sábado, 11 de janeiro de 2020




Pesquisei muito e encontrei, como escrevi no texto anterior, muita informação interessante sobre essas simpáticas figuras, os Magos... os Reis!
Na memória popular pouco mais ficou do que aqueles homens, com vestes reais, carregando o ouro, o incenso e a mirra e ajoelhados aos pés do Menino, o novo Rei dos Judeus. Festejam-se, admiram-nos, foram e continuam a ser preciosa fonte inspiradora para poetas, como Edmont Rostand (1868-1918):

Eles perderam a estrela uma noite. Por que perdemos a estrela?
Por ter, por vezes, olhado demais para ela.
Os dois reis brancos, sendo estudiosos da Caldea,
Traçavam com varas círculos no solo.
Eles fizeram cálculos, coçaram as barbas,
Mas a estrela tinha fugido, como se fosse uma idéia vazando.
E estes homens cujas almas tinham sede de serem guiados,
Choravam, erguendo as tendas de algodão.
Mas o pobre Rei Negro, desprezado pelos outros dois, diz a si mesmo:
"Pensemos nas sedes que não são nossas; ainda devemos dar de beber aos animais."
 E, enquanto ele segurava seu balde de água,
Na humilde rodada do céu onde camelos bebiam,
Ele viu a estrela dourada, que dançava em silêncio.

Inspirou inúmeros filósofos, escritores, pintores e escultores, dos mais célebres aos mais humildes como os que, no agreste do Brasil fazem estas imagens, que há muitos anos compõem o nosso presépio:


Terminado o texto anterior não abandonei os Magos que “avisados por Deus e temendo o feroz rei Herodes” fizeram o regresso às suas terras por novos e escondidos caminhos.
Seguindo os traços destes homens, que ninguém sabe quem foram nem quantos, é voz corrente, sobretudo na Pérsia, Irã, que no caminho eles foram espalhando a boa nova: “Vimos o menino. Ele vai ser o rei abençoado.”
E naquele longínquo oriente uma nova esperança, uma nova fé começa a nascer e a entusiasmar muita gente.
Hoje o Irã tolera três religiões: o islão, única religião oficial, a cristã e a judaica. 99% são muçulmanos, dos quais uns 7% sunitas), 0,7% cristãos, o que dá uma população de uns 400.000 e uns 200.000 judeus.
Dizem que eles morreram logo em Jerusalém. Outros na Índia e ainda outros na Pérsia, onde deixaram o “terreno” preparado para que o cristianismo crescesse e frutificasse.
Mais tarde Santa Helena, mãe do imperador Constantino, viajou à Índia (?) e recuperou seus corpos. Depositou-os em um túmulo belíssimo e o colocou na grande igreja de Santa Sofia, em Constantinopla, coisa impossível de ter acontecido, porque Santa Helena faleceu em 330 e a Igreja de Santa Sofia só foi construída entre 532 e 537. Como ela mandou construir duas igrejas, uma da Natividade em Belém, que dura até hoje e a Basílica da Ascenção de Jesus no Monte das Oliveiras, a ser verdade que recuperou os corpos dos Magos, deve tê-los sepultado, mais logicamente em Belém. Mas...
John of Hildesheim no livro do século XIV, “Historia Trium Regum” (“História dos três reis”), afirma que Baltasar, Melchior e Gaspar eram da Índia, Pérsia e Caldeia (atualmente Irã e Iraque). Eles iniciaram a sua viagem de forma separada, reuniram-se em Jerusalém e continuaram juntos até Belém. Depois de adorar Jesus, voltaram juntos à Índia, onde construíram uma igreja e, após uma visão que lhes revelou que sua vida terrena estava a ponto de terminar, faleceram ao mesmo tempo e foram enterrados em sua igreja na Índia.
Mas parece mais consentâneo que Santa Helena tenha recuperado os corpos em Sabba, cidade da Pérsia, possivelmente na Mesopotâmia. Mais provável, ainda que tudo lenda, as relíquias recuperadas pela imperatriz Santa Helena, sim, mãe do imperador Constantino, reunidas no ano 300 na cidade de Sabba os restos dos três misteriosos personagens e a partir dali terem sido enviadas para Constantinopla. Repousaram durante poucos anos neste lugar, até Santo Eustórgio, bispo de Milão, ir a Constantinopla pedir ao imperador Constantino que o confirmasse nessa função. Constantino não só o confirmou como lhe terá dado, como relíquias, os corpos do Reis Magos.
Ainda no século IV Santo Eustórgio mandou construir uma Basílica, que ficou conhecida com o seu nome, onde depositou as relíquias levadas de Cosntantinopla. Durante muito tempo esta Basílica foi um destino de peregrinos, já que era considerada o local da tumba dos Reis Magos.
Também há quem afirme que no final do século VI, o imperador Maurício transportou as relíquias para   Milão, o que é outra invenção sem qualquer cabimento. Isto parece mostrar que quem escreveu sobre o imperador Maurício (Flávio Maurício Tibério Augusto, imperador bizantino no período de 582 a 602, nascido na Arménia), no século VI...  se terá esquecido de Santo Eustórgio, e nada sabia de Milão.!!!
Em 1164, o imperador alemão Frederico Barba Ruiva saqueou Milão, e descobriu que uma igreja milanesa custodiava as relíquias. A abadessa deste convento era irmã do prefeito da cidade e prometeu dar as relíquias em troca de proteger a vida de seu irmão da fúria do imperador depois do ataque à cidade. O Arcebispo de Colónia foi chamado a intervir e no fim só pediu uma recompensa ao imperador: que permitisse que a abadessa abandonasse a cidade de Milão com tudo aquilo que pudesse carregar sobre seus ombros. A abadessa cumpriu com a sua parte do trato e como agradecimento ofereceu as relíquias ao Arcebispo de Colónia.
Desta forma as relíquias, os supostos restos mortais dos Magos: Baltazar, Melchior e Gaspar, foram transferidos como dádiva para o Arcebispo de Colónia com a finalidade de o Império Sacro Germânico ficar sob a proteção dos Reis... já santos.
As relíquias tinham grande significado religioso e poderiam atrair muitos peregrinos de toda a cristandade e com isso se ordenou a construção daquela magnífica catedral que tinha começado em 1248 e levou mais de 600 anos para ser terminada. Foi construída no local de um templo romano do século IV, um edifício quadrado conhecido como a "mais Velha Catedral" e administrada por São Materno, o primeiro bispo cristão de Colónia. Uma segunda igreja foi ainda construída no mesmo local, a chamada "Velha Catedral", cuja construção foi completada em 818 mas acabou queimada em 1248.
Atualmente tais relíquias são mantidas no Santuário dos Reis Magos na Catedral de Colónia num sepulcro de ouro. Mas... serão mesmo eles que lá estão???


