domingo, 24 de outubro de 2021

 

Como se fabricam deuses - 2

 

Interessante: comecei o primeiro blog em 2005, que o provedor eliminou sem dar qualquer satisfação nem conhecimento (a mim e todos os outros!) e recomecei este (e o Zukumuna) em 2009.

Escrevi sobre tudo: política, história, ladroagem, romancecos, filosofia, geografia, religião, viagens, etc., e muitos outros temas, não me envergonhando de entrar por aqueles que costumam ser feroz pertença de catedráticos honoris causa ou sem honoris­ nenhum, metendo a cara, e aprendendo com muitos comentários que fui recebendo.

Vejo que as pessoas se cansaram do que escrevo – pouquíssimos comentários e visitas ao blog – o que deve significar que ou “estão de saco cheio” ou estou escrevendo muito mal.

Bem sei que a idade tem essas coisas, levando-me a preparar a aposentadoria dos escritos. Passar a escrever só para me entreter, arquivar os textos e... pronto.

Mas não vou agora deixar os “deuses” na sua etérea paz, porque não acabei de escrever o que penso.

Penso, existo, escrevo, e quem não quiser ler... não leia. Mas por favor digam que não querem mais para eu não encher os vossos computadores com os meus e-mails.

Só por curiosidade: ao fim de tantos anos a escrever, noto que as pessoas estão muito mais interessadas nas historinhas verdadeiras ou semi verdadeiras, histórias de amor e semelhantes bobagens, do que quando arvoro em intelectual, pensador ou filosofo – ápodos que em consciência, por favor dispenso. Isso me leva a concluir que as pessoas não estão dispostas a discutir problemas pesados, chatos, ou que possam colidir com as suas linhas de pensamento. Não gostam de discutir, coisa que a mim me dá um gozo especial.

Nessa mesma linha de atuação (atuação?) vemos uma Europa a desaparecer. A maioria, se for consciente, está desinteressada da política, de problemas, acabando por ter governos que se governam e desgovernam e esmagam o povo. Talvez prefiram sentar-se a ver uma novela... coisa incrivelmente medíocre.

Ora vamos à deuso-logia.

No texto anterior deixámos saudades do rei Wamba, que lutou para não ser rei! Era um homem forte e determinado. No seu tempo (672-680) cessaram as perseguições aos judeus.

Andemos um tanto mais para trás para o aparecimento das primeiras religiões que estabeleceram um Deus Único e se era único teria que ser Universal.

Penso que se pode começar com Zaratustra ou Zoroastro, - terá vivido entre 1.700 e 1.500 a.C. - que fundou o masdeísmo, uma religião e filosofia originada na antiga Pérsia, com uma fé multifacetada centrada numa cosmologia dualista do bem e mal.

Aos trinta anos, enquanto participava num ritual de purificação num rio, Zaratustra viu um ser de luz que se apresentou como sendo Vohu Manah ("Bom Pensamento") e que o conduziu até à presença de Aúra-Mazda (Deus) e de outros cinco seres luminosos, os Amesa Espentas, o que o levaria a elevar Aúra-Mazda ("Senhor Sábio") ao estatuto de divindade suprema, criadora do mundo e única digna de adoração.

Uma religião de paz e bom senso – o Bom Pensamento – que os Amesa Espentas: dividem em

Vohu Manah ("Bom Pensamento"): os animais;

Asha Vaista ("Verdade Perfeita"): o fogo;

Epenta Ameraiti - ("Devoção Benfeitora"): a terra;

Khashathra Vairya - ("Governo Desejável"): o céu e os metais;

Hauravatate ("Plenitude"): a água;

Ameretate ("Imortalidade"): as plantas.

Os zoroastrianos acreditam que Zoroastro é um profeta de Deus, mas não alvo de veneração. Eles acreditam que através dos seus ensinamentos os seres humanos podem aproximar-se de Deus e da ordem natural marcada pelo bem e justiça (asha).

Temos nestes princípios tudo aquilo que a humanidade hoje pode e devia respeitar. Não se fala de guerras, nem de proselitismo mas de simplicidade e humildade.

Tão natural foi esta religião que não representa seus deuses em esculturas mesmo tendo templos, e deixou traços nas principais religiões mundiais como o judaísmo, cristianismo e islamismo através das seguintes crenças:

Imortalidade da alma, Vinda de um Messias, Ressurreição dos mortos e Juízo final.

