domingo, 16 de outubro de 2022

 

A Fábula da Ignomínia

 

Procede sempre de maneira que de tua sabedoria

Nunca sofra o teu semelhante. Domina-te. Jamais te entregues

Rubaiyat – Omar Khayyam

 Era uma vez... e foi assim mesmo.

A história que vou contar, verdadeira, passou-se na Alemanha, e que eu presenciei há mais de 50 anos.

Nos arredores de uma pequena e muito bonita cidade, Giessen, um jovem engenheiro cedo se lançou na construção e fabricação de componentes elétricos para fins industriais.

Casou, e com a ajuda da mulher que assumiu a contabilidade, cresceu rápido por fabricar com grande qualidade e em poucos anos tinha já uma fábrica de grande referência e uma razoável quantidade de trabalhadores.

A fábrica era de um único proprietário, o engenheiro que a criou, mas estava já com idade para se aposentar, e sem filhos.

Chamou o advogado, reuniu todos os trabalhadores e no fim de um simpático almoço, num rápido pronunciamento, disse-lhes:

- Estou cansado, tenho direito a me aposentar, e, na presença do advogado que trouxe toda a documentação necessária, a empresa vai ser entregue a vocês todos. Vocês a partir deste momento, após a assinatura dos necessários documentos, serão os donos dela. Fica também consignado que, enquanto eu viver será a empresa que me pagará, a mim e minha esposa uma aposentadoria, também consignada na documentação a assinar.

Irão vocês escolher quem ficará no comando, em votação de todos, porque do mais modesto ao engenheiro mais qualificado, todos são sócios, donos, da empresa; à medida que forem saindo, ou se aposentando ou por qualquer outra razão, deixam a sociedade. Novos contratados, se necessários, após um estágio de poucos meses, se quiserem continuar na empresa, e merecerem, assumem a sua quota parte.

A votação foi fácil, garantiram ao diretor geral um período de quatro anos, e a empresa cresceu de forma ainda mais rápida, e era muito conceituada não só dentro da Alemanha como fora, exportando os seus equipamentos.

Ao fim dos quatro anos o pessoal quis mudar de diretor, um homem bem competente mas extremamente exigente, e escolheram um outro, mais aberto, até um tanto brincalhão, acima de quem logo começaram a cair algumas dúvidas sobre a sua seriedade nas compras e vendas, porque estaria a viver com mais pompa, sempre se tornando muito amável com os colegas.

Mandaram, em sigilo investigar, e confirmou-se que esse sujeito estava a fazer investimentos e comprar casa longe dali. Moral da história, estava a roubar a empresa e já se notava que as finanças andavam demasiado apertadas.

Imediata convocação para discutirem o futuro e foi apresentado novo candidato para diretor geral.

O alegre, brincalhão (e desonesto) tinha conquistado um bom número de colegas que, por razões óbvias queriam que ele continuasse a ser o responsável da empresa.

Discussão acesa na assembleia acabou por vencer o bom senso e a rigidez dos mais experientes e mudou-se novamente de diretor, sendo o que saía rebaixado no seu trabalho e logo convidado a sair.

Foi pena porque era um bom técnico, mas saiu. E não conseguiu trabalho em lugar algum.

Entretanto a fábrica continuava a progredir, muito bom nome entre os clientes, mas precisou de um técnico para substituir o que tinha sido dispensado, que após uma boa admoestação, foi readmitido.

Não tardou para inventar calúnias e a envenenar a cabeças de muitos colegas, que em nova assembleia, passados só dois anos, reconduziram o desonesto funcionário para o comando.

E recomeçou a empresa com dificuldades financeiras que jamais tivera. Logo se concluiu que a nomeação deste indivíduo tinha sido um erro que estava a matar a empresa. As vendas a cair, dificuldade de caixa mesmo para pagar salários, etc..

Nova assembleia geral.

