segunda-feira, 4 de novembro de 2019



Quem manda lá em casa?

Você, que está a ler este texto, se é homem, deve pensar que são os homens, com a sua força bruta que dominam o mundo.
Vou só lembrar alguns nomes da história para o levar a pensar quem é que, no final, manda.
É evidente que não esqueço o paranóico do Henrique VIII, nem outros semelhantes, mas bem procurado encontrará algumas mulheres que fizeram o mesmo a uns quantos maridos.
Comece por recordar aquela que, segundo a Bíblia, foi a primeira mulher, a famosa, famosíssima Eva.
Estavam, ela e o parceiro (namorado, porque ainda não eram casados) numa boa, num Paraíso que, diz a dita Bíblia, não tem semelhante em beleza e quietude neste planeta, quando a sujeita meteu na cabeça do macho, homem fortão, feito de barro, mas com a melhor argila da região, que essa coisa de serem inferiores a Deus era uma afronta.
O cabra macho ainda lhe deu uns “chega pra lá, não vem com essas conversas, tamo aqui numa nice, etc”, mas a dita cuja não largava do pé dele. Inventou uma história complicada que metia uma cobra que andava a persegui-la, mas esqueceu-se de dizer que, quando apanhou a cobra distraída, tirou-lhe o veneno dos dentes e o colocou dentro duma maçã, lindona, que as havia muitas lá no Jardim de Éden.
Mesmo sem fome, vozinha meiga, dengosa, decote exagerado para a época, decote que ia até aos pés, porque só depois disso é que Deus os vestiu com uma pele de carneiro, prometendo isto e aquilo, convenceu o “chefe” Adão a comer a maçã!
Deu a maçã, mesmo toda decotada

