terça-feira, 27 de novembro de 2012


 


A estátua equestre de D. José

Lisboa


“Vocês sabem qual é a pata direita do cavalo de D. José? – Não??? – É a esquerda!”
Esta era uma brincadeira do meu tempo de menino, que nos obrigava a ir constatar o fato! Basta ir lá ver o dito cavalo!
Agora a Câmara de Lisboa mandou restaurar a estátua. Está lá há 237 anos, foi feita pelo grande artista Machado de Castro sob projeto de Eugénio dos Santos, o arquiteto que, junto com Carlos Marcel, e sob a supervisão do engenheiro chefe, Manuel da Maia, projetou a Baixa de Lisboa, totalmente destruida pelo terremoto de 1755.
D. José não quis posar e o artista teve que recorrer a retratos. Para evitar diferença acentuada na parecença, baixou-lhe o capacete e deu-lhe uma cara de jovem... quando o rei estava já envelhecido. Como é óbvio o Marquês de Pombal também quis ficar na estátua e lá está a cara dele bem na frente, num grande medalhão que, quando da sua morte e condenação foi de lá retirado, mas, recolocado em 1833!
Pronta, foi a estátua colocada no lugar onde ainda está, uns dias antes da inauguração, entretanto resguardada por cortinados de tafetá carmezim até 6 de Junho, quando o rei fazia 61 anos!

(Olhem a pata esquerda!)

Na noite da inauguração acenderam-se 28.000 luzes na Praça do Comércio, além das habituais.
Houve festas vistosissimas nas salas da Junta da Casa dos Vinte e Quatro, na do Juiz do Povo, no Colégio de Santa Maria de Jesus, com concertos, discursos, recitações poéticas nas línguas grega, hebráica, arábica, inglesa, francesa que por fim eram traduzidas para português, porque...
No segundo dia vieram suas Magestades à Praça do Comércio ver passar o cortejo alegórico, com 8 carros triunfais, acompanhados de danças! Tão grandioso a desfile que durou a noite toda.
Na noite seguinte queimou-se vistoso fogo de artifício depois do que os monarcas passaram à Sala da Alfândega, sala com 223 palmos de comprido e 96 de largura, onde se sentaram na tribuna real para assistir a uma sonata cantada em italiano, L’Eroe Coronato.
Na sala imediata, iluminada com 1.200 luzes, fora preparada uma ceia descomunal e opípara, com lagos rodeados de flores onde “navegavam” miniaturas de todos os tipos de embarcações do rio Tejo.
Custou 100.000 cruzados, o que seria hoje algo como... 2.000.000 Euros.
Consumiram 226 arrobas de vaca, 118 de vitela, 112 de presunto, 39 de carneiro, 55 de bacalhau, 4 de toucinho, 459 galinhas, 170 perus, 26 perúas, 312 pombos, 18 perdizes, 4 porcos, além de 4.154 ovos, 24.725 pães, 5 baricas de azeitonas, 358 arrobas de açúcar, 13 de canela, 16 arráteis de baunilha, 954 canadas de leite e 624 arrobas de gelo para sorvetes! (Por favor multipliquem as arrobas por 15 e verão a bestialidade da despesa!)
E vinhos? Nacionais e estrangeiros custaram só o equivalente hoje a 100.000 euros!
E ainda se consumiram 2.292 barris de água!
Depois da ceia houve o baile, iniciado pelo conde de Oeiras e a Embaixatriz de Espanha, e a Marquesa de Pombal com o Embaixador, só entrando nesta primeira dança as senhoras de primeira Grandeza que não fossem solteiras!
No último dia repetiu-se a passagem do cortejo com os mesmos carros alegóricos e danças, à noite foi queimado mais um grandioso fogo de artifício, e o importante capitalista Anselmo José da Cruz Sobral fez representar nessa noite, à sua custa, o drama musical O Monumento Imortal. Finda a representação foi servida mais uma esplêndida ceia, apresentada em ricas porcelanas da Saxónia.
El-Rei D. José por se encontrar doente e melancólico, olhou todas estas manifestações festivas com a maior indiferença e desprazer.
Ano e meio depois... falecia!
É de esperar que na reinauguração da estátua, após a sua restauração, a CML não gaste tanto dinheiro... a menos que a UE financie!

26/11/2012

sexta-feira, 23 de novembro de 2012



Que austeridade, dona presidenta ???



Muito interessantes as declarações da madama dona presidenta dilma roskoff ao caduco rei de Espanha:
“O Brasil só começou a reduzir despesas administrativas durante o (des)governo do famigerado sapo barbudo.”
Brilhante afirmação. O que vale é que o rei Juan Carlos, apesar de velho, semi-podre, não é burro, é muito educado, um nobre, e tem que cumprir com o protocolo para não perder aquela boquinha de rei. Assim deverá ter sorrido, cumprimentado a dona, e pensado “vá mentir prá...”
Mas, coisa curiosa:
- em 2001, no tempo do presidente FHC, havia 12 ministérios
- lula aumentou para 34
- a madama Roskoff já vai em 39 e estará em vésperas de criar o 40°
Redução drástica das despesas do governo!
Simultaneamente o numero de funcionários federais aumentou também, nem que fosse unicamente para servir os novos minstros, mas não só.
Mas tanto reduziu as despesas administrativas a dupla sertaneja lula/roskoff, que os escândalos nos ministérios e empresas estatais se sucedem, diariamente, tal como o número de homicídios!
Agora, um processo que foi (intencionalmente) levantado tardiamente, contra o senhor sapo, pelo desvio de dez milhões de reais – quase quatro milhões de euros – acaba por ser arquivado porque... passou o tempo, e assim querem safar o safado.
Há uma vaga esperança que o STJ reassuma o caso e tente julgar o tal lula, por essa e MUITAS outras, inclusive por ser também o chefe evidente, e denunciado, do famoso mensalão.
Mas este é um país tropical...
Um outro dos implicados na gatunagem da res publica, julgado, apanhou cinco anos de cadeia. Brilhante. Deviam ter sido dez ou quinze. Mas dá tudo no mesmo porque ao fim de nove meses saiu para “cumprir” o resto da pena em liberdade!
Delícia de país! Um malandro é condenado e cumpre a “pena” em liberdade.
Por hoje chega de tristeza.
Como cantava o poetinha, como é carinhosamente chamado o grande Vinicius de Morais:
“Tristeza não tem fim, felicidade sim!”

