sábado, 16 de fevereiro de 2019


Troquei a série! Foi primeiro Amigos 23 e agora o 22.

Amigos – 22

Quem tem família grande, consanguínea ou colateral, sempre encontra mais ou menos afinidade com alguns dos parentes. Desta vez vou lembrar alguns primos, dos quatro costados, três do meu lado e dois por virtude conjugal! Vou lembrar por ordem... de idades... ou não.
O mais velho, francês, médico, vivia em Salies-de Béarn, un très bel et sympathique petit village, nos Pyrénées-Atlantiques, fazendo parte ainda do país basco francês, Baixa Aquitânia, local de termas.
O seu nome Salies, do Occitane Salias – sal –, devido às suas águas ricas em sais que deram origem às termas muito conhecidas e de grande qualidade.
A uma tia, irmã de minha mãe, por razões de saúde foram-lhe recomendadas tais termas e aí vai ela, durante alguns anos fazer o seu tratamento termal. Praticamente sempre acompanhada da sua única filha, uma muito simpática e bonita garota, por quem o nosso médico em questão não demorou a ficar de beiça caída. E ela também!
Muito correto, quando decidiu que estava na hora de casar, foi a Portugal falar com o futuro sogro, milionário, homem de poucas falas e poucos sorrisos, que estava bravo com a ideia de ver a filha que iria herdar uma gorda maquia, casar com um zé mané médico de termas! Ele queria um genro do mesmo padrão financeiro!
O noivo não se intimidou e avançou para uma conversa, a sós, porta fechada com o terrível futuro sogro, para expor as suas intenções.
Lá dentro o sogro disse que estava a reservar a filha para um marido que a pudesse sustentar sem que ele ficasse preocupado com isso. O noivo, sempre tranquilo, só lhe disse que após o casamento quem tinha que se preocupar com ela era ele, o marido, e que não precisava nada do dinheiro do sogro, o que este não gostou.
Nós, os primos, sabíamos que a seguir a esse pedido iriamos todos comemorar, aguardávamos, em profundo silêncio, juntos com a futura sogra, nervosa, o desfecho do difícil diálogo. Não demorou muito. De repente o pai da noiva sai da sala, monco caído, e quando a tia lhe perguntou “e então?” a única resposta que ele deu foi “o gajo é muito feio”!
Estava resolvida a parada. Fomos para uma boite, no Estoril, comemorar, conversar, rir e dançar e, poucos meses depois, 1956, aconteceu o esperado casamento, e o casal foi viver na casa dele, em França.
A noiva, minha prima direita, era a maior amiga da minha mulher, de modo que cada vez que íamos a França (e por razões de trabalho tive que ir diversas vezes, e de carro) sempre fazíamos pontaria para ficar um, dois dias lá em Salies, com eles.
O novo primo até podia não ser bonito, e não sendo eu especialista nisso, prefiro fixar-me nas suas verdadeiras qualidades.
Muito amável, alegre e sempre educado, muito estimado lá nas termas, cuidava de rico e pobre, não tardou que entre nós se estabelecesse um vínculo que foi sempre muito forte e gratificante.
Conseguia tirar umas horinhas, enquanto as primas ficavam no papo, para ir comigo, por exemplo a um negociante de vinhos, já bem serra acima, Pirinéus, que além de ter uma adega muito bem fornecida, para o simpático docteur os preços eram sempre especiais. Saí de lá um dia, de regresso Angola, via Lisboa, com duas caixas de vinho... que hoje não teria dinheiro para comprar, como Bourgogne Nuits Saint George e outros néctares!
Numa das vezes que mais me demorei em Paris, a sua terra natal, o casal foi lá passar uma semana conosco. Eu estava ocupado durante o dia, o casal e as primas visitavam familiares e museus, e ao fim do dia juntávamo-nos todos em boa e alegre convivência.
Eu corria Paris de carro, rodava o Arco do Triunfo sem abrandar e ainda a contar histórias o que muito o divertia.
Lembro dum carro que ele teve, um DKW Junior, 1960, 796 cm³, três cilindros, dois tempos, que era uma bomba na estrada! Não deixava que alguém lhe pusesse as mãos, mas quando lá passei e quis num dia ir com a minha mulher ao Santuário de Lourdes ele fez questão que fossemos no carro dele e lhe deixasse o meu velho Simca Aronde. Cerca de 100 kms. Na estrada aquele carro voava! Era só tocar no acelerador que ele parecia um Ferrari. Um espetáculo de carro que ganhou quase todos os ralis em que entrou!
Era igualzinho a este, cor e tudo!