Aí o cara danou-se. Ficou meio doente, alucinado, insultou Deus que, ofendido na sua Omnipotência, lhes deu logo, ipso facto, ordem de despejo daquele idílico lugar.
Depois a Eva deve ter levado uns tapas naquela cara e, de raiva, criou tão mal os dois primeiros filhos que um matou o outro.
Passam anos, muitos anos, que nesse aspecto a Bíblia perdeu a conta e botou lá uns números absurdos, e lá volta o “Livro dos Livros” a contar que havia uma boa quantidade de mulheres formosas (ainda hoje há) que nada tinham para fazer. Não havia emprego. Então os homens começaram a fazer “comércio” com elas. E a pouca vergonha num instante – instante bíblico – cresceu de tal forma que Deus viu que estava tudo corrompido, achou que tinha feito o homem com barro podre e decidiu extingui-los. Depois faria outro melhor. Infelizmente, não fez.
Mas havia lá um sujeito tranquilo, um cara legal, e Deus na sua infinita compaixão pensou em tentar reabilitar a humanidade e disse ao amigo Noé: Olha Noé, isso aí na terra está uma zona e vou acabar com essa parafernália. Faz aí uma embarcação, boa, bem feita, madeira resinosa (Deus sabia muito bem o que era necessário) porque vou inundar tudo. Leva contigo a tua família e alguns animais (todos os da terra não caberiam nem em vários milhões de barcos, aliás arcas) e vamos começar tudo de novo.
Não começou nada novo.
Alguns descendentes de Noé não eram recomendáveis! E a prova não tardou a aparecer, e assim que chegamos a Abraão já vemos Sara, que era infértil dizer ao marido: : Bem vês que o Senhor me fez estéril, e não posso ter filhos. Toma pois a minha escrava Agar, a ver se ao menos por ela posso ter filhos. E assim nasceu Ismael. Apesar de nascer de Agar, de acordo com a lei mesopotâmica, Ismael era creditado como filho de Sara tornando-se herdeiro legal. Mas um dia Deus lá fez uma habilidade e mandou Abraão se juntar novamente com Sara, já velha, e nas andanças com o velho, pariu Isaac.
Não tardou que Sara brigasse com Agar, e tentou obrigar o marido a correr com Ismael e sua mãe, porque queria deixar tudo para Isaac! Abraão era inteligente. Afastou os dois, deu a ambos fortuna, e calou a boca de Sara. Felizmente os irmãos continuaram a dar-se bem.
Abraão era considerado um homem rico. Tinha grandes rebanhos de ovelhas e cabras que ocupavam extensas áreas de terra, assim como seu sobrinho Loth (não era antepassado, que se saiba, do grande Marechal Loth grande figura do Brasil) igualmente rico, para que não se criassem questões por falta de espaço para os animais, decidiram ir cada um para seu lado, para novas terras. Combinaram que um iria para a esquerda e outro para a direita. (Nada de política nisso)
No caminho, Loth, que seguia com a sua família, parou em Sodoma para descansar um pouco e juntar os animais, mas Deus avisou-o que aquela terra, Gomorra e tudo à volta, numa grande extensão, ia ser destruída por chuva de fogo e enxofre.
Deus sabia tudo. Sabia até que um meteoro iria escaqueirar toda a região.
O pessoal daquelas bandas vivia numa pouca vergonha, completamente vergonhosa.
E mais disse Deus: nem se atrevam a olhar para trás. Loth saiu com a mulher que armada em esperta quis ver o que acontecia e ficou transformada numa estátua de sal (devia ter ficado meio amarela por causa do enxofre) e seguiu só com as duas filhas, jovens, virgens e...
Andaram muito, mas mesmo muito e foram abrigar-se numa montanha. As gatinhas, todas boazudas, em conversa moderna entre elas disseram: Aqui não há homens, como vamos deixar descendência? - Fácil, embebedamos o nosso pai, com vinho (já havia vinho a vender por ali, ou quem o produzisse, se não havia homens? Devem ter levado de recordação de Sodoma) e deitamo-nos, uma de cada vez com ele. Assim fizerem, primeiro a Moab e depois a Amon. O velho Loth, mesmo de porre, tacou em cima das duas, que deram origem às tribos dos moabitas e dos amonitas.
Começaram bem. Incesto à traição.
Abraão mandou entretanto à procura de mulher para casar com Isaac. Ao delegado  da procura apareceu uma jovem, que segundo consta era lindíssima (boa com’ó milho), Rebeca. Casaram e nasceram dois filhos gémeos. Esaú nasceu primeiro, assim sendo o primogénito, mas a dita Rebeca gostava mais de Iaco. Bem tentou convencer o marido que Iaco era melhor que Esaú, mas o bom velho Isaac não foi na conversa dela. O que ela fez? Fantasiou Iaco para se parecer com o irmão e levou-o a receber a benção do pai.
A história a partir daí começou de novo, mas para o comportamento dos homens e mulheres... tudo igual.
Que tal vermos o que se passava na Índia?
Aí por 1.000 a 2.000 a.C uma garota lindona, segundo o texto épico Majabharata, a personagem mais importante deste texto, é filha do rei Drupada de Panchala, Draupadi que casa com Arjuna.  Quando Draupadi chega a casa com seu marido Arjuna e seus quatro irmãos para conhecer a sogra Kunti, os cinco irmãos vão dizer que Arjuna havia conquistado algo e, então Kunti, sem saber do que se tratava, diz: divida em igual entre vocês.
Comando materno, não poderia ser desobedecido, o que levou os cinco irmãos a tornarem-se maridos de Draupadi. Grande farra, hein, Draupadi?
Carinha de sonsa, a Draupadi

Como isto se terá passado há uns 4.000 anos, vamos dar uma olhada em tempos mais recentes, talvez com outra famosa mulher, quase daquelas bandas, que além de também ser linda, era inteligente, a inimitável Sherazade. De acordo com a lenda, porque ninguém se lembra de a ter visto, terá vivido há uns 2.500 anos.  Enganou tão bem o marido, um facínora, rei Shariar da Pérsia que em vez de a mandar matar se apaixonou por ela... e viveram felizes para sempre!

Mulher determinada a Sherazade. Muito boa... a pena do pavão!

 

E que tal a Cleopatra VII Thea Philopator, que parece não seria uma beleza, a não ser quando Elizabeth Taylor a representou? De qualquer modo era uma faraó, e para generais ou imperadores romanos dormir com a rainha dos egípcios era uma boa... Devia ser. Mulher determinada, recuperou inúmeros territórios que haviam pertencido à dinastia ptolomaica, mas a submissão a Roma acabou com ela, ainda em muito bom uso porque parece ter-se apagado com 39 anos. Assumiu o trono com 17, e não terá perdido tempo em ter aconchego na cama. Vestia-se faustosamente – como uma rainha! – usava montes de jóias, teve três maridos, um que era irmão, outro primo e até Marco Aurélio, e pelo menos um “namorado”, o glorioso Júlio César a quem se foi oferecer. Foi-os enganando a todos, enquanto pôde, até que a guerra contra Roma lhe acabou com a farra.
Chateada, derrotada, lembrou-se da vovó Eva, a da cobra, mas em vez de lhe tirar o veneno e dá-lo a um romano deixou-se picar e...
Narigão, não seria tão fria quanto o mármore mostra

Aproxima-se a nossa época, e vamos passar um pouco por Portugal
Mencia Lopez de Haro, biscainha, nasceu em1215. Casou com um Castro que lhe vendeu uma boa porção das suas muitas propriedades (!). Enviuvou, volta a casar com Sancho II de Portugal em 1242. Sancho era O Piedoso, monarca mole, e o irmão, depois Afonso III, primeiro raptou-lhe a mulher, certamente com a colaboração desta, e depois tirou-lhe o trono. A Doña Mencia... foi para a Galiza e não se falou mais nela!
A Mencia, também de narigão... safava-se só o chapéu!

