Encontro com Caronte
Ontem foi um daqueles jours para esquecer. Tinha passado uma noite sem
dormir, sentindo-me mal, mas sem dores, sem febre, com o coração batendo dentro
dos parâmetros normais.
Durante a manhã quis dormir antes do almoço, e nada. Depois tentei a
sesta e... nada. Só queria dormir um pouco.
Estava muito cansado, com frio, mesmo bem agasalhado, uma fraqueza
absurda, tentando entender o que se passava comigo. Telefonei ao médico, que
não consegui encontrar, e não me atrevi a ir ao hospital porque me lembrei do
que aconteceu com o Carlos Lacerda. (Um político brasileiro, sempre na oposição
a tudo, esteve exilado, regressou com a anistia e, com 63 anos sentia-me muito
cansado. 1977. Decidiu ir passar um fim de semana na clínica de um médico
amigo, para descansar. Entrou, e não se sabe bem como, adormeceu... até hoje!).
Eu fiz de forma diferente. A meio da tarde depois de ter pesquisado tudo
na internet (onde se aprende um bocado de choses) pesquisando até se não seria
o fim da picada, a tal SEPSE (que não me atrevo a dizer o que é para não
assustar ninguém). Mas como não coincidiam os sintomas, Grazie a Dio, decidi que
não me entregava assim sem dar luta.
Levantei-me, fui andar no jardim, quase duas horas, e sentia que ia
melhorando um pouco. Pouco, mas era já positivo,
Nesse meio tempo apercebo-me que no meio de uma escuridão surgia uma fraca
luz que se ia aproximando. Vinha na proa de uma barca, uma candeia de luz amarelada
e triste que parecia sair de um túnel.
A bordo um só homem, velho, milenar, que não foi difícil reconhecer:
Caronte! Aquele cheira a mortos.
Quando se aproximou fui logo dizendo ao velho barqueiro para Hades:
- Cumpadre, a mim nã me levas já!
- Vieni con me. È il tuo momento.
- No, non lo è. Torna tra qualche altro anno. (Eu já falava italiano
como Dante!)
- Ma tu eri vecchio e malato.
- Vecchio ma vivo. Malata è tua madre.
Aí Caronte, irritou-se, porque falei da mãe dele. Mas como eu sabia que
ele não podia sair da barca, afastei-me um pouco da margem, não fosse levar uma
remada na cabeça, e soltei uma gargalhada. Caronte estava furioso. Tinha
perdido uma viagem.
- Tornerò domani, maledetto.
- Vieni
domani e avremo qualche bicchiere di vino toscano. Qui, a terra. Non sulla barca.
Caronte soltou um gritou, um grunhido de centos de decibéis, e começou a
dar a volta para ir embora. Mas antes ameaçou:
- Hades ti sta aspettando. So che hai freddo e lì sarai sempre molto
caldo.
- Grazie
mille, ma carne grigliata preferisco mangiare qui.
Foi-se a barca, a escuridão clareou, eu voltei para dentro de casa e fui
beber um copo, à minha saúde.
Comi umas frutas e fui-me deitar cedo.
Dormi doze horas e já mandei um e-mail ao Caronte a dizer-lhe que vai
demorar para nos voltarmos a encontrar.
Assim o espero.
11/11/2021
Sem pressa meu querido tio, sem pressa.
ResponderExcluirTenho ouvido dizer que é muito dificil enviar textos pró lado de cá e a mim, os seus, continuam a fazer-me falta
Tio ainda me ri....ainda bem que deu conta desse barqueiro 🤣. Ainda bem que já se sente bem bjs
ResponderExcluirAdorei a sua conversa com Caronte Tio Chico.O barqueiro foi para outras freguesias, que aí ainda se fala de vida. Aliás, como dizia não sei que filósofo grego: "A morte não me diz respeito. Onde ela está eu não estou. Onde eu estou ela não está." Um grande abraço e brindemos à vida.
ResponderExcluirLONGE VÁ O AGOIRO! ABRAÇO.
ResponderExcluirAlma até Almeida...! Votos de uma pronta recuperação .
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