DESCOBERTA DO CAMINHO MARÍTIMO
PARA A ÍNDIA
Carta (do Rei Dom Manuel) que foi a El Rey, e a Raynha de Castella com a noticia do descobrimento. [12 de Julho de 1499]
Muyto altos, muyto eixelentes Principes, e muyto poderosos Senhores. Sabem Vossas Altezas como tinhamos mandado a descobrir a Vasco da Gama, fidalgo de nossa Cassa, e com elle Paulo da Gama, seu Jrmaão, com quatro navios pelo oceano; os quais agora já passava de dous annos, que eram partidos; e como o fundamento principal desta empresa sempre fosse por nossos antepassados, de serviço de Deos nosso Senhor, e proveito nosso; provelhe por sua piedade, assy os encaminhar, segundo ho recado, que por hum dos Capitaens que a nós a esta cidade ora he chegado, ouvemos, que acharão e descobriram a Jndia, e outros Regnos, e Senhorios a ella Comarquãos; e entraram e navegaram o mar della, em que acharãao grandes Cidades, e de grande edificios, e ricos, e de grandes povoacõens; nas quaais se faz todo o trauto da especiarya, e de pedrarya, que pasa em naaos, que os mesmos descobridores virão e acharam em grande cantidade, e de grande grandeza, a Meca; e dahy ao Cairo, dhonde se espalha pelo mundo, do qual trouxerão logo agora estes cantidade, a saber: de canella, cravo, gengivre, nos noscada, e pimenta, e outros modos de especiarya e ainda os lenhos, e folhas delles mesmos; e muita pedraria fina de todas sortes: a saber: Robys, e outras; e ainda acharão terra, em que há minas douro, do qual, e da dita especiaria, e pedrarya nam trouxeram logo tanta soma, como poderam, por não levarem mercadoria. E porque sabeemos que Vossas Altezas disto ham de receber grande prazer, e contentamento, ouvemos por beem darlhe disso noteficaçam.
E cream Vossas Altezas, que segundo o que estes sabeemos, que se pode fazer, que nam háa hy duvida que segundo a disposicão da jente Christaam, que acham, posto que tam confirmada na fee não seja, nem della tenham tam inteiro conhecimento; se nam sigua, e faça muito serviço de Deos em serem convertidos, e inteiramente confirmados em sua santa fee, com eixalsamento della; e depois de serem assim confirmados, ser azo de destroyção dos mouros daquellas partes; alem de esperarmos em Nosso Senhor, que o trauto principall, de que toda a mourama daquellas partes se aproveytava, e que por suas maãos se fazia, sem outras pessoas nem linhajees nisso entenderem; por nossas ordenanças com os naturaes e navios de nossos Regnos, se mandar todo, para daquy se largamente poder prover toda a Christandade desta parte da Europa das ditas especiarias e pedraryas; que sera com ajuda delle mesmo Deos, que assy por Sua Merce ho hordena, mays caussa de nossas tençoens e propositos com mais fervor se eixercitarem por seu serviço na guerra dos mouros de nossas conquistas destas partes, para que Vossas Altezas tem tanto proposito, e nos tanta devaçam.
Muyto altos, muyto eixcelentes Principes, e muyto poderosos Senhores, nosso Senhor Deos haja sempre vossas pessoas, e Reaes Estados e sua Santa guarda.
Escrita em Lisboa [12] de Julho 1499.
Torre do Tombo (Coleção de S. Vicente, Livro 3.°, Fol. 513).
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