Não tem fim, mesmo!
Até porque a média de homicídios no país "continua" em 9600 por semana!

21/11/2012

terça-feira, 20 de novembro de 2012




Sobre a austeridade

Já mais de uma vez expandi minha estupefação perante um fenómeno “tsunamesco” que tem vindo sistematicamente a derrubar a chamada economia ocidental
Todos os países devem bilhões, trilhões ou quatrilhões, os bancos foram generosamente socorridos pelos governos falidos, os dias vão passando e ninguém enxerga – ninguém quer enxergar - o óbvio.
E o óbvio é que alguma coisa, ou a coisa toda está errada. Os únicos que estão certos são os bancos que sobem o custo dos empréstimos, e se estiverem em más condições os governos imprimem mais umas toneladas de notas – à surrelpa – e entregam aos bancos para... para que mesmo?
A solução há muito que se apresenta clara: devo não nego, pagar não pago.
Zera tudo, repõem-se os salários dos pequenos, só dos pequenos, que foram cortados, reduzem-se os juros, estimula-se o investimento particular, e encara-se de frente a concorrência da Coreia, China, Marrocos, Etiópia e outros.
E os países, voltam a poder respirar, porque hoje estão afogados na estúpida e brutal “austeridade”, que continua a matar a classe produtiva em favor dos sanguessugas.
Felizmente que nem todo o mundo compactua com esta ladroagem de austeridade. Graças ao Bom Deus ainda há gente neste planeta que pensa, age e resolve.
Leiam o texto a seguir que, mesmo sem autorização se transcreve, e que foi hoje publicado no jornal “O Globo”, com algumas passagens que merecem especial destaque:
- sairam para as ruas batendo com colheres em panelas vazias (e olha que há países com muitos paneleiros),
- demitiu-se o governo
- cadeia para os responsáveis
- fora com os partidos políticos
- escreveu-se nova Constituição.

A ilha da utopia

Era uma vez uma ilha, perdida nos mares do Grande Norte, si­tuada além do que a imagina­ção possa conceber. Era tão fria que a chamavam Iceland, terra do gelo. Em nossa língua, Islândia. Viviam nela cerca de 300 mil habitantes: um lugar próspero, rico para os padrões da épo­ca, uma gente bonita e saudável. Com um regime democrático estável, con­trolado pela população, dispunha de excelentes sistemas de saúde e de edu­cação, boa alimentação, baixa crimina­lidade, alta esperança de vida, desen­volvimento económico sustentável, re­gulado por diversas agências públicas.
Nada indicava que algo de mal pode­ria ocorrer naquela Terra da Promis­são. No entanto, trágicos fatos ali tive­ram lugar e sua recordação talvez possa ajudar a refletir sobre a crise que an­gustia o mundo atual.
Quando e como exatamente esta his­tória aconteceu? Os arqueólogos mais reputados, com base em evidências e documentos, atestam que as coisas co­meçaram a degringolar na virada no século XX para o século XXI, há centenas de anos...
Disseminaram-se, então, pela ilha, trazidas por mercadores estrangeiros, fantásticas promessas. Baseavam-se em três palavras-chave: desregulamentar, privatizar, internacionalizar. Se fos­sem capazes de enveredar por êste ca­minho, os ilhéus se tomariam muito ri­cos, e em pouco tempo.
Persuasivos eram aqueles mercado­res, e o povo resolveu segui-los. Os bancos públicos foram privatizados, e as empresas internacionais, autoriza­das a explorar os recursos naturais. As agências reguladoras, enfraquecidas, definharam. Os dinheiros agora circu­lavam em abundância, a Bolsa de Vai rés galopava e a construção civil alçai cava níveis frenéticos. Houve espantosos fenómenos, como o fato de os bancos privatizados contraírem empréstimos equivalentes a dez vezes ao que então se chamava o PNB, ou seja, a soma de todos os bens e serviços produzidos no país.
Vozes prudentes murmuravam: aquilo não podia dar certo.
E não deu.
Num belo dia, no ano de 2008, estourou a crise. Medonha. Os bancos faliram. A Bolsa despencou. Cessaram as atividades económicas. O desem­prego disparou. A ilha descobriu-se endividada até o último fio de cabelo.
Vieram então homens probos e pediram calma. Numa língua ininteligí­vel, explicaram tudo: os antecedentes e os consequentes. As coisas se resolveriam através de uma nova palavra mágica: austeridade. Instituições e bancos internacionais ajudariam. Os problemas seriam equacionados, embora fosse necessário apertar os cintos. Claro, muitos perderiam ca­sas, haveres, empregos, futuro e tudo o mais. As dívidas, porém, seriam pa­gas, e a honra, salva. O pacote, em­brulhado com laço de fita e aprovado pelo Parlamento, virou lei. Em 2009, a fatura parecia liquidada.
Entretanto, as gentes não mais se deixaram persuadir.
Queriam entender melhor como pudera uma terra tão próspera tor­nar-se em menos de dez anos uma nação de mendigos. Não haveria responsáveis! Foram às ruas, com apitos e bum­bos, batendo talheres em panelas va­zias. Pulando e gritando, cercaram o Parlamento, atirando ovos e tomates nos representantes. Não houve polícia capaz de segurar aquela ira. Corria o ano de 2010 quando a pressão das multidões organizadas impôs um referendo. A Lei do Parlamento foi recusada por 93% dos votos. A dí­vida, contraída por alguns, não seria paga por todos. Era preciso zerá-la e recomeçar.                     
E teve início a investigação sobre as responsabilidades. Altos executivos e gerentes dos bancos foram para a ca­deia. Os banqueiros que puderam, fu­giram, como ratos de um barco à deri­va. Ao mesmo tempo, decidiu-se redi­gir uma nova Constituição, capaz de proteger a nação de outros aventurei­ros.                            
Por toda parte, organizavam-se as gentes. Em cada distrito, uma assem­bleia. Participativa e consciente de que a Coisa Pública deveria ser trata­da com atenção e cuidado. Entre pou­co mais de 500 candidatos, sem pré­via filiação partidária (os antigos par­tidos tornaram-se suspeitos), elege­ram-se 25 representantes. Foram eles que, ouvindo as assembleias locais, autônomas em relação ao Estado e aos partidos, construíram uma nova Carta Magna, a ser aprovada em outro referendo popular. Regulação e controle, palavras esquecidas, retorna­ram, devidamente valorizadas. A primeira consequência foi a renacionalização dos bancos, baseada no con­ceito de que o dinheiro de todos é muito importante para ser deixado em mãos de poucos.
Aquele povo mostrou que, por ve­zes, como dizia E. Morin, o imprová­vel acontece. Demitiu-se um governo. Refez-se o Parlamento. Exercitou-se a autonomia. Foi escrita uma nova Constituição, preocupada com as pessoas e não com os dinheiros. E a prosperidade voltou, atestada por bons resultados em 2011 e 2012.
Uma revolução. Pacífica e democrá­tica.
Mas realizada há tantos séculos e numa terra tão longínqua... Talvez por isso se fale tão pouco dela e dos maravilhosos eventos que acontece­ram na bela Islândia. Uma ilha da “utopia.”
                     
