EM LOANDA
A PRIMEIRA REGATA
24 de Janeiro de 1863
Do livro “A Velha Luanda – nos festejos, nas solenidades, no ensino”
De José de Almeida Santos – Luanda 1972
O ano de 1863 trouxe logo no início um acontecimento histórico ressumante de júbilo e de pompas reais: o casamento d’El-Rei D. Luiz I com a princesa D. Maria Pia de Saboia. Em Loanda, o Governador Geral, José Batista d’Andrade, fixava os dias 22, 23 e 24 de Janeiro para as celebrações do real consórcio.
Te-Deum, cumprimentos oficiais, felicitações, baile no Palácio com “cerca de 30 damas loandenses e muitos cavalheiros principais.”
Para o dia 24 – último dos folguedos e cerimónias – estava marcado um festival náutico na baía de Loanda e à noite récita na “Sociedade Dramática 31 de Outubro”. Tratava-se na realidade de um programa em cheio, condigno do fecho das festividades. E muito embora os luandaenses amassem por tradição o teatro, decerto os atrairia vivamente a regata organizada pela jóvem “Associação Naval de Loanda” que criava assim novos interesses nos moradores, arrastando-os para as emoções inéditas da competição, para o gosto ao ar livre, do mar, do saudável prazer do desporto.
Concorriam naturalmente as embarcações de recreio, propriedade dos ricos negociantes e personalidades distintas da terra. Era eles: o escaler “Corisco” do sr. Eduardo Hypolito de Oliveira; “Dona Antónia” do sr. Francisco Barboza Rodrigues; “Segredo” do sr. António Ignacio Ruas – que alinhavam para a primeira competição – e as baleeiras “Atrevida” do mesmo sr. Hypolito de Oliveira; “Saltarello” do sr. José Malheiro dos Santos; e “Dona Isabel” do Secretário do Governo – que disputavam a segunda corrida.
Também desfilaram na baía embarcações de cinco remos, desafiando-se em velocidade e perícia: os escaleres «Raio», do Sr. Hypolito d’Oliveira; «Acaso», do Sr. Ennes da Costa Alonço; e as baleeiras «Augusta», do Sr. Luiz António de Oliveira Machado; «Carolina», do Sr. António Estêvão dos Santos; e «Sultana», do Sr. Isaac Izagury. No final, vinha à frente, triunfante, arrancando o primeiro prémio, a baleeira «Augusta», seguindo-se-lhe o escaler «Acaso», que ganhou o segundo trofeu.
Chegada a hora do almoço, abancavam os sócios do «Naval» na casa do consócio Sr. Pamplona, sita na Ilha, o qual reunia à sua mesa sessenta e dois talheres. Para depois do repasto estava já fixada a regata de embarcações de vela em que competiriam o «Corisco», armado a «cutter», o «Baio», o «Saltarello» e o «Cavallo Branco». Arrancou o prémio — que consistia em seis libras a serem distribuídas pela respectiva tripulação — a última destas embarcações.
Um cutter do século XIX
Pormenor insólito de tragédia ia-o dando uma das baleeiras, a «Saltarello», ao voltar-se – felizmente sem consequências de maior, sendo recolhida a tripulação por outra baleeira, a «Sultana», e por um escaler do brigue «Pedro Nunes».
E pouco depois, das mãos do Senhor Governador Geral, recebiam as tripulações das duas baleeiras — a sinistrada e a salvadora — cerca de 70$000 rs. fortes, produto da subscrição ali efectuada entre os presentes.
À noite, concorriam ao teatro aqueles amantes do desporto, para, entre muita outra gente, assistirem à representação de «Um banho nas Caldas», «Uma noite na casa do guarda» e «Por um triz» — sorrindo divertidos nas comédias e sacolejando-se de hilariedade na farsa.
Findavam assim os festejos realizados em Loanda para celebrar os augustos esponsais de El-Rei D. Luiz com a Senhora Dona Maria Pia de Saboia.
O que foi escrito no «Boletim Official do Governo Geral da Província d'Angola» n.o 5 de 31 de Janeiro de 1863 — Pag. 32
O dia 24 foi escolhido para se efectuar a regata promovida pela Associação naval de Loanda, que para esse fim foi instituída nesta cidade. Reuniram-se os sócios na casa do sr. Pamplona, num dos mais commodos e aprasíveis logares da ilha e pouco depois das 9 horas da manhã começou a regata. Houve primeiro duas corridas, uma das embarcações de 4 remos, e outras das de 5 remos.
Para cada uma das corridas havia dois prémios, sendo um de libra e outro de meia libra para cada homem da tripulação. As embarcações de 4 remos eram os escaleres Corisco, propriedade do sr. Eduardo Hypolito d'0liveira; D. Antónia, do sr. Francisco Barbosa Rodrigues; Segredo, do sr. António Ignacio Ruas; e as balieiras Atrevida, do sr. Eduardo Hypolito d'0liveira; Saltarello, do sr. José Malheiros dos Santos; e D. Isabel, do secretario do governo. D'estas ganhou o primeiro prémio o escaler do sr. Barbosa Rodrigues, e o segundo a balieira do secretario do governo. Servia de patrão do escaler o sr. Eugênio Augusto d'Andrade, e da balieira o sr. Luiz António Rodrigues. As embarcações de 5 remos eram os escaleres Raio, do sr. Eduardo Hypolito de Oliveira; Acaso, do sr. Hugo Eanes da Costa Alonço; e as balieiras Augusta, do sr. Luiz António d'01iveira Machado; e Carolina, do sr. António Estevão dos Santos; e Sultana, do. sr. Izaac Zagury. Ganhou o primeiro prémio a balieira Augusta, e o segundo o escaler Acaso; os proprietários foram os patrões d'ambas.
Pela uma hora da tarde serviu-se lautamente um lunch de 62 talheres, e em seguida começou a regata das embarcações de vella, que foram o Corisco, armado a cuter, o Raio, o Saltarello, a Sultana e o Cavalo branco, do sr. Hugo Ennes da Costa Alonço, que ganhou o prémio, que era de 6 libras para a tripulação.
Um sinistro, que poderia ter sido de funestas consequências deu logar, passado o momento do perigo, a novas e mais vivas comoções. A balieira Saltarello, da qual servia de patrão o sr. António Ignacio Ruas, ao virar de bordo, voltou-se; foi porem immediatamente socorrida por um escaler do brigue Pedro. Nunes, e pela balieira Sultana, de que era patrão o sr. António Estevão dos Santos. As tripulações das duas balieiras, quando chegaram á ilha, foram recebidas com enthusiasmo, e o sr. Ruas e o sr. Santos receberam não vulgares provas d'estima. Logo ali se promoveu uma subscripção para a gente das duas embarcações e em poucos minutos se juntaram mais de 70$000 reis fortes que foram destribuidos pelo sr. governador geral.
11/08/2013
Nenhum comentário:
Postar um comentário