Com a conquista dos árabes no século VII, os muçulmanos consideraram os zoroastrianos como dimis (dhimmis), ou seja, praticantes do monoteísmo (à semelhança dos judeus e dos cristãos), e, como não aderiram ao islamismo, foram sujeitos a pesados tributos cujo objetivo era estimular a conversão ao Islão.

Sobrevivem hoje alguns milhares, deixados entregues à sua crença, mas sem expressão mundial.

A seguir surge no Egito o senhor Amenófis IV, que se intitulou Akenathon. Correu com a casta dos sacerdotes, uns sanguessugas desgramados, e instituiu o culto de um único Deus, Athon, o Sol, de quem se intitulou filho. Autoproclamou-se o filho direto de Deus e governou em seu nome!

Não durou muito porque os sacerdotes cortaram-lhe o “barato” e voltaram a mandar, sobretudo nas virgens que o povo tinha que lhes oferecer para... para quê mesmo?

Foi um átimo de monoteísmo que morreu à nascença.

Vem a seguir a Bíblia contar que Abraão (por volta de 1800 a. C.) um patriarca bíblico, recebeu de Iavé (Deus) a missão de chefiar os povos semitas e migrar para Canaã, sendo assim considerado o pai das religiões monoteístas atuais.

Mas que Deus falou com Abraão? O mesmo, sempiterno que criara Adão e Eva? Ou outro/outros tantas vezes mencionados na mesma bíblia?

Os seus descendentes, incluindo via Ismael, criaram diferentes deuses, cada um a seu jeito, sobretudo hebreus e muçulmanos, deuses de guerra, deuses eufemisticamente chamados de únicos, mas que eram, e ainda são, deuses privativos de diferentes povos, instigando-os a que combatam, matem, roubem os vizinhos.

Onde está a universalidade destes deuses? Não está. Não são deuses únicos por muito que a bíblia – a quem para melhor “argumentarem” chamam de Livro Sagrado – assim o afirme, mas em dezenas ou centenas de passagens se contradiz, porque incitava povos a guerrearem com os adoradores de outros deuses, sem sequer referir se esses poderiam ser, na opinião dos vencedores, deuses verdadeiros ou falsos!

Foram deuses criados, inventados, para juntar o povo sob uma regra que obrigava e castigava quem não a seguisse. Assiste-se ainda hoje, e parece que por tempo a vir, à ferocidade com que o “pacífico” Islão se refere a qualquer um que não siga Maomé!

Uma nova concepção de DEUS houve que foi diferente (já lá vamos) mas entretanto relembremos que o próprio islão ao invadir e conquistar a Pérsia matou e dizimou a quase totalidade dos mazdeístas, que seguiam uma religião de concórdia e paz.

Previsto no mazdeísmo e na bíblia, está a vinda de um Messias, esperado não como um deus, mas como um profeta que trouxesse entendimento entre os homens.

E veio. Veio um HOMEM que disse a coisa mais simples, mas que, ainda possivelmente por milénios para a frente, parece ser o impossível.

O Filho do Pai, do teoricamente mesmo Deus Único, não trouxe leis, nem castigos, não fomentou guerras, nem aversão a vizinhos e outros povos, não estabeleceu hierarquias nem luxos.

Ao Deus chamou simplesmente Pai, o Pai de todos, qualquer que fosse a sua origem ou nação.

Pregou só o impossível: Amai-vos uns aos outros. Todos seriam irmãos.

A solução de todos os problemas da humanidade e da natureza.

Respeitai, amai o vosso semelhante, ajudai os que mais necessitados, sede simples como as criancinhas, fazei aos outros o que gostarias que fizessem convosco.

Nem há quase 4.000 anos, com Zoroastro, nem há 2.000, nem hoje os homo sapiens, mesmo batendo com a mão no peito, estão preparados para isso.

Erguem, ou ergueram templos sumptuosos, com mão de obra miserável, criaram impostos para o povo enriquecer os episcupus (vigilantes), continuam a pregar verdades misturadas com contos de fada, e o Filho do Pai, chicoteado e morto na cruz, simplesmente disse “Pai perdoai-lhes. Não sabem o que fazem!”

Há muitos anos comprei um livrinho de bolso que falava sobre as religiões. Há mais de 70 anos, e lembro até hoje a frase com que o autor, um pastor protestante, depois de uma breve descrição sobre a maioria das religiões, cada uma com seu texto próprio, sem comparações com outras que já tinham existido e das que prevalecem, começa a falar sobre o cristianismo, e marca:  O cristianismo é o milagre da normalidade!