Daniel Aarão Reis é professor de História Contemporânea da UFF

20/11/2012



segunda-feira, 19 de novembro de 2012



CAFÉ  E  CACHAÇA *

Faz 50 anos que deixei Évora, depois de ter vivido cinco na saudosa Mitra! Até hoje Évora está dentro do meu coração, e ainda a considero a mais bonita cidade de Portugal!
Lembro os bailaricos no Lusitano, no Harmonia e o “hotel” onde pagávamos 2$50 para dormir: a estalagem onde ficavam as carroças e mulas, no edifício onde depois foi a Rodoviária! Como se pode imaginar o “quarto do hotel” era qualquer espaço que se encontrasse em cima dum bocado de palha! Saudades? Sim!
Aprendi muito nessas terras. Não só na velha Escola de Regentes Agrícolas mas com o povo simples, cheio de sabedoria tradicional.
Não esqueço nunca uma “aula” recebida no Café Arcada! A meio da tarde, o Café quase vazio, entrou um casal, forasteiro, com um casalinho de filhos nos seus quinze anos, e sentaram-se numa mesa perto do balcão do bar. O criado aproximou-se, profissional, e aguardou ordens.


O velho Café Arcada antes de ser destruido pelo fogo

O pai de família: Eu quero um café. A mãe: P´ró meu marido não pode ser muito forte. O pai: Mas eu quero quente. A mãe: Para mim pode ser forte, mas não muito quente. O garotão: Para mim é forte e quente. A donzela: Para mim fraco e morno.
O criado, imperturbável, repetiu tudo, obteve a confirmação dos fregueses e foi ao balcão encomendar os cafés. Registou na máquina enquanto pedia ao colega:
- Sai quatro cafés.
Eu, sentado ao balcão, ouvi tudo aquilo e fiquei curioso para ver como o criado se desenvencilhava. Pegou nos cafés, colocou na bandeja, dirigiu-se aos clientes, e ar de interpretação da “mercadoria”:
- Forte e morno? Para mim. Quente e fraco? Eu. E por aí fora. Todos tomaram os seus cafés “individualizados”!
A minha admiração foi grande! Cumprimentei o esplêndido criado, agradeci a “lição” e dei-lhe uma gorjeta no valor de dois cafés: 1$00!
Agora, há já vinte e cinco anos que peregrino pelo Brasil, onde há pouco uma pesquisa feita para o Programa Brasileiro de Desenvolvimento da Aguardente de Cana, concluiu que o imposto que os portugueses impuseram na cachaça serviu para reconstruir Lisboa, arrasada pelo terramoto de 1755 e ainda manter as duas Universidades, em Lisboa e Coimbra.


Gravura francesa da época

Se isso assim aconteceu considero uma genialidade ter-se conseguido, com tão pouco, fazer tanto!
Quem, e onde se bebia essa cachaça toda? No Brasil? E recolhia-se tanto dinheiro assim que deu para reconstruir uma cidade violentamente arrasada por um terramoto? Ou em Portugal, concorrendo com as aguardentes locais, as bagaceiras, os vinhos, a geropiga, os abafados e até o Vinho do Porto?
Partindo do pressuposto que era no Brasil o principal consumo, devia por aqui andar tudo bêbado. E o índio que pouco dinheiro tinha, não deve ter contribuído para a reconstrução nem de uma pobre oca, nem os escravos, de uma modesta banza. Sobram os colonos. A beber assim não durariam duas gerações!
E quem sustentava as Universidades, se Lisboa consumiu rios de dinheiro para se reconstruir? Que bêbados?
Como não parece muito verosímil que tal sustentação fosse baseada no imposto sobre a cachaça, e como também não pretendendo desmentir a resultado da tal pesquisa, por falta de dados, sou levado a concluir que a cachaça deve ter, isso sim, contribuído para levantar o moral dos trabalhadores que reconstruíram Lisboa, dando-se a cada um, por dia, uma boa canada.
Nas Universidades, apesar de ser tradicional haver um ou outro professor chegado ao álcool, bem como alguns estudantes que ficaram famosos por terem levado dez e mais anos para concluir os cursos enquanto esvaziavam incontáveis barris, não consta nos anais daquelas venerandas instituições de ensino, que os professores fossem pagos com barris de pinga.
Quem sabe se foi por falta de suficiente número de bebedores que o Marquês “se viu obrigado” a fechar a Universidade de Évora? Com a descoberta que esta famosa pesquisa nos proporcionou, deve rever-se toda a história, e talvez não tenha sido por raiva dos jesuítas!
Valha-nos Deus. Já só faltava esta para ainda mais acirrar os ânimos contra os portugueses.
Em vez de guerra proponho que levantemos todos um bom copo de cachaça, e nos saudemos TODOS como irmãos. Ou será melhor bebermos um copo do milenar Tinto de Peramanca?
  
