quinta-feira, 23 de outubro de 2014


O REMADOR É UM INCOMPETENTE

(Esta “história” é velha, mas sempre atual, e lembra muito alguns governos de países que estão em crescimento, mais ou menos, zero)

Lê-se numa crónica que no ano de 94 se celebrou uma competição de remo entre duas equipas, uma composta por trabalhadores de uma empresa publica brasileira e outra pelos seus congéneres japoneses.
Dada a partida, os remadores japoneses começaram a destacar-se desde o primeiro instante, chegando à meta em primeiro lugar. A equipa brasileira chegou com uma hora de atraso.
De regresso a casa a diretoria da empresa reuniu-se para analisar as causas de tão desastrosa atuação e chegaram à seguinte conclusão: detectou-se que na equipa japonesa havia um chefe de equipa e dez remadores, enquanto que na brasileira havia um remador e dez chefes de serviço, situação que teria que ser alterada no ano seguinte.
No ano de 95 após ser dada a partida, rapidamente a equipa japonesa começou a ganhar vantagem. Desta vez a equipa brasileira chegou com duas horas de atraso.
A diretoria voltou a reunir após forte reprimenda do governador do estado, do ministério competente e do congresso, e constataram que na equipa japonesa havia um chefe de equipa e dez remadores, enquanto que a brasileira, após as eficazes medidas adotadas sobre o fracasso do ano anterior, era composta por um diretor de serviços, dois deputados, três acessores especiais, três chefes de seção e um remador.
Após minuciosa analise chegou-se à conclusão seguinte:
O REMADOR É UM INCOMPETENTE
No ano de 96, a equipa japonesa ganhou terreno desde a largada. A embarcação brasileira que este ano tinha sido encomendada ao departamento de novas tecnologias, chegou com quatro horas de atraso.
No final da competição, e para avaliar os resultados alcançados, celebrou-se uma reunião ao mais alto nível, no ultimo piso do edifício da administração, chegando-se à seguinte conclusão; a equipa japonesa era composta por um chefe de equipa e dez remadores.
A equipa brasileira, após uma auditoria e um acessoramento especial do departamento de informática, tinha optado por uma formação mais vanguardista, composta por um senador, dois deputados, dois diretores da receita federal, dois acessores políticos da diretoria e um massagista que controlavam a atividade do único remador, ao qual se tinha aberto um processo disciplinar e retirado todos os bónus e incentivos, devido ao fracassos das competições.

Nota: no Brasil negam que isso se tenha passado com a equipa deles. Dizem que houve um caso destes, sim, mas com uma equipa portuguesa!
Aqui para nós: parece que foi com ambas, só que os portugueses disputaram com os alemães.


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A lenda da Mani Oca

(Em 2001 ofereci seis meses do meu tempo à Obra da Rua – Casa do Gaiato, em Moçambique. Foi uma experiência de valor imenso. O que abaixo vai escrito é dessa época, vão já 13 anos!)

