domingo, 26 de maio de 2013




TROVAS PARA O POVO

e... não só!


De um pequeno livreto, que deve ter uns cem anos, e na contra capa anuncia montes de livros a preços populares, como Orações a $30, Trovas para o Povo a $50 (de onde saíu este “fado”!), História de D. Inês de Castro a 1$00, Romeu e Julieta a 2$00, Texas Jack, 100 números a $60, bem como Capitão Morgan, e O que é o Casamento de Honoré de Balzac a 2$00, e até um Arte de Lavar Roupa por $50! (Tudo nos bons velhos Escudos portugueses, que valiam ouro!)
Uma maravilha!

 
De todos estes fados elegi um que vem preencher a dificuldade de muito pretensos nobres completarem a sua árvore genealógica!


Minha Família

(Para ser cantado com música do Fado Alexandrino)

MOTE
Minha família é distinta
E de nobre posição,
Eu pertenço a boa gente
Creiam, não lhes minto não...

GLOSAS
Minha mãe é vendedeira
De tremoço e burrié,
Tenho uma tia que é
Creada d'uma parteira.
Minha avó é lavadeira
Lava roupa branca e tinta,
Meu avô todo se pinta
A vender fava torrada,
Descendo de gente grada
Minha família é distinta...

Tenho um primo cauteleiro
Um tio que vende sorvetes,
Outro que é moço de fretes,
Um cunhado que é padeiro,
Tenho um sobrinho aguadeiro,
Varredor tenho um irmão,
Meu padrinho é sacristão
Meu pae é moço de cego
Sou tipo nobre, não nego,
E de nobre posição !...

Minha sogra vende sinas,
Minha sobrinha anda ao trapo,
O meu sogro, homem pacato,
É guarda d’umas sentinas.
Leva cartas ás meninas
Um coxo que é meu parente,
Também tenho um descendente
Que na praça vende flores,
Como vêem meus senhores
Eu pertenço a boa gente! ..

As minhas primas Linhares
São amas, criam gaiatos,
Eu deito gatos em pratos
Bacias e alguidares...
Donairosos titulares
Eu tenho com profusão,
Vivo n'um louco estadão
E livre de más penhoras
Mas... co'a barriga a dar horas
Creiam não lhes minto não!...

***

Para “completar”, uma trova, (da nobreza!) do século XV.
O primeiro Conde Vimioso, D. Francisco de Portugal, filho (ilegítimo) do bispo de Évora, D. Afonso de Portugal, tinha, pela sua posição e seu talento para a poesia, um papel muito importante nos Serões do Paço. Em 1515 El-Rei Dom Manuel deu-lhe o título de Conde.
Sua mulher, D. Joana de Vilhena, entretinha as damas que a visitavam, com a leitura de algumas obras de seu marido.
A trova que se segue foi por ele composta quando em 1498, em Belém, aborrecido, enquanto aguardava embarcar para África, onde foi comandar a praça de Arzila.

“Trova do Conde de Vimioso estando em Belém
enfadado do tempo e dos couzas dele”.

Isto acho de Belem:
Vejo d’além uns oiteiros,
Que não dizem mal nem bem
A quem conte meus marteiros.

Falo-lhes sem esperar
Resposta do que lhes digo;
Outro tanto vi achar
No amigo e no inimigo.

D’isto vivo em Belem,
Descanço de ver oiteiros,
Que respondem c’o que tem
E são muito verdadeiros.


20/05/2013

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