* Escrito em 30/03/2001 (Há mais de onze anos!)

quinta-feira, 15 de novembro de 2012




De Volta à Indonésia

Há uns quantos – muitos – anos, ainda o nosso querido amigo, hoje embaixador, António Pinto da França, estava longe de ir como consul de Portugal para a Indonésia, em Luanda, um jornalista cujo nome esqueci já, contou-me uma história, que sempre supus autêntica, sobre uma aventura por ele vivida.
Estávamos no meio da II Guerra Mundial. Os japoneses haviam invadido Timor, e os soldados portugueses que ali estavam juntaram-se às tropas australianas. Discretamente, como tudo que Salazar fazia, mandou-se de Portugal um navio, um “steamer ship”, a carvão, levar mais um contigente de tropas para aquela longínqua colónia, aliás para a Austrália. A acompanhar esse contingente, e para relatar a viagem, um jovem jornalista, esse que bem mais tarde conheci em Angola.
O navio, não tinha capacidade para fazer a viagem direta até ao destino. Tinha que ir parando pelo caminho para se abastecer de alimentos e sobretudo de combustível, carvão.
Com a guerra em plena força, as esquadras japonesas e americanas no Pacífico, encontrar carvão era um problema grave.
Pelo rádio ia-se tomando conhecimento que em tal porto ainda havia carvão, mas ao ali chegarem eram informados que tinham acabado de passar os navios de um dos beligerantes e rapado tudo. O navio português começava a ver que seria difícil chegar ao destino, andando “de Herodes para Pilatos”. Navegaram por vários portos e o problema ficava cada dia mais complicado.
Uma das paragens foi em Batávia, Jacarta, onde o jornalista teve oportunidade de descer em terra. Quando souberam que ele era português, foi rodeado de simpatia, e uma das coisas que lhe quiseram logo mostrar é o que escreve mais tarde o embaixador Pinto da França no seu livro, primeiramente editado em inglês em 1970, “Portuguese Influence in Indonésia”;
“No mesmo Museu (Arquivo Nacional de Jacarta), levaram-me a uma arrecadação para me mostrarem o famoso canhão português, conhecido por "Si Djagur", que foi transferido para Batávia pelos holandeses, após a queda de Malaca (para os ingleses, em 1825). É realmente enorme e muito bonito. Tendo a culatra a forma invulgar dum punho fechado, para os indonésios símbolo de relações sexuais — tem em Java a reputação de ser uma fonte de fertilidade. Por muitas gerações as mulheres estéreis vinham, de perto ou de muito longe, trazer flores a "Si Djagur", nome dado pelos javaneses ao canhão. Depois, sentavam-se no canhão, acreditando que assim se tornariam férteis. Alguns anos após a independência, no empenho de combater a superstição, o governo ordenou que o canhão fosse transferido da entrada para um armazém do Museu Nacional. De nada serviu. Numerosos grupos de mulheres juntavam-se diariamente à porta do Museu, protestando, pedindo com grande alarido que lhes franqueassem o armazém e as deixassem sentar-se sobre o canhão. Como esta crença parecesse haver esmorecido, o canhão saiu posteriormente da arrecadação onde estivera escondido e passou a estar exposto à entrada do museu de Kota, no centro histórico de Jacarta. Porém, segundo me dizem, as mulheres estéreis voltaram a visitá-lo para lhe trazerem flores e nele se sentarem.”
Contou-me ainda o tal jornalista que as mulheres, e não só as estéreis, além de se sentarem no canhão, esfregavam nele as mãos e as passavam depois na cabeça, no coração e nos orgãos sexuais dos filhos e filhas, porque os homens que tinham feito aquele canhão, além de prolíferos eram bondosos!
A seguir o nosso jornalista foi levado a encontrar outra marcante presença dos portugueses naquela terra. Meteram-no num carro e diziam-lhe que ele haveria de descobrir por si o que lhe queriam mostrar. O carro seguiu por uma estrada à beira da costa, o mar de um lado a encosta do outro. Uns quantos quilometros percorridos de repente surge a meia altura um espigueiro! Isso mesmo um espigueiro como os que se vêm no norte de Portugal.

