TIRADENTES
Um livro – um Herói
Sempre
gosto de comentar os livros que leio, quer seja para criticar, malhar, tentar
esclarecer ou elogiar.
Recebi
há dias, de um grande amigo, um belo presente: o livro “O Tiradentes – Uma
biografia”, 500 páginas, edição de 2018, de Lucas Figueiredo, e li com muito
interesse o livro em 3 ou 4 dias.
Eu
não tinha uma opinião que fundamentada sobre quem teria sido e o que tinha
feito Tiradentes, a não ser que fora o único enforcado e
decapitado-esquartejado, na Inconfidência Mineira, por ser o mais modesto dos
envolvidos na conjura.
Mas
estava enganado. Ele foi bem mais do que isso.
Politicamente
nada encontrei no livro que merecesse qualquer comentário. O autor, sendo de
feição política de esquerda ou direita, não envolveu em todo o texto a sua
opinião, o que já é um ponto a seu favor.
Livro
com grande quantidade de informações, o que obrigou o autor a um quase
conhecimento de toda a vida do Herói, de quem sempre se soube quase nada e
sobre quem muito se especulou.
Serviu
para políticos fazerem discursos e até para um movimento terrorista o MRT –
Movimento Revolucionário Tiradentes, justificar as suas ações.
Só
dois comentários, não ao autor; o livro é um tanto cansativo pela imensa
quantidade de detalhes, referências... necessários, cansativamente pesquisadas,
e todos com indicação das fontes onde foram encontrados, outro ponto a seu
favor.
Do
Tiradentes, Joaquim José da Silva Xavier, existe pouquíssima informação e então
cada um terá uma opinião a seu respeito.
Parece
que o primeiro livro que apareceu sobre ele foi publicado em Paris em 1892 por
Montenegro Cordeiro , “Tiradentes – Une esquisse”, que já procurei em França e
está esgotado. Aqui no Brasil o que existe sobre Tiradentes é muito pouco, e
sobretudo bastante fantasiado.
Pintaram-no
com uma linda e vistosa farda, quando as fardas daquele tempo nada tinham de
especial, além de que as de Tiradentes, por andar a correr florestas e mato
estavam muito rasgadas.
Depois
de ser executado pintaram-no (sem que algum pintor jamais o tivesse visto,
igual a um Cristo) e a emoção geral, não só do povo mas dos “ilustrados”
senhores das políticas foram-se aproveitando dessa admiração pelo infeliz, toda
a sua vida injustiçado.
A “imitação” de Cristo
1.
Tiradentes
foi um homem de bem, correto, valente, sempre injustiçado, não pertencia às
"zelites" mineiras, entrou para o Regimento de Cavalaria com o posto
de alferes, cumpridor e eficiente em todas as ordens que foi recebendo, 14 anos
preterido para a promoção dentro do exército a que pertencia, homem simples,
mas destemido.
2.
Não
bajulava ninguém sempre enviado para os lugares mais inseguros, como a fronteira
Minas Gerais/Rio de Janeiro, onde viviam bandos de assassinos à espera da
passagem de comerciantes que sempre levavam algum dinheiro ou ouro com eles, e
eram brutalmente roubados e mortos.
Sempre regressava
vitorioso, prendendo e até abatendo alguns dos facínoras, e jamais ouviu um
palavra de louvor, nem projeto de promoção na carreira.
3.
Quando
se fartou de ver a corrupção entre governantes, ouvidores, juízes,
comerciantes, todos, e vendo que jovens que entravam no exército depois dele, beneficiados
e protegidos ou de famílias mais ricas, eram promovidos e ele permanecia, e
permaneceu, quatorze anos no mesmo posto, um dia comentou que Minas Gerais eram
muito mais ricas do que Portugal e enquanto eles aqui se esfolavam para
trabalhar a corte jogava dinheiro fora como se fosse lixo.
4. Aí, em conversa com
homens formados em Coimbra que tinham vivido, mesmo à distância, a
Independência americana, com o seu entusiasmo e sede de justiça, liberdade e
igualdade (esta, até hoje uma farsa) decidiu que Minas tinha que se separar da
ganância de Portugal, desbocado e inconsequente saiu por todo o lado a pregar uma
rebelião ou revolta, para se separarem da Coroa, em Portugal.
5. Os pseudo líderes - que
só Tomás António de Gonzaga, praticamente assumiu - confabulavam enquanto
tomavam café e uma cachacinha, sem daí passarem, e só Xavier enfrentou a
estrada e todos com quem se encontrava os animava a aderirem. Sempre de cara
aberta, entusiasmado, mas descuidado. E não parava em Minas e no Rio de
Janeiro.
