sexta-feira, 11 de maio de 2018



Algumas leituras – 4


DONCÔVI

Os Iberos
(um apontamento)


Se pensarmos que na Península Ibérica pré-romana havia talvez uns cem povos, ou diferentes etnias, cada uma, ou quase, com sua língua própria, também não nos custa muito tentar aprender um pouco da língua tradicional do minêro, de Minas Gerais, uai!
Para quem é “peninsular” e/ou goste de genealogia, é agradável saber de onde se veio, quem são os antepassados, tal como diz o minêro: DONCÔVI, i.é, “Donde é que eu vim”!
Essa conversa do “puro sangue”, “sangue azul” e outras invenções é coisa “pra boi dormir”. Nós, todos, todos, somos uma mistureba danada, mais ainda se acreditarmos que o nosso antepassado comum apareceu “assim”, como num estalar de dedos, lá no Vale do Rift, em África.
Depois foram-se descolorando uns, escurecendo ou mantendo o colorido outros, mas... somos todos farinha do mesmo saco.
O que se sabe sobre os primeiros habitantes da Península Ibérica é muito pouco. Nem se pode afirmar a origem da palavra, que tanto pode ter sido tomada do Reino da Ibéria, algures lá para o sul da atual Geórgia, como do rio Ibris (que, segundo Estrabão se terá chamado Oleum Flumen, com os romanos). De qualquer modo os autores que nos deixaram alguma coisa escrita, sobretudo os gregos, copiados mais tarde por romanos, dizem que a Ibéria se situava entre os rios Ródano, em França e o Ebro, hoje na Espanha. O resto era a barbárie
Não admira que, segundo Adolf Schulten”, os lígures tivessem constituído a população mais antiga da Península Ibérica, “historicamente comprovada”, e indícios arqueológicos e pesquisas etnográficas relativamente recentes sugerem que os lígures estejam ligados aos lusitanos, possivelmente por partilharem uma origem comum. Tal teoria é aceita por estudiosos, como Adriano Vasco Rodrigues, que a defende na sua obra "Os Lusitanos". Quem sabe?
Quando se começa a ter notícias dos lígures, aí por volta do século XVI a.C. (1580 a.C.) estavam eles no sul da Gália, e o seu território ia desde a base dos Alpes até ao rio Ródano. E a Ibéria, para o lado do Ocidente ia até ao mesmo Ródano. Portanto eram vizinhos... e porque não o mesmo povo?
A arqueologia vai dando passos e descobrindo o que a história não conservou, e mostrando que não eram tão selvagens como os antiguinhos pensavam.
Há documentos incríveis, como as pinturas das Grutas de Altamira que terão, talvez, 32.000 anos, há uma oliveira em Portugal que tem 3.500 anos e continua a dar boa azeitona, e já se encontraram na província de Málaga, restos humanos, de Neandertais com mais de 40.000 anos, mas o que se conhece sobre a vida dos povos, aos poucos é que se vai desvendando.
Segundo uma teoria, os Iberos eram os habitantes originais da Europa Ocidental – pouco provável porque, certamente de algum lado para ali foram os criadores da grande cultura megalítica que teve início em Portugal. Segundo outra teoria, os Iberos são de origem Ibéria Caucasiana, provavelmente tendo cruzado todo o Magrebe e depois o Mediterrâneo. As mais antigas manifestações de ordem religiosa remontam aos deuses do médio oriente, sobretudo Baal, o principal deus fenício, adorado por praticamente todos os povos da região semítica, do mesmo modo em Cartago, o que ajuda a crer que foi de onde saiu grande parte dos povos que formaram os iberos. Além de Baal, Melkart e Astarte deuses “importados” do Oriente.
Os iberos não foram um povo, mas um complexo de povos, dada a sua diversidade e variedade.
Comecemos por falar um pouco dos mais antigos – conhecidos – que tudo parece indicar tenham vindo do médio oriente.
Sabemos por exemplo que na região onde hoje está Andorra havia uns povos que se chamavam olositanos, castellanos e ceretanos, e seriam mais ou menos os mesmos. Nem os primeiros, nem os segundos têm algo a ver com os lusitanos nem com os atuais castelhanos, mas já se falava, há 2.500 anos que os presuntos ceretanos eram famosos e se vendiam até na Grécia!
Não se precipitem porque vamos “comer” outros presuntos famosos da Cantábria!
Também se sabe que terão sido os gregos que levaram a cultura da vinha para a Península há cerca de 4.000 anos e que as oliveiras terão ido de Cartago há mais tempo do que isso.
Os primeiros escritos sobre eles, de que sobraram uns escassos apontamentos, consideravam a Ibéria unicamente a área voltada para o Mediterrâneo, e começaram por se interessar sobretudo pelos Tartessos, que terá sido o primeiro estado organizado na Península. Não só porque foram maioritariamente colonizados pelos gregos, por ser rica em ouro e prata e pela admiração que lhes causava a longevidade dos seus reis! Ocupavam uma área que seria hoje metade do Algarve além das províncias de Cadiz, Sevilha, Córdoba e Granada. Há mais de 2.700 anos já tinham escrita própria, mas de que nos ficaram só algumas estelas, ainda hoje sem tradução.
Duas outras zonas mediterrâneas foram colonizadas – ocupadas – uma por Cartago, e uma outra por influência direta dos fenícios.
Eram os iberos os senhores da parte sul e leste da Península, sendo que durante muito tempo a Meseta Central esteve quase desocupada. No sul os tartessos, os túrdulos e os turdetanos, os bastetanos e bástulos, e ainda os oretanos.
Subindo pela costa oriental encontravam-se o que chamam os iberos propriamente ditos: contestanos, edetanos, ilergavones, cesetanos, layetanos, indigetes e ausetanos, e mais um monte de outros pequenos povos como os “artistas” do presunto, ao lado dos arenosios e andosinos! No lado do Atlântico eram os cônios, cinetes e saefes.
Há quem afirme que a costa atlântica foi começada a colonizar antes ou ao mesmo tempo que a mediterrânea. Mas ninguém consegue unanimidade nas suas afirmações.
Segundo Herodoto os primeiros helenos a empreenderem viagens marítimas longas foram os gregos foceus (de Foceia, na costa de Turquia quando, quando por volta de 500 a.C. foram corridos da Lídia pelos exércitos de Ciro). Não havia naus; eram embarcações de cinquenta remos. Chegaram a Tartessos, onde conquistaram a amizade do rei Argantônios, que reinou oitenta anos e viveu cento e vinte. Tal a amizade, que o rei os convidou a deixarem a Jónia para ali se instalarem. Daí possivelmente a primeira, grande, colônia grega, na Península.
Os iberos falavam uma língua, com muitas variantes, mas de raiz mais ou menos comum que seria um substrato do que se falava no II milénio a.C.
Eram agricultores, outros mais ganadeiros, tinham os seus chefes e elites, guerreavam muito, sobretudo quando escasseavam os alimentos de um grupo e tinham que ir buscá-lo a outro.
Trabalhavam muito bem a metalurgia, bronze, e os instrumentos encontrados, como espadas, punhais, tripés, caldeirões, etc. atestam a sua perícia.
Muito antes das Guerras Púnicas, já os helenos, como todos, não sabiam quem teriam sido os primeiros povoadores na Sicília, a quem chamaram de ciclopes e lestrigones, seres lendários. Mas no séc. V a.C. ali encontraram, povos iberos, que Tucídides relata que os Lígures, igualmente um povo que parece ter saído dos iberos, teriam expulsado uma outra tribo ibérica, os sicanos, das margens do rio Sicano, do nordeste da Península Ibérica. Por causa deles a ilha foi chamada de Sicânia, tendo sido antes conhecida como Trinácria, nome que lhe provinha de Tri Acra, três cabos!