Leonor Teles de Menezes,  A Aleivosa, nasceu em 1350. Devia ser muito mais gata do que mostra o seu presumido retrato. Casada com João Lourenço da Cunha.
Quando o rei Fernando a viu ficou loucamente apaixonado por ela – que Fernão Lopes descreveu como sendo "louçana e aposta e de bom corpo, com suas fremosas feiçõoes e graça" – (hoje se diria boa comó milho), quis tomá-la por amante.
Como é que o Fernando se enamorou disto?

Leonor, muito vivaça, não foi nesse papo, resistiu, e mandou dizer que só a teria por casamento. Alegando-se uma remota consanguinidade, obteve a anulação do primeiro casamento e preparado o casamento com o rei. Isto motivou uma enorme reprovação popular e perturbação social e política, que gerou um clima de insegurança em todo o reino. Morreu o rei, arranjou logo um amante, João Fernandes Andeiro, galego, e como regente, quis entregar o trono a sua filha casada com João I de Castela, o que seria entregar Portugal.
Dom João, o Mestre de Aviz, meio cunhado e o grande doutor João das Regras... acabaram-lhe com a ganância.

Philippa of Lancaster, nasceu em 1360, filha do Duque de Lancaster, casou com o D. João I de Portugal. Os seus filhos foram considerados A Ínclita Geração. Muito culta, assim que casou foi logo avisando a família e a nobreza que essa coisa de andar a “traçar” mulher, ou homem, fora do casamento... seriam postos fora da Corte. Moralizou a sacanagem. Tão respeitada, ainda hoje, que é a única mulher representada no monumento Padrão dos Descobrimentos.
Casamentaço. D. João I com Filipa de Lencastre

Maria Francisca Isabel de Saboia foi Rainha Consorte de Portugal em dois períodos, primeiro de 1666 até 1668 como esposa de D. Afonso VI, este física e mentalmente débil, e depois até dezembro de 1683 como “esposa” de D. Pedro II, irmão do precedente. Parece que em vida do primeiro ela já andava de sacanagem com o cunhado.  Diz-se que foi no bosque de Salvaterra, onde el-rei gostava muito de ir à caça, que esses amores mais se acentuaram. Morreu, ainda em bom uso, 37 anos, três meses depois do primeiro marido em 1683. Mas já andava com o segundo há quinze anos. Que era uma farra, era mesmo.
Morreu cedo. Estava um bocado gorda e mal disposta

Maria Ana Josefa de Áustria. Arquiduesa da Áustria. Muito culta, conhecia e falava alemão, francês, italiano, espanhol, latim e português, e um pouco de inglês. Casou com D. João V, sendo mais velha do que ele seis anos. O rei João vivia na farra, traçava as madamas nobres que lhe apetecia o que, como é de supor, deixava a rainha chateada. Embebedado com tanto ouro que chegava do Brasil, e mandava quase todo para Londres e Flandres para pagar dívidas, só se preocupava em deixar um herdeiro no trono. De acordo com o Memorial do Convento, o rei prometeu ao confessor da rainha que construiria um grande convento se a rainha lhe desse um herdeiro. Deu, e ele mandou construir o Convento de Mafra. Dizem que o padre confessor teve muito trabalho para conseguir esse filho! Verdade? Mentira?
O padre só não conseguiu foi despentear a senhora

Carlota Joaquina de Bourbon. Tanto se tem já falado, escrito e filmado sobre esta dama, que pouco sobra para dizer. A Megera de Queluz, como os portugueses a tratavam, ou A Rainha adúltera, parece que era feia, que o marido, João VI a tratava mal, mas dizem que ela tinha, com alguma frequência, encontros fortuitos! Daí os nove filhos terem paternidades diferentes, o que ninguém conseguiu provar. Era só ir às ossadas deles e ver os DNA. Mas é melhor que descansem em paz.
Só mesmo os puxa-saco é que “apreciavam” isto

Maria Pia de Saboia, chegou da Itália para casar com o rei D. Luis, mas, muito metida a “importante”, desde logo decidiu mostrar-se arrogante e tratar mal o sogro, um dos homens de maior valia que Portugal teve em toda a sua história, Dom Fernando de Saxe Coburg.
Ficou conhecida como O Anjo da Caridade e A Mãe dos Pobres por sua compaixão e causas sociais (tinha que se mostrar!) mas não se calou e proferiu uma famosa frase em resposta à crítica de um dos seus ministros devido ao preço das suas extravagâncias: "Quem quer rainhas, paga-as!".
Arrogante mas elegante e carinha de “aqui quem manda?”