Espigueiros no Soajo, Serra da Peneda, Gerêz, norte de Portugal

Rezava a lenda que um dia fora encontrado na praia o corpo dum homem, de pele clara, forte. Ainda respirava, levaram-no para cuidarem dele, e como nunca tinham visto nenhum semelhante acreditavam que tinha sido enviado pelos deuses.
Não há dúvida que era português, um náufrago, que ali ficou, criou família, ensinou aos nativos como conservar as suas produções ao abrigo de predadores e deixou essa indelével marca da sua origem e a memória de homem bondoso, forte e prolífero, e assim também venerado.
Ainda há pouco tempo, e nalguns lugares, segundo Pinto da França, quando nascia uma menina de pele mais clara diziam logo que era descendente de portugueses, e se fosse rapaz, mas forte, era também de origem “portuguis”!
Belas sementes espalharam os portugueses de antão.
Na Índia, Mascate, Malaca, um grande centro de irradiação da influência portuguesa, Indonésia, Macau e até Japão.
Em muitos lados ainda se fala  um “papia kristang”, ou qualquer outro “crioulo” com as raízes portuguesas. O que será que Portugal tem feito, ou está a fazer, para preservar essa cultura, tão bonita e tão venerada, nessas longíquas terras?
Ou abandonou tudo como fez com o Gabão onde grande parte da população, que sabe que o primeiro contato com europeus foi com os portugueses, que deram nome ao seu país, sempre quis estudar a língua portuguesa e a história dos descobrimentos para melhor compreenderem a criação do seu país, e Portugal nem se dignou enviar para lá um professor!
Em Malaca, Cingapura, e outras cidades há uma imensidão que não quer perder um valor cultural que lhes deixámos: a língua, o kristang. Em nem um destes países Portugal tem sequer um consulado!
Morreram os Afonso de Albuquerque, Francisco Serrão, e outros que deram portugueses de valor aos povos que encontraram, e promoveram a sua aproximação e integração.
E assim, lá nos confins, se mantém tão vivo o culto do “Meninu”.
Já Bandarra previa esse culto do Menino Imperador.
E hoje Portugal espera por que? Milagre? Milagres são os homens de fé e vontade que os fazem acontecer.
Até remover montanhas.

15/11/2012

domingo, 11 de novembro de 2012





Stefan Zweig  

ou  Nostradamus


Fazer previsões para o Brasil, fez Stefan Zweig, mas, inteligente, limitou-se a dizer que seria o país do futuro. Quem sabe se pesquisando melhor Nostradamus por lá se encontre algo de mais concreto, como é habitual nas suas profecias... que nunca deram certo!
Mas nem tudo é tão ruim por estas bandas, mesmo considerando que de janeiro de 2011 a setembro de 2012 tivessem havido, , 7.799 homicídios dolosos, e no Rio de Janeiro (a cidade mais “mortífera” é, hoje, Maceió), e que depois da madama dona presidenta ter anunciado, proclamado, vociferado que as tarifas de energias elétrica iriam baixar pelo menos 20% o que levou mais pessoal a votar no PT, no dia seguinte às eleições veio a confirmação: a conta da luz vai AUMENTAR  12,27%. E viva o PT.
Mas não há-de ser nada porque o Stefan Zweig disse que isto ia ser o país do futuro.
Não esquecer que temos o futuro petroleo do pré-sal, e agora já estimada nova quantidade a mais de 7.000 metros de profundidade! Não tarda estamos a perfurar os nossos antípodas pelos pés, que não vão achar graça, tanto mais que ficam na Sibéria entre Korkodon e Stolbovaja (podem conferir). Já imaginaram o Putin a sentir os pés furados?
Mas, se, e tal, as reservas existirem, os cálculos apontam para 55 bilhões de barris daqui a seis anos! Mas, se, e tal, para isso, precisa: investimentos, investimentos, investimentos. Já falámos disto.
Entretanto já se produzem quase dois milhões de barris por dia, o que não chega para o consumo, que cresce com velocidade, o que significa que, sem aumentar o consumo, as reservas darão para 75 anos. Talvez nessa ocasião chegue o tal futuro, se... não tivermos um outro mansalão ou um presidente igual ao tal, ou ao da Guiné Equatorial que esquece na conta dele 90% do valor do petroleo exportado!
O mesmo se passa com o gás: o governo diz que daqui a cinco anos vamos produzir 170 milhões de metros cúbicos por dia. Será? Hoje produzimos setenta e importamos 30 da Bolívia, a quem o sapo barbudo, muy amigo, deles, não dos brasileiros, decidiu aumentar o preço, para nós, desse gás!
Pelo que se dá a conhecer há gás em praticamente todo o território. O problema é sempre o mesmo: fazer um buraco e fazer sair gás não parece tão difícil. Mas, e o meio ambiente? E as infra-estruturas? E o mais complicado é que só dois e meio por cento desta perspectiva não é de gás chamado “não convencional”, que se encontra em rochas pouco permeáveis o que dificulta e encarece a sua exploração.
E a energia elétrica? Ah! Isso é outra coisa, porque até 2015 precisamos ter a funcionar mais 30 usinas hidrelétricas, porque os apagões estão a surgir com demasiada frequência.
E alguém acredita que se vão construir essas usinas todas? Acreditam em Papai Noel e esquecem o tremendo impacto ambiental que essas usinas podem provocar? Complicado.
Mas também há a energia eólica. Os mesmos dizem que em 2016 os ventos vão cobrir 9% do atual consumo, mas o consumo em 2016 deve passar dos atuais 455 GW energia, quase no limite da produção!Os tais nove por cento devem baixar para 7 ou 8.
No que respeita à produção de alimentos, está provado que a capacidade agro-pecuária deste continente brasiliano, parece poder ainda crescer a ritmo muito forte, assim o preço das comodities se mantenha alto. Mas como não há bela sem senão, esse aumento das comodities, provocam um real aumento de custo de vida aqui dentro, e hoje aquele quase paraíso de vida barata, passou totalmente à história. Rio e São Paulo dispararam, disparataram nos preços e alguns itens conseguiram dobrar de valor em menos de um ano! São hoje duas das cidades mais caras do mundo! Lindo, né?
Os medicamentos custam 4 e 5 vezes mais do que por exemplo nos EUA, Argentina ou Portugal, em Inglaterra há diversos produtos alimentares que custam metade do que no Brasil, os automóveis pelo menos mais cinquenta por cento mais do que na Argentina, mesmo sendo aqui fabricados.
Stefan Zweig só não previu, que em matéria de transportes, rodoviários ou marítimos, o Brasil é campeão de custos. Meramente a título de exemplo um piloto de navios, a quem é confiada a missão, e obrigação, de levar os navios para os portos e atracar, ganha em média, mais mil por cento do que, por exemplo, um seu colega em Singapura, o maior porto do Mundo!
Mas nenhuma “bolinha de cristal” poderia prever, o que fizeram com um palhaço, analfabeto!
Quanto a isto ouçam o filósofo Olavo de Carvalho
De qualquer modo o Brasil é, ou talvez seja mesmo, o país do futuro.
Futuro? Quando?
Ah! O futuro só a Deus pertence.