Turdetanos e os turdulos eram tartessos, ibéricos

Em meados do século III a.C., os cartagineses, depois de terem perdido a hegemonia do Mediterrâneo, perdendo a Sicília e a Sardenha, querendo vingar-se de Roma, mas não tendo como fazê-lo pelo mar, decidiram que o caminho era por terra.
Invadem a Ibéria, onde fundam algumas cidades como Cartagena, lutam e submetem alguns povos, muitos dos quais acabam nas fileiras de guerra para chegarem a Roma.
Amilcar Barca, o primeiro a começar esse avanço, depois dos primeiros sucessos, morre afogado ao atravessar o rio Júcar. Quem sabe se alguma linda serrana o distraiu, como cantou Luis de Góngora em  1603:
En los pinares del Júcar
vi bailar a unas serranas,
al son del agua en las piedras
y al son del viento en las ramas...
¡Qué bien bailan las serranas,
qué bien bailan!

As Ilhas Baleares não tinham nenhuma relação com os iberos e antes da chegada dos romanos só as duas maiores ilhas estariam habitadas, desde uns 3.000 anos a.C., época a que chamaram pretalayótica!
Agricultores, umas cabras, ovelhas e poucas vacas, mas uns costumes curiosos. Hábeis, excelentes atiradores com a funda serviam como mercenários nas guerras entre gregos e cartagineses, e viviam, no século V a.C. em covas. Os mortos despedaçavam-nos com facas de madeira, depois colocavam os pedaços dentro de um vaso e cobriam-no com pedras. Tinham vinhas, mas gastavam o “dinheiro” todo a comprar vinho e escravas, e um costume nupcial muito louco, sobre a desfloração da noiva: enquanto se celebrava a boda, os amigos e familiares se “uniam” com a dita “gatinha” por ordem de idade, até que, FINALMENTE, chegava a vez do marido!

No próximo texto continuaremos com os celtas e suas misturas.

01/05/2018

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