6. Um dos maiores devedores
a todo o mundo e à Corte, já metido na conjura e "amigo" do
Tiradentes, pensou que o melhor para ele seria delatar ao governador de Minas
Gerais tudo quanto sabia, para ser recompensado das enormíssimas dívidas que
tinha, com Minas e com a Corte.
7.
Aí
começa a Inconfidência, brutal, cheia de condenações aleivosas, embustes e
mentiras, textos deturpados pelos juízes, etc., encobertando amigos do
governador, até que culmina na morte, monstruosa, de Joaquim Xavier que quis
assumir a culpa de todos para que os outros se livrassem da condenação. Palmas
para ele. Honesto, ético, mas meteu a cara fundo de mais. Acabou meio louco com
todo o seu entusiasmo e vontade de ver Minas independente.
Ele
é realmente um HEROI, e eu passei a admirá-lo, muito, e a respeitar a sua
memória.
Mas
terminei de ler o livro com um amargo de boca, e uma tristeza pesada: a
corrupção corria livre, brutal e descarada por todo o lado, Os governadores,
auditores, fiscais, todos, comerciantes, etc., metiam a mão nos dinheiro
públicos com um desplante incrível. Ninguém pagava dívidas, nem a fornecedores
nem a Minas e roubavam o que podiam do "quinto", para ser
estupidamente desbarato em Portugal (com o que eu concordo!).
O
que me entristeceu com isto:
a)
Os nobres portugueses que para aqui vieram roubaram quase tanto quanto hoje
alguns políticos e governantes. Olhos fechados para os puxa saco e amigos, e
nada para os outros, como para o Xavier.
b)
Essa corrupção tornou-se endémica, e continuamos a sofrer com isso, daí o país
não crescer como poderia.
Séculos
de pouca vergonha não se limpam em um mandato presidencial.
E
o pior foi o exemplo dos tais "nobres", pior ainda sendo portugueses,
que me envergonham.
O governador de Minas,
Visconde de Barbacena, Luiz Antônio Furtado de Castro do Rio de Mendonça e Faro,
nobre, formado em Coimbra, chegou sem um tostão, e o seu primeiro ato foi
locupletar-se com a verba que tinha obtido para melhorar os militares -
dinheiro, armas, casernas, o equivalente a largos anos do salário de um alferes!
- e regressou a Portugal milionário!
Era fácil encher a sua
fortuna. Comerciantes havia que deviam à Coroa tanto dinheiro (o delator da
Inconfidência, só cerca de 2.600 anos do salário do alferes) e não pagavam, iam
entregando calmamente parte ao governador para ir protelando o pagamento, como
muitos faziam.
O visconde ainda teve o
desplante de, antes de regressar a Portugal, trocar o nome duma pequena
localidade, chamada, primeiro Arraial da Igreja Nova de Nossa Senhora da
Piedade da Borda do Campolide, e a seguir Borda do Campo, para Barbacena, para
se elogiar a si próprio, ele que foi um ladrão que aqui esteve 10 anos a
roubar.
Chegado a Portugal foi
homenageado por D. João VI, ainda príncipe regente (D. Maria I estava já mais
do que louca) ocupou altos cargos, altíssimos, como refere a Enciclopédia, e em
1808 não quis acompanhar a família real para o Brasil.
Fez amizade com o
invasor francês, Junot, que o nomeou membro da deputação (que puta ação!) que
foi a Paris cumprimentar, e saudar Napoleão. Logo Junot que roubou centenas ou
milhares de obras de arte em Portugal. Deviam entender-se bem em pilhagens.
E ainda, quando D. João
regressa a Portugal, é “promovido” a conde, nomeado Par do reino e do Conselho
de Estado !!!
Os ignaros que vivem na
cidade de Barbacena nunca pensaram em riscar o nome dele do mapa!
É assim que se não
ensina e esquece a história.
Se lá tiver uma estátua
que lhe façam o mesmo que ele ajudou a fazer a Tiradentes: esquartejá-la. Se
for de pedra, que a moam e sirva de alicerce a uma conduta de esgoto.
O que lhe parece a
ideia, senhor prefeito de Barbacena?
Finalmente felicito o
autor do livro, Lucas Figueiredo, pelo exaustivo trabalho que nos levou a
melhor “conhecer” um injustiçado louco por liberdade.
18/12/2022
Outro mártir que lutou contra o "sistema" e acabou sendo "eliminado": nosso "Bozo"!
ResponderExcluirSistema de país pobre a roer um país demasiado rico!
ResponderExcluirSua densa análise é uma indicação primordial de que todos — e especialmente os jovens — devemos ler o relato do L. Figueiredo para, à luz da história, compreender e avaliar melhor a atual conjuntura, em que estamos a vivenciar um dos maiores retrocessos político e social que se tem notícia.
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