domingo, 23 de abril de 2023

 

COMO  DÓI  A  SOLIDÃO

 

É muito difícil chegar a uma idade avançada e ver a velocidade em que os amigos nos vão deixando porque alcançaram o merecido descanso.

Hoje, logo pela manhã, recebi mais uma dessas notícias que me deixou extremamente abalado, as lágrimas logo me encheram a cara, e conto agora por poucos dedos de uma só mão, quantos ainda por aqui andam, longe, muito longe, em lugares que o físico não me permite mais alcançar.

Ainda há poucos anos conseguíamos reunir para um almoço trinta ou quarenta, daqueles amigos que durante muitos anos foram como irmãos.

Mas começaram a chegar aos implacáveis noventa e vão adormecendo na Paz Eterna.

Foi hoje um dos últimos e dos mais chegados amigos, que nos conhecemos, bem meninos, na entrada para a escola, 1ª classe, talvez em 1936 ou 37, já lá vão oitenta e muitos anos.

Tivemos uma adolescência e mocidade com frequentes encontros e brincadeiras.

Depois fui estudar para longe de Lisboa, víamo-nos menos, mas não perdíamos a amizade. A seguir serviço militar e não tardou a que eu realizasse o sonho de ir para África.

Muitos para lá foram também e uma maioria que ficou em Portugal perdi de vista, simplesmente sabendo, de vez em quando, que estavam bem, tinham casado, etc.

Muito  mais tarde, os cabelos já esbranquiçados, encontrei um desses primeiros amigos que, parece, não nos víamos desde que fizemos uma viagem, de navio, a Roma, em 1950, e estávamos já em 1990. Talvez uns 40 anos sem nos termos encontrado!

 No “Carvalho Araujo” a caminho de Roma – 1950

Em pé, o último à direita é o meu amigo e o 3° da esquerda sou eu

 

Um forte abraço, uma imensa alegria com o encontro, logo combinamos um almoço de quatro da mesma época. Três estão no Além.

Juntou-se logo um outro que vive em Madrid (e acabei de saber que está muito bem) colegas desde aqueles idos da 1ª classe, que durante as minhas posteriores idas à Europa conseguia juntar e que passei a chamar o Trio Maravilha. O almoço mais importante nessas idas!

O “Trio Maravilha” em Merida, 2006

 

Foram almoços maravilhosos. Ríamos, contávamos passagens da vida e saíamos com as baterias da amizade recarregadas.

Um dia este amigo escreve-me a pedir que encontrasse um Professor brasileiro que ele tinha conhecido lá em Lisboa... (já não lembro o nome) para lhe agradecer o envio de um livro ou um dicionário que lhe tinha oferecido.

Consegui localizar o Senhor, a quem transmiti os agradecimentos e expliquei a razão de ele não o ter feito há mais tempo. Falámos um pouco e o Professor disse-me então que o meu amigo tinha sido a pessoa mais bem educada que conhecera, um verdadeiro nobre.

E era. Sempre atencioso, simples, alegre e, sobretudo, amigo.

Quando comecei a escrever, primeiro para um blog (que me “roubaram”) e depois até para o jornal “O Dia” de Lisboa, além de permanente e “fiel” leitor dos meus escritos, foi ele que fazia a ponte com a desorganização daquele jornal!

Escrevi há pouco uma pequena história “Habemus Nigrus Papam”, que depois tive que rever. Estava confusa.

Mandou o seu filho Zé escrever para me dizer que estava à espera desse texto que queria muito ler.

Já estava corrigido, mandei logo. Não sei se teve tempo para isso.

Deixou um vazio muito grande em todos que o conheceram, e eu choro a perda de um amigo, irmão muito querido. Amigo raro e simples como são os Grandes.

Obrigado Xico, Francisco de Novaes e Ataíde, por teres sido tão amigo.

Em breve vou ter contigo.

Retrato pintado em 2006

 

22/04/23

 

6 comentários:

  1. Aos setenta e poucos anos também já começo a perder amigos. Bertrand Russell, aos 96 anos, dizia que era o único sobrevivente de sua geração. Todos os antigos amigos, colegas de juventude já haviam morrido, só sobrara ele.

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  2. Para o Pai era sempre um enorme prazer ler os seus textos. Perguntava-me sempre se tinha lido. Pelo sim pelo não imprimia sempre os textos para eu ler.
    Era sempre uma festa puder encontra-lo. E sempre que eu voltava do Brasil perguntava-me se tinha estado com o Xico Amorim.
    Obrigado pelas suas palavras e por ter sido tão amigo
    Um abraço,
    Francisco Ataíde

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  3. Beijo Tio Chico ! Saudades para si e Tia Bela

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  4. Força Tio Chico. Grande homenagem. Somos parte desse organismo gigante que nunca para, sempre se transforma e sempre vai, todos estaremos sempre juntos. A minha geração foi bastante castigada, (Flower Power? ) todos os meus verdadeiros amigos de fraldas e de adolescência, das enormes gargalhadas e dos memoráveis encontros e histórias já se foram, entre os 60 e os 65. Grande abraço e saiba que estamos sempre muito perto ! Beijão a todos

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  5. Como é verdade! Perder um amigo é perder um pouco de nós próprios! Perder marido, perder filhos, perder Pais, perder irmãos… desgostos seguidos vão acabando connosco!!! ❤️❤️❤️

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