quinta-feira, 12 de julho de 2012



Custo lula



Uma das broncas do então presidente Lula com a Vale estava no assunto siderúrgicas. A companhia brasileira deveria progredir da condição de mero fornecedor de minério de ferro para produtor de aço, tal era o desejo de Lula.
Quando lhe argumentavam que havia um problema de custo para investir no Brasil — e não apenas em siderúrgicas — o ex-presidente apelava para o patriotismo. As empresas privadas nacionais teriam a obrigação de fabricar no Brasil.
Por causa da bronca presidencial ou por erros próprios, o fato é que a Vale está envolvida em três grandes siderúrgicas — ou três imensos problemas — conforme mostra em detalhes uma reportagem de Ivo Ribeiro e Vera Saavedra Durão, no "Valor" de ontem. Em Marabá, no Pará, o projeto da planta Alpa está parado, à espera da construção de um porto e de uma via fluvial, obrigação dos governos federal e estadual, e que está longe de começar. No Espírito Santo, o projeto Ubu também fica no papel enquanto a Vale espera um cada vez mais improvável sócio estrangeiro. Finalmente, o projeto de Pecém, no Ceará, está quase saindo do papel, mas ao dobro do custo original.
E quer saber? Seria melhor mesmo que não saísse. Acontece que há um excesso de oferta de aço no mundo e, mais importante, os custos brasilei jros de instalação das usinas e de pro-af dução são os mais altos do mundo. Não, a culpa não é só do dólar nem dos chineses. Estes fazem o aço mais barato do planeta, com seus métodos tradicionais. Mas o aço brasileiro sai mais caro do que nos EUA, Alemanha, Rússia e Turquia, conforme um estudo da consultoria Booz.
A culpa nossa é velha: carga e sistema tributário (paga-se imposto caro até durante a construção da usina, antes de faturar o primeiro centavo), burocracia infernal e custosa, inclusive na disputa judicial de questões tributárias e trabalhistas, e custo da mão de obra.
Dados do economista Alexandre Schwartsman mostram que os salários estão subindo no Brasil na faixa de 11 a 12 % anuais. A produtividade, estimado 1,5%. Ou seja, aumenta o custo efetivo do trabalho, e mais ainda pela baixa qualificação da mão de obra. Jorge Gerdau Johanpeter, eterno batalhador dessas questões, mostra que a unidade de trabalho por tonelada de aço é mais cara no Brasil do que nos EUA.
Não há patriotismo que resolva. Mas uma boa ação governamental ajudaria. Reparem: todos os problemas dependem de ação política e, especialmente, da liderança do presidente da República. Trata-se de reformas tributária e trabalhista, medidas legais para arejar o ambiente de negócios, simplificar o sistema de licenças ambientais, reforma do Judiciário e por aí vai, sem contar com um impulso na educação.
Se isso não anda, é falha de governo, não do mercado. A crise global e a mesma para todo mundo, mas afeia os países diferentemente, conforme suas condições locais. O Brasil precisaria turbinar os investimentos, mas não há como fazer isso num ambien¬te tão desfavorável e tão custoso, o governo cai então no estímulo ao consumo e no protecionismo para barrar e/ou encarecer os produtos estrangeiros. De novo, não conseguindo reduzir o custo Brasil, aumenta o custo mundo.
A situação é ainda mais grave no lado dos investimentos públicos. Uma das obras de propaganda de Lula era a Ferrovia Norte-Sul, tocada pela estatal Valec. Pois o Tribunal de Contas da União verificou que o dormente ali saía por R$ 300, enquanto na Transnordestina, negócio privado, ficava por R$220. O atual presidente da Valec, José Eduardo Castello Branco, nomeado há um ano, depois das demissões por denúncias de corrupção, conta ainda que vai comprar a tonelada de trilho por R$ 2 mil, contra o preço absurdo de R$ 3 mil da gestão anterior, que vinha lá do governo Lula. Claro que um presidente da Republica não pode saber quanto custa uma tonelada de trilho, muito menos o preço de um dormente. Nem pode acompanhar as licitações. Mas o ritmo "vamo-que-vamo" imposto pelo ex-presidente, junto com o loteamento político criou o ambiente para os malfeitos e, mais importante, porque mais caro, para os enormes equívocos na gestão dos projetos.
O diretor do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, general Jorge Fraxe, também nomea¬do por Dilma para colocar ordem na casa, conta que encontrou contratos de obras no valor de R$ 15 bilhões — ou "15 bilhões de problemas".
Quando o mundo vai bem, todos crescendo, ninguém repara. Quando a coisa aperta, aí se vê o quanto não foi feito ou foi feito errado.
CARLOS ALBERTO SARDENBERG é jornalista. E-mail: sardenberg@cbn.com.br

