quarta-feira, 16 de setembro de 2009

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Recuerdos argentinos
 em 3 capítulos !

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Aqui mesmo ao lado – quase 3 horas de vôo Rio-Buenos Aires – e só agora surgiu a oportunidade de fazer uma rápida visita!
Cidade bonita, bem traçada, muito bem arborizada, largas avenidas e enormes e bonitos parques, clima magnífico, uma gastronomia, sobretudo nas carnes, que não tem confronto, ótimas massas – pastas – e uma imensa e sempre excelente variedade de vinhos. Moral da história: valeu a pena! E não foi só Buenos Aires.
Pelo que se consegue acompanhar através do noticiário internacional, a Argentina atravessa uma crise difícil, não só econômica, mas talvez até de identidade. Um país que no começo do século XX tinha conseguido elevar-se ao nível internacional do primeiro mundo, sendo, de longe o carro chefe de toda a América Latina, atraindo milhares de imigrantes, com uma imensa e forte classe média, parece não saber agora encontrar uma saída para os seus problemas, com um “casal presidente” a enriquecer, a querer perpetuar-se no poder, e a sobrecarregar ferozmente de impostos a economia, debilitada.
Continua a ter como “carro chefe” da sua economia a produção de trigo, milho e soja, carne e lã, e os famosos vinhos. Sendo o 5° produtor vinícola mundial exporta somente 20% da sua produção, já que o argentino, e os turistas, como eu por exemplo, não dão trégua a “coisa boa”!
Para compreender qualquer povo há que saber um pouco da sua história. Por hábito, nas minhas viagens sempre procuro comprar alguns livros de história do país. Sobretudo dos países dos “novos mundos” que ainda há relativamente poucos anos não tinham qualquer estrutura, saíram de colônias e tiveram que se fazer, Deus sabe com que lutas e sacrifícios.Não se pode resumir a meia dúzia de linhas a história de quem quer que seja, mas alguns aspectos são importantes para traçar as linhas mestras.
Buenos Aires começa com um punhado de náufragos, no princípio do séc. XVI, ali abandonados, miseráveis, quase sem comida, sofrendo a pressão dos aborígines, e onde só raramente passava algum navio que lhes pudesse aliviar o sofrimento. Ao fim de um, dois e até cinco anos lá vinha uma vela, uma “esmola”. Foram os portugueses do Brasil os que começaram a aparecer para com eles fazerem algumas trocas!
Sair daquele improvisado “refúgio” e penetrar nas pampas à procura de comida, de algum animal, era uma aventura difícil e perigosíssima: a planície, imensa, a perder de vista, não tinha pontos de referência. O regresso era uma loteria! Um dia um grupo de aventureiros encontrou um manancial que parecia inesgotável: manadas de gado vacuum, aos milhares, bravos, abandonados a si próprios, que naquelas terras ricas tinham encontrado comida abundante e excelentes condições de reprodução! Mas era impossível aproveitar a sua carne; não havia como transportá-la para a dividir com os outros, menos ainda como conservá-la. Os “pamperos” limitavam-se a abater as rezes, tirar-lhes o couro e deixar a carne para os ratos e outros animais da planície. Começa com couros a “moeda” dessa gente.
Aos espanhóis o que lhes interessava, depois da pilhagem do ouro dos incas, maias, aztecas, etc. era a prata de Potosi. Isso continuava a enriquecer a corte espanhola, mas a um custo elevado: toda a mercadoria enviada da “corte” para abastecer Lima e o Alto Peru, viajava em galeões até ao Panamá, atravessava aquele istmo no dorso de mulas, voltava a ser embarcada em navios no Pacífico até Lima, novamente carregada em mulas para atingir as minas, onde viviam uns quantos milionários e uma imensidão de trabalhadores, escravos e livres. A prata das minas fazia de volta o mesmo quase interminável, e caro, caminho.
Sonhava o vice-rei do Peru com uma saída para o Atlântico, que tornasse as viagens mais rápidas e baratas. Através do Brasil, era difícil porque os portugueses haviam de querer “direitos” de passagem e alfândega. Para o sul, Montevideo não existia e em Buenos Aires a coroa havia estabelecido um “virrey”, fora da jurisdição do “virreynado del Peru”! E por aqui começa o tráfego para o Alto Peru e o crescer do porto de Buenos Aires. A rota seguia por Cordova, Santiago del Estero, Tucuman e Jujuy, e pelo caminho se algum lucro ficava, era sobretudo para os “porteños”. Todos os colonos dependiam de um ou outro “virrey” mas o que os crioulos – espanhóis nascidos nas colônias, como no Brasil que separavam os brasileiros dos reinóis – procuravam era a independência financeira, já que política não lhes dizia respeito.
