Mais
Vinho
Um
pouco de História
Muita
gente gosta de meter o nariz no vinho, ou na vinha – coisa errada! –
conjeturando que esta terá sido introduzida na Europa pelos gregos.
Ninguém
sabe bem quem primeiro chegou a essa Europa, mas a verdade é que no Médio
Oriente como no Egito houve vinho desde tempos muito antigos. E eles deixaram a
prova. Produziam, exportavam e chamavam-lhe a “bebida de Horus”. Pelo
menos em 2733 a.C.
Olha
aqui todo o processo: vindima, fermentação, embalagem e exportação
E
em França?
Segundo
a arqueologia, que tanto nos ensina, há alguns cem milhões de anos, ou perto
disso, ainda não havia nem Europa, nem o que estava a aparecer desta, nem tinha
ligações com África, já um arbusto que se enrolava e crescia para o alto, sem, como
é evidente, classificação botânica na família das ampelidáceas, estava presente
naquele solo.
Era já a vinha, no seu
estado espontâneo, uma vitis, a futura Vitis Vinifera de Lineu.
Os homens de Neaderthal
não tinham aparecido, nem os de Cro-Magnon, nossos pré-vovozinhos, mas a vinha
já lá estava... à sua espera! Quando apareceram... devem ter-se logo metido nos
copos!
No laboratório de geologia
da Sorbonne há um fóssil da “Vitis Sezannensis”, descoberto em 1870 em Sézanne,
na região de Champagne.
Fossil da Vitis
Sezannensis encontrada numa escavação de mármore
Esta vinha, vestígio
anti-diluviano, apresenta um estreito parentesco com a vinha atual. Data do
período Eoceno, entre 55 e 35 milhões de anos atrás (!), notável pelo seu
desenvolvimento lenhoso, não estaria ainda suficientemente desenvolvida para
produzir fruto para a vinificação. (Também não havia muita gente para beber...
nem bares).
No sítio Paleolítico Terra Amata, perto
de Nice, que data de 400.000 anos, há evidências de que os Homo
Heidelbergensis colhiam e comiam uvas selvagens.
Com isto se quer
demonstrar que a origem da vinha, até onde vão hoje os conhecimentos, era
europeia, confirmada também pelos fósseis de vinhas, suas folhas e gavinhas,
muito bem conservadas em tufos quaternários, na região de Montpellier.
Daí que não há porque aceitar
ou insistir que a vinha apareceu no médio oriente, mas é sim europeia.
Um dia surgiram os tais
Neanderthais e seus subsequentes Cro-Magnons e não há razão para deixar de crer
que eles um dia descobriram que aquelas frutinhas esquecidas num canto da
caverna tinham fermentado, e ficavam com um gostinho agradável e até davam
“nova vida à vida”.
E vá de espremer uvas e
criar recipientes cerâmicos para guardar aquele néctar.
Há 10.000 anos havia uma
bela adega no sul da Georgia, fronteira com a Arménia. Há pouco desenterrada.
O pior foi quando aquela
bebidinha gostosa azedou. E lá vão os trogloditas à procura de algo que
impedisse aquela maravilha de se estragar.
Segundo consta, um deles,
mais esperto, certamente, decidiu juntar-lhe resina de pinheiro e a bebida
aguentou-se mais tempo.
Lá pelo Médio Oriente,
onde Alá ainda não tinha ditado ordens, os bebedores deliciavam-se também com
esta bebida, encontraram outro conservante, ainda hoje fonte de sobrevivência
de alguns povos de algumas partes desertas das arábias: deitaram mão a uma
outra resina, a goma adragante, exsudada pelas Astragalus gummifer
Labillardière e Astragalus Microcephalus Willd.
Nomezinho complicado, mas
resina muito boa. Também se usou – ou usa ainda? – a goma arábica, constituída
principalmente por arabina, mistura complexa de sais de cálcio, magnésio e
potássio do ácido arábico. Este ácido é um polissacarídeo que produz
L-arabinose, D-galactose, ácido D-glucorônico e L-ramnose. Você, leitor, quer
um copo disto? Só para dizer já é difícil! Também se usou e talvez use ainda o
ácido málico e muitos outros.
