.

 

(a continuar)

01/10/21

 

2 comentários:

  1. Eu AMEI esse texto. Leio sempre sobre mitologia porque me interesso pelos arquétipos e como os Deuses antigos eram tão voltados para atributos importantes, valores que muitas pessoas no mundo contemporâneo já perderam, ou nem sabem o que são... um abraço bem apertado!

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  2. Com muito interesse Aguardo a continuação da história....bjs querido tio

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