Em 1864, o relicário foi aberto e descobriram os esqueletos de três homens. É possível que estes sejam os restos dos três reis magos que adoraram Jesus, ou seriam apenas três esqueletos anônimos que se fizeram passar pelos magos no início da Idade Média?
Um esqueleto pertence a um homem jovem, outro a um homem de meia-idade e outra a um idoso. Um mosaico do século VI em Ravena, que representa os três magos, mostra precisamente homens com estas características. Este detalhe coincide com o resto da história o que parece conferir alguma veracidade.
Em 1906 o então Bispo de Milão, Cardeal Ferrari obteve uma restituição parcial das relíquias que se conservam no altar da Basílica de Santo Eustórgio e obteve outras pistas intrigantes.
Mas tem mais história sobre os corpos dos magníficos Magos.
Tudo é bem enigmático. Marco Polo, no capítulo 22 do seu livro “Il Millione” diz que os Magos saíram da cidade Sabba na Pérsia, hoje Saveh, e que, cerca de 1275, viu os corpos dos três Magos nos seus sepulcros, ainda “inteirinhos e com os cabelos e barba como quando vivos”. Diz ele que interrogou muita gente que apenas soube dizer que estavam ali sepultados havia longuíssimos anos!
Isto mais de um século depois de o Barba Ruiva os ter levado para Colónia! Seria uma espécie de vingançazinha de um italiano para perturbar os germânicos? Mas as considerações de Marco Polo sobre a visita dos Magos ao Menino são demasiado fantasistas, até porque ter visto os três corpos, “fresquinhos...” depois de doze séculos... Infelizmente.
A verdade... ninguém sabe. Como Buda dizia que “passou a vida à procura da verdade e morria sem a ter encontrado”!
Deixemos os ossos dos simpáticos Magos descansarem (devem ainda estar estafados de tanta andança) e vamos seguir pela sua herança.
Hoje em Saveh não existe nem uma só igreja, mas a Grande Mesquita dali foi edificada no século XII por cima de um antigo templo zoroastriano. Nada quase sobra do original mas dizem que era construído em tijolo, tendo “uma sala principal para o fogo sagrado, e dois compartimentos onde os representantes do antigo culto se recolhiam para orar”!
Sabe-se que antes de ser destruída por Gengis Khan, Saveg era um importante centro astronómico... Os Magos seriam astrónomos, sacerdotes zoroastristas ou ambas as coisas?
Hoje, os cristãos do Oriente, dizem que foram os três Reis Magos que iniciaram uma nova religião, porque terão entendido que o Menino, mesmo recém nascido, lhes terá transmitido uma mensagem de Amor e Paz.
Céline Hoyeau que se deslocou há pouco ao Irã à procura dos rastos dos Magos, foi a Urmia, à beira do Lago do mesmo nome, sede de uma das mais antigas comunidades cristãs de todo o mundo, onde os Magos teriam sido sepultados, de acordo com a antiga tradição da Igreja do Oriente, segundo o Padre Pierre Humblot, já em França com 85 anos em 2012, que passou quarenta anos no Irã. A Igreja Persa, que ele tanto trazia no coração e que fora fundada, dizia ele, com ar misterioso e divertido, pelos Magos!
O padre que recebia muitos iranianos atraídos pelo cristianismo deu muito crédito a essa tradição, descoberta na Crónica de Zuqnin, uma crónica universal, em língua siríaca, que conta a história do mundo desde a Criação até ao ano de 775, e terá sido escrita por um monge em meados do século VIII, que conta a epopeia de doze (e já não três) reis que, todos os anos aguardavam em oração num certo monte Victorial a luz de uma estrela que devia guiá-los para Deus “que lhes apareceria sob a forma de um homem pobre e humilde”. No regresso do monte eles anunciaram na Pérsia o que tinham visto em Belém. (Não há como saber onde seria este monte Victorial)
