Curiosidades
Lisboetas - III
Um pouco de história... do
Automóvel
Muitos estarão
cansados de saber que o primeiro veículo auto propulsionado terá sido a
invenção do senhor Nicolas-Joseph Cugnot que apareceu pela primeira vez em 1769. Um motor a
vapor, de pistão rotativo, foi na ocasião um meio fenómeno, visto haverem já, máquinas
a vapor, mas somente estáticas. Aquele era um avanço considerável sobre estas,
mas, muito difícil de conduzir, devido ao enorme peso, sendo as duas rodas da
frente, da direção, comandadas por uma alavanca, que exigia muita força para se
controlar. Em 1771 aquele veículo, chocou contra uma parede de tijolos, que
derrubou, o que terá sido o primeiro acidente automóvel da história, e perdeu o
interesse do público!
A verdade é o assunto da
primogenitura automobilística não é tão simples assim.
Num ensolarado dia de Junho de 1781,
o senhor Pierre Delaval apresentou em Portugal, à rainha D. Maria I, na sua
quinta em Belém, um “carrinho que anda por si”!
Pasmem ó gentes! Portugal poderia
ter tido a primeira fábrica de “carrinhos” do planeta!
A rainha gostou tanto da “viatura’
que mandou dar ao francês uma gratificação de 57$600 reis, conforme consta do
respetivo recibo passado pelo inventor:
J’ai reçu par les Ordes
de Son Excelence Monseigneur le Marquis de Marialva Douse monnaye d’or
aujurdouy, 19 Juin 1781.
À margem do recibo encontra-se esta
elucidativa nota:
São 57$600 rs. que se entregão ao Marquez
de Marialva para este homem que veio em 16 de Junho à Quinta de Belém com hum
carrinho que anda por si para verem suas Mag.es
Esta “notícia de última
hora” foi publicada na Revista Portuguesa”, Ano VII, 2ª série, n° 11,
Janeiro-Fevereiro de 1941, no Funchal, Ilha da Madeira.
Parece que nunca
mais alguém soube do tal “carrinho” nem do senhor Delaval e seria muito
interessante que alguém conseguisse vasculhar na Torre do Tombo para ver se
mais alguma coisa existe sobre o assunto. (Delaval só encontrei um sr. Pierre
Louis Delaval, nascido em Paris em 1790, ótimo pintor.)
Ficamos sem saber
se o carrinho era tipo Ferrari, Cadillac ou... carrinho de corda.
Como a D. Maria
ficou louca – talvez porque quisesse um carrinho daqueles para fazer uns ralis
lá em Belém, quem sabe? – e como pouco depois a corte veio para o Brasil
trazendo milhares de documentos da Biblioteca Nacional... pode até acontecer
que o relato dessa misteriosa demonstração que deu origem ao recibo, esteja
perdido na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro onde, de quando em vez, se
deixam roubar livros, documentos e outras coisas.
Um palacete chorando por cuidados
O antigo convento
de Santo António da Convalescença, fundado em 1640, restaurado em 1746, hoje
com aspecto de abandono, uma triste, rasgada e envergonhada bandeira nacional
num mastrinho no primeiro andar, “ali” na Estrada de Benfica, 275, em Lisboa.
Pelo que dá a
entender a vista pelo Google Earth, neste endereço funciona qualquer
departamento do Estado, mas o Guia de Portugal de 1924, diz que nessa época tinha
já sido transformado em casas de habitação.
O “convento”
(cerca de 1940)
Ainda se vê o que
parece ser uma igreja ao fundo (hoje derrubada)
e três portas para
a rua, das quais subsiste uma única.
Informa o Guia que
a sua fachada “ainda” recoberta com azulejos do século XVII, deve esta “ainda”
ao arquiteto José Maria Nepomuceno (1836-1895) porque foi este arquiteto que os
comprou como entulho nas obras da Madre-de-Deus, que pertenciam a uma capela
árabe*! Nesse “entulho” terão ido azulejos dos séculos XVI e XVIII.
O arquiteto
Nepomuceno – foto de 1884
No primeiro andar
os azulejos que emolduram as janelas do corpo central e das extremas “são do mais apreciado que Sevilha fabricava
na primeira metade de Quinhentos”. Como os outros, foram comprados junto ao
entulho. Enfim uma grande mistureba!
Portas adentro há
(ou havia?) mais coisas que Nepumoceno “colecionou” em Xabregas e outros lados.
Para quem vive em
Portugal, uma visita ao antigo convento... deve valer a pena. Mas como nos
aparece... é uma pena!
No entanto a
opinião sobre o senhor Nepomuceno... não agradava a toda gente. Num próximo
texto falaremos da Igreja da Madre-de-Deus, onde este senhor superintendeu às
obras de mais um restauro (foram muitos durante quatro ou cinco séculos), mas
para já fica sobre este arquiteto a opinião do Conde de Sabugosa (um dos
famosos Vencidos da Vida):
“... a indignação não tem limites quando ao
observar o mistifório (miscelânea, embrulhada) aglomerado por uma recente ‘restauração’ (?) se nos patenteiam
intenções pretenciosas colhidas na mofina dos Violet le Duc, e que até fazem
supor intuitos sectários de profanar o caracter religioso da fundação.
Verdadeiros atentados contra o bom gosto, a arte e a arqueologia.
Azulejos arrancados em alguns sítios, noutros
acrescentados com enxertos trazidos de vários monumentos (Farol do Cabo de São
Vicente, Convento de Santa Ana, etc.) azulejos mandados fazer modernamente
‘imitando antigo’; fantasias ampliando os quadros da sacristia, e tudo isso num
amálgama que não se sabe se o intento foi restaurar, se modernizar, se fazer
servir o monumento de ‘reclame’ a ceramistas e azulejadores. Uma confusão!
Mas onde todos os que tiverem algum critério ou
simplesmente uns pós de bom-senso, de bom-gosto, ou de consciência artística,
sentem invadi-los uma onda de repulsão, é quando, ao examinar os capitéis no
pavimento superior do claustro pequeno, verificarem a resolução estapafúrdia
que o ‘restaurador’ tomou de substituir alguns que se achavam mutilados por
outros onde se encontra figurado ‘um comboio com a sua máquina fumegante’ (!) e
alguns símbolos maçónicos (!).
Isto num claustro do séc. XVI!”
Nota: Se já em
1781 mostraram à Rainha um “carrinho que andava por si”... porque não esculpir uma
máquina a vapor num capitel a fingir que era do século XVI?
E os símbolos
maçónicos? Como a maçonaria foi iniciada em 1717 na Inglaterra, e maçon significa pedreiro, nada mais
lógico ao senhor Nepomuceno do que mostrar o óbvio: as colunas foram feitas por
maçons, e assim ali deixaram a sua assinatura.
O que julgo interessante
é uma visita aos lugares descritos neste texto e conferirem. Pode ser que outro
posterior restauro tenha melhorado os caprichos e estas mensagens cripto-líticas.
09/10/2015
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