Continuação
CALOTEIROS * II
Continuemos
com mais uns caloteiros que, parece, sumiram já da minha vista. Guardo os
“acidentes” financeiros, porque ainda hoje tenho vontade de lhes dar uns
sopapos, de preferência em frente da família... deles.
IV
Definindo
o pilantra: político desde nascença, deputado, tendo chegado a substituir o
governador na ausência deste por ser presidente da Assembleia Legislativa,
menos uns 5 a 6 anos do que eu (eu, que na ocasião, como hoje, matando cachorro
a grito ou pouco menos), depois de ter assinado, com os restantes comparsas,
que cada deputado não podia utilizar mais do que uma viatura e respetivo
motorista (assim se chamam os carros que são nossos e eles usam e abusam), o
sujeito, tinha ao seu serviço, que eu vi, contei e os próprios motoristas
me confirmaram, cinco – 5 – carros, aliás, viaturas! Um para ele, outro
para a mamãe dele, um para a esposa dele, e mais um para cada uma das duas
filhinhas dele irem e voltarem do colégio (na faixa dos 12 aninhos).
Estava
a mudar para um apartamento (imenso, novo) deixando o “velho” num bairro
chique, encomendou-me uma mesa de som, daquelas cafonas, cheias de aparelhos e
luzinhas coloridas que piscam com o ritmo, que foi devidamente construída e
instalada no novo lar e fez sucesso.
Um
dia, sexa, disse-me para ir eu ao apê anterior, onde já não moravam, mas ainda
estava cheio de coisas, moveis, etc., ver ou buscar não sei já o quê. Não
precisei de gritar “Abre-te Sésamo”, que em português deveria ser “Abre-te Gergelim”,
porque o porteiro, instruído pelo patrão, abriu a porta. Entrei para buscar o
“?” e tive ocasião de me deparar com o covil dos ladrões; o meu espanto foi
igual ao do Ali Babá ao ver as riquezas acumuladas! Num dos quartos teria uns
20 ou 30 tapetes persas e franceses, ainda enrolados, aguardando o transbordo
para o novo apê/palacete, e ao lado umas oito a dez caixas, caixotes, de louça
de Limoges. O ouro não estava à vista, mas as pratas estavam empilhadas em
outro cómodo.
Cumpri
a missão que ali me levara e comentei depois com o cliente:
-
Lindos tapetes, e que louças magníficas.
-
Isso são tudo coisas que me oferecem! Já nem sei onde guardar tanta coisa,
Coitado.
Olhem o póbrema deli! Arrisquei, com ar de brincadeirinha:
-
Se o sr. quiser eu possa guardar alguns tapetes.
Sorriu
com ar alarve e nada disse.
A
seguir lembrei-lhe que faltava pagar-me a última parcela do obra que fiz, além
das visitas técnicas que tanto eu como o meu filho Luis fizemos diversas vezes
à sua nova casa, porque as mininas não sabiam mexer naquilo e já tinham
avariado vários equipamentos.
-
Eu nada lhe devo!
-
Deve sim. O saldo da mesa de som e as visitas que temos feito. Tenho-lhe
mandado sempre nota de tudo. Deve-me ainda o equivalente a US$ 200,00. (Penso que era
esse o valor, mas... já lá vão uns 40 anos...)
O
sujeito levanta a voz:
-
Não lhe devo nada.
-
Deve sim. US$ 200,00
-
Se insistir nessa teimosia vou mandar o meu irmão a sua casa. Ele é o inspetor
chefe do Imposto de Renda... (já nem sei o que seria) e vamos ver quem
ganha.
-
Pode mandar o seu irmão e mais quantos inspetores quiser. Se ele encontrar
alguma coisa errada pode multar, expropriar os bens, que se resumam a 7 ou 8
camas, porque os meus filhos dormem em camas, meia dúzia de cadeiras um ou duas
mesas e o fogão da cozinha. Eu até hoje ainda não aprendi a roubar nem explorar
ninguém.
O
besta ficou vermelho, mandou que me expulsassem do gabinete (gabinete de
presidente dessa assembleia de ...), ao que lhe disse que não precisava, que
sabia onde era a porta. Mas à saída virei para trás e ainda lhe disse:
-
O sr. é milionário, mas um dia vai pagar-me isto. Nem que seja um cêntimo, mas
pagará.
Não
pagou.
Fui
agora procurar o nome dele na Internet, que foi fácil encontrar, cheio de
referências políticas, sem nada ter feito pelo país. Não posso dizer o nome
dele. Já bateu as botas.
Também
não posso dizer que a terra lhe seja leve. É melhor pesada e com laje votiva em
cima.
V
Mais
um, talvez o último, porque não adianta chorar em cima do vinho derramado... e não
bebido.
Este
um comerciante de origem libanesa, loja enorme na 25 de Março de São Paulo, só
vendia meias. Aos milhares.
Milionário,
um palacete imenso no bairro mais caro, o Morumbi, no meio de um terreno
enorme, garagem para dez ou mais caros, enfim, um muitíssimo bem sucedido comerciante,
com a loja sempre cheia de compradores de todo o lado que carregavam caixas de
meias.
Não
se chamava Hassan nem Efrahim, mas era algo desse tipo.
Para
casa dele fiz também uma espampanante mesa de som.
Enquanto
negociámos foi sempre atencioso, recebeu-me em sua casa onde tomei um café
árabe, que devo dizer apreciei.
Foi
pagando a entrada, a segunda parcela, depois quis trocar um dos aparelhos de
som por outro importado, bem mais caro e... aí começou o póbrema.
Quando
fui à loja para receber o saldo que era relativamente pequeno (ainda lembro,
uns US$ 150,00) o meieiro... reclamou que já me tinha pago!
-
Não pagou. - Paguei. - Não pagou ... e a conversa azedou.
Rápida
discussão no meio da loja, sempre cheia e clientes e empregados, o caloteiro a
querer ridicularizar-me perante todos aqueles espectadores, alguns já com
aparente vontade para correrem comigo da loja.
Não
gostei. Aproximei-me da mesa dele, no centro da imensa loja para ver que
ninguém o roubava (!), olhei-o bem nos olhos e, com voz macia só lhe disse:
-
Sr. “x”, não precisa me pagar. Esses 150 dólares devem fazer-lhe falta para
aumentar o luxo do Morumbi. Boa tarde.
Frase
muito bonita, mas, ainda dessa vez fui roubado.
Não
aumentei os meus luxos, nem deixei de viver.
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