Esses doze reis ou magos, foram pouco depois batizados pelo Apóstolo Tomé, tornaram-se missionários, e “a fé na Vida se expandiu pelo Oriente. Um deles estaria sepultado na Igreja de Santa Maria, em Urmia.”
Outro padre francês, o padre Jean-Louis Lejeune, desde 1968 no Irã, passou a vida ao lado dos iranianos ao ponto de pensar em persa”! Ao serviço da igreja caldeica-católica, próxima dos responsáveis de outras igrejas de Urmia, levou Céline Hoyeau ao seu bispo, Monsenhor Thomas Meram um iraquiano, também instalado no Irã há mais de quarenta anos e que conhece bem as 80 igrejas de Urmia e das povoações nos arredores. “Os cristãos estão aqui desde o primeiro século”, afirmou, explicando que a sua igreja foi fundada por Addai e Mari, dois discípulos de Apóstolo Tomé, e que este mesmo havia passado pela região. Por isso se diz que aquela “igreja é apostólica”.
A igreja sofreu consecutivas vagas de perseguição, mas também uma imensa expansão. Mil anos antes dos jesuítas ela enviou missionários por toda a Rota da Seda, até à China. “Chegámos até a ter um bispo mongol, no século XIII!”
O sacristão Sargon Ushana, afirma que uma outra igreja foi fundada sobre um templo zoroastriano. “Um mago era o encarregado do fogo sagrado. De volta de Belém esse velho sacerdote zoroastriano transformou o seu templo em Igreja”. “Temos trabalhado muito para encontrar o túmulo, mas até agora, nada”.
Padre Eilosh Azizyan, assírio, está “100%” seguro que a sua Igreja, de Santa Maria, está sobre o túmulo de um Mago. “Ela parece nova, mas as pedras mais antigas estão no interior das paredes atuais; ela foi quase destruída pelos otomanos e reconstruída em 1944. Pesquisadores italianos estão interessados em explorar, e se isso se provar, dará grande crédito ao cristianismo e ao Evangelho no Irã”.
O presidente do Instituto de Proteção do Património Histórico e Cultural Italiano, Silvano Vicenti, informou que em Abril de 2017, um responsável da província de Azerbaijão Ocidental da Pérsia, onde Urmia, Urumieyh, é a capital, o contatou para tentar detectar potenciais restos mortais de magos que estarão sob a famosa igreja de Santa Maria, o que mostra que as autoridades iranianas se começam a interessar pelo assunto...
Vicenti considera-se ateu, mas... “se novas evidências emergirem, estou pronto a mudar de opinião!”
De acordo com a tradição mais aceite terá sido o Apóstolo Tomé quem evangelizou a Mesopotâmia, ou um dos seus companheiros, Mari, um dos 72 discípulos de Jesus, quando Tomé seguiu para a Índia.
Um manuscrito antigo permite datar a primeira igreja fundada em Kohké, nos arredores de Seleucie-Ctésiphon, capital dos partos (cerca de 35 kms a sul de Bagdad), entre 79 e 120.
A partir de 226 os persas querendo unificar o Império à volta duma religião nacional, o mazdeismo, começaram violentas perseguições aos cristãos.
Depois da conquista muçulmana tudo parece ir abaixo, com sucessivas vagas de perseguições. Sob o Califado Abássida (750-1517), que transferiu a sede da Damasco para Bagdad os cristãos são mais bem tratados. Logo a partir desta altura o Patriarca Timóteo I, ainda no século VII, nomeia monges missionários na Ásia Central na Rota da Seda. Extraordinária epopeia de monges missionários que se aventuram por mar até à Birmânia e Tailândia e por terra até à China, mil anos antes dos jesuítas ali terem entrado.
Uma estela de Sig Nan Fou, erguida em 779 em chinês, assinada por monges persas, testemunha a implantação de vários mosteiros cristãos ao lado da atual Pequim.


