Notícias da
Califórnia
A pequena e simpática cidade de Sausalito, com cerca de 7.000
habitantes, um pouco a norte de San Francisco, passada a Golden Gate, está
sobre uma bomba relógio, por se encontrar em cima da famosa “Falha de San Andreas”.
Sismos são quase constantes, e a qualquer momento um grande terremoto pode
acontecer. Todos os habitantes têm disso consciência, mas... a vida segue
normal e tranquila.
Henry Sousa, jovem engenheiro naval nascido em San Diego, filho de um
açoreano construtor de barcos de recreio, que o iniciou naquela arte e que Henry
depois desenvolveu na universidade, assim que se formou mudou-se para
Sausalito, onde logo encontrou trabalho, e era muito muito mais agradável do
que qualquer grande cidade. Trabalhava com barcos e gostava de dar o seu
passeio de bicicleta, sempre que algum tempo livre o permitia.
O seu trabalho, além de projetar novas embarcações, que não lhe ocupavam
todo o tempo, era também dar assistência a muitas das que estavam fundeadas
cidade.
Cidade baixa plana, rodeada por alguns morros de baixa altitude, ruas
bem arborizadas, era um ótimo local para, tranquilo, fazer um pouco de
exercício, pedalar, pensar, apreciar os arredores.
Ali era quase um refúgio de artistas, e de alguns endinheirados, que
gozavam da tranquilidade do lugar.
Um dos casais com vida financeira folgada, Pauline e Brian Jones, ela,
médica, nos trinta e pouco e ele quase cinquentão, bem de vida, sem filhos, diretor
de uma empresa de informática em Silicon Valley, para onde se deslocava com
frequência, ficando às vezes lá por alguns dias, em constantes reuniões, sem
voltar a casa.
Pauline, trabalhava num Centro de Atendimento médico em Mill Valley, a
cerca de 10 minutos de sua casa.
Amantes de mar possuíam um veleiro de 28’, onde raro saiam, cuja guarda
e manutenção estava entregue a Henry com quem já haviam saído para alguns
passeios naquela linda baía.
Nos seus passeios de bicicleta, normalmente de manhã, houve um dia em
que Henry passava na rua onde moravam os Jones, um sismo, não muito forte,
fê-lo desiquilibrar-se um pouco na bicicleta. No mesmo momento Pauline ia a sair
no seu carro, de ré. Assustou-se com o sismo, não viu o ciclista e acertou-o em
cheio no exato momento em que ele, meio desiquilibrado passava por trás!
Henry no chão, meio combalido, bicicleta torcida, Pauline sai do carro,
aflita, ajuda o ciclista a levantar-se, o que muito lhe custou, senta-o no
carro enquanto vai buscar a bicicleta caída no meio da rua, e volta com o carro
para a garagem, com o chão já a tremer menos.
Preocupada com Henry, que sangrava um pouco de algumas esfoladelas,
levou-o para dentro de casa, pegou desinfetantes, ligaduras e outros, toalhas
para limpar o sangue, mas antes quis assegurar-se que não havia fratura alguma.
Cuidadosamente tratou das feridas, pequenas, enquanto Henry se compunha da
queda que o deixara meio tonto, combalido.
Já conhecidos, Henry concordou com a médica, que não parecia haver
necessidade de ir ao hospital, mas precisava de descansar um pouco.
- Deixe-se ficar no sofá até se sentir bem. Esteja à vontade. Quando
quiser sair eu vou levá-lo a casa.
Verão, um dia lindo, Pauline vestia uma roupa leve, que deixava a sua figura
jovem bem desenhada, o que ao “acidentado” não passava desapercebido!
Com as ideias baralhadas com o tombo, acabou por adormecer, mesmo
sentado, sono que não durou muito. A seu lado Pauline aguardava, preocupada, o
evoluir do problema.
Henry abriu os olhos, ajeitou-se na cadeira, olhou bem nos olhos de
Pauline, ainda sem realizar o que, exatamente, estava ali fazendo! Levemente
dolorido, as feridas pensadas, devagar reconstituiu o que lhe tinha acontecido.
- Pauline, muito obrigado pelo seu cuidado. Estou a sentir-me já
muito bem. Posso ir para casa e não a incomodar mais.
- Não, Henry, eu é que tenho que me
desculpar. Não o vi e... podia até ter sido bem pior. O sismo atrapalhou-me.
- É normal um ciclista passar
desapercebido nestas ruas arborizadas, com sombra das árvores alternado com o
sol direto. Eu quando vi o carro a descer para a rua devia ter parado, mas
também estava meio preocupado com o sismo. E nem cuidei de olhar para me
certificar se me tinha visto. Mas tudo já passou e vou ter que lhe pedir uma
coisa mais.
- O que quiser.
- Levar-me a casa mais a bicicleta
torcida!!! Sabe onde moro?
- Não.
- Numa boat house em meio de
reconstrução, em Waldo Point.
- Com certeza, mas como são quase
horas do almoço, vou preparar qualquer coisa e depois falamos nisso.
Pauline levantou-se, saiu da sala e Henry, depois de se assegurar que
estava em condições de se levantar e andar, foi atrás.
No corredor que levava à cozinha de repente novo choque! Pauline tinha
parado para fechar a porta de um quarto e quando Henry estava a passar, desta
vez o “acidente” foi bem melhor: ficaram agarrados um ao outro. Primeiro um ar
de espanto, depois o abraço foi-se ajeitando melhor, olhos nos olhos, Henry bem
devagar foi aproximando a cara e beijou-a, sem que Pauline esboçasse algum
gesto de repúdio!
- Desculpe Pauline. Desculpe. Foi ato impensado!
- Se foi impensado, o que lhe parece
este em que eu, nós, estamos a pensar?