9 de novembro de 2012

quinta-feira, 8 de novembro de 2012



Interregno  mental

Durante a vida, não deve haver quem não sinta necessidade de dar um “descanso” à cabeça. Talvez por ter pouco miolo, ou escassa capacidade de armazenagem, o que é verdade é que preciso mesmo dar uma parada de tempos a tempos.
Já fiz isso várias vezes, em África no “mato”, tentar caçar alguma coisa, barraca de campismo, a maioria das vezes isolando-me e gozando o sossego e a exuberância, em mosteiros beneditinos também algumas vezes, e até quando fui passar seis meses no interior de Moçambique, ajudando nas tarefas da Obra da Rua, a Casa do Gaiato, e ainda, por incrível que pareça, na travessia do Rio para Angola, à vela, quando o completo isolamento em alto mar parece que não nos deixa pensar em nada por muito que se procure meditar.
Sempre se sai de cabeça bem mais leve. Uma espécie de faxina geral!
O problema é que com a idade essa faxina tem-se mostrado necessária a períodos cada vez mais curtos. Não admira; durante a vida enchemos a cabeça de problemas, somos implacavelmente massacrados pela vergonha, aliás sem vergonhice que nos rodeia em todos os campos, e a “juventude”, já gasta, não deixa grande reserva de força para aguentar.
Todos sabemos que a televisão nos enche a casa de mentira, porcaria e pornografia, não há anúncio nem que seja para vender batatas onde não apareça uma mulher despida, chegando-se ao cúmulo da degradação com um anúncio, grande, que vi na estrada, o chamado “outdoor”: em cima a marca da cerveja, a meio a garrafa e por baixo, em letras enormes o “slogan”: “O orgasmo gostativo”!
Não dá para acreditar que tenhamos chegado tão baixo, no tão ignóbil lamaçal da moral e ética. Mas o cartaz lá está, e quando cruzei com ele quase parei por não querer acreditar que tal fosse possível. Infelizmente é.
Tudo isto, este martelar constante, somado ao descalabro e vergonha (sem vergonha!) da política, das pseudo ações sociais, da baixaria que é a educação, da corrupção, que por mais que nos queiramos alhear, a quem tem um espírito combativo mas se reconhece impotente, acaba por derrubar.
Depois duma rápida consulta via internet, e dum contato telefónico, aí vamos.
É relativamente longa a viagem, sobretudo pelas cidades que se tem que atravessar. Cidades com aspeto triste, total ausência de planejamento, construídas ao longo da estrada, tudo com ar de sujeira, inúmeras lojas de venda de carros usados, dezenas de obstáculos “quebra molas” que mais parecem obstáculos para concurso hípico, buracos sem fim, enfim, um caminho pouco agradável, e quem vai com espírito de descanso e silêncio, logo se sente frustrado.
Passado Itaboraí aparece um pedágio e o motorista pensa que chegou à Alemanha! Finalmente uma estrada boa, mesmo que tenhamos que pagar! Mentira. Uma estradeca de duas faixas, uma em cada sentido, muita curva, quase sempre traço duplo no chão impedindo ultrapassar, mais obstáculos, mais buracos, mais controles eletrônicos de velocidade (50 km/hora). E ninguém se livra de encontrar um caminhão ou um ônibus pela frente, e a paciência de que se revestiu ao sair de casa... logo acaba.
Finalmente chegamos à subida da serra para Nova Friburgo. O espetáculo destas serras grandiosas, cabeços imensos emergindo cobertos de densa floresta, acalmam-nos o ânimo.
Não muito depois de atravessar esta última cidade, igualmente comprida e cheia de semáforos, saímos da estrada e entramos numa “picada”! Mais um quilômetro e pouco e deparamo-nos com o que íamos procurar: no meio daquelas paisagens, num sossego quase total, um cantinho do céu, o Mosteiro de Santa Cruz, da ordem dos beneditinos.
Pelas fotos se vê que não é uma construção grandiosa, uma ostentação, mas um lugar simples, exatamente o que procurávamos. Na imagem do Google vê-se bem o isolamento, o lugar para meditar ou simplesmente não pensar, mas seguramente para se estar longe do descalabro em que o mundo e toda a sociedade está afogada e tentar deixar que a imundice e seu peso saiam da cabeça.



Antes que algum dos monges nos venha receber já podemos dizer para nós mesmos: “A Paz está comigo”; logo a seguir aparece o bom prior que ao nos cumprimentar nos dá a sua benção: “A Paz esteja contigo”, mas como tudo neste Mosteiro, em latim: “Pax vobiscum”.
Depois desta singela apresentação, e de ficarmos a saber o nome de cada um, conduz-nos a um dos quartos de hóspedes. Simplicidade e sobriedade monástica, onde não foi esquecido o cuidado e atenção com que recebem um estranho que ali vai procurar ninguém sabe bem o que, com a porta a abrir-se para o exterior, e a mata em frente.
Um leito, um lavabo, um armário e uma mesa! Mas jamais trocaria isto por uma suite de luxo nos insolentes e demagógicos hoteis, por exemplo em Dubai ou Las Vegas!
O ambiente do Mosteiro inserido no meio das montanhas, rodeado de mata, do lado do nascente dois imponentes morros de granito (inselbergs, da “família” do Pão de Açucar), salpicados com centenas ou milhares de bromélias que parece estarem ali para proteger o isolamento dos monges na sua silenciosa e humilde vida de trabalho, oração e estudo.

