quarta-feira, 21 de julho de 2021

 

Virtude, Democracia e Verdade


Mais uma incursão na filosofia, que se traduz simplesmente por pensar. Não vou já a tempo de me tornar um filósofo, mas fico-me com Descartes: “Penso... logo existo!”

Em 1757 Rousseau (o tal Jean-Jacques) recebeu da sua amiga Condessa d’Houdetot (Elisabeth Françoise Sophie Lalive de Bellegarde, que tinha um salão literário) uma carta perguntando-lhe o que era a virtude.

A resposta de Rousseau é, como tudo que lhe diz respeito, notável. Infelizmente longa demais para a reproduzir aqui, mas de que vou tirar só uma pequena passagem.

“Você procura mais embaraçar-me do que se instruir, perguntando o que é a virtude. Eu podia responder-lhe em duas palavras que é algo que ninguém consegue aprender a não ser por si mesmo, e que você não saberia nunca se o seu coração não lhe respondesse; aliás por que voltar a uma questão já tão discutida e tão bem resolvida? Abra Platão, Cícero, Plutarco, Epicteto: consulte o virtuoso Schaftesbury (Inquiry concerning Virtue como o seu Essai sur le Mérite et la Vertu) e o seu digno intérprete (que terá sido Diderot).”

E continua: “Faça ainda melhor, estude a vida e os discursos do justo e medite o Evangelho; ou, talvez, deixe todos os seus livros, entre dentro de si mesma, escute essa voz secreta que fala a todos os corações e seja virtuosa para saber o que é o ser-se virtuosa.”

Pode alguém se livrar de estudar a virtude? Não, os seus efeitos divinos são incompreensíveis, ela nos aquece mesmo antes de nos iluminar, nós a amamos tão logo a procuramos, e sentimos antes de a conhecer; e se a razão me leva a perder-me na sua procura, eu me consolaria facilmente que um qualquer erro me tornasse um homem de bem.

Dá para reler e pensar.

Os dicionários são bem mais lacónicos: “Disposição firme e constante para a prática do bem! Força moral.

Para dar agora um giro pela Democracia e Verdade, “pensei” que, sem a tal força moral e sem que olhemos bem para dentro de nós, jamais se poderá falar, ou pensar em democracia e verdade.

Os filósofos, consideram a democracia uma utopia, e desde muito tempo se veem batendo de frente, não com a filosofia da democracia, mas com a sua aplicação na vida prática.

Não se pode dizer que a filosofia e a democracia tenham nascido praticamente juntas, se bem que de começo tivessem até um razoável entendimento.

Mas a democracia não tardou a usar a força. Parece ter esquecido que cada ser indivíduo tem o mesmo direito à vida que qualquer outro com opiniões diferentes. Alguns casos são bem demonstrativos:

1.- A democracia matou Sócrates e os seus seguidores (os primeiros filósofos) e não lhes pouparam críticas. Porque Sócrates tinham uma visão humanística diferente, e não a da maioria, da turba, irresponsável e covarde. Quem tinha a Verdade no julgamento de Sócrates?

2.- Mais tarde a democracia mandou matar Jesus, mesmo que o responsável tenha reconhecido a sua inocência. A voz da maioria, falou mais alto. A Verdade de Jesus era a afirmação que o Seu reino não era deste mundo. Assim sendo o status quo da época não teria que ser perturbado! Mas, sempre a maioria, medrosa e covarde, preferiu livrar-se de Alguém que incomodava.

Se realmente a democracia é a voz da maioria, ela se identifica muito mais com uma ditadura do que com os valores humanos.

É verdade que houve até filósofos que consideraram a democracia a melhor forma de governo... desde que ela fosse exercida pelas elites! Ditadura de consenso? Plutocracia?

Terá sido por causa destas e similares questões que acabou nascendo a filosofia contra a democracia. As polis, cidades estado gregas, reconheceram assim, na filosofia o seu inimigo mortal. E logo a filosofia floresceu e prosperou não raras vezes com a teologia e despotismo! No homem, a autonomia está em revolta contra si mesma. Este é o propósito da filosofia; a sua razão visa sempre a verdade.

Não posso deixar de citar Buda, que na hora da morte terá dito que toda a sua vida tinha procurado a Verdade, mas morria sem a ter encontrado.

A democracia é por essência irracional: o poder em nome do número e da força! É um pré-poder anti-humano, mesmo, sendo o homem um animal racional e não apenas social.

Mas a natureza esmagadora de todos é levada a destruir-se. A vocação, pelo menos. O poder, na verdade, se é de todos, deve ser de cada um, e deve, portanto, garantir o indivíduo. E se o homem renuncia à democracia em nome da razão, também renuncia ao desencanto.

