terça-feira, 11 de maio de 2021

 

O  Tempo  e  os  Alicerces


Há algum tempo, sem quase nada em que ocupar o espírito e o tempo, lembrei-me que era bom recordar aqueles amigos que mais marcaram as nossas vidas. Aliás é sempre uma benção recordar os amigos.

E, à medida que me fui lembrando, fui colocando os seus nomes em duas listas. Uma, daqueles que ainda por aqui estão, e que esperamos estejam ainda muito tempo, e outra dos que nos deixaram já.

Não tardou começar a transferir alguns nomes duma lista para a outra, e hoje essas listas mostram um tremendo desequilíbrio! Uma vai aumentando e a outra, mesmo com alguns bons amigos que o “virtual” da internet proporcionou, encurta! E agora são raros os e-mails dos que ainda por aqui andam!

Ainda agora só alguns. E como é difícil falar deles! Rememorar tempos de juventude, de adultos, de avós, a simpatia e o verdadeiro sentido de irmandade que, por bondade de tantos, me encheram a vida, que agora, mesmo que não queira, se vai esvaziando!

Lembro com admiração e inveja (porque não?) as suas vidas sãs, corretas, humildes, e ainda assim, praticamente todos alcançaram situações profissionais de destaque.

Um deles passou uns muitos e últimos anos da sua vida preso a uma cama, imobilizado por estranha doença, mas sempre com disposição positiva, não falando de si, mas interessando-se pela saúde dos amigos.

O outro, os achaques da avançada idade foram-se multiplicando, e o corpo não agüentou mais. Ambos exemplares pais de família, amigos de longas datas, uma simplicidade de vida e ao mesmo tempo uma atividade notável, almas grandes.

Cada vez que um amigo se vai, uma vontade imensa de estar com os que ainda por cá peregrinam, não dá sossego. Mas a distância é muito grande e cada vez mais difícil de a vencer.

A internet veio unir-nos um pouco mais, mas essa troca de notícias, por muitas que sejam, sabem sempre a pouco; apesar das palavras amigas que por vezes nos enternecem e comovem, o contato pessoal não existe. E faz tanta falta!

A vida terrestre, de todos, tem prazo para terminar. Ninguém sabe quando, mas com o avançar, e pesar, dos anos, não é difícil imaginar que já pouco falta.

Às notícias, tristes, que de vez em quando nos chegam, soma-se a catarata de notícias que nos afogam em desumanidade. Pelos jornais, TV, internet, parece que os jornalistas fazem gala em nos colocar frente a um mundo horroroso! A política mundial que se baseia na guerra, quer de tiros quer de finanças, as crises criadas por irresponsáveis desonestos, a fome que grassa em bilhões de infelizes, a insegurança, sobretudo nas grandes cidades, as drogas, os assaltos, estupros e inacreditáveis casos de pedofilia de pais com filhos, os filmes com sexo mais que vivo, não só entre os dois sexos, mas entre homossexuais, homens ou mulheres, mostrados em horários de dia quando qualquer criança pode assistir, e demorando em detalhes nojentos, a violência exibida na sua mais profunda aberração, a mentira e traição, atributos de filmes das sociedades mais financeiramente abonadas, enfim, tudo isto leva a equacionar se vale a pena continuar a viver num mundo de tal forma depravado.

Chega-se a idade avançada, e todas essas violências e aberrações cada vez mais nos magoam. Será por estarmos mais frágeis, ou porque estamos super carregados com a insensibilidade e vergonha que grassam nas manchetes?

Futebolistas a ganharem por mês o que um engenheiro, bem pago, não recebe em doze ou mais anos! Uns pseudo artistas que se exibem escandalosamente, muitos deles também analfabetos a fazerem fortunas com o dinheiro dos basbaques, ou mesmo um outro analfabeto, que chega a presidente dum país, e que depois o mundo inteiro se digladia para lhe conceder honoris causas!

Está tudo invertido. Os valores que me foram passados durante a infância e adolescência, o empenho e preocupação em levar uma vida íntegra, sem me desviar dos princípios éticos e sociais, parece que de pouco valeram.

Bandido, político, berrador de microfone, falso e covarde, é o grande atrativo da juventude de hoje.

Mas, vão ter amigos? Vão talvez ter dinheiro, e uma vida interior vazia.

Não se interessam por se debruçarem, mesmo um instante sobre alguns princípios, como esta máxima de Maomé: “Se tivesse só dois pães, daria um para alimentar o meu espírito!”

Os amigos, os verdadeiros, sempre foram um dos grandes alicerces da nossa vida. Não pelas suas qualidades externas, mas da alma. E agora, da minha geração, só cá estão uma meia dúzia. E alguns muito caídos.

À medida que os vamos perdendo, o nosso edifício vai desmoronando.

Está cada vez menos sólido.

Nota: - Texto escrito há dez anos, revisto e atualizado.

 

09/05/21

 

 

 


Um comentário:

  1. Querido tio Chico,continuo a ler com vontade os seus escritos.Tambem eu de uma geração mais nova me comove ver tantos amigos dos pais que apesar de uns há muitos anos não os ver,fizeram parte de uma família mais alargada .... obrigada por contar tantas histórias que nos fazem conhecer melhor estes tios que aos poucos nos vão deixando.Um abraço grande para si e para a linda tia Bela .

    ResponderExcluir