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Ó Incas! Ó Incas!
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Dia seguinte Cusco, ou Qosqo! Capital do antigo Peru e dos Incas e, como os peruanos agora lhe chamam, Capital Arqueológica da América, Patrimônio Cultural da Humanidade decretado pela Unesco, situada a 3.350 metros de altitude. Num antigo palácio inca, logo “oferecido” ao irmão de Pizarro, que por sua vez o ofereceu ao clero e a seguir parou um pouco nas mãos do marquês de Salas y Valdés que, com a humildade própria dos nobres espanhóis, mandou colocar sobre a porta principal quatro bustos: o dele, sua mulher, seu filho e nora, hoje, magnificamente restaurado, é o Hotel Libertadores, um 5 estrelas que parece um museu. Dentro, dois claustros à moda castelhana e uma longa parede de pedra inca que é uma beleza.
O claustro do hotel
À chegada, um chá de coca, para ajudar o debilitado físico a aguentar-se melhor naquelas altitudes. E aguenta!
Cusco é uma cidade para se visitar a pé. Pequena, suaves declives, e muita, muita construção não só incaica como colonial. Pelos registros fotográficos, em 1935, e até 1950, Cusco era uma cidade velha, suja, arruinada, semi-abandonada. Hoje, recuperada, limpa, com as velhas casas coloniais em rápida recuperação, tem muito que ver e aqui aproveitámos para ver quase tudo a que tínhamos direito, e não só!
O Peru está situado numa região em que terremotos são uma quase constante e, em cada século, tem sempre mais do que um de grande violência. As construções modernas e/ou coloniais sofrem brutalmente, mas as incaicas ou até bem mais antigas permanecem impassíveis, tranquilas. Os incas, e seus anteriores sabiam muito mais de construções anti-sísmicas do que a engenharia atual! Incrível, mas a realidade.
Os muros dos incas podem dividir-se em duas categorias: os das construções dos nobres ou de templos, de pedras quase polidas, que se encaixam umas nas outras de forma impressionantemente perfeita, e as restantes, em pedra tosca, mas em ambas a resistência aos terremotos está à vista! Não cedem um milímetro!
Olhem a maravilha desta parede!
Logo após a chegada dos espanhóis, desenvolveu-se em Cusco uma arte riquissima mista, porque estes vieram aqui encontrar um imenso escol de artesãos que os Incas haviam trazido de todo o lado do seu incipiente Império, para ali desenvolverem a sua arte: ourives, prateiros, tecelões e outras áreas têxteis, técnicos de construção e hidráulica. Cusco se já o era antes, mais ainda desenvolveu o gosto e qualidade artística que se respira por todo o lado.
Catedral de Cuszo
Como em Lima, a Catedral de Cusco não tem descrição: a grandeza e a riqueza deixam o visitante esmagado! Ouro, prata, pintura e escultura cobrem aquelas imensas paredes e tetos e altares, num nunca acabar de arte! E a Gran Custodia de ouro maciço de 22 kilates, 1,20 metros de altura, tendo incrustadas só 331 pérolas, 263 diamantes, 221 esmeraldas, 89 ametistas, 62 rubis, 43 topázios, 17 brilhantes, 5 safiras e 1 ágata! Um espanto.
Nem o Gil Vicente fez melhor!
Como é evidente há muitas outras igrejas e todas têm riquezas imensas. E tem museus e ruínas dos tempos incaicos com as suas impressionantes muralhas, por onde começa mesmo a nossa grande aventura dos tais “Ó Incas...”
Um "pedacinho" duma parede em Sacsayhuaman.
Algumas das pedras têm 4 metros de altura
Nos arredores da cidade é obrigatória a visita a diversos sítios, onde o guia, por muito bem que nos explique o que aquilo foi, nós saímos sempre com uma sensação de frustração porque na realidade ninguém sabe ao certo a finalidade daquelas maravilhas: Sacsayhuaman, Q´engo, Pucapucara, Tambomachay.
A igreja de São Francico, construida em cima do Templo do Sol.
Os terremotos derrubaram a igreja dos conquistadores "n" vezes,
mas a estrutura do Templo do Sol nem se mexeu!
Por todo o lado o turista é assediado por vendedores de algo típico: tecidos, pinturas, colares de pedras ou prata, e tudo isso, tudo é muito bonito, dum bom gosto notável.
Os Incas é que ficaram na história e têm todo o direito disso, porque foi um Inca, talvez menos de cem anos antes da chegada dos espanhóis que teve uma profunda visão de Estado e começou a reunir sob o seu governo todas aquelas tribos ou etnias que até então ou se ignoravam ou se guerreavam entre si. E eram muitas, muitas. Uma pequena idéia de parte delas: os ayamarcas, os azángaros, os cajamarcas, cañaris, cayambis, chachapoyas, chancas, chinchanos, chiriguanas, chuchaychos, chupaychos, cochucos, collas, collec, coyallos, guambos, guarcos, guayacondores, hatun collas, huancavillas, lucanas, pacajes, panataguas, quechuas, sauaseray, wari, yauyos, yungas, e mais uns quantos.