Saindo de Portugal, e para encerrar o texto, quem não se lembra de uma mulher, gostosona, que parece ter sido também bastante “generosa”, e daí ficar junto com estas rainhas. Chamou-se Norma Jeane Mortenson, mas só nos lembramos dela quando falamos na Marilyn Monroe! Primeiro casou com um policial, depois com um jogador de beisebol, a seguir com um dramaturgo, dizem que “dava” para o The Voice,  que a levou de presente para o JFK, que a traçava mesmo na Casa Branca, nas barbas da Jacqueline. Parece que esta também dava a sua curva naquela Branca Casinha!
De qualquer modo, Marilyn, esta sim, foi a grande rainha do sec. XX, que faria a felicidade de qualquer rei ou plebeu! Se não a felicidade... o sonho.



03.11.19

2 comentários:

  1. Francisco,
    Muito bom.
    Poderia acrescentar à sua galeria as raínhas meio-irmãs Urraca e Teresa.
    Urraca, depois do seu primeiro casamento com Raimundo, o Borgonhês (por ser conde de Bourgogne), o qual teve a gentileza de morrer cêdo, deu umas "voltas" com o seu cunhado Henrique (também o Borgonhês, mas que, por ser filho-segundo do Duque de Bourgogne, nenhuma consanguinidade o unia a Raimundo; apenas o primogénito do Duque de Borgonha estava casado com uma irmã de Raimundo, sendo esta, então, sua cunhada), casou-se em segundas núpcias com Afonso de Navarra, o Batalhador (ao que dizem mais dado à arte da guerra do que à peleja amorosa), com este travou repetidas batalhas por causa do vale do Néjar e da Rioja (disputariam o vinho?) e morreu aos 40 anos de parto, fruto de amores com o seu amante Diego Lopez de Haro, senhor de Biscáia, de quem já tinha outros pimpolhos.
    Teresa não ficava atrás da sua meia-irmã. Casou-se em primeiras núpcias com o sobredito Henrique, morto este envolveu-se com Vermudo, filho primogénio do Grande Conde de Trava, D. Pero, e, sonhando tornar-se raínha da Galiza, deu em casamento a sua filha Maria Henriques ao seu amante. Foi este acto a causa próxima da justa de S. Mamede, quando os ricos-homens de Entre-Douro-e-Minho, não querendo envolver-se na guerra que o bispo de Compostela, Diego Xelmirez, e os Grandes Condes galegos (entre os quais, Vermudo) travavam contra o rei de Leão, Afonso VII, sobrinho de Teresa, esgrimiram o argumento ideológico do incesto (um homem dormir com mãe e filha era, ao tempo, considerado muito, mas mesmo muito incestuoso) para apearem a Teresa do trono do condado e lá sentarem seu filho Afonso Henriques. Solucionado o assunto como se sabe, Teresa, a quem a ideia de noites frias arrepiava, casou-se com o irmão de Vermudo, Fernão Peres, o qual, como qualquer outro filho-segundo, não teria onde cair morto se não arranjasse um bom casamento, ou se as armas não lhe proporcionassem melhor sorte. Desde então, e contrariamente à historigrafia oficial, Teresa, Fernão e Afonso Henriques viveram em saudá vel convivência, tendo até Fernão aparecido a outorgar documentos importantes do nóvel reino de Portugal.
    Há, de facto, mulheres das Arábias!
    Abraço
    APM

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  2. SE TODOS OS HISTORIADORES CONTASSEM A HISTÓRIA COM ESTA GRAÇA, O MUNDO SERIA MAIS CULTO, PELA FACILIDADE DE RETENÇÃO PROPORCIONADA PELO MÉTODO DE EXPOSIÇÃO USADO!
    ACHEI TANTA GRAÇA, QUE IMPRIMI O TEXTO TODO PARA DAR À NIA!
    ABRAÇOS DO ANTÓNIO

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