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A Herança Maldita da Petrobras

O primeiro plano de negócios (2012-2016) divulgado pela atual presidente da Petrobras, Graça Fóster, não deixa margem para qualquer dúvida: o desempenho da estatal vem retrocedendo desde que o PT chegou ao poder, em 2003.
Depois de verificar que a empresa não vinha cumprindo as metas de produção estabelecidas, Graça Foster decidiu rever esses números para um patamar que definiu como mais "realista", deixando clara sua reprovação em relação à herança — por que não dizer maldita — recebida de seu antecessor, Sérgio Gabrielli.
Ao reconhecer o atraso em mais de um ano na operação de novas plataformas, a presidente da estatal baixou em 700 mil barris de petróleo por dia a estimativa de aumento da produção até 2020.
Essa parece ser a primeira de uma série de mudanças na gestão da estatal, que ao longo dos dois mandatos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sofreu forte pressão política e acabou tendo parte de seus cargos técnicos e díretorias dividida entre aliados da base governista.
A interferência política na gestão da Petrobras ficou bastante clara em 2007, após a descoberta do campo de Tupy no pré-sal e da decisão do governo Lula de alterar o marco regulatório do petróleo — de comprovado sucesso formulado e implementado no governo do PSDB — em meio a uma intensa campanha publicitária vinculada ao projeto eleitoral do PT, em 2010, que acabou garantindo a eleição de Dilma Rousseff.
O resultado desta "reforma da reforma" foi um desastre para o setor e para a Petrobras.
Aos poucos os prejuízos estão sendo percebidos e contabilizados. Graça Foster tenta consertar a irracionalidade e o aparelhamento partidário dentro da empresa na medida do possível, mas o setor foi desorganizado e o modelo institucional perdeu bastante credibilidade.
Sob a batuta de Fernando Henrique, com a flexibilização do monopólio da Petrobras, uma atuação firme da Agência Nacional do Petróleo (ANP) e a realização de leilões anualmente, o Brasil viu sua produção de petróleo crescer em 150%.
Com a suspensão dos leilões desde 2008, deixamos de arrecadar algo em torno de R$ 15 bilhões nos últimos quatro anos.
Além disso, a área exploratória sob concessão, que alcançou um máximo de 341 mil km2 em 2009, será reduzida para 114 mil km2 no final de 2012, em razão da falta de novos leilões, o que deverá comprometer ainda mais a produção futura de petróleo no país.
Os investimentos privados definham, as empresas estrangeiras vão embora e a Petrobras e a OGX se desvalorizam.
Só na semana passada, os acionistas da Petrobras amargaram uma perda de R$ 22,3 bilhões.
Esse processo de desvalorização começou em 2009, quando o governo ini¬ciou uma operação de capitalização da Petrobras que se mostrou desastrosa para o acionista minoritário.
Além de demorar mais de um ano, devido a uma série de indefinições e de uma total politizaçáo de todo o processo, provocou uma desvalorização de 43% nas ações da empresa desde então.
Com isso, fica cada vez mais distante o sonho da autossuficiência na produção de petróleo.
Os números falam por si: a importação de gasolina, por parte do Brasil, passou de nove mil barris diários em 2010 para 80 mil, de acordo com as estimativas previstas para este ano.
Se não bastasse, estamos também importando diesel e etanol.

SÉRGIO GUERRA


12/07/2012



N.- Ambos os textos do jornal “O Globo”

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