Do Brasil: a cultura e a sua falta - 3
Falar de cultura pode até ser atrevimento. De cultura brasileira.
Vão-me cair em cima os mestres, aqueles que sabem tudo de coisa pouca, talvez
os mestres de algumas escolas que pensam ensinar disciplinas mas esquecem da
cultura, e não os Mestres que sabem um pouco de quase tudo, aprendido ao longo
da vida e do seu interesse pelo Outro.
O Brasil vive com culturas dispersas, o que é natural face às
origens dos emigrantes. Entre umas desanimadas festas da cerveja, Oktoberfiest com nome alemão e tudo, lá
pelo sul, passando pela da Madona da Quiropita para os italianos do
Bexiga em São Paulo, ao Bumba-Meu-Boi lá para o Norte, este de tradição
e cultura antiga, pode-se assistir a algumas outras isoladas que as populações
locais se empenham em ano após ano aumentar o brilho e a participação de
forasteiros. Pouco mais.
Nacional só o Carnaval, que se transformou em “mercadoria de
exportação”, dificilmente se encontrando já aquele verdadeiro carnaval de
bairro, do povo. Hoje o carnaval, aquele carnaval grande, espetáculo de
“exportação”, não é mais para o povo. Só para turista ou brasileiro rico que
pode pagar milhares para assistir.
Então, friamente analisadas as festas “nacionais”, podemos ainda
encontrar algumas de caráter religioso em Minas, e a cada quatro anos, tipo
festa bissexta, a subida da rampa em Brasília de um novo presidente a inaugurar
um “novo ano e um novo período de promessas”, que o povo, quer assista ou não,
fica a torcer para que dê certo, e nunca dá. Teoricamente a festa seria para
ele, povo. Mas é para ele, o eleito, e sua camarilha. E que festa...
Ah! É verdade. O futebol. A maior festa nacional... sobretudo quando o
Brasil ganha.
Mas até aqui, de cultura brasileira... tudo isto sabe a pouco. A nada.
Falando de língua, temos a língua portuguesa a unir este quase
continente, e se os paulistas não a deturparem muito pronunciando os plurais à
moda italiana, sem o “s” no final (dois pão, quatro homem, etc.),
perdurará por muitos e muitos anos. Ainda. Porque pelo meio da multidão estão mauricinhos
e patricinhas que queriam mudar a nossa língua para a inglesa, o que
lhes facilitaria as idas aos states
fazer compras. (É evidente: lá custa tudo
menos de metade do que custa aqui!
(E ainda temos aquele crime
de se reescrever Machado de Assis, porque alguns ministros não sabem o que
significa “sagacidade” e outras palavras assim difíceis e vão mudá-las para
esperteza e afins! E o governo vai distribuir 600.000 exemplares, de uma nova
edição “revista e assassinada” de o Alienista, de graça, o que evidencia uma
negociata, - ver roubada – das grandes e um imenso crime contra a cultura).
Línguas nativas então... nem cheiro delas, e entre os quase 200 milhões
de brasileiros deve ser difícil encontrar um, unzinho só, que fale alguma em
profundidade. Tirando alguns índios que ainda vivem no meio das florestas, como
é óbvio, e que serão os últimos guardiões de um valor inestimável que parece
ninguém se interessar em preservar!
Vamos tendo, haja Deus, mas muito raramente uma boa música, mas que se
está a degenerar com essa proliferação virótica dos “rap” e “funk” que nem é
música nem coisa alguma, mas que se difunde como vírus na Internet, e pelo
mundo. O tempo da Bossa Nova passou e hoje está difícil entrarmos num outro
período de tanta criatividade e beleza!
Mas cultura não é só isso, assim como somente saber muito de matemática
ou física ou outras ciências também não se pode chamar cultura.
Diz o Aurélio (sempre a mania de consultar os Mestres) sobre cultura: “O
complexo dos padrões de comportamento, das crenças, das instituições e doutros
valores espirituais e materiais transmitidos coletivamente e característicos de
uma sociedade; civilização.” E diz mais: “O desenvolvimento de um grupo
social, uma nação, etc., que é fruto
do esforço coletivo pelo aprimoramento desses valores.”
Aqui é que está o nó do póbrema! Para se atingir essa civilização,
essa cultura, há que transmitir coletivamente as nossas crenças,
os nossos valores espirituais e das instituições. E pior quando tentamos
transmitir, e coletivamente, padrões de comportamento tão ignóbil com aquele
que, todos os dias, todos, se nos apresentam através dos órgãos de informação
expondo claramente o descalabro e desmando nos mais altos escalões da vida
pública, os que deviam dar o exemplo, sem que nada aconteça aos ladrões.
Ladrões, sim. O povo, pode não ter muita cultura mas não é besta, e recebe
esta transmissão de valores – invertidos – como se fossem os verdadeiramente
bons, ou pelo menos os mais rentáveis, e fica almejando alcançar posições
semelhantes para se locupletar também do aparente inesgotável erário público.