Bromélia das rochas

Quando o dia rompe nada consegue calar os bandos de maritacas. Sobrevoam o Mosteiro, pousam na cobertura da torre e ali ficam um pouco em animada gritaria ou sonora conversa! Mais modestos são os canários, os anus pretos, os bem-te-vi e alguns outros quase a cantar em gregoriano para não interferir nas orações.
O tempo aquece e a floresta cala-se. No calor os animais refugiam-se nas sombras, talvez durmam a sua sesta. O raro manso grasnar dum pato refrescando-se no pequeno lago, e essa quietude começa a retirar-nos da cabeça o acumulo dos ruídos da cidade, da televisão, a fazer-nos esquecer que há jornais e notícias e que o mundo não parou. Conseguimos até esquecer a banditagem que continua a querer destruir o país!
Um refúgio na biblioteca, pequena mas recheada de livros sobre teologia e filosofia, assuntos que não só não fomos procurar como nem capacidade temos para os enfrentar. Um ou outro livro de história prende a nossa atenção, e no centro do silêncio que pássaro algum se atreve a romper, devagar uma sensação de bem estar nos vai envolvendo.
Chamada para as refeições. Na mesma o silêncio só quebrado pela leitura que um dos irmãos faz algum livro da história da igreja ou dos santos padres.
Comida simples mas oferecida com amor fraterno. Uma delícia.

 A igreja, simples e bonita, vista do lado de dentro do mosteiro

No fim da tarde volta a algazarra da passarada. Regressam ao poiso depois do dia de “trabalho”. Lá longe, junto com os patos e galinhas, o balir dum carneiro no comando do rebanho, ou uma troca de opiniões entre o galo chefe e alguma galinha de posição elevada!
Cai a noite e um martelar constante, ritmado, incessante, chama a nossa atenção. Estaria alguém a trabalhar? Não podia ser porque o martelo não parava. E assim ficou mesmo depois de me ter recolhido.
De manhã quis saber se havia algum “carneiro hidráulico” a elevar água para o Mosteiro. “Não, não temos, mas já pensámos nisso.” – “Então que ruido era aquele, ontem à noite, que parecia alguém a martelar mas não parava?” – “É um sapo. O sapo tambor!”
Tenho ouvido muito sapo. Mas como aquele, nunca! E fiquei, mentalmente, a cumprimentar o ritmo do bichinho!
Três dias neste isolamento, no silêncio, só quebrado quando precisava esclarecer algum detalhe, respeito que devemos para quem nos recebe tão fraternalmente,  ausência total de televisão e rádio, as orações dos monges sempre em latim, o canto gregoriano, o clima de montanha onde a humidade do ar ao meio dia fica em 20 ou 30%, tudo isso contribui para a Paz que procurávamos.
O único “senão” que me obrigou a ficar menos tempo foi a quantidade de degraus que tinha que subir e descer: do quarto para o refeitório, deste para a igreja, depois para a biblioteca, volta, repete, e a meio do dia as minhas pernas já fraquejam demais!
No último dia acordei novo! Sentia-me muito bem. A cabeça estava aliviada. Mas como ainda houve que subir e descer umas quantas vezes, as pernas e a coluna queixavam-se!
Foi uma curta vivência. Mas valeu muito a pena, e fica a vontade de repetir.
Quem sabe? Vontade não falta. E o Mosteiro continua com as portas abertas para os que procuram o seu refúgio.
Bem hajam.

08/11/2012

sábado, 3 de novembro de 2012



Do BRASIL !