Com a invasão da Espanha por Napoleão, e da vergonha que reinava naquele país, que chegou a ter um irmão de Bonaparte como rei, os povoadores dos “virreynados” das Américas entenderam que nada deviam à nova majestade, trataram de despejar o “virrey” e montar uma junta governativa. Mas à boa moda espanhola, cada um por si! Buenos Aires tinha o porto de entrada das mercadorias e ficava com a totalidade das receitas da “aduana”, e as outras regiões da atual Argentina, o interior, que se...
Para se tornarem autênticos argentinos, sendo praticamente todos filhos ou descendentes de espanhóis, criaram contra estes uma guerra absurda: filhos contra pais e avós, chegando ao ponto de correrem da cidade com os espanhóis solteiros e alguns comerciantes já endinheirados que aproveitaram para espoliar! No interior os governantes sucediam-se, a maioria em situação de pouco mais do que penúria, e com a rapidez com que uma faca corta um pescoço! Era o método mais usual para troca de governo!
Entretanto Buenos Aires crescia, fomentava a criação de carneiros e organizava a de bovinos, em meados do século XIX sobrava-lhe dinheiro e, muito inteligentemente, planificou uma magnífica cidade, importou espécies arborícolas sobretudo da Europa, lançou linhas de caminhos de ferro para todo o lado (ainda hoje a rede ferroviária é superior ao somatório de todas as linhas dos restantes países da América do Sul, Brasil incluído) fomentou a educação criando a obrigatoriedade do ensino primário e estabelecendo a gratuidade no secundário e nas universidades (três delas fundadas no século XVI). O interior... pedia esmola!
Um dia os argentinos descobrem no seu país (ainda 1/3 do território era terra dos índios) as famosas terras roxas, talvez as melhores do mundo para agricultura, enchem os celeiros de trigo e milho, desenvolvem a vinha nas “orillas” dos Andes, e quando finalmente conseguem uma máquina para fazer frio, as suas imensas manadas de gado logo vão abastecer a Europa, sobretudo a Inglaterra.
Mas, e os índios? Os índios... atrapalhavam os “assentamentos cristãos”, e “houve que” lhes dar caça! Chegaram a pagar a caçadores de índios pelas orelhas que traziam! Mas história vergonhosa e triste não interessa.
"Comício a la Peron" no tradicional bairro La Boca
Até aos anos 30 do século XX Buenos Aires desenvolveu-se muito e já não tratava o interior como bastardos! A Argentina atraiu imigrantes sobretudo para a agricultura e pecuária, cresceu, o povo alfabetizado, a classe média forte, mas as idéias socialistas e anarquistas fizeram também a sua aparição! E com eles a chegada dos militares ao poder, e do maior apoio das oligarquias tradicionais! Vem a 2ª. Guerra Mundial e as exportações de alimentos tornam-se mais difíceis, apesar do enorme aumento do valor dos produtos. Em 46 assume Perón, ditador sem experiência nem idéias, pactuando e desarticulando à esquerda e à direita, a Evita a querer ajudar os mais desafortunados, e o inevitável golpe militar que culmina com o desespero da Guerra das Malvinas para ver se calavam a opinião pública que clamava não só pela situação econômica, mas pelas centenas de milhares de ativistas e estudantes que o poder das armas havia feito desaparecer. Até hoje! Centenas de milhares.
Voltam os civis e depois disso só um governo poderia ter dado certo não fosse a mesma herança castellana “si hay gobierno, yo soy contra”: Alfonsin. A saga prossegue, e talvez sobretudo agora, porque os momentos que atravessamos são sempre os mais percebidos, sente-se um descontentamento geral, uma insegurança face às atitudes do “casal presidente”, e assiste-se até à imigração de argentinos para qualquer lugar onde se sintam mais seguros!
Com tanto desgoverno algumas universidades estaduais perderam a hegemonia e qualidade propiciando a abertura de outras privadas.
Depois falaremos dete tango !...
De qualquer modo a Argentina é um país que vale muito a pena... tudo!
No próximo capítulo vamos falar até de tango, e como não podia deixar de ser, do imortal Carlos Gardel! Quem não gosta?
do Brasil, por Francisco G. de Amorim

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