No final de 61 nasceu o nosso quinto filho, o João, e em casa deles o segundo e último, François.  As duas mães trocaram cartas que se cruzaram pelo ar, cada uma convidando a outra para serem madrinhas do novo neófito. E foram.
Guardo muita saudade de ambos.
A querida prima/irmã Maria Joana Frick Gonçalves e o querido médico Joseph Oliveau.

       
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Vamos seguir com a mesma família. Fica mais fácil.
Primo direito, mais novo dois anos do que a irmã, e menos sete do que eu, sempre muito brincalhão, muito alegre, ótimo companheiro, apesar de pai rico, tentou toda a vida seguir os seus próprios passos, o que o trazia em inúmeros desentendimentos com o pai, que ele, com seu espírito alegre e bom, conseguia ir resolvendo, e entusiasmou-se muito quando conseguiu a representação da Estée Lauder, e até fazer alguns destes produtos famosos na fábrica de sabonetes da família, a Santa Clara, do famoso Feno de Portugal (que Deus haja), fábrica que o tempo “comeu”!
Quando nosso avô comum morreu, e muito pouco deixou, não sei como ele conseguiu ficar com alguma coisa dele, porque a viúva, a nossa avódrasta, uma saloia espertalhona, jamais devolveu à minha mãe o que lá estava em casa e era da minha avó! Coisas!
Pois o primo ficou com a espingarda de caça, que era boa, e mais uns cinco pequenos copos de cristal. Quando um dia, em Lisboa passei em casa dele, mostrou-me a espingarda e os cinco copos, eu lhe disse: “ficaste com TUDO que era do avô. Eu não tenho nada!” Amável deu-me dois desses copos! Uma simpática recordação.
Nós vivíamos em Luanda e um dia por lá apareceu e, como é evidente, ficou em nossa casa. E foi descobrindo “coisas” novas! Uma delas foi o maracujá que nunca tinha comido! E havia na cidade uma senhora que fazia um maravilhoso sorvete com esse fruto. Pois todos os dias fazia questão de ir comer um belo sorvete e comprar uns quantos frutos que comia com especial prazer.
O fito da viagem era arranjar clientes para os produtos Estée Lauder. Apresentei-o aos donos das melhores casas da terra – sobretudo Quintas & Irmão e Armazéns do Minho – deixando um dos Quintas com interesse no negócio, e a mim como seu “representante, apesar de eu estar já no banco. Mas era assunto que me ocupava só uns instantes de quando em vez.
Regressa a Lisboa, prepara uma gorda dose de produtos de toda a qualidade e feitio, homme e femme (não sei se já existia unissex!!!), despacha para Angola, manda os documentos para mim e que avisasse o Quintas.
Quando fui levar o assunto para os Quintas, a coisa se complicou, dando eles uma desculpa toda esfarrapada: Ah! Nós somos representantes da Gilette... e eles não querem que trabalhemos produtos concorrentes... de modo que não podemos trabalhar a Estée Lauder.” Caso encerrado e uma montuêra de perfumes na Alfandega.
Telefono-lhe: “O Quintas... nhã, nhã, nhã, não quis ficar com a mercadoria!”
- Guarda em tua casa. E vamos abrir aí uma boutique.
- ?!?!?!?!?
- Vou-te mandar o dinheiro para pagar os direito da alfandega (diziam que Angola era o mesmo que Portugal, Minho, Alentejo, etc., mas mercadoria que circulasse entre os dois territórios tinha que pagar direitos!!!). Entretanto vocês procuram aí uma loja para alugarmos, e eu vou mandando daqui roupas de marca, o mais chique que conseguir.
- ?!?!? Engoli em seco e disse ‘então vamos nessa’.”
Guardei tudo lá em casa, no andar térreo onde era suposto ser o quarto de uma criada... que não tínhamos! O cheiro daquela perfumaria toda, que seria de alto nível, invadiu a casa e foi por todos os andares, que até hoje, quase sessenta anos passados, o cheirete da Estée Lauder ainda me enjoa!
Um pouco mais tarde mandou-me um representante de maiôs de praia (em Portugal fatos de banho!) para que eu escolhesse e encomendasse os que se deveriam vender na loja. Eu jamais havia comprado semelhantes artefatos (nem hoje o faço!) e pensei reunir em casa umas amigas da minha mulher para que, em assembleia dessem a sua “abalizada” opinião quando chegasse o vendedor! Foi uma farra. As senhoras olhavam, discutiam e concluíam que tal modelo ficada muito bem à amiga “a’, um outro à outra amiga “b”, etc. e ao fim de mais de meia hora tinham escolhidos uns seis maiôs, para as amigas (!) que o vendedor cheio de paciência me fazia compreender com o seu olhar que aquilo jamais se venderia. Então tomei o comando, e perguntei: “O que se vende?” E ele mostrou os bikinis mais “escandalosos” que tinha, dizendo que quem comprava aquilo eram as “boazudas” das boates e outras de “convivência fácil”! Indicou quais os tamanhos convenientes e fechei a compra.
Estes, “escandalosos” venderam-se num instante. Os especiais para as amigas, se a loja existisse ainda lá estariam!
A seguir pedi para não me mandarem comprar nada de artigos para a loja porque é assunto que continua a não me interessar minimamente!
A minha área nessa nossa sociedade eram microscópios, artes gráficas, equipamentos de raios X, e outros o que, na realidade não tem muito a ver com modas.
Pouco tempo depois abríamos em Luanda a mais simpática e elegante boutique da cidade, a “Chimene” – nome em homenagem a mulher do grande Cid, El Campeador, Don Rodrigo Dias de Bivar!
Olhem a beleza do pequeno envelope para embrulhar uma pulseira ou algo pequeno... mas bonito!