Há muito tempo que não falamos do Brasil. Até foi bom porque se acumulam mais notícias e se confirma o que anteriormente foi dito.
Há nesta terra contra-sensos difíceis de explicar, mas rebuscando daqui e d’além sempre se pode tentar entender como isto funciona, aliás, como isto... funciona mal.
Em primeiro lugar há que reconhecer que o percentual de gente que alcançou a classe média é muito importante, e de aplaudir. Como não há bela sem senão, é necessário esmiuçar algumas das causas desse ”fulgurante” crescimento.
Talvez o principal, e autêntico, seja o aumento do salário mínimo nacional, hoje em R$ 622, equivalente a € 234 ou US$ 307, e então já se considera que uma família que ganha R$ 1.000 - € 377 –é contabilizada como pertencente a essa classe! Se for uma familinha só de casal e um filho... o rendimento mensal por cabeça é de exorbitantes R$ 377 : 3 = 125,8 Reais.
Aqui está uma das fórmulas usadas para apresentar esse crescimento económico-social.
Outra está no alargamento do financiamento a pessoas físicas: tanto para compras de fogões, geladeiras, eletrodomésticos em geral e automóveis – tudo isto fruto da dependência do atual governo dos sindicatos de metalurgicos, de onde surgiu o famigerado “sapo-barbudo”, ainda a mandar mais do que a madama dona presidenta. E ainda o crédito à habitação, com financiamentos a longo prazo e juro baixo. (Estava a pensar na bolha imobiliária dos EUA, mas, é bobagem. Aqui é Brasil.) Como é de calcular o preço dos imóveis subiu em flexa. E o dos alimentos, e de tudo. (Hoje São Paulo e Rio de Janeiro estão entre as cidades mais caras do mundo!)
Depois os números começam a traduzir um pouco mais a realidade. Com tudo isto, super eleitoreiro, a arrecadação fiscal no ano foi inferior em 1% a 2011! Estranho, né? A inadimplência aumentou 5,9%, e já alcança os 20%! O lucro da Petrobrás, que descobriu as famosas reservas do petróleo, o super comentado “pré-sal”, já caiu este ano cerca de 14%, e as suas ações tiveram igual desvalorização. Em 2007 as mesmas ações tiveram um aumento acumulado de 98,88%, e este ano “acumula para baixo”! Uma festa.
A taxa Selic, a básica do Banco Central, está em 7,25% ao ano, mas os juros do cartão de crédito, depois dos bancos terem baixado 50% do seu valor (parece mentira mas é o que apregoam!) continua em 10,5% ao mês, o que dá mais de 200% ao ano! Assim a classe média cresce!
Entretanto, o Brasil, aliás o PT que tanto bramou contra a dívida externa, tendo feito disso um cavalo de batalha contra o governo de FHC, já vai, mais uma vez, em US$ 817 bilhões!
E o PIB? Ah! É verdade, o PIB, que os crâneos do governo anunciavam no início do ano que devia alcançar 4% de aumento, segundo os últimos números, está a travar-se uma dura batalha para não ser inferior a 1,3%. Para o próximo ano já se fazem previsões mais ótimistas: o governo havia anunciado uma previsão de 4%, mas, por prudência acaba de informar que não deve passar dos 3,25%.
O que não constitue qualquer problema visto a inflação em 2012 dever alcançar só 6%!
E por aí segue: a indústria está com crescimento negativo de 3,1%, o que não impede que dentro de 3 ou 4 anos em São Paulo estejam em circulação um carro para cada dois habitantes! Onde os vão meter? Quem responder é despedido!
No Rio, com Copa do Mundo e Olímpiadas à vista, a organização está meia perdida. Só para a festa da inauguração, um daqueles segredos que não tarda todo o mundo conheça, o prefeito já convidou dois ou três mil estudantes dos países vizinhos, para virem participar dessa cerimónia! Voluntários, é evidente; voluntários a quem terá de pagar viagem, alojamento, refeições e um mínino de “pocket money” para poderem beber um refresco durante os ensaios! Uma economia interessante. (Como é de calcular a agência de viagens que vai tratar disso deve ser de um comparsa.)
Há dias um ônibus, que para não quebrar o ritmo, circulava em velocidade alta no centro da cidade, ao fazer uma curva tombou de lado. Não há crise porque morreram só 3 pessoas e 6 ficaram feridas. O curioso é que se constatou, depois, sempre depois, que esse ônibus já tinha 143 multas, a maioria por avançar o sinal vermelho! Mas continuava a circular. Nesse mesmo dia houve só mais seis acidentes de ônibus. Só. Mas como todos os ônibus são de empresas privadas, com muita força na política e na polícia, fica-se iamginando qual será o numero de multas NÃO PAGAS de toda a frota que circula na cidade. E o seu valor, que deve ser absurdo!
De qualquer maneira o Rio de Janeiro continua lindo!!!
Com assaltos, tiroteios – ontem foram assassinados mais três policiais – e a paisagem urbana mais bonita e imponente do mundo.
Mas não é só aqui, não: na China há menos assaltos, mas mais prisões e desprezo pelos direitos humanos, se é que isso existe por lá, o que não deve preocupar o 先生 (isto quer dizer senhor) Wen Jiabao, que só acumulou uma fortuna de quasi três bilhões de dólares, e isto porque ele é comunista verdadeiro e devia achar que essa grana se destinaria a distribuir pelos mais necessitados, ou o 先生 Bo Xilai, que deixou a mulher assassinar o sócio inglês, para ficar com empresa de que era sócio só para eles, enquanto o seu filhinho 花花公子 (isto é palyboy em chinês) fazendo o seu dever de comunista sincero matou-se a ele e três prostituas, tudo nu, quando chocou com o seu modesto Ferrari contra um muro! Esta de andar com três prostitutas nuas num ferrarizinho, e mais o condutor e proprietário com a mesma indumentária, e até parece que o pobre 花花公子 comunista ia bem devagar sem se distrair com o espetáculo que à sua volta se desenrolava, i.é, despia!
Por enquanto, por estas bandas esta cena ainda não vimos. Mas tem outras com o mesmo fundo moral!
Os vereadores, que deviam trabalhar, de graça, pelo bem da comunidade, ganham SÓ o equivalente a 75% do salário do governador do Estado, que no Paraná era de mais de R$ 24.000, superior até ao presidente desta res publica!
Mas há casos interessantes que quase fariam inveja até ao tal 先生 Wen Jiabao. Ora leiam este pedacinho duma reportagem da revista Época, sobre salários: “No começo de setembro, ÉPOCA deu início a uma série de reportagens sobre os supersalários no setor público. A primeira delas mostrava, a partir de documentos obtidos com exclusividade, a composição dos maiores salários entre os servidores na ativa do governo paulista. Entre os cinco primeiros, quatro eram de engenheiros do DER, o Departamento de Estradas e Rodagem, que haviam conseguido liminares na Justiça para ganhar mais que os R$ 18.725 recebidos pelo governador, o teto do Estado. O engenheiro José Luiz Fuzaro Rodrigues, líder do ranking, recebia, àquela altura, R$ 69.961,14 mensais - R$ 47.576,44 só de auxílio-combustível – e levava para casa, líquidos, mais de R$ 51 mil.”
O mesmo fuzaro, coitado, só levava para casa R$ 51 mil por mês, e como têm 14 salários por ano, ficava na miséria de R$ 714 mil por ano! É dificil imaginar como se pode viver neste nível de pobreza! Afinal são só cento e doze salários mínimos... brutos. Mais difícil ainda é como conceber como ele conseguia, e consegue, que a mamata segue, consumir tanto combustível.
Ora digam lá se o grande cantor Jorge Ben Jor não tem razão quanto canta:

Moro num país tropical.
Abençoado por Deus 
E bonito por natureza.
Mas que beleza.

Mas não é para todos.

02/11/2012