Para se fundar um governo, sobretudo no sentido da democracia moderna (melhor dizendo, atual), não é pela lógica dos argumentos apresentados, que nunca produziram valores, mas pela persuasão de um caráter idóneo, ético, do orador, se este é realmente digno de fé.

Na eterna luta entre o bem e mal, o bem tem uma irredutível desvantagem: não tem futuro, enquanto o mal tem. Uma vez que nós, humanos somos orientados para o futuro, sentimos um insaciável incentivo para deixar o mal conduzir-se em todas as suas formas: a culpa, o remorso, a pobreza, o crime, o pecado, a folia e a tolice. Nenhum destes males é suscetível, pelo menos em princípio, de ajustamento ou correção de um qualquer modo. Em vez disso, que coisa pode alguém fazer face ao bem, a não ser admirá-lo?

Como disse Voltaire, se não houvesse o Diabo, seria preciso inventá-lo.

Não é preciso grande esforço para se concluir que a democracia é mesmo uma utopia. E quando segura pela mãos dos “eleitos”, que parece jamais se ter visto algum deles abdicar do seu poder para reconhecer uma verdade que tenha ido contra a maioria, e há muitos casos, que nome poderíamos dar a este tipo de democracia levada ao extremo?

Muitos são os que ainda lembram o pomposo nome dado às repúblicas soviéticas: República Democrática da Alemanha, de Angola, e muitas, muitas outras “democracias” da AK-47! Onde, na maioria delas não entrou ainda sequer a ponta de um primeiro dedo do pé para olharem para o inferior.

As massas aplaudem os animais humanos que se esmurram por dinheiro, as mulheres que dançam nuas nas boates, pretendem defender os palestinos mas aplaudem quando os israelitas lhes dão uma imensa tareia com o seu poderio militar,

Perderam-se as noções dos verdadeiros valores, dos valores da vida: tradição, respeito, ética, felicidade. Hoje só há dois “valores” que se respeitam e almejam: a tecnologia e o dinheiro. Aquela para melhor chegar a este. Os restantes valores, culturalmente estão mortos ou a agonizar.

É o fim de uma civilização. Todas acabam. A nossa, que herdámos dos gregos, até os africanos estão já a lamentá-la, e a recear, talvez mais do que os próprios europeus, o que virá após isso.

A cultura africana vai também ser arrasada pelo poderio financeiro, como já está sendo.

A América Latina auto estrangula-se, e aplaude, com o socialismo da corrupção.

E depois?

Ah! Depois os filósofos têm que ficar de boca fechada. A democracia a vir, não aceita filosofias que se choquem com a sua ditadura do proletariado.

Pode não ser o Fim do Mundo. Mas vai ser para muitos. Sobretudo para aqueles que um dia pensaram e se bateram por um mundo melhor. Pelo valor individual de cada um.

Quer dizer que não há solução?

Talvez haja, mas a muito, muito, longo prazo. E há já um exemplo: o Japão.

O Japão e o seu sistema educativo. As escolas primárias não têm empregadas para a limpeza nem para o arruma das salas. Os alunos têm a seu cargo a limpeza geral de toda a escola, participam do arrumo da cozinha e lavagem da louça, recebem uma educação cívica, impecável, cultuam a sua história e tradições, em casa são ensinados a terem o maior respeito pelos idosos e, em todo o país ninguém consegue encontrar caído no chão um mínimo pedaço de lixo.

Ora esse respeito, que vem do berço, envolve tudo à sua volta, a começar pelo Outro. Assim, adultos, conseguem discutir na Dieta os assuntos do país, sem terem que considerar os “adversários” de outros partidos como inimigos, mas como parceiros, com ideias diferentes sempre visando o bem geral.

A isto, mesmo onde subsiste um imperador, se pode chamar de democracia.

Talvez pudéssemos chamar a este sistema de governo, governo do respeito ou do entendimento.

E não esquecer as leis dos Inuites, que julgam sem o objetivo de castigar, mas de reintegrar.

Há pouco tempo consideravam-se os países nórdicos, Dinamarca, Noruega, etc., um exemplo de democracia e desenvolvimento. A democracia deles está a matá-los. Não tarda a verem-se todos nas horas santas ajoelhados no chão virados para Meca.

A democracia não tem que ser boazinha. Não é uma espécie de brincadeira infantil. Não pode deixar que outros destruam os seus valores.

Apartheid ou firmeza na manutenção da sua cultura, no respeito à sua história, aos antepassados?

Parece mesmo utopia, apesar de haver alguns povos, raros, que conseguem, com educação e simplicidade, viver em democracia, em perfeito entendimento.

E nós, os chamados ocidentais?

Perdidos.

 

09/07/21

 


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