Paralelamente, as instituições, e aqui deviam entrar o
congresso, o judiciário e etc., que também não podem gabar-se de dar ao povo o
exemplo que ele tanto queria receber e necessita! Lá aparecem vários senadores
que..., deputados que..., juízes que... , outros políticos e funcionários do
alto escalão que... , enegrecem e desacreditam todas as instituições, que elas
em si, não têm vontade própria. A imensa quantidade do povo vive de mão
estendida às “graças” do des-governo que assim comanda legislativo e judiciário
e eleições. A chamada farsa dos Três Poderes.
Como primeira transmissão de valores, estamos não só a
empobrecer a nossa cultura como a roubá-la!
Depois o Aurélio fala-nos nas crenças. Acreditar em que? Nos governantes e políticos, já ninguém
acredita. Reverenciar a história, toda deturpada... ninguém se interessa. Numa
religião? Povo composto de gente de tão diferentes culturas originais, tinha
conseguido um modus vivendi bastante harmonioso, casando o
catolicismo com tradições africanas, não só dando origem ao candomblé, mas
adoçando por todo este imenso país o rigor romano. Criou os seus santos, e porque
não, se todos o fizeram, desde a Senhora de Aparecida à Senhora do Rosário e ao
Padinho Páde Cíço, e mais devoção menos devoção, essa religião
brasileira, brasileira sim, serviu como meio de união. Há poucos anos chegaram
os vendedores de milagres, os grandes marqueteiros vendedores de
crendice. Assistimos agora a outra virose bem mais perigosa do que as músicas
funk, que logo logo vão saturar também e não fazem bem a alguém, as igrejas
de enriquecimento rápido, o melhor negócio neste momento no Brasil, depois
de banco, é claro.
Há dias, nas janelas de uma dessas igrejas estava colocada uma
larga faixa, que eu vi, e dizia:
“Esta semana grande promoção
de milagres”
Incrível! Milagres por atacado. Talvez até para revenda. Preços
módicos. Pagamento no cartão de crédito ou em “n” parcelas sem juros. Entrega
em domicílio?
Lamentei não ter comigo uma máquina fotográfica! Mas muito povo acorre
e paga para ver. Sem impostos nem inspetores de espécie alguma a perturbar o
negócio, uns quantos milagritos combinados com silenciosos empregados ou
familiares, promovem o rápido enriquecimento desses pastores ou bispos.
O povo vai lá porque procura qualquer coisa. Ele passa mal, há pobreza,
desemprego, fome até num país que produz 200 milhões de toneladas de grãos o
que dá uma média uma tonelada por cabeça e por ano, quantidade mais do que
suficiente para engordar a todos! Procura milagres assim como joga na loteria à
espera deste outro milagre. E milagres não acontecem. Cada um de nós é que os
faz!
Então que crença devemos transmitir aos jovens e vindouros? Que valores
espirituais? O que se entende por valores espirituais? A educação
cristã? A hebraica? Porque não hindu? E o candomblé?
Isto de religião é complicado, mas valores espirituais não
tanto. O espírito é eterno, a carne limitada a um curtíssimo espaço de tempo
entre a concepção e a morte. Daí que mausoléus e outros mais ou menos bem
enfeitados jazigos possam ser úteis se nos ajudarem a reter o exemplo que o
defunto eventualmente nos deixou! De outro modo não passa de mais uma
demonstração de estratificação social, abominável.
Sem valores espirituais, morais e éticos, não conseguiremos,
jamais, alcançar valores materiais. Não os materiais representados por
riqueza, ostentação, esbanjamento, mas as obras de arte e infra-estrutura que
identifiquem e ajudem a unir o povo.
Infelizmente também poucas são as escolas e faculdades confiáveis, e
para a ignorância vale mais um diploma do que o conhecimento.
Com isto talvez se possam resumir os valores espirituais a pouco
mais do que aquele ensinamento cristão: “Ama o teu próximo com a ti
mesmo”, acrescentando o que naquela época era ainda desnecessário lembrar,
ou impor: “Respeita a natureza”.
Ainda o nosso Aurélio diz por fim que “O desenvolvimento de uma
nação é fruto do esforço coletivo pelo aprimoramento desses valores.”
Temos que começar por valorizar o que temos e o que tivémos. Porque
enquanto os desprezarmos não os podemos aprimorar.
Onde fica então o desenvolvimento da nação?
Talvez com esta demonstração de “cultura”
vinda do altíssimo topo, onde se destaca a objetividade, o conhecimento
político-científico, a erudição e a...
Tem uma infraestrutura muito
importante para o Brasil, que é também a infraestrutura relacionada ao fato de
que nosso país precisa ter um padrão de banda larga, tanto backbone como
backroll, compatível com a necessidade que nós teremos para entrarmos na
economia do conhecimento, de termos uma infraestrutura, porque no que se refere
a outra condição, que é a educação, eu acho importantíssima a decisão do
Congresso Nacional de Brasil em relação aos royalties.
Esta maravilha de linguajar é parte de um
pronunciamento, oficial, da madama dona presidenta!
Entendeu o que ela disse? Nem ela.
E o pior é que está lá desde 2011 e quer
ficar mais quatro anos.
Só um backroll nos salva.
01-jan-03 / + ago-2014