O Mosteiro de Santa Cruz em Coimbra
Comecinho do século XII. Estava Afonso Henriques em desavenças com sua mãe, quando o arcediago D. Telo, pediu a Dona Taraja um terreno, fora das portas de Coimbra, para aí fundar um mosteiro, “e não tinha ela dado o que prometera, por então, andava tudo conturbado e não tinha sequer poder sobre si mesma.”
Ao tempo ainda do Conde Raimundo e da Rainha Urraca, D. Telo, agregando a si uma falange de homens de primeiro plano em número igual ao dos doze Apóstolos, começou a lançar os fundamentos do Mosteiro de Santa Cruz, nos arrabaldes de Coimbra, guardando silêncio quanto ao seu surgimento.
D. Telo, homem de origem humilde mas de grandes virtudes, muito estimado e conceituado, depois de ter ido em peregrinação à Terra Santa, e de se ter profundamente informado sobre a vida monástica, de tantos mosteiros que visitou, no regresso, em Montpellier, “não sem a ajuda de Deus, comprara casualmente uma sela, que era muito bem trabalhada e era mais que excelente para montar a cavalo. Certo dia em que o arcediago ia montado numa mula pela porta de Coimbra e caminhava pela Rua Régia, aperceberam-se dela os cortesãos, que notaram o seu bom recorte. Alguém de entre os conselheiros deteve a atenção na sua elegância e propôs ao Infante (Afonso Henriques) que pedisse ao arcediago que lha desse. Sem demora, satisfaz ele o pedido, sugerindo em troca a oferta dos Banhos Régios.
O príncipe, cheio de respeito respondeu que teria de ver o assunto. Mas aos ouvidos do rei e de Hermígio, seu mordomo mor, Deus fez chegar a inspiração de apoiar os planos do arcediago, e é-lhe passado um documento autenticado com as armas reais. Pela sua execução deu o arcediago ao infante um peitoral todo bordado.”
Inicia a construção do Mosteiro com o lançamento da primeira pedra em 28 de Junho de 1131; um ano depois ordena Afonso Henriques a construção da nova Sé de Coimbra, sobre a antiga já muito deteriorada, sem condições de ser o centro espiritual da nova capital de Portugal. Hoje a Sé Velha, uma das maravilhas da arquitetura portuguesa.
Logo D. Telo começa a receber doações, e com isto não tardou que a inveja dos cônegos da Sé, e o próprio bispo de Coimbra, D. Bernardo começasse uma “guerracontra o Mosteiro, onde a obediência, a humildade e a vida de pobreza, contrastavam com o fausto dos seculares, “ora desviando as esmolas dos fiéis, ora impedindo o direito de sepultura, ora dizendo mal da vida religiosa...” Tudo faziam para denegrir a ação de D. Telo, “que comprou por trinta maravedis de ouro, ao bispo Bernardo e aos seus cônegos, um horto que ficava a pegar e tinha abundantissima fonte de águas.” Quis ainda o bispo, e os cônegos, baixar as despesas da obra do Mosteiro para atrasar a obra, e tanto procuraram inflamar os espíritos do povo “coisa que desagradou ao Infante, nosso Rei, que lhes lançou em rosto mulheres de má vida e outras coisas execrandas.
Para se abrigar das exigências do bispo, vai D. Telo a Roma e coloca o Mosteiro, onde já os seus seguidores tinham feito os votos de vida apostólica, acolhendo-se ao hábito e regra de Ordem de Santo Agostinho, diretamente sob a tutela de Roma, do Papa Inocêncio II, nascido Gregorio de Papareschi, que imediatamente o confirmou, escrevendo uma Carta-Privilégio em que definia minuciosamente todas as propriedades já pertencentes ao Mosteiro, e a D. Afonso Henriques para que o protegesse.
Estas Cartas foram sendo confirmadas pelos papas Lucio II, Eugénio III, Adriano IV e Alexandre III, sempre solicitando ao Infante a sua proteção.
Coimbra era já a capital de Portugal, e do Mosteiro Afonso Henriques quis fazer um centro de estudos, talvez a base de uma universidade, dotando-o com livros e dinheiro, e tanto se interessou que, ele mesmo, escreveu ao Papa Adriano “quanta seja a minha estima por ele não serei capaz de o exprimir por palavras, de tal modo que aí o meu corpo seja sepultado e espero que, por permissão de Deus, com isso advenha sufrágio especial à minha alma por benefício de orações. E enquanto por graça de Deus a vida me acompanhar, estarei certo que nenhuma adversidade terá de suportar da parte de qualquer pessoa eclesiástica ou secular, porque a mim pertence velar por aquilo que ofereci, por mor de S. Pedro a quem ofereci.”
Era grande o património do Mosteiro e, detalhes interessantes quanto aos limites do seu terreno, registam várias propriedades de judeus, e até a estrada dos hebreus: pelo sul terminam os termos da paróquia de Santa Cruz na Ribeira dos Judeus, descendo pelas casa de Gonçalo Travesso e o Almocávar dos judeus (o cemitério) até à almuinha (herdade) do rei; no fim da almuinha fica a propriedade que foi de Salvador Zuleima... Do nascer do sol... sobe um tanto até à Fonte dos Judeus. Aí tudo o mais até Gonçalo Travesso o separa do Bairro dos judeus.
O reinado de Afonso Henriques ficou marcado pela tolerância para com os judeus. Estes estavam organizados num sistema próprio, representados politicamente pelo grão-rabino nomeado pelo rei.
O grão-rabinoYahia Ben Yahi foi mesmo escolhido para ministro das Finanças de Afonso Henriques, responsável pela coleta de impostos no reino. Com esta escolha teve início uma tradição de escolher judeus para a área financeira e de manter um bom entendimento com as comunidades judaicas, que foi seguida por seus sucessores.
Mais tarde foram sepultados na igreja do Mosteiro, conforme havia determinado, o primeiro Rei de Portugal, e o segundo, Sancho.
Em 1507 o Rei D. Manuel achou que os túmulos dos primeiros reis não tinham a grandeza que eles mereciam e mandou executar novas obras, que são jóias da arquitetura manuelina.
As fotos a seguir, obtidas na Internet, mostram um aspecto da antiga cidade de Coimbra, vendo-se em cima, à direita em cima, o antigo castelo. O Mosteiro de Santa Cruz ficaria à esquerda a seguir ao vale.
Depois, fotos dos túmulos dos primeiros reis.
20/07/2011
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