No tempo do seu esplendor os cristãos do Oriente alcançavam 80 milhões de almas, mais do que toda a Europa junta.
Mas século IX e depois no XIII, sob a dinastia Ming, a China se fechou a toda a religião estrangeira e a presença cristã se apaga.
Na mesma época os Mongóis massacram os muçulmanos, os cristãos da Pérsia são dispersados e muitos mongóis convertem-se ao cristianismo, chegando um deles, em 1281 a ser Patriarca.
Mas depois de tentativas de aliança entre os Cruzados e Mongóis estes se voltam cada vez mais para os muçulmanos e centenas de milhares de cristãos são massacrados.
Despois da “noite escura” veio a época da “grande separação”: a latinização da Igreja da Pérsia, começada com os Cruzados, cristaliza-se em 1553, alguns bispos se voltam para Roma em reação a um Patriarcado tornado hereditário. Um patriarca católico instala-se à cabeça de uma Igreja, mesmo continuando a chamar-se “caldaica”.
Um pequeno resto de cristãos do Oriente refugia-se nas montanhas do Kurdistão, nos montes Hakkari, arrebanhados do Kurdistão pela Turquia. Viveram isolados até ao enfraquecimento do Império Otomano, antes de voltarem para as planícies do Irã e Iraque. E voltam a ser vítimas de perseguições no século XX, sobretudo após a I Guerra Mundial.
Seduzidos pelos russos sobre a promessa da criação de um estado independente, revoltam-se contra os turcos, mas são deixados pelos “aliados” e massacrados.
Surge agora, com o Papa Francisco, alguma esperança dessa Igreja com a nomeação de cardeais siríacos: Sua Santidade Bechara Rai, patriarca de Antioquia dos maronitas, Baselios Cleemis Thottunkal, arcebispo dos sírio-malankara da Índia, George Alenchery, arcebispo dos sírios-malabares (estes dois últimos, da região por onde andou São Tomé), e da instalação dum bispo maronita para a Europa, Monsenhor Nasser Gemayel, responsável durante quarenta anos dos catecúmenos no Irã. Ele vê assim “um desafio para a nova evangelização no seio da comunidade, uma vez que ela tem sido tão perseguida que se fecha nas suas etnias, em vez de abrir aos numerosos convertidos que batem à sua porta”
Todos os antigos cristãos do Paquistão, China, Etiópia, Pérsia e Ásia Central garantem ser descendentes desses Magos. Serão, quase de certeza herdeiros da sua Fé que os levou ao cristianismo.
Que Deus os ilumine e proteja.
Entretanto São Tomé foi a caminho da Índia e falaremos sobre ele... proximamente.

10/jan/2020

4 comentários:

  1. Isto é um quebra cabeças de dimensões gigantescas e nunca será solucionado mas desde que cada um acredite na sua verdade e não queira impô-la à força e tenha a generosidade de respeitar a verdade dos outros, então teríamos atingido a plenitude. Mas o ego e as vaidades do ser humano nunca irão permitir que isso aconteça.

    ResponderExcluir
  2. CARAMBA! Super interessante.
    PARABÉNS e obrigado.
    Abraço,
    Henrique

    ResponderExcluir
  3. Espantoso trabalho, que li de um fôlego. Agora vou reflectir. Parabéns, Francisco. E obrigada!
    Saúde e vitalidade!
    Grande abraço.
    H

    ResponderExcluir