quarta-feira, 28 de março de 2012



O quase (des) Acordo Ortográfico



Data venia, vou dar também a minha opinião sobre o tão falado, discutido e assinado “Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa”.
Foi muito discutido! Os portugueses sentiam-se “donos” da língua, os brasileiros, representando cerca de 85% dos falantes da mesma língua, entendiam que devia chegar-se a um acordo para não se perder a língua em uns quantos novos crioulos, inclusivé o “crioulo de Portugal”. Discutiu-se, zangaram-se e por fim, mesmo de má cara, todos os países lusófonos, communis consenso, decidiram aceitar o que os viri legibus scribundis.
Post, huc et ullc foram surgindo vozes descordantes, sobretudo da parte dos “antigos donos da língua”.
Parece que todos, elogiando muito Fernando Pessoa, se esqueceram da sua célebre frase “a minha pátria é a língua portuguesa”, certamente querendo referir-se também a goeses, minhotos, angolanos, brasileiros, etc.
Quantos Acordos já se fizeram, por consenso ou imposição, desde que se escrevia assim:
“Don Denis pela gra de Ds rey de Portugal y do algarve. A quantos esta cta uire faço saber q eu recebj de ffrey Johanne Guardador e scriva domeu Çeleiyro...”
Foi D. Diniz, no século XIII quem ordenou que se abandonasse o latim para que se escrevessem em português todos os textos oficiais.
Logo no início do século seguinte Dante Alighieri escreve “A Comédia”, introduzindo, para espanto e admiração universal, uma nova língua, a que se chamou italiana.
Em Portugal quem deu todo o valor à língua portuguesa foi Camões, e em Inglaterra a língua só começou a ser uniformizada com a edição da Bíblia e a seguir com os textos de Shakspeare!
Mas desde esse tempo quanto mudou! Poucos hoje sabem ler Camões e raros, ingleses, os originais do seu grande mestre.
Lembro dois grandes escritores contemporâneos que me obrigaram a pesquisar em vários dicionários para os conseguir entender: João Guimarães Rosa e Luandino Vieira.
Rosa escreveu com a popularia verba, Luandino com algo parecido, misturando português com kimbundo, a tal popularia verba dos angolanos, sobretudo de Luanda. E o mestre Mia Couto? O que ele já criou?
Ninguém se queixou dos novos vocábulos apresentados, todos foram sucesso literário, não houve necessidade de “traduzir do “clássico” para o “hodierno”, e continuam a ser livros procurados e edições repetidas.
Vai tempo que em Portugal se falou o arcaico céltico, cartaginês, germânico, latim e árabe. Talvez até o grego com a ortografia cirílica. E o provençal. Podíamos ter feito logo um acordo ortográfico e, quem sabe, universalizar a escrita numa forma única.
Tem-se feito muita brincadeira com palavras que no Brasil e em Portugal têm significados completamente diferentes. Ninguém reclama! Então porque não continua cada um a escrever como entenda, sendo inegavelmente sua a opção? É evidente que só esta geração dos mais velhos não querem – nem eu – trocar o que para nós era certo pelo... futuro. Mas as novas gerações, se seguirem o Acordo vão entender-se melhor! Isso parece evidente.
Ipso factum, um dos pontos que ficaram assentes no Acordo foi não considerar erro quem continuasse a escrever conforme seu consuetudo. Não é erro, será simplesmente arcaico, e cada um dos teimosos sempre será livre de escrever como muito bem lhe apeteça.
Ego in porto navigo, faço uma pequena mistureba, uma espécie de maioneza linguística/ortográfica, e imagino que tenho atingido o intelecto de quem lê. Este parece ser o fundamentum omnis societatis: communicare! Como diriam os nossos vovovôs, intentio rerum!
Parece que o “grande problema”, o pomo da discórdia, gira agora em volta do VOLP – Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa. O Brasil já editou o que estaria prescrito no Acordo. Portugal está no “sim, não, pois...”, reclama, zanga-se e entretanto perde lugar, porque como a edição de um vocabulário desta magnitude exige um financiamento elevado e os restantes territórios com a mesma língua, certamente terão muito mais dificuldades em editá-lo... o Brasil sai na frente. É lógico.
Assinou-se o Acordo, o que significa que todos concordaram. Virou uma espécie de lei aprovada pelos parlamentos e assinada pelos presidentes das repúblicas. Ora se é lei, Dura lex sed lex.
Dixi.

Notas:
1.-Os “alguns” vocábulos em latim mostram que já evoluimos um bom pedaço: pittaciu, do latim, e pittakion do grego! E agora discute uma letra no meio da palavra!
2.- Depois o senhor Graça Moura que me perdoe, mas se retirarmos o “p” de “adopção” não vira “adução” (Jornal “O Globo”, dia 24/03/2012)! Fica simplesmente adoção. Ainda me recordo que, em português, as palavras em geral têm acentuação na sílaba paroxítana, que no meu tempo se chamavam de “graves”! Donde parece depreender-se que não só não necessitam de acento... nem do “p.
3.- O que dizer de: rego (subst.) e rego (verbo); colher (verbo) e colher (subst.);jogo (subst.) e jogo (verbo); sede, lugar e sede, avidez; seca, a roupa e seca, falta de água?

28/03/2012

3 comentários:

  1. Caro Francisco, da família dos Amoríndeos, talvez porque sou Professor e estou habituado, infelizmente, a dar notas (cá está um das palavras que o Sr. Graça Mouro gosta), tal não é a burrice que grassa pela república, dou Muito Bom.

    Aquele Abraço (expressão que também foi generalizada pelo seu Gilberto Gil, mas atenção, absolutamente sem ofensa e em grafia única).

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