Antes dos Incas só os Wari, lá para as bandas do Lago Titicaca é que tiveram um arremedo de império ou organização de estado, mas segundo as lendas, que no Peru tudo são lendas, terão sido os chancas, grupo que vivia da pilhagem, que lhes acabou com a “festa”. Foram mais tarde esses chancas que pelo contrário deram origem ao Império Inca, ao Tahuantisuyu, como hoje se lhe chama, quando foram derrotados pelos incas, acabando por outros povos se juntaram a estes... os mais fortes.
Interior do Templo do Sol
Tupac Inca Yupanqui, o grande chefe inca de visão de estado, mais tarde chamado Pachacutec, começa assim o tal Tahuantisuyu - que talvez se possa traduzir por reunião de regiões ou grandes etnias - mas que não passa do seu quarto seguidor, quando chegam os espanhóis e ajudaram a desfazer toda essa organização!
Entretanto os incas, baseados em todo o saber ancestral deles e de outros povos, construíram milhares de quilômetros de caminhos. Não conheciam a roda porque não tinham animais de tração, e daí os caminhos serem estreitos. Mas espantosamente bem delineados e construídos. Nas regiões de declive acentuado e chuvas fortes todos têm valas para escoamento de águas, à beira dos precipícios construiram muros de proteção - alguns caminhos passam a mais de 4.900 metros de altitude - e assim interligaram uma imensa região que vai de Quito no atual Equador a Santiago do Chile, abrangendo toda a região montanhosa e a faixa costeira daquela região da América.
Construíram imensos depósitos de alimentos em todo o lado, com a finalidade de alimentar a população em anos de fome ou os exércitos em movimento, experimentaram novos cultivos, tentando, e conseguindo em muitos casos, adaptar plantas de regiões mais quentes a outras mais frias ou agrestes, e fizeram tanta outra coisa que a nossa admiração tem que lhes render homenagem.
Até maquetes das cidades e templos que pretendiam construir, para as estudarem nos seus mínimos detalhes!
Outro aspeto dos muros de Sacsayhuaman
Não se pense que os Incas eram uns sujeitos tipo Paz e Amor e adoradores do Sol! Não. Eram uns déspotas como quaisquer outros. Ou por mim ou contra mim! Quando um daqueles muitos povos, farto das exigências do governo central começou a fazer rezas aos seus deuses para se livrarem dos Incas, estes ao tomarem conhecimento disso atacaram essa gente, destruíram o seu templo, mataram todos os homens, todinhos mesmo, e levaram consigo mulheres e crianças!
Cortar pescoços aos do contra... era outra festa. Tinham até instrumentos próprios para cortar pescoços, e se o nível do inimigo o merecesse esse instrumento seria de ouro!
Mas... como criar e manter um império?
Outra coisa que faziam era exigir dos povos subjugados a permanente entrega de jovens meninas, entre os oito e dez anos, para serem educadas nas aclla huasi - casa das escolhidas. Logo depois da adolescência as mais bonitas ficavam para os Incas - o que se espera? - as de sangue nobre destinavam-se ao culto, sendo uma delas nomeada a esposa do Sol, e na terceira escolha, mas boas ainda, ficavam aquelas que se iriam ofertar aos curacas - chefes de tribo ou de clã - com quem os incas procuravam manter laços de amizade, e por fim sobravam as servidoras de las démas! Entre todas, as feias, separavam-se as que tinham boa voz para alegrar as festas da corte!
Era uma farra. Como é de imaginar os tais povos submetidos não gostavam muito que lhes levassem as filhas!
Por essas e outras, no dia em que os espanhóis chegaram, aqueles viram aí um modo de se livrarem da canga dos Incas e largamente contribuíram para a queda do tal império, o Tahuantisuyu!
A famosa pedra dos doze angulos, que mostra bem a engenheria
deste povo
É muito estranho verificar-se que os incas, com tanto conhecimento tecnológico adquirido ao longo de séculos, com obra espantosa, não tivessem desenvolvido uma escrita! Daí que toda a sua história anterior à chegada dos conquistadores esteja envolta em lenda e incertezas. Os espanhóis escreveram ainda muita coisa sobre esse tempo anterior, mas tudo envolto em mistério e lenda e ainda sem qualquer noção de tempo, em anos, que parece que para aqueles povos isso não contava.
Tudo em Cusco nos envolve nessas lendas, arte, história, mistério!
Até a comida! Uma carne de alpaca, grelhada no carvão, acompanhada de papas horneadas... Ó Incas... que delícia!
Cansou? Uma chásada de coca e volta a ficar ótimo. Doidão!
E é bom ir dormir cedo que amanhã o levantar é às 04 horas para ir de trem para o grande atrativo “histórico-esotérico” do Peru: Machu Picchu.
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