A única religião que não é um código de proibições, como sempre se ouviu nas igrejas. Que diz ao pecador que ouça o vazio que deixa o pecado, que nada mais é do algo que vai contra a natureza e o amor ao próximo.

Mas o que é hoje o AMOR? Sexo? Esmola para ofender o esmoler e se auto engrandecer? Ignorância dos necessitados? Ou, SIMPLESMENTE, o maior poderio bélico, para ameaçar os outros quaisquer que sejam, sobretudo desde que sejam mais fracos?

De que adiantam procissões, datas festivas em qualquer religião, que o povo aproveita para comer e beber melhor, sempre de costas viradas aos problemas?

De que adiantam santuários onde vão milhões por devoção e turismo, onde choram emocionados, mas onde é impossível que não sintam que estão a fazer parte de um teatro, talvez até uma farsa, porque escondem assim a necessidade de lutarem por um mundo mais, muito mais justo.

Para que servem conventos onde se enclausuram homens e mulheres para orar? O que fazem com aqueles que lá não entram, muitos nem entram em casa alguma porque não a têm?

Há, evidente que há, muitos, muitos, que se dedicam totalmente aos outros, e eu até conheci alguns. Mas quantos são e como influenciam o perdão universal? Miseravelmente poucos. Muitos, isto é, raros.

Terá que vir outro Messias e contar o mesmo, e ser novamente desprezado e ridicularizado?

Mais uma vez conto o mesmo: o homo sapiens acabou de nascer. Está como aquela criancinha a quem tiram um brinquedo e ela chora e bate no companheiro.

O crocodilo tem 60 ou 70 milhões de anos, como as tartarugas e muitos outros animais. Tiveram tempo para se adaptarem. O homo terá, com boa vontade, uns 150 mil, 0,25% da idade desses “velhos”.

Solução: esperar. Talvez uns milhares de anos, milhões. Os homens não têm pressa porque imaginam que o Sol só se apagará daqui a uns 10 bilhões!

Entretanto não consegue, não quer, reconhecer todos os outros como irmãos. Aproveitam e vão roubando, matando e esquecendo os OUTROS.

 

6 comentários:

  1. Continue a escrever que gosto muito de o ler, grande beijinho e outro para a tia Bela

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  2. Parabéns por este texto tão sentido e verdadeiro!!! Também eu vejo o mundo e as religiões exactamente da mesma forma. A evolução tecnologica que se desenvoveu tambem não ajudou, antes pelo contrário, afectou enormemente as últimas gerações. Facilitou muito a comunicação entre todos os povos, mas ao mesmo tempo também trouxe consigo o isolamento, a falta de relações fisicas ( essencial ao Homo) que está a dar cabo da humanidade! As pessoas 'escondem-se' atrás dos meios de comunicação eletronica, sem emoções, sem compaixão, sem laços nem interesse pelo próximo. É tão mais fácil viver assim, mas o q o comum dos mortais não atinge, é que o vazio interior que ao mesmo tempo vai sentindo, vem exactamente destes ideais, religiosos ou não, que vai desenvolvendo sózinho na sua solidão e egoismo, e se esquece de olhar para estes princípios básicos que muito bem mencionou no seu texto acima escrito. São princípios tão simples e básicos que, além de serem essenciais para o equilibrio do ser humano, são as bases ou pilar de todas as relações humanas e da vida em sociedade. Nós somos humanis,e como tal, além de termos 1 cérebro também temos uma parte emocional, e o conjunto de ambos é que faz sermos diferentes de todos os outros animais. Não é só o cérebro mas também as emoções!! E nas emoções está o amor, a compaixão, a piedade, o perdão, a alegria, a bondade etc, e infelizmente também o ódio, o egoísmo, a falsidade, o desejo de poder, a vingança, a ambição desenfreada etc etc ..em que estes últimos mencionados parecem prevalecer em detrimento dos primeiros. Enfim, aprasr de tudo, ainda vou encontrando pessoas pelo mundo com as quais me identifico ( como é o nosso caso) e graça a este meio eletrônico que estamis ambos a utiluzar. Nem tudo está perdido neste mundo, haja srmpre esperança !!

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    1. A esperança é a última coisa que morre com o homem. Até lá ela pode estar viva, alegre ou esfarrapada, como parece ser o tempo que estamos a atravessar

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  3. Respostas
    1. É evidente que o assunto é inesgotável. Mas eu já dei o MEU recado!

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