O
meu 90° Natal
Não lembro do 1°. Evidente; tinha poucos dias de vida, e nem lembro de muitas dúzias deles, apesar de ser uma época em que, sobretudo, sem pensar em presentes, sempre houve um misto de alegria e tristeza.
Alegria pela vida que se reunia à nossa volta. A alegria completa não durou muito. Cedo começaram a ir embora os nossos entes mais queridos.
Primeiro no tempo dos nossos pais e avós e depois quando a nossa casa que se enchia de alegria, de abraços, no íntimo de todos uma sempre vontade de sermos cada vez melhores pessoas, que se não era uma quimera, pelo menos dava um toque na consciência de cada um.
A família, o clã, que formámos há sessenta e muitos anos, foi crescendo até um dia, quando um deles nos deixou para sempre, era maior a tristeza do que a alegria dos pequeninos e depois dos netos que ocupavam grande parte do nosso coração, porque o vazio nunca se preencheu.
Mais tarde começámos a ver alguns filhos e netos saírem do nosso meio e irem tentar vida lá, longe, porque o país que nos recebeu não oferecia perspectivas concretas, coerentes.
Depois ainda tivemos a repetição de outro filho que nos deixou.
E o Natal passou a ser, sobretudo para nós, os velhos, um momento em que a alegria e animação dos pequenos não conseguia preencher o tanto que nos faltava.
Agora mais netos foram embora à procura de vida nova, que parece terem achado. Mas estão longe, mesmo já adultos continuam a fazer parte da meninada que nos fazia sorrir, que faziam aquela barulheira trocando entre si uns presentinhos de pouco valor económico mas cheios de valor amoroso.
Outro filho, já considerado idoso, saiu também do país, e está isolado noutra terra, à espera que esta calamidade mundial o deixe trabalhar e seguir a sua vida.
Além da família também aparecia um ou outro convidado dos nossos filhos e a casa enchia-se com mais de duas dúzias de sorrisos e abraços.
Este ano, o presépio já está montado, mas não haverá crianças.
Mas lá estão aqueles bonecos simples, humildes, como o Menino e seus Pais, os Magos e os animais, para que não esqueçamos que nada somos se não nos procurarmos igualar ao que esse Menino nos trouxe: a mensagem da Paz, da Família e de amor ao próximo qualquer um que ele seja, e onde quer que esteja.
O momento que estamos a viver é grave. Gravíssimo, até.
Paz, Família e Amor ao próximo são palavras, e sobretudo atitudes, que estão a ser combatidas em todo o Mundo.
Em cima disso, esta pandemia brutal que nos isolou, entristeceu, e nos traz o coração apertado, temendo que esse mal chegue perto de quem amamos, quase a perder a esperança que termine logo. Já colheu vidas demais. Podia parar.
A ganância e os ganhos fáceis em qualquer das falsas moedas em que o mundo vive, ignoram que, em muito lugar, sobretudo nalgumas regiões de África, continuam a nascer crianças, lindas como quaisquer outras, mas no meio de uma imensa pobreza. E logo que nascem, olhinhos fechados, assim que os abrem fazem um sorriso maravilhoso para as suas mães, sem saberem que as vão fazer sofrer por não terem condições de lhes darem uma vida digna. As mães beijam-nos e choram de dor.
No oposto, a vida dos biliardários só se preocupa em querer mais e mais. Desconhecem a dor, a fome, a pobreza e jogam dinheiro fora, aos montes.
O Natal tem que fazer meditar sobre todo este mundo desajustado, infame.
E no momento que parecer o de maior alegria algumas lágrimas vão teimar em sair.
18/12/2020