Moçambique é um dos grandes produtores de mandioca. No entanto não é fácil encontrar-se, em restaurantes, pratos com base neste produto que, pela sua larga utilização, podia considerar-se nacional. (Hoje, 2014, em praticamente todo o lado, no Brasil, se encontra a mandioca, mesmo em restaurantes caros.)
A palavra mandioca (Manihot esculenta, Grantz) poderá ter a sua origem numa lenda brasileira. De qualquer modo parece ser planta oriunda da América do Sul. OCA em língua tupi, da maioria dos índios do Brasil, significa casa. A lenda conta que MANI era o nome da filha dum cacique, um chefe:
“Em tempos antigos... a filha dum cacique apareceu grávida. O cacique quis punir quem desonrara a sua filha e ofendera o seu orgulho, mas, por mais que castigasse a filha, esta sempre afirmava que não tinha conhecido nenhum homem. Em face desta teimosia o cacique decidiu matar a filha. À noite, enquanto dormia, apareceu-lhe em sonhos um homem, duma raça que ele nunca tinha visto, dizendo-lhe que não matasse a filha porque ela era, de fato, inocente.
Passado o tempo, a filha do cacique deu à luz uma menina lindíssima, muito branca, que a todos surpreendeu. Puseram-lhe o nome de Mani.
Mani andou e falou muito precocemente, não dormia nunca, nem tinha dores. Ao fim de um ano morreu.
Foi enterrada dentro da própria casa, e regada diariamente conforme o costume daquela tribo. Ao fim de algum tempo brotou da cova uma planta inteiramente nova, desconhecida. Cresceu, deu flores e frutos, e vieram os pássaros que comeram os frutos e ficaram embriagados, o que fez aumentar a superstição sobre esta planta.
Um dia a terra fendeu-se. Cavaram-na. Os índios julgaram ver nas grossas raízes o corpo, já seco, de Mani.
Num ritual sagrado comeram-no, gostaram e multiplicaram-no” .
MANI OCA. A Casa da Mani. Mesmo que seja só uma lenda, é bonita.
A mandioca é como a Mani da lenda: planta-se, rega-se e ela oferece-nos um magnífico alimento!
A mandioca tem sido desde tempos que se perdem na memória, uma das mais importantes culturas das regiões tropicais, tornando-se numa das suas principais fontes de energia alimentar, e ocupa o quarto lugar em área plantada, no mundo, sendo cultivada em mais de noventa países.
O cultivo da mandioca, sob o ponto de vista agrícola, apresenta uma série de vantagens, que fazem dela uma das culturas de maior importância nos trópicos, sendo para muitos povos o alimento preferido e quase insubstituível. Tem uma elevada tolerância a períodos de seca relativamente prolongados, produz satisfatoriamente em solos de baixa fertilidade, e é muito rústica, oferecendo grande resistência a pragas. Além disso, uma das suas importantes qualidades é a possibilidade de ficar armazenada no próprio solo, por um bom espaço de tempo, o que significa, entre outras vantagens, não ter custos de armazenagem e ficar defendida da maioria dos predadores.
Segundo alguns historiadores, depois que a mandioca foi levada para África foi nítido o aumento da população, porque se alimentava melhor.
Por todas estas razões e por tradicionalmente a mandioca ser um dos produtos base de grande parte de Moçambique, a FAO, o organismo das Nações Unidas para a alimentação, continua a incentivar a sua cultura por todos os países de clima tropical. A Casa do Gaiato, pela sua idoneidade e capacidade, foi escolhida para colaborar com este programa, e tem estado a multiplicar esta planta que depois é enviada para outras regiões onde as variedades estão ou degeneradas ou em carestia. Com alguma regularidade técnicos da FAO vão acompanhar a evolução da cultura, estudar o seu estado sanitário e de desenvolvimento, para garantir a distribuição de plantas saudáveis e de boa qualidade.
Entre os técnicos que ali apareceram, chegou um nigeriano, homem maduro e experiente, professor universitário, um mestre. Analisou as plantas com cuidado e minúcia enquanto agachado e sem tirar os olhos das mesmas dava as suas instruções a duas técnicas que o acompanhavam. Uma delas observou:
- Mas nesse caso não conseguimos obter um rendimento de 100%.
- 100%? Mas eu não quero 100% para nada. 20% já é muito bom. O que eu quero é dar de comer às populações que neste momento nada têm.
Até que enfim! Apareceu um homem sensato. Inteligente. Ao contrário de tantos sábios que continuam inutilmente agarrados a compêndios universitários, alheios às realidades da terra e social das populações.
Enquanto
Há um imenso abismo entre a agricultura na Europa ou nos Estados Unidos, de grande extensão, subsidiada, e agricultura de subsistência ou pouco mais, dos povos de África, sem qualquer apoio, nem sequer do São Pedro que lhes alterna os anos normais com outros calamitosos. Este é um dos profundos calcanhares de Aquiles nas relações Norte-Sul.

2001, revisto em 13-out-14

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