segunda-feira, 18 de abril de 2016



O crepúsculo


Frase feita: a cada novo minuto, ou segundo, entramos nos últimos dias da nossa vida. Tanto faz ter 20 ou 80 anos a Dama de Branco nunca marca hora, mas sempre aparece.
Os hindus são talvez – alguns – dos que mais meditam, e procuram dedicar a velhice à preparação da sua estadia no Além, que, para praticamente todos é de pouca duração visto que acreditam na reencarnação. Nessa altura da vida nada os interessa mais do que meditar, penitenciarem-se por algum pecado cometido, esquecer o corpo, o Ego, e esperar o momento da transição com a mente, o Eu, preparada.
Além disso pouco mais um ancião pode fazer: faltam-lhe as forças, começa a confundir os problemas, uma maleita aqui, outra ali, se por acaso o cérebro não foi afetado, ele vive com algumas memórias, que sabe que são assuntos que deixaram de lhe pertencer, e valoriza o espírito.
Renasce.
Jesus disse: “Na verdade te digo que aquele que não nascer de novo não pode ver o reino dos céus. João 3:3.”
É difícil renascer quando se está em plena força da vida. A família, o trabalho, o sobreviver, a luta diária, muitas vezes não permite uma folga, um tempinho para deixar o ego de lado e pensar no eu. Mesmo sem querer viramos egoístas
“Conhece-te a ti mesmo”.
No antigo templo de Luxor, há dois provérbios, gravados na pedra: um deles, no templo exterior onde os iniciantes estavam autorizados a entrar, diz "O corpo é a casa de Deus". É por isso que se diz: "Homem, conhece a ti mesmo." No templo interior, onde só se podia entrar depois de comprovado estar digno e pronto para adquirir maior conhecimento e iluminação, um dos provérbios é "Homem, conhece-te a ti mesmo, assim conhecerás os deuses."
Mas quem é o “A ti mesmo”?
Sou eu? Só, ego-ísta, ego-centrista, que me olho no espelho e procuro melhorar a minha imagem, a imagem passageira do tempo em que era jovem, bonito (?), cheio de saúde, que me quero exibir aos outros, a querer sempre mais e melhor, ou a do velho, carcomido pelos anos, doenças e quantas vezes pela solidão?
Lembram de “O Retrato de Dorian Gray”? Um dos mais bem explorados “retratos” daqueles que não tomam conhecimento do Outro, do seu igual, do ambiente, e do seu espírito.
Há alguns dias escrevi um pouco sobre Confúcio, um homem de rígida moral social, que orientou a vida do povo chinês durante mais de um milénio. Mas Confúcio não passou para o plano espiritual todo o seu imenso saber e exemplo. Até ao fim dos seus dias procurou um lugar de relevo em qualquer das cortes reais.
Possivelmente contemporâneo outro grande homem, uma grande lenda, viveu para procurar conduzir os homens ao plano mais elevado, à existência dum Ser supremo que rege o curso do Universo, o Tao.
Esse homem foi outro mestre, Laozi ou Lao Tsé, o Grande Mestre Lao.
Uma biografia, Shih-chi, compilação histórica escrita no século I a.C. descreve um encontro estes dois grandes Mestres. Lao Tsé teria reprovado o orgulho e a ambição de Confúcio em termos tão profundos que este o terá comparado a um dragão que cavalga sobre nuvens até ao céu.
Para Laozi, tudo tem origem no Tao, obedece às leis do Tao e finalmente retorna a Tao, que pode ser descrito como a divindade, o ser absoluto, a ordem do mundo, a natureza moral do homem bom, enfim ao que nós chamamos de Deus, havendo quem lhe chame Brahman, Yahveh, God, Boh, Jumala e tantos outros nomes.
Lao-Tsé, quando, segundo a lenda desapareceu montado num búfalo

Deus não é um castigador, nem jamais mandou exércitos para combater “infiéis”, nem faz milagres para que a vida deste ou daquele corra melhor. Nem mesmo que se encha o mundo de velas e promessas deixarão de haver terramotos, tsunamis e outras catástrofes naturais.
O monoteísta reconhece um Deus-pessoa que reside no céu. Os hebreus no tempo de Moisés não reconheciam um Deus Único para todo o mundo, mas privativo para Israel, o Deus dos Exércitos. Einstein escreveu que há três tipos de concepção de Deus:
1.- Deus-máquina entre os povos primitivos;
2.- Deus-pessoa entre os hebreus do Antigo Testamento e os cristãos de todos os tempos;
3.- Deus-cósmico professado por poucos místicos que ultrapassam a noção de igrejas, teologias e se encontram em todo o lugar. Entre estes enumera três Demócrito, Francisco de Assis e Spinoza, um pagão, um cristão e um hebreu.
Demócrito considerava a felicidade como objetivo do homem, Francisco, o Poverello “casou” com a Pobreza para viver somente o seu Eu, o espírito, e Spinoza para quem Deus e Natureza nada mais são do que dois nomes para a mesma realidade, a única e qualquer espécie de matéria em que consiste o universo.
Para fechar, que o tema é complicado, uma pequena passagem de um dos poemas de Lao-Tsé
A ética genuína só existe
Onde o homem vive de dentro da sua fonte
E age pela pureza do seu coração;
Onde a genuinidade do seu ser
Se revela em atos desinteressados
E isentos de desejos.
Ou ainda
Quem dá valor a si mesmo, não é valorizado.
Quem se julga importante, não merece importância.
Quem se louva a si mesmo, não é grande.
Tais atitudes são detestadas pelos poderes celestes.
Detesta-as também tu, ó homem sapiente.
Quem tem consciência da sua dignidade,
De ser veículo do Infinito, se abstém de tais atos.

P.S.- Estes poemas não lembram seres repelentes tais como... uns quantos políticos?


18/04/2016

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