Aí por 1970 descobri num ferro velho um carro abandonado por um babaca que tinha estado em Angola no serviço militar. Um (ex magnífico) MG TC de 1947, bastante maltratado, mas, carro dos sonhos de todo o jovem dos anos 50/60, comprei-o. Fui arrumando umas coisas, precisava de um painel novo e mais uns quantos outros arranjos, mas quando soube que tinha que ir para Moçambique decidi vender aquela relíquia. Quem a comprou? O primo, que o levou para Portugal. Lá o teve muitos anos.
(E ainda vendi outra! Um Morris Minor, 1932, 640 cc!)

Luanda 1970 – Com os oito filhos

Tinha brincadeiras malucas: gostava de aparecer numa sala metendo a mão por dentro das calças e fazendo aparecer um dedo no meio da braguilha, e ele mesmo se divertia com isso.
Uma noite, quando jantávamos em Luanda, com um grupo de amigos, pedimos vinho, tinto. Ele pediu também uma garrafa de água porque sempre misturava um pouco de água no vinho. O que foste fazer! Alguns dos amigos presentes, os do “politicamente certo” começaram logo a sentenciar que ninguém mistura água no vinho, que estraga o vinho, que isso não se faz, e outras similitudes verbais, ao que ele responde com o ar mais calmo:
- É assim que eu gosto. É assim que eu bebo.
Todos meteram a viola no saco, e hoje é assim que eu quase sempre faço!
Sempre brincalhão, ele e a irmã na meia idade sofreram duma terrível doença pulmonar que levou a ambos. Primos direitos, irmãos. Muita saudade Teddy – Eduardo Frick Gonçalves


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Para o texto não ficar muito longo, os outros primos vão esperar mais uns dias!

26-jan-19




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