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Os Albertos
Meu Deus! Como a vida é curta! Há dias éramos uns meninos, logo adolescentes, jovens, maduros, passados e, por fim... velhos, idosos ou velhinhos!
Não sei o que se passa com a memória, mas à medida que os anos avançam, e já bem avançados, principiamos a esquecer o que se passou ontem, na semana passada ou há pouco tempo, e lembramos passagens da vida tanto tempo esquecidas, da juventude.
A nossa memória é como a de um computador: tem capacidade limitada, com o uso, os “programas” incompatibilizam-se uns com os outros, o “disco” vai apagando o que sobra ou já não interessa, “desfragmenta-se” e tudo fica cada vez mais lento em reagir!
E daí, as histórias que os vovôs gostam de contar! Todos os vovôs gostam. Sobretudo cenas de “naquele tempo”... que não se sabe bem se foi ontem ou há muito tempo!
Sabemos, ou desconfiamos, que o “homo sapiens” apareceu na Terra há uns 50.000 anos, e que isso nada é em relação ao surgimento da própria Terra! Ninguém acredita na “conversa” do Matusalém ter vivido 969 anos, nem Noé 950, e tendo o primeiro filho aos 500! Mesmo contando os anos como os balinescos, de 210 dias... eu só teria 136!
Se assim fosse e com o constante aumento de perspectiva de vida que se tem verificado nos últimos tempos, estaríamos ainda hoje com Dom Afonso Henriques, em vez de tantos imbecis governantes que nos têm perturbado a vida, pediríamos ao Cabral para nos explicar melhor como “achou” as terras de Vera Cruz, e ainda ouviríamos o próprio Vatsayana contar como foi que estudou para escrever o Kamasutra! Etc.
E certamente não deixaríamos também de pedir ao Hamurabi que voltasse a impor a sua lei contra bandidos, ladrões, e outros congêneres como políticos, etc.
Mas, “naquele tempo”... ainda estudante, tive um colega, companheiro, com quem criei uma ótima relação de amizade e de farra, que se chamava, e chama, Alberto.
O Alberto "brasileiro" !
Com dezenove anos, depois de assistir ao desbaratar de todos os bens da família, pelo pai e tio, jogadores inveterados, não lhe foi difícil ver que não havia mais dinheiro para continuar os seus estudos, e imigrou para o Brasil. Aqui fez a sua vida, prosperou profissionalmente, teve várias mulheres de papel passado e boa variedade de outras acidentais, mas nunca enriqueceu a trabalhar para “outrem”, para patrões! Ganhou experiência, o que é evidente, e continua a ser um senhor, porque o berço o marcou!
Estivémos quarenta anos sem saber um do outro. Sem nos vermos! Pouco mais do que desconfiávamos que o “outro” estaria vivo! O reencontro foi uma festa! Falámos de filhos, netos, colegas “perdidos” e outros já idos. Hoje vivemos na mesma cidade, entrados em bons anos, encontramo-nos regularmente, falamos sobre os tempos da juventude e sobre filosofias diversas quando nada mais há para dizer, e essa amizade, de tantos anos, parece fortalecer-se cada vez mais! Conversas sempre acompanhadas com um bom copo de vinho!
Os quarenta anos sem nos vermos sumiu já da nossa memória, mas foi uma perca grande!
Já escrevi neste blog sobre um outro amigo, também Alberto, pescador, filho, neto e... de pescadores, que conheci na Baía das Pipas, no sul de Angola, talvez em 1963. Há quase 50 anos! Tivémos pouco contato nas ocasiões que o visitei, mas sempre guardei uma bela recordação deste amigo. Durante quase todo este tempo tinha o seu rasto como perdido, sabendo somente que saíra de Angola assentara arraiais em Tavira, no Algarve, mas... isso não era suficiente para o encontrar. E a dúvida a perturbar, sem saber se continuava entre nós ou se já tinha, também “ido”!
O Alberto, angolano, na "juventude dos seus 91 anos !
Foi através do blog que um seu amigo me avisou que este Alberto, seu conhecido, vivia mesmo em Tavira, estava com 90 anos, e com mais saúde do que muito rapaz de 20!
Foi uma alegria muito grande. Escrevemo-nos, falamos pelo telefone, e ficou “combinado” que se eu voltasse um dia a Portugal, que faria uma caldeirada à pescador “como manda a tradição”! Bastava isto para me dar uma terrível vontade de atravessar o Atlântico!
De um dos Albertos, o da minha juventude, estive sem nada dele saber por quarenta anos, até que finalmente, e por uma série de coincidências curiosas, nos voltamos a encontrar.
Agora estou a preparar-me para ir abraçar o outro Alberto. O da Baía das Pipas. Vamos ter muito que conversar, sabendo que jamais conseguimos recuperar o tempo que as vicissitudes na vida nos obrigou a vivermos separados.
Mas ao olhar para o tempo “perdido” longe dos amigos, que nos parece uma eternidade, ao final das contas, vemos que foi um quase relâmpago. Um instante. Um átimo, como melhor soa aos ouvidos dos físicos.
E pensamos: quantos “relâmpagos” deste tipo desperdiçamos na vida?
Cada momento que nos surge, some logo a seguir. Se não o aproveitamos com todas as nossas forças, empobrecemos.
22-jul-10
Amigo não só não é para esquecer, como custa viver longe deles!
22-jul-10
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