Levantou-se a voz de um dos mais antigos colaboradores – sócio, como todos – e expôs o problema de forma dura e direta;

- Colegas e amigos

Estamos numa situação difícil, em risco de termos que fechar a fábrica, que alcançou grande qualidade e crédito junto dos seus cliente e dos bancos, fruto do trabalho do nosso antigo patrão e de todos aqueles que com ele trabalharam. Depois nós nomeamos o que considerávamos mais capaz, o engenheiro K... que, com seu grande trabalho e visão ainda elevou esta NOSSA empresa ao mais alto conceito, e quando um grupo de colegas, aqui presente, quis e conseguiu nomear uma pessoa desonesta, coisa que jamais pensámos que poderia estar entre nós, a NOSSA empresa começou a afundar, está neste momento a atravessar dificuldades nunca imaginadas.

Demos um passo para ir mais fundo quando o readmitimos, pior quando novamente o colocámos como diretor, o que mostra que esse homem deverá ter alguns parceiros nesta triste situação.

Ele está com um elevado património pessoal ROUBADO do nosso trabalho. E nós, todos, em risco de ver a fábrica fechar,

Vamos votar mais uma vez para ver se ainda conseguimos salvar o que já está meio perdido. Tem dois grupos aqui e cada um escolheu o seu representante. Não vale a pena enunciar o muito que por nós todos fez o engenheiro K... e sabemos que se votarem por aquele que nos roubado, a fábrica não terá mais que uns meses de vida.

Nós ficaremos pobres e o LADRÃO não sei se continuará a rir de nós, rico, porque aqui, na sala ao lado, está a equipa de investigadores da polícia, com o relatório de tudo o que esse homem tem feito e mais, trazendo já uma ordem de prisão.

Agora vamos votar:  Ou o engenheiro K..., sisudo, exigente, correto, ou no ladrão para nos roubar o que nos sobra.

É fácil imaginar em quem se votou.

 

Eu que estava, em 1966, naquela área em visita a duas fábricas de material fotográfico, depois de ouvir o que acima escrevo, pedi para fazer uma rápida visita a essa fábrica. Não recordo o nome dela, mas estava novamente em grande recuperação e era um exemplo em toda a região. Vi e ouvi o relato que acima transcrevo, certamente com algumas falhas porque são passados mais de 56 anos.

 

Aqui no Brasil está a passar-se algo semelhante, bem sei que em proporções muito maiores, onde estão envolvidos 225 milhões de habitantes, e a correr mal a votação, a ladroagem, em velocidade louca, levará muito milhões à miséria e, ainda para piorar, a toda a América Latina, que escumalha semelhante não deixa evoluir.

 

Pensai e meditai. O que se passou naquela fábrica na Alemanha Eu vi.

 

16/10/22

 

 

5 comentários:

  1. Tomara, meu Amigo. Que muitos o leiam, mais o ouçam. Porque o saber dos ditados e adágios populares não falha . E “ quem te avisa,…”
    HB

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  2. A fome é urbana. FHC distribuiu terras do Estado mas é mais fácil traficar droga no Calçadão.
    Que pena , Brasil...
    HSO

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  3. Francisco,
    A grande diferença é que, por aí, não há candidatos alemães ao posto de comando.
    É que das 2ªs, 3ªs e por aí abaixo gerações de emigrantes alemães, do espírito protestante germânico, só restará a paixão pelo chope e pouco mais.
    Um, é descendente de italianos; o outro tem sangue lusitano. Estamos conversados.
    Abraço
    APM

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  4. E agora?
    Associando-me à avaliação preocupante, enfatizo que o sentimento é de perda, decepção, tristeza, vergonha e inconformismo.
    Esse sentimento não apaga a noção de crença na Liberdade, Verdade, Coragem e Ética.
    Brasil acima de tudo!
    Quer dizer, que haja um Brasil bom e com igualdade de oportunidades para todos os brasileiros!

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  5. Aléssio Ribeiro Souto5 de novembro de 2022 às 07:17

    E agora?
    Associando-me com a avaliação preocupante, enfatizo que o sentimento é de perda, decepção, tristeza, vergonha e inconformismo.
    Esse sentimento não apaga a noção de crença na Liberdade, Verdade, Coragem e Ética.
    Brasil acima do tudo!
    Quer dizer, um Brasil bom e com igualdade de oportunidades para todos os brasileiros.

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