E sem dar tempo a resposta, agarra-o bem e o beijo foi bem mais
demorado.
A seguir, pega-lhe na mão, e de mansinho leva-o, não para a cozinha, mas
para outro lugar. Henry deixa-se levar, o coração a bater mais forte.
Entram no quarto dela e não tardou que tivessem esquecido a hipótese do
almoço. Deixaram-se ficar em exercícios, que normalmente se fazem na cama, por
um bom tempo!
Jovens, cheios de saúde, mesmo com o pequeno acidente ciclístico, deram
largas à sua juventude.
Quando pararam um pouco, Pauline confessou:
- Eu e o Brian estamos casados há quase oito anos. Mas hoje os seus
“bits” parecem ser muito mais importantes do que eu. Tenho até andado a pensar
em divórcio. Este nosso encontro trouxe-me nova vida. Foi providencial.
- Pauline, eu sou solteiro à espera
que me caia uma “deusa” do céu! Parece-me que o céu não deixa nada cair, sem
que um fenómeno estranho aconteça! Como o raio, seguido do trovão, e depois a
bonança. Você caiu do céu!
- Se eu soubesse já o tinha
atropelado há mais tempo!
- Daqui para a frente não vamos
perder mais tempo. Arranjaremos maneira de nos encontrarmos. Até...
Conversa interrompida com mais beijos e com o resto.
- O Brian só deve voltar amanhã à tarde. Temos ainda muito tempo para
aproveitar. Agora vamos comer alguma coisa para não perdermos as forças!
Uma refeição
rápida, uma garrafa de vinho para festejarem e, já enamorados, foram para a boat
house. Pauline encantou-se com a simplicidade da casa, já habitável, que
visitou sem largar o braço ou a mão de Henry.
- Pauline: já pensei num plano para amanhã! Eu
saio daqui cedo, no meu carro, e vamos passar o dia em Bird Island. Lá perto
tem um pequeno e simpático restaurante e voltamos depois do almoço.
- Ótima ideia.
- Hoje
vou deitar-me cedo para arrumar as ideias e amanhã, pelas oito horas passo em
sua casa.
Mais um
longo beijo de despedida, Pauline, que tinha redescoberto o gosto de viver,
voltou para casa a pensar que tinha que deixar o marido mais a sua informática.
Conhecia já Henry, um rapaz, 29 anos, educado, que lhe pareceu uma boa
companhia. Mas tinham que caminhar ainda algum tempo para melhor se conhecerem.
Encontros, sempre que possível, tudo bem, mas compromisso... terá que esperar
um pouco.
Henry,
moído, dormiu intercalado com sonhos estranhos, mas... gostosos.
Pauline, nervosa.
Sabia que uma nova vida começava para ela. O casamento com o Brian estava
agonizando, apesar de sempre se terem tratado muito bem, com muito mais amizade
do que amor, que parece havia sumido. Custou-lhe a adormecer até porque sabia
que de manhã a esperava novo passo para...
Oito e pouco
já ela estava à espera, Henry nem teve que sair do carro a não ser para lhe
abrir a porta. O beijo que ficou à espera a noite toda, “vingou-se” bem cedinho
antes de carro começar a andar.
O caminho
para a praia, por estradas secundárias, deixava-os com um sentimento de
tranquilidade, que os fazia apreciarem mais a pequena serra que tinha que
cruzar, e a sua mata. A distância, curta em linha reta, acabava levando a cerca
de 20 milhas.
Praia pequena,
quase ninguém, um paraíso para namorados. Pauline com no seu biquini estava
linda. Com Henry, também jovem, físico saudável, faziam um par perfeito, onde
se via uma forte atração mutua.
Nadaram,
estenderam-se ao sol, abraçaram-se, beijaram-se mais vezes do que as calmas
ondas do Pacífico, deixando-se ali ficar o máximo de tempo que puderam.
No regresso
a casa não houve tempo para uma parada num hotel. Brian podia chegar mais cedo!
Já em casa,
ao jantar, em ambiente tranquilo, Pauline vai direta ao assunto:
- Brian,
a nossa vida de casal está morta! Eu sei que a empresa te dá imenso trabalho e
preocupações. Eu continuo com a minha vida na rotina da medicina e a ter que
ficar muitas vezes só em casa. Sabes como te considero, mas isto não é vida de casal,
tanto mais que até hoje nem um filho conseguimos. Acho que o melhor para ambos
é nos separarmos.
Brian
arregalou os olhos. Jamais esperaria que tal acontecesse.
- Pauline,
tens razão, e eu me sinto culpado por isso. Não adianta prometer que vou ser outra
pessoa daqui para a frente, porque nestas idade só a boa vontade nada faz. Se
achas que vais encontrar mais felicidade na tua vida, não sou eu que te vou
impedir. Não quero é perder a nossa amizade e respeito, que a vida profissional
transformou o que começou como um grande amor,
É evidente
que algumas lágrimas quase, quase, correram.
Pouco tempo
passado, divórcio legalizado sem traumas.
Brian tinha
já uma considerável fortuna. Deixou a casa e uns milhões a Pauline e foi lá
para Silicon Valley aumentar a fortuna. E depois se soube que foi também ter
com uma outra que tantas vezes o acompanhava nas “noites” de reuniões de
trabalho! Por isso também foi tão amável no divórcio!
Henry acabou
de compor a Boat House, que vendeu, e tinha à espera um grande amor, uma
bela casa e até um veleiro para disfrutarem aquela baía!
Melhor do
que tudo isso é que não demorou a que chegasse o primeiro filho. Um Sousa...lito!
Para estes
parece ter chegado algo que caiu, MESMO, do céu.
Até ver.
24/07/21