Ainda hoje essa goma é
utilizada em vinhos que bebemos todos os dias e em outros que são só bebidos
pelos milionários, os de champagne!
Há quem suspeite que até
ácido málico é utilizado, mas como a sua principal fonte será a maçã... fica
bem disfarçado. Deve ficar uma espécie de cidra vinicolada!
Um amigo meu, sobre quem
vou ainda escrever, teve um restaurante em Lourenço Marques. O vinho que lá
servia, o vinho da casa, era bastante aceitável, e barato. Quando lhe perguntei
que vinho era, ele, em segredo me afirmou, ao pé da orelha, que era feito por
ele mesmo, ali nas margens do Índico, na cave do seu restaurante, e nem uma uva
entrava da sua composição!!! Fiquei de olho arregalado e pedi-lhe a fórmula. Depois
ma daria. Infelizmente nunca mais falámos nisso e perdi, com certeza uma
grande lição de pseudo-enologia e de química.
Voltando à história,
muitos séculos e milénios se passaram desde os fosseis das pré-vinhas
encontradas, até ao seu cultivo, que só aparece, em antigo documento egípcio
que indica a sua cultura o que não significa que ela seja dali oriunda.
Se foram ou não os gregos
e romanos os primeiros a dedicarem-se à sua cultura, a selecionar variedades, e
instituir técnicas, foram eles quem transmitiram essa maravilha através do
Mediterrâneo, não esquecendo que a vinha era já cuidada em tempos neolíticos.
Segundo o que a
arqueologia tem descoberto no fundo desse mar, e até em diversos outros sítios,
é fácil acreditar que o vinho era a principal mercadoria que viajava pelos
mares europeus.
Os egípcios há muito
tinham abandonado a cultura, e foram os gregos e suas colônias que o tornaram
mais conhecidos, e grande fonte de riqueza.
Em Massilia, hoje
Marselha, era maior a quantidade de vinho exportado do que o importado da
Grécia. Estes como viajavam e demoravam para serem bebidos eram conservados com
conservantes incríveis que hoje custa a aceitar: cinzas de pinheiro
misturadas com resina, argila e até gesso. Os vinhos produzidos no sul da
Gália, hoje França, não necessitavam de conservantes, mas como eram vinhos
espessos, fortes de álcool levavam uma boa mistura simplesmente de água.
Apesar dos romanos serem
já bons vinicultores, não só na Itália como na Sicília, também se sabe que o
vinho da região hoje conhecida como Alentejo, em Portugal era muito cobiçado
por Roma. Ainda hoje e não só por romanos!
O vinho chegou a ser
proibido na Gália. Os homens bebiam de tal modo que iam completamente bêbedos
para as batalhas!
Somente no ano 273 um
édito romano autorizou a cultura da vinha em qualquer lugar.
Quem diria que Paris, Lutèce,
estaria rodeada de vinhas e que, por exemplo em Montmartre se produzia um
magnífico “gran cru”!
Graças aos celtiberos
peninsulares que pacientemente foram melhorando as cepas indígenas, os
Bituriges Visbisci plantaram a variedade “biturica”, que deu origem aos
cabernets, e desenvolveu a cultura da vinha na região de Bordeaux.
Mais tarde Lyon torna-se a
capital do vinhos dos francos.
Quem diria, há milhares de
anos, que destas coisinhas lindas ia sair um néctar melhor do que hidromel? E
que até faz bem às coronárias?
A vinha foi-se assim espalhando
e se instalou em toda a Europa, e todo mundo. Até a Grã Bretanha tem já vinhos
de qualidade. Há muitos anos.
Graças a cientistas
como eu, que não dispenso o meu copo às refeições.
E com uma vantagem:
acabaram os vinhos fracos, ruins, de baixa qualidade. Quem quiser vender tem
que ter qualidade, o que nos leva a poder comprar, quase de olhos fechados uma
garrafa de vinho, de baixo custo, e qualidade bem aceitável.
Que tal um copo de Biturica
